O Cais de Natal
Todo cais… é uma saudade de pedra.
Fernando Pessoa.
O cais é o limite, a baliza, a fronteira entre a terra e o mar, entre o acolhimento do pouso e a incerteza da viagem, é o lugar que possibilita a chegada e a partida, e portanto, que produz a saudade – é de lá que se vislumbra o horizonte das expectativas, de onde se espera parado pregado na pedra do porto. (A referência aqui é à música “Minha História”, versão de Chico Buarque e Gesù Bambino, na qual a personagem se funde ao cais, “Esperando, parada, pregada na pedra do porto…”). Mas a saudade aqui só é possível pelas relações que as pessoas estabelecem com aquele lugar, relações entre pessoas e pessoas, entre pessoas e lugares e entre pessoas mediatizadas por lugares, e vice-versa, enfim, por redes heterogêneas.
O CAIS DA CAPITAL
A Lei Imperial de primeiro de outubro 1828, que regulamentou a atuação da Câmara Municipal, que havia sido criada com a Constituição de 1824 em substituição ao antigo Senado, fixa as atribuições da Câmara e de cada um de seus membros. No que se refere às atribuições diretamente relacionadas ao espaço e à forma urbana, elas são essencialmente as seguintes: alinhamento, limpeza, iluminação, desobstrução, manutenção e reparação das ruas, cais, muralhas, fontes, prisões e outras construções, para o benefício dos habitantes, para o decoro e “ornamento” das povoações.
A preocupação com as limitações do porto de Natal, esteve bastante presente no discurso dos administradores locais da província ao longo do século XIX. Os problemas que a área portuária trazia para navegação, eram apontados com uma das grandes causas da estagnação econômica que acompanhava, não só a capital, como também o próprio Rio Grande do Norte, nesse século. Com a impossibilidade de receber navios de maior porte em seu ancoradouro, o questionamento da posição de Natal enquanto capital e centro comercial da província passa a ser colocado em evidência, já que a cidade não conseguia realizar o escoamento da produção que vinha do interior da província. Esta situação ocasionaria a dependência da capital com as praças comerciais de Pernambuco, privando-a da absorção de recursos importantes oriundos desta mediação. (ARRAIS, Raimundo. op., cit., p. 121.).
A partir da década de 1870, o surgimento de novos entrepostos comerciais, fruto da iniciativa de particulares, como o comerciante Fabricio Pedrosa, responsável pela criação da Praça Comercial de Macaíba e depois da Praça de Guarapes, ameaçariam o posto de capital de Natal. Os portos desses entrepostos, conseguiam realizar o escoamento da produção que vinha do interior, além de possuírem feiras mais atrativas do que a do Passo da Pátria, principal feira natalense. (RODRIGUES, Wagner do Nascimento. op., cit., p. 46.).
Acompanhando uma tendência da época das províncias brasileiras, de escolha de novas cidades-capitais, a centralidade de Natal foi questionada, aparecendo a proposta de algumas cidades do estado que seriam mais adequadas para assumir esse status. Além de Macaíba e Guarapes, São José de Mipibú e o povoado de Utinga, foram algumas das possibilidades ventiladas pelos grupos dirigentes locais norte-rio-grandenses.
Os melhoramentos do porto, tão imprescindíveis para reanimar o comércio da capital, por falta de condições da província em bancar esses serviços, foram deixados de lado, apesar de ser constante, no discurso da elite política-administrativa potiguar, a reivindicação de verba ao poder central, para as intervenções no porto. Apenas com a proclamação da República, o crédito destinado às obras do porto, foi aprovado pelo governo. Em 1890, Pedro Velho, líder do Partido Republicano e futuro governador do Rio Grande do Norte, conseguiu, junto ao ministério da indústria, viação e obras públicas, a verba no valor de 400 contos de réis, que só chegaria a terras potiguares efetivamente no ano de 1893.
Com a instauração do Regime Republicano, uma nova maneira de pensar o porto surgiria no discurso dos grupos dirigentes locais. Tal percepção transformaria o porto, em um problema de ordem central para o futuro do estado, ganhando esse espaço novos sentidos e usos.
