O Terpsychore-Club
O Terpsychore-Club era mais um clube recreativo que funcionava em Natal. O clube tinha lugar na rua Coronel Bonifácio (atual Santo Antônio), também situada na bairro de Cidade Alta.
Desde 1917, ofereciam aos seus sócios saraus, pic-nics, festas de aniversário e bailes carnavalescos. O Terpsychore ajuda a construir na cidade a imagem do moderno, não apenas por promover em seus salões a circulação do ideal de cidade moderna desejado pelas elites, mas também por introduzir no espaço urbano mais um “bello prédio”, (TERPSICHORE-club. A Republica, Natal, 29 jun. 1923.) edificação condizente com os padrões arquitetônico desejados por essa classe.
A adoção dos estilos neoclássico e eclético nas novas edificações feitas em Natal, como o Teatro e o Palácio do Governo. indica que a influência francesa não se ateve apenas à moda e literatura. De acordo com Nestor Reis, “nas habitações destinadas às camadas mais abastadas tendia-se à utilização máxima de materiais importados e ao emprego das formas arquitetônicas como símbolos de posição social” (REIS, Nestor Goulart. O quadro da arquitetura no Brasil. 8. ed. São Paulo: perspectiva, 1997. p. 180.). No Brasil, a Escola Politécnica, situada no Rio de Janeiro, foi uma grande transmissora dos estilos arquitetônicos em voga na Europa.
Os clubes tinham um papel importante na construção dessa nova cidade almejada pela elites locais pois, através dessas instituições, difundiam-se novas práticas sociais que seriam refletidas nos espaços urbanos. As associações, geralmente fechadas a um número restrito de sócios, acabavam gerando uma segregação espacial pois eram em lugares como os clubes que a elites se distinguia do povo, onde as práticas das elites eram legitimadas, em contraponto às práticas populares. Eram nos clubes e nas atividades praticadas por eles que os ideais das elites circulavam. Lá as elites se formava e se transformava. Em Natal, as práticas definiam os espaços. À medida que as elites tentavam distinguir suas práticas das práticas dos outros grupos, ela ia definindo uma configuração social, que se refletia na organização dos espaços da cidade.
ANTECEDENTES
Até o final do século XIX, Natal apresentava alguns costumes e tradições que chegaram até nós. Outros, porém, já se diluíram no tempo. Praticamente desapareceram da cidade em crescimento. Temos serenatas e tertúlias (estas com outros nomes). Mas os “Cantões”, já desapareceram.
As festinhas familiares de hoje, aniversários, comemorações de qualquer espécie, entre amigos, eram chamadas antigamente de “tertúlias”. Lindolpho Câmara em seu livro “MEMÓRIAS E DEVANEIOS”, editado em 1938 no Rio de Janeiro, refere que a falta de clubes recreativos na cidade determinava as comemorações caseiras. Parece que esse não era o motivo principal. Hoje, a cidade está cheia de clubes e as festinhas familiares continuam. São as mais gostosas.
Em Natal, o sonho das elites era fazer com que Natal alcançasse um grau de civilidade típica de uma capital. Deu-se início a construção de muitos prédios que sem as práticas sociais seriam desprovidos de qualquer sentido. Essas práticas sociais davam sentido aos espaços da cidade. Nesse período os clubes, bares, cafés, cinemas, jardins públicos e clubes esportivos representavam espaços de um lazer polido e civilizado (ARRAIS; ANDRADE; MARINHO, 2008).
Em Natal, cafés, bares e bilhares não foram os únicos estabelecimentos dedicados às diversões. Os clubes tiveram grande destaque na vida social da cidade, essas casas recreativas funcionavam como espécie de sociedades fechadas, era nesses locais que a elite definia sua imagem.
Os clubes recreativos eram sociedades fechadas e seletas, ambientes em que as elites desenhavam seus espaços e definia suas imagens. Entre os clubes existentes em Natal destacou-se Club Terpsychore.
Os clubes eram espaços de sociabilidade com grande importância no cenário da vida social da cidade de Natal. Nas duas primeiras décadas do século XX, as principais festas aconteciam nos salões dos clubes da Cidade Alta.
O Club Terpsychore faz a alusão a um outro clube homônimo situado no Rio de Janeiro/RJ que era carinhosamente conhecido como “Castelo Musical Dançante”, fundado em 15 de agosto de 1885, e situado à rua do catete, n. 54.
As mudanças que ocorreram em Natal se estendem ao cotidiano da população, falar na cidade é também falar em sujeitos, em vidas, em papéis sociais, comportamentos e conflitos. Assim, a inserção de um modo de vida burguês na cidade passou a delegar também regras e comportamentos para os diferentes sexos. Os cafés, os clubes, cinemas e o teatro da cidade são palco para essas novas posturas e relações, além disso, os discursos circulantes na época como as crônicas, as matérias de jornais e os discursos publicitários que circulavam em diferentes periódicos podem ser compreendidos como representações e documentos relacionados ao modo de vida praticado na Natal das primeiras três décadas do século XX.
