A contribuição dos campos de pouso fluviais no desenvolvimento de Natal

Não foi somente o porto e a linha férrea que causam impacto no espaço urbano de Natal, e em particular do bairro da Ribeira. É preciso tecer alguns comentários também sobre a aviação nascente.

Ainda que a aviação seja uma “aventura” cujos primórdios antecedem a Primeira Guerra Mundial, é no período do entre as duas Grandes Guerras, particularmente na década de 1920, que a aviação apresenta progressos notáveis. As linhas aéreas se expandem aos poucos em várias direções do planeta. Nesse contexto, Natal apresenta grandes vantagens estratégicas, tendo em vista ser o ponto mais próximo entre a Europa, a África e a América do Sul e, portanto, de onde a travessia do grande oceano representava as menores dificuldades.

Veja abaixo o resumo das principais companhias aéreas que fizeram de Natal um ponto de escala incontornável em suas rotas para o Brasil e outros países da América do Sul, entre o final da década de 1920 e início da década de 1940, em plena Segunda Guerra Mundial:

Aviação comercial e estratégica em direção ao Brasil e à América do Sul: Natal como escala internacional (1920 – 1940)

Natal se tornou uma escala da maior importância par as empresas e nações envolvidas na ampliação dessas linhas em escala Internacional, em direção a América do Sul; a cidade entra, assim, no circuito mundial da navegação aérea nascente. As empresas aéreas transportam inicialmente correspondências, bagagens e mercadorias; somente num segundo momento, especialmente a partir da década de 1930, se torna possível e viável o transporte também de passageiros.

As empresas aéreas europeias referidas no Quadro 1, e outras como a espanhola Iberia, que passa a estabelecer uma linha com o Brasil via Natal logo após o termino da Segunda Guerra Mundial, usam as colônias europeias na África como escala.

Entre a década de 1920 e o início da Segunda Guerra Mundial, Natal recebeu inúmeros representantes ilustres da aviação nascente: franceses inicialmente, mas também italianos, portugueses, brasileiros, alemães, americanos e de várias outras nacionalidades. O que desperta a atenção, nessas experiências, é o fato de que cada pouso era motivo de comemoração pública. Em caso de acidentes, os pilotos e equipe recebiam das autoridades locais e do povo o necessário socorro. As mesmas autoridades, inclusive os representantes consulares ou das empresas aéreas instalados na cidade, apressavam-se em receber os pilotos e suas equipes e em providenciar-lhes a melhor acolhida possível.

Em nível local, esse momento produz, por assim dizer, uma reaproximação da cidade com o rio. Afinal, os hidroaviões amerissavam no Rio Potengi, que funcionou como hidrobase entre 1922 e 1945, até o final da Segunda Guerra Mundial. O primeiro aeródromo de Natal surge em 1927, mas era localizado no atual município de Parnamirim, distante cerca de 20 quilômetros da cidade de então, e só vai ter um papel realmente fundamental com a Segunda Guerra Mundial, quando se torna uma importante base aérea norte-americana, mas também brasileira. A partir de 1927, a cidade tinha, portanto, dois campos de pouso, um fluvial, mais antigo, que recebeu seu primeiro avião em 1922, e um terrestre, em Parnamirim.

Em 21 de dezembro de 1922, o “Sampaio Correia”, proveniente de Nova York e pilotado pelo brasileiro Euclides Pinto Martins e pelo americano Walter Hinton amerissaram no Potengi. Os pilotos entraram na cidade pelo cais da Tavares de Lyra. Viveiros (2008, p. 65-66).

A partir de 1927, foram construídos 49 campos de pouso ao longo da costa oriental do Brasil, dos pampas argentinos e sobre os Andes. Segundo Carlos Peixoto, o campo de pouso de Natal era um deles. Em 1927, ainda na fase de negociações e estudos de ampliação da rota da CGA até a América do Sul, esteve em Natal o piloto da companhia Paul Vachet, que viajava ao Brasil desde 1925. Peixoto (2003, p. 27).

Vários locais ao longo do Rio Potengi serviram de pontos de desembarque dos aviadores que chegaram a Natal. Paulo Viveiros, que repertoriou dezenas de pousos tanto no aeródromo de Parnamirim quanto no Rio Potengi, provenientes de várias partes do mundo entre 1922 e 1939, identificou, para alguns desses voos, pontos de desembarque no rio, sempre na margem direita, do lado da cidade: Praia da Montagem, depois chamada de Rampa, o Cais da Tavares de Lyra, a Pedra do Rosário, e a Hidrobase da Compagnie Générale Aéropostale, francesa,posteriormente pertencente à Air France, no Refoles, em 1939.

Sequência de fotos do momento de embarque e desembarque de passageiros na Rampa.
Locais de embarque/desembarque: hidroaviões no Rio Potengi (1922-1939). Produzido pelo autor sobre mapa da cidade atual do Google Maps. Os locais se baseiam em Viveiros (2008: 63-192).

Mas, do ponto de vista da aviação, a praia da Limpa, se tornou o lugar de maior destaque. Ficava nas imediações das oficinas de montagem, assim chamadas porque se tratava de uma área de apoio para a construção do porto de Natal. Conhecida hoje como Rampa, ela passou de um ponto de embarque e desembarque de passageiros e bagagens de companhias internacionais da aviação civil, nos anos 1930, para se tornar uma base aérea americana durante a Segunda Guerra Mundial, associada a outra base aérea americana, bem maior e mais importante, localizada em Parnamirim. A importância desse local estratégico pode ser aquilatada pelo fato de ter sido o palco de um encontro histórico entre o Presidente dos Estados Unidos, Franklin Delano Roosevelt, e o Presidente brasileiro Getúlio Vargas, em 29 de janeiro de 1943. A Fundação Rampa apresenta um histórico do que foi esse local incontornável da aviação mundial.

Os diversos indícios aqui citados demonstram, portanto, uma aproximação importante da cidade do Natal, e particularmente da Ribeira, com o Rio Potengi, entre 1920 e 1945 aproximadamente.

Fotografias da Rampa, Natal-RN. Fonte: Fundação Rampa.
Boeing B-314 Dixie Clipper que trouxe Roosevelt ao Brasil em 1943. Pouso no Rio Potengi.

Fontes:

O rio Potengi e a cidade do Natal em
cinco tempos históricos. Aproximações e distanciamentos por Rubenilson B. Texeira.

INFRAESTRUTURA E MODERNIZAÇÃO URBANA: OS IMPACTOS DO PORTO, FERROVIA E AEROPORTO EM NATAL E DAKAR (1890-1930)
Rubenilson Brazão Teixeira

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