RIBEIRA
A Ribeira foi a segunda ocupação urbana e, desde o século XIX este bairro era visto como o mais dinâmico da cidade. Ao longo de sua existência esteve sempre identificado como centro comercial e cultural, bairro portuário que tinha na ligação com o Cais a principal razão de seu movimento. Seu primeiro núcleo urbano, segundo Cascudo (1999, p.153), construiu-se em torno das Ruas Dr. Barata e General Glicério, depois chegou até a Rua do Comércio (atual Rua Chile), onde se encontrava, nas suas proximidades, o Cais da Tavares de Lira. Este, depois de algumas mudanças, instalou-se no lugar atual e diante dele, no final do século XIX, foi construída a Avenida de mesmo nome, que se tornou a principal rua do bairro. Até o final do século XIX, a cidade não possuía ligação com as cidades vizinhas, e o Rio Potengi era a via de acesso da população à capital do Estado do Rio Grande do Norte. O Cais era a porta de entrada da cidade. O Cais da Tavares de Lira ficou instalado diante de uma larga avenida e, em torno desta, diversas ruas estreitas foram se consolidando ao longo dos anos, com armazéns e a parte principal do comércio atacadista e varejista da Cidade do Natal.
Pelas condições econômicas favoráveis neste bairro, começam a despontar, a partir de 1850, os primeiros sinais de transformações. Foram construídos o primeiro cais da Alfândega de Natal (1863) e a Estação Ferroviária da Great West (1883); instaladas uma indústria de tecidos (1888) e a primeira fábrica de sabão (1896). Na Rua do Comércio (atual Chile), foram construídos os primeiros edifícios de mais de um pavimento e instalada a sede do Governo Provincial, em um sobrado imponente (1860).
Na primeira metade do século XIX, a cidade de Natal possuía muitas construções de palhoças, e entre os bairros da Ribeira e de Cidade Alta havia muitas áreas desocupadas, isolando um bairro do outro. A capital era uma cidade tranquila, sem muito movimento nas ruas, principalmente à noite. A partir de meados do século XIX, enquanto centro administrativo e sede do porto marítimo, a capital potiguar passou por alguns melhoramentos. No bairro da Ribeira, foi edificado o Cais 10 de Junho, em 1869.
No final do século XIX, o comércio do bairro da Ribeira já se encontrava bastante diversificado, contava com várias lojas de variedades, a exemplo citamos: o Bazar Natalense, a Casa de Lobato, a G. N. Aranha (O Nortista, ano II, nº 108, Natal, 6 abr. 1894.); o armazém de fazendas, miudezas e comissões de Ângelo Roseli, o empório comercial de Fortunato Aranha, a Antiga Loja de fazendas e miudezas (esplêndido sortimento de todos os artigos de modas) de Nicolao Bigois, a Popular Comércio e Indústria (fazendas, miudezas, chapéus, calçados e alfaiataria) de Barbosa e CIA (Diário do Natal, Natal, sábado, 1 jul. 1893.), entre outras. O bairro abrigava também vários serviços, como: Progresso – Companhia de seguro mútuo contra fogo (Diário do Natal, Natal, sábado, 1 jul. 1893); Museu de Joias (grande
oficina de ourives, loja de jóias, relojoaria e Lunetaria), Especialidades da Empresa Graphica de Renaud e CIA (Diário do Natal, ano IV, nº 368, Natal, 15 dez. 1895.); assim como os melhores hotéis da cidade.
HOTEL BRAZIL – Este importante estabelecimento, propriedade de Francisco de Paula, acha-se completamente montado com todas as acomodações precisas para famílias, passageiros, hospedes e viajantes – e dispõe de tudo quanto desejar se pode para ser agradável a todo aquele que tenha de procura-lo. Toda sorte de recreios, bilhares, excelentes banhos de toda qualidade, aposentos cuidadosamente preparados com asseio, – tudo enfim de útil e agradável de confortável que se pode desejar aos cômodos da vida encontrar-se-há no HOTEL BRAZIL, e pelo mais cômodo preço possível. Praça Marechal Deodoro – logo no cais de desembarque – Ribeira – Natal (Diário do Natal, ano IV, nº 368, Natal, 15 dez. 1895.).
Quando Luís da Câmara Cascudo nasceu, em 30 de dezembro de 1898, Natal ainda era uma pequena vila que mantinha grande parte dos seus traços coloniais. Dividia-se em duas áreas principais: a Cidade Baixa, próxima ao cais do porto, na qual se localizava o comércio; e a Cidade Alta, no cume dos morros circunvizinhos do porto, onde ficavam igrejas e prédios do governo. Por esta época Natal contava como pouco mais de dezesseis mil habitantes, ao passo que na segunda década do século XX, período de que datam suas primeiras crônicas acerca da cidade, esse número praticamente triplicara.
Nessa época, Natal não tinha nem docas nem porto. Os navios ficavam bem no centro, entre as margens do rio Potengi. Para embarcar ou desembarcar tinha-se que vencer a distância num bote. O tabelião Miguel Leandro, desejando ir a bordo de um navio receber um parente, chega ao cais “Augusto Lira” e diz para um preto que estava sentado no bote de sua propriedade chamado “mocinha”:
– Olá, da costa d’África! Quanto queres de remuneração
para me transportar deste polo àquele outro hemisfério?
– Como, patrão? Para o cemitério?
– Se for por ignorância vá; porém se for para zombar de
minha alta prosopopeia, dar-te-ei com este pau que a natureza
fez e a mão do homem aperfeiçoou, nessa cachola sorridente e
reduzir-te-ei ao pó para onde voltarás.
– Já fui e voltei. Quer ir, desça, patrão.
CAIS 10 DE JUNHO
O Cais Tavares de Lira, está localizado na Ribeira, à margem do rio Potengi, no início da avenida de mesmo nome. Sua construção foi iniciada em 1869, na gestão do presidente Pedro Barros Cavalcanti de Albuquerque. Foram gastos nas obras, 2:940$000 (dois contos, novecentos e quarenta mil réis). Originalmente denominado de Cais 10 de Junho, teve ele o seu topônimo substituído, em seguida, para Cais Pedro de Barros, em homenagem ao governante que autorizara a sua construção.
Em 1870, encontraremos esse projetado logradouro com o nome de “Praça 10 de Junho”. O dia 10 de junho é tradicionalmente conhecido como dia de Camões, de Portugal e da “raça” portuguesa. Curiosamente, é uma denominação um tanto desvinculada do período, quando o Brasil tentava afirmar-se como nação moderna e independente.
Por volta de 1870, instalou-se na Travessa Venezuela, o comerciante Antônio ldalino de Vasconcelos. Naturalmente a travessa ficou popularizada pela denominação de Beco do Antônio ldalino. Era uma via pública de grande movimento, pois todas as pessoas que desembarcavam no Cais Pedro de Barros, atual Cais da Tavares de Lira, para alcançar a rua Correa Teles, atual Dr. Barata, atravessavam obrigatoriamente o Beco do Antônio ldalino.
O cais já estava bastante deteriorado e o Presidente teme que isso atrapalhe a comunicação entre os dois bairros.
CAIS PEDRO DE BARROS
O Potengi invadia, lambendo as pedras das calçadas, as ruas enfileiradas. Vez por outra, terrenos alagados cediam e as construções vinham abaixo. Em 1869, é que o Dr. Pedro de Barros Cavalcanti de Albuquerque mandou fazer um anteparo. Dez anos depois, o Dr. Rodrigo Lobato Marcondes Machado informava sobre o serviço do cais – importante melhoramento empreendido no intuito de repelir as marés que ameaçam avassalar os terrenos e as casas…
Em 1873, muda-se a denominação para “Praça Pedro de Barros” e propõe-se que o cais seja prolongado até o Passo da Pátria, pois além de facilitar o trânsito entre os dois bairros da cidade, também daria um “melhor aspecto” ao porto. Os terrenos encharcados a beira rio seriam regularizados e finalmente poderiam receber construções, igualmente regulares, acompanhando o cais:
A prolongação do caes d’esta cidade até o lugar denominado – Passo da patria – é um melhoramento de reconhecida utilidade; e, com effeito, além de facilitar o transito entre o bairro alto e baixo da cidade, e dar um melhor aspecto ao porto, trazia elle comsigo a acquisição de um terreno, que, por ser alagado diariamente nas preamares, nenhum prestimo tem hoje. Poderia, realisada a obra, prestar-se á edificação, e estou convencido de que ella não se demoraria. (Relatorio do Segundo Vice-Presidente Bonifacio Francisco da Camara de 11 de Junho de 1873, p. 43).
O muro funciona como um novo limite da cidade com o rio. O encharcado insalubre que permanece no interior entre os dois bairros precisa ser eliminado, as fronteiras entre a cidade e o rio já estão estabelecidas. O aterro da parte interior é reivindicado para se fechar o incômodo esgoto que persiste em ligar o alagadiço ao rio. O “caes” precisa de novas intervenções, agora no sentido de controlar o tipo de fluxo que lhe cabia. O calçamento eliminaria a temível lama e um guarda-corpo de ferro evitaria o inconveniente transporte de carga – antes desejado – na praça “social” da cidade. Começava-se a estruturar um novo cenário para o local:
Feito isso, poder-se-ha então fechar a abertura, que existe na parte mais baixa da praça e que se deixou para facilitar o fluxo e o refluxo das marés, enquanto não se concluir o aterro, que póde por ali ser consuzido em canôas. Convem que se proceda ao calçamento de toda a arêa do caes para evitar a lama que sobre elle formam as chuvas; que se colloquem varandas de ferro pelo lado do rio para embaraçar que inconvenientemente se façam desembarques de volumes. Estas obras, que não são mais que o complemento das que estão feitas, servirão para conservação e aformoseamento do caes que tem esta cidade. (Relatorio do Segundo Vice-Presidente Bonifacio Francisco da Camara de 11 de Junho de 1873, p. 43).
O muro funciona como um novo limite da cidade com o rio. O encharcado insalubre que permanece no interior entre os dois bairros precisa ser eliminado, as fronteiras entre a cidade e o rio já estão estabelecidas. O aterro da parte interior é reivindicado para se fechar o incômodo esgoto que persiste em ligar o alagadiço ao rio. O “caes” precisa de novas intervenções, agora no sentido de controlar o tipo de fluxo que lhe cabia. O calçamento eliminaria a temível lama e um guarda-corpo de ferro evitaria o inconveniente trans porte de carga – antes desejado – na praça “social” da cidade. Começava-se a estruturar um novo cenário para o local:
Feito isso, poder-se-ha então fechar a abertura, que existe na parte mais baixa da praça e que se deixou para facilitar o fluxo e o refluxo das marés, enquanto não se concluir o aterro, que póde por ali ser consuzido em canôas. Convem que se proceda ao calçamento de toda a arêa do caes para evitar a lama que sobre elle formam as chuvas; que se colloquem varandas de ferro pelo lado do rio para embaraçar que inconvenientemente se façam desembarques de volumes. Estas obras, que não são mais que o complemento das que estão feitas, servirão para conservação e aformoseamento do caes que tem esta cidade. (Relatorio do Segundo Vice-Presidente Bonifacio Francisco da Camara de 11 de Junho de 1873, p. 43).
O cais homenageou Pedro de Barros Cavalcanti de Albuquerque que nasceu na capital Pernambucana, em 6 de maio de 1839. Em 1861 recebeu o grau de Bacharel, pela Faculdade de Direito do Recife. Foi ele Auditor de Guerra, diretor da Imprensa Oficial da Corte, jornalista, advogado e Presidente da Província do Rio Grande do Norte.
Em 9 de junho de 1869, ele transferiu a residência presidencial e a secretaria do Governo, que até então funcionavam na Rua da Conceição, na Cidade Alta, para a Rua Chile, na Ribeira. A sede do Governo permaneceu naquele prédio até 1902, quando o então governador Alberto Maranhão, transferiu-a para o Palácio Potengi, na Praça 7 de Setembro.
O Cais Pedro de Barros foi cenário de importantes acontecimentos sociais da Capital Potiguar. Era ele frequentemente enfeitado com bandeirinhas, e especialmente preparado para embarques e chegadas de pessoas ilustres, principalmente políticos.
Conforme expõe o relatório da Intendência de Natal que se reporta ao triênio 1902-1904 algumas obras são destacadas, tais como o jardim da praça Augusto Severo, a reforma do cais Tavares de Lyra, o calçamento e arborização da Avenida Rio Branco, o saneamento do Baldo, na Ribeira, entre outras.
Em 1903, Alberto Maranhão estava em seu último ano de mandato de governador. Era preciso a indicação de um sucessor. Pedro Velho, o mentor da Oligarquia Maranhão, apontou Tavares de Lyra como sucessor, e como convém observar, o candidato foi beneficiado com a reforma constitucional de 1892, levada a efeito em 1898, que reduziu a idade mínima para o cidadão eleger-se governador do Estado. Na eleição procedida em 14 de junho de 1903, Tavares de Lyra e Juvenal Lamartine foram eleitos com ampla maioria de votos.
O jornal A República noticiou da seguinte maneira o retorno do governador eleito:
Saudando o Dr. Augusto Lyra, A República sente-se orgulhosa ao ver essa corrente de simpatias que tem acompanhado nosso eminente amigo, que, moço ainda, é tido no país inteiro como um dos mais distintos representantes da política republicana. (DR. AUGUSTO LYRA. A República. Natal, n. 07, 12 jan. 1904, p. 01.).
A oligarquia encontrava-se de luto devido a morte do Cel. Adelino Maranhão, secretário da Junta Comercial do Estado, além de irmão de Pedro Velho. Mesmo assim segundo os jornais da época, os correligionários acorreram ao cais para recepcionar o seu novo governador.
Com o passar do tempo e o avanço dos meios de transportes, o pequeno cais foi desativado para o uso de passageiros, e transformado em um simples
ponto de descarga de mercadorias. Posteriormente o cais, que se achava semiabandonado, foi reconstruído com uma rampa de desembarque, recebendo ainda um gradil de ferro, para proteção.
CAIS TAVARES DE LIRA
Em seguida, o cais recebeu uma nova denominação, passou a chamar-se Tavares de Lira, que é o mesmo topônimo da avenida que lhe dá acesso. A nova denominação, que perdura até os nossos dias, foi uma homenagem prestada a Augusto Tavares de Lira que governou o Rio Grande do Norte de 1904 a 1906. Também foi historiador com várias pesquisas sobre a “Terra Potiguar”, político de destaque no cenário nacional, o governador Tavares de Lyra foi ministro da justiça no governo de Afonso Pena.
O Diario do Natal, jornal de oposição, não perderá a oportunidade de criticar a ação da Intendência. Em matéria intitulada Como elles são… afirmará que a iniciativa de mudança do nome do Cais, antes chamado Deodoro da Fonseca, foi de Pedro Velho. Segundo Elias Souto, a razão para a modificação era simples: Deodoro já havia dado o que podia, enchera de graças Pedro Velho e agora, morto, nada mais podia oferecer lhe. Mas nada espantava mais o chefe da oposição do que saber que uma praça da cidade receberia o nome daquele que presidia a Intendência. Esse Quincas Moura só podia ser mesmo um bom discípulo do Chefe, era o que sempre dizia o Diario:
E o sr. coronel Joaquim Manoel, como é um bom discipulo do chefe […] botou o seu nome em uma praça decruzamento, e como presidente da Intendencia, assignou a resolução desse acto, isto é: fez e baptisou. […] Matheus, já sabe; e o mais é historia, porque a Republica assim mesmo… (DIARIO DO NATAL, Natal, 08 jan. 1905.).
Na reforma do cais da Tavares de Lyra, realizada em 1904, uma das intervenções destacadas pelo governador, era a construção de uma grade de ferro que favorecia a prática da observação e contemplação do rio Potengi. O porto se tornaria, não só um lugar de entrada e saída de mercadorias, mais também um local de onde os transeuntes poderiam admirar os navios que aportavam na capital, observando o rio e as novas práticas esportivas, vistas como necessárias, pelas elites locais, para cuidar da saúde e da beleza dos corpos.
O governador Antônio José de Melo e Sousa realizou poucas obras físicas, pois além do tempo reduzido que governou o estado, havia poucos recursos para ser empregados. Entre as suas poucas realizações, podemos destacar a recuperação do cais Tavares de Lyra e colocação de iluminação a gás acetileno em algumas ruas de Natal; no interior, mandou desobstruir os canais do vale do Ceará-Mirim.
Em 1907, já na administração do governador Antônio José de Mello e Souza, o Arquiteto Herculano Ramos foi contratado para reformar o Caes Augusto de Lyra, elaborando um plano para o futuro Caes Tavares de Lyra e cuidando ele mesmo da administração de todo o trabalho:
MELLO E SOUZA, Antonio J. Mensagem apresentada ao Congresso Legislativo a 01 de Novembro de 1907. Natal: Typographia d’A Republica, 1907. Sobre as Obras Públicas (p.24-27): […], fiz construir uma pequena casa annexa ao galpão existente, com accommodações para os passageiros e um aposento para o contractante daquelle serviço.” O segundo serviço foi o cais Augusto Lyra (futuro cais Tavares de Lyra), “estando completamente demolido e imprestavel o caes Augusto Lyra, e havendo urgente necessidade de reparal-o, sobretudo para o serviço de passageiros, pois que o caes da alfandega acha-se continuamente atulhado de mercadorias, contractei a reconstrucção provisoria daquelle caes com o habil architecto Herculano Ramos que encarregou-se gratuitamente de organizar o plano e de administrar pessoalmente todo o trabalho. …. (Mensagem do Governo – 01 de Novembro de 1907. Arquivo compilado no HCUrb).
O arquiteto Herculano Ramos foi responsável por outras diversas obras da prefeitura, como a construção do cais Augusto Lyra, o palacete do Congresso, pelo projeto para a construção de um edifício que deveria servir ao Superior Tribunal de Justiça, entre outros.
Em 1908, por meio da Resolução n.118, tem-se a renomeação de uma avenida e de um cais situados no bairro da Ribeira que passaram a denominar-se, respectivamente, de avenida Tavares de Lyra e Cais Tavares de Lyra (A REPUBLICA, Natal, 28 fev. 1908.). Continuava-se inscrevendo na toponímia da cidade a memória da rede de parentela dos Albuquerque Maranhão. Observa-se, como destacou Lepetit, que os “grupos sociais definem seu quadro espacial, nele inserindo suas lembranças” (LEPETIT, Bernard. Por uma nova história urbana. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001. p.149.).
Neste mesmo ano, Manoel Dantas, uma das figuras de destaque do meio intelectual natalense e redator do jornal A República, publicou, no respectivo periódico, uma matéria, na qual descrevia sua emoção ao ter visitado o cais da Augusto Tavares de Lyra:
Sexta feira passada, deveres de amizade levaram-me ao caes “Augusto Lyra” para os votos de boa viagem a dois distinctos moços, dignos representantes dessa geração, nova e cheia de fé que o Rio Grande do Norte, dentro do meio social que personificamos, vai formando para um dia confiar-lhe seus destis. Tive então uma impressão de contentamento profundo ao espectaculo que offereciam as aguas do Potengy, em cuja tranquilidade como que havia uma exhaustão de vida. O sol faiscava sobre a lisura do espelho cristallino, naquella tarde de verão. As collinas cobertas de verdura eram uma moldura côr de esperança na fita prateada do rio. Escalerea e canôas, pejados de gente e mercadorias, iam e vinham de terra para o “Orator”, o “Bragança”, o “Planeta”, o “Cabral”, o “Alagoas”, cinco vapores que affirmavam a vida do nosso porto e a prosperidade do nosso commercio. (CONTENTE, Braz. A Republica, Natal, 10 ago. 1908).
Em sua conferência publicada em 1909, intitulada: Natal daqui a cinquenta anos, Manuel Dantas, um dos principais intelectuais natalenses no começo do século XX, imaginava que, em 1959, o porto de natal estaria cercado por grandes “palácios flutuantes”, trazendo milhares de passageiros a Natal.
Nesse mesmo dia, no vasto porto que se constituirá anos antes adiante dos arrecifes, por meio de dois molhes gigantescos, partindo, um, da ponta do Morcego, outro da ponta do Genipabu, como dois braços enormes querendo apertar num amplexo hercúleo as ondas revoltas do mar alto, o transatlântico Cidade do Natal, palácio flutuante de 40.000 toneladas, lançou ferro, despejando nos cais, ruas e parques milhares de passageiros que vão encher o trem transcontinental na torna-viagem, recebendo os milhares de passageiros que acabaram de fazer a travessia sensacional. DANTAS, Manoel. ata a u a n enta ann s: segunda conferencia realizada no Salão de Honra do Palácio do Governo em 21 de março de 1909. Natal: Flor do Sal, 2009 (fac-similar da primeira edição lançada pela Imprensa
Official, em 1909.
No dia 05 de janeiro de 1910, o apito do vapor Manaos se fazia ouvir pela multidão, concentrada no largo no cais Tavares de Lyra, que ali fora assistir ao desembarque do candidato ao senado Tavares de Lyra (CHEGADA DE TAVARES DE LYRA A NATAL. A República. Natal, n. 03, 05 jan. 1910, p. 01.). Durante sua estadia, sucederam-se as recepções, invariavelmente jantares ou almoços.
O topônimo deste logradouro foi oficializado em 1914, através de decreto assinado pelo governador Alberto Maranhão, para comemorar a abertura da avenida, também foi colocado um obelisco que ainda se encontra lá “testemunhando” as transformações ocorridas na Avenida Tavares de Lyra.
Nesse esforço de inscrever-se no território, e, por sua vez, de forjar a construção de uma determinada memória para o regime republicano no estado, a relação com a Intendência municipal de Natal tornava-se primordial. Entre as atribuições do governo municipal estava também o estabelecimento ou a mudança de nomes de ruas, avenidas, praças e outros equipamentos urbanos; bem como a autorização para instalação de bustos, placas e outros referentes materiais destinados a forjar essa memória oficial. Como ressaltou Raimundo Arrais, o grupo que “controlou o poder no estado do Rio Grande do Norte mobilizou a lei para inscrever no espaço público da capital do estado seus valores, suas projeções de mundo, sua memória. Essa foi uma maneira de os republicanos se apoderarem da cidade” (ARRAIS, Raimundo (org.). A terra, os homens e os sonhos. Op. cit., p.19.).
Augusto Tavares de Lira nasceu em 1872, no então povoado de Macaíba, RN. Homem de moral inabalável, prudente, modesto e sereníssimo, foi ele professor de história, no Atheneu Norte-Rio-Grandense, deputado estadual e federal, governador do Estado, senador da República, ministro de Estado em duas gestões, professor de Direito, ministro do Tribunal de Contas e historiador eminente; tendo inclusive, o seu nome inscrito no Livro do Mérito Nacional.
Tavares de Lira publicou uma longa série de monografias, baseado em documentação segura. Em 1921, ele escreveu o livro “História do Rio Grande do Norte”, descrevendo os mais importantes fatos de nossa História, fonte confiável, utilizada com segurança por pesquisadores até os dias atuais.
Casou-se, em 21 de janeiro de 1902, com dona Sofia Maranhão, filha do então senador Pedro Velho. A cerimônia realizou-se em Natal, na capela da Fábrica de Tecidos. Os noivos foram, em seguida recepcionados na residência dos pais da noiva. Tavares de Lira faleceu aos 86 anos de idade, no Rio de Janeiro.
O ancoradouro era a região próxima ao porto, destinada para os navios ancorarem. No periódico republicano, podemos perceber o processo de diferenciação entre o ancoradouro e o cais, que até o final do século XIX, em Natal, se confundiam. Diferente do ancoradouro, o cais era uma estrutura construída para o desembarque, mas que permitia a realização de trabalhos necessários ao funcionamento do porto, como o de transportes de suas mercadorias, até os armazéns realizados por empregados. O cais seria um local de circulação de pessoas empregadas nos serviços necessários para o embarque de pessoas e mercadorias, sendo também um local para sociabilidades, como era o desejo do governador Augusto Tavares de Lyra, para o cais que levaria seu nome. O ancoradouro era apenas o local de chegada, de rápido contato da embarcação com a cidade.
No governo de Ferreira Chaves (1895 – 1900) foi reconstruído o Cais da Tavares de Lira e o calçamento a paralelepípedo da Avenida Tavares Lira; construiu a Praça Leão XHÍ em frente à Igreja de Bom Jesus Das Dores no Bairro da Ribeira, edificou o Prédio da Escola Doméstica na Praça Augusto Severo, aterrou, arborizou e calçou a praça Pedro Velho, gastando 62:9443814 contos de réis e embelezou a praça “Sete de Setembro” em frente ao atual Palácio da Cultura, localizado no centro da Cidade Alta.
Um mapa de Natal, datada de 1864, ainda não apresentava a avenida Tavares de Lira, que somente foi concluída em 1919, no governo de Ferreira Chaves. O quarteirão que separa a avenida Tavares de Lira da travessa Venezuela, foi reduzido à metade, sendo cortado no sentido diagonal, visando à abertura da avenida. Nas proximidades do atual Cais Tavares de Lira existia outro quarteirão, que foi suprimido para facilitar a ligação daquele logradouro, público com o rio Potengi. O quarteirão que obstruía a Tavares de Lira ligava-se à rua Chile, em ambos os lados. À sua frente existia um largo, denominado Praça da República.
A pesquisadora Nesi (2002, p.118) em Caminhos de Natal informa as intervenções ocorridas nesta avenida:
O quarteirão que separa a Avenida Tavares de Lira da travessa Venezuela foi reduzido à metade, sendo cortado no sentido diagonal, visando à abertura da avenida. Nas proximidades do atual Cais Tavares de Lira existia outro quarteirão, que foi suprimido para facilitar a ligação daquele logradouro público com o rio Potengi. O quarteirão que obstruía a Tavares de Lira ligava-se à Rua Chile, em ambos os lados. À sua frente existia um largo, denominado praça da República.
A própria reforma do cais da Tavares de Lyra, em 1904, foi feita, tomando-se a precaução, segundo o discurso oficial do próprio governador do Estado, de colocar-se uma grade de ferro próxima ao cais que permitisse esse ato de olhar e contemplar a paisagem.
A vida dos “trabalhadores do mar” passou a ser organizada pelas licenças exigidas pela capitania dos portos. O desembarque na cidade envolveu, a partir do Período Republicano, uma série de exigências. Primeiramente, as embarcações não poderiam mais estar fundeadas próximas ao cais, sendo necessário haver uma distância de vinte metros dos navios em relação ao cais. (CAPITANIA do porto. A República, Natal, 2 de junho de 1913.).
Em 1926 foi iniciado o calçamento da Praça Augusto Severo, Avenida Junqueira Aires, construção do Cais Tavares de Lyra.
Eduardo dos Anjos apareceu nas eleições para a composição da municipalidade de 1926 a 1928 como representante do operariado. Contudo, em matérias do A Republica desde o início do século XX pode-se constatar que ele não era um simples operário. Tratava-se de uma espécie de empreiteiro que foi contratado pelo governo para realizar diversas obras na capital. Assim, em fevereiro de 1905, o governo estadual informou que destinou 169.920 réis a Eduardo dos Anjos em pagamento “por haver concluído as obras do calçamento a que se refere o seu contracto” (EXPEDIENTE. A Republica, Natal, 04 fev. 1905.). Em julho do mesmo ano, o futuro intendente, adjetivado como “operoso artista”, recebeu mais 4:430.000 réis pelos serviços realizados no cais de desembarque da cidade (O termo “artista” era utilizado para designar diversos trabalhos braçais, as chamadas “artes de fazer”, incluindo do operário da indústria ao empreiteiro ou chefe de uma tipografia, ver: SANTOS, Renato Marinho Brandão. Natal, outra cidade!. Op. cit., p.48.). Ainda em 1906 efetivou reparos no Cais Augusto