LOCALIZAÇÃO
A atual Rua Câmara Cascudo está localizada no bairro da Ribeira. Por ela passou, em 26 de abril de 1817, o cadáver desnudo do coronel André de Albuquerque Maranhão, inquirido em um pau, tendo então uma moradora daquela rua, Ritinha Coelho, recoberto o corpo do inditoso revolucionário com uma esteira. Calma não é ainda a rua em questão!
Depois a rua tornou-se conhecida como Rua das Virgens, tradicional denominação que foi substituída por rua Senador José Bonifácio, através do Decreto Municipal de 13 de fevereiro de 1888. Em 1941 ocorreu uma nova mudança do nome da rua, que ganhou o nome de Coronel Bonifácio. Aí sim até então, recebia a denominação de Coronel Bonifácio uma outra rua, hoje conhecida como rua Santo Antônio, na Cidade Alta, localização esta do Terpsychore-Club.
PIC-NIC
Não raro os sócios dos clubes estendiam para o espaço público algumas atividades sociais organizadas pela direção. Um exemplo dessas atividades de lazer vinculada ao clube que ocorria fora dele eram os famosos pic-nics. Esse tipo de evento social realizado sempre no subúrbio da cidade, ou nas praias, permitia aos sócios uma renovação de ares, uma aproximação com a natureza, sem dispensar os bons costumes e hábitos civilizados.
Com um pic-nic, o Terpsychore comemorou a passagem do seu aniversário em 1921 e; da mesma maneira, o Centro Náutico ofereceu um dia de lazer para os natalenses em 1924. Mas não sendo essa atividade um privilégio dos clubes, um grupo de rapazes organizou um pic-nic para homenagear o belo sexo em 1916 (TERPHSICHORE. A Republica, Natal, 24 ago. 1921. PIC-NIC NA LIMPA, A Republica, 7 set. 1924; O PIC NIC de Petropolis. A Republica, Natal, 12 ago. 1916.).
CREPÚSCULO
O Terpsychore não era propriamente um clube pequeno, pois possuía sede própria e atingia um considerável número de sócios. No entanto, lendo a coluna social d’A Republica, tudo indica que esse clube não fazia sombra ao Natal-Club, que ainda nos anos 1920 reinava soberano na capital do Rio Grande do Norte. Esse quadro só se reverteria no final da década de 1920, mais precisamente em 1928, quando se deu a inauguração do Aero-Club, no bairro do Tyrol.
O Aero-Club reunia, num mesmo ambiente, o charme dos salões, as aventuras da aviação e a competitividade dos esportes. Representava uma reordenação dos ideais das elites locais, que precisavam de um espaço moderno, capaz de unir a sofisticação dos salões às modernas práticas aeronáuticas e esportivas.
Na opinião do colunista da Cigarra, o Aero-Club era uma “aggremiação que reúne actualmente sob a sua bandeira os ideaes da elite da sociedade natalense, no que representa de melhor em esforço, devotamento á terra commum e espirito progressista” (A AVIAÇÃO no estado. Cigarra, Natal, ano 2, n.3, p. 24, abr. 1929.). O glamour do tradicional baile de carnaval, em 1929, foi transferido da Cidade Alta, onde estava localizada a sede social do Natal-Club, para o novo bairro do Tyrol, onde estava instalado o Aero Club.
Em nota sobre o mesmo carnaval, o redator da Cigarra afirma em 1929 que “O Aero Club já se vae tornando indispensável á alegria natalense, e á sociedade da capital. Os seus salões cheios de distincção fidalgas terrão sempre o prestigio de nossas demoiselles” (COMMENTARIOS. Cigarra, Natal, ano 2. n. 3. p. 2, abr. 1929.).
FONTES:
A AVIAÇÃO no estado. Cigarra, Natal, ano 2, n.3, p. 24, abr. 1929.
Amélia Duarte Machado, a Viúva Machado: a esposa, a viúva e a lenda na Cidade do Natal (1900-1930). / Ariane Liliam da Silva Rodrigues Medeiros – Natal, RN, 2014.
ARRAIS, Raimundo; ANDRADE, Alenuska; MARINHO, Márcia. O corpo e a alma da cidade: Natal entre 1900 e 1930. Natal, RN: EDUFRN, 2008.
COMMENTARIOS. Cigarra, Natal, ano 2. n. 3. p. 2, abr. 1929.
REIS, Nestor Goulart. O quadro da arquitetura no Brasil. 8. ed. São Paulo: perspectiva, 1997. p. 180.
TERPSICHORE-club. A Republica, Natal, 29 jun. 1923.
BIBLIOGRAFIA:
Caminhos de Natal / Jeanne Fonseca Leite Nesi ; ilustrações, Urban Sketchers Natal. – Dados eletrônicos (1 arquivo PDF). – 2. ed. – Natal, RN : IPHAN, 2020.
Cantos de bar: sociabilidades e boemia na cidade de Natal (1946-1960) /Viltany Oliveira Freitas. – 2013.
Natal Não-Há-Tal: Aspectos da História da Cidade do Natal/Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo; organização de João. Gothardo Dantas Emerenciano. _ Natal: Departamento de Informação, Pesquisa e Estatística, 2007.
Natal também civiliza-se: sociabilidade, lazer e esporte na Belle Époque Natalense (1900-1930) / Márcia Maria Fonseca Marinho. – Natal, RN, 2008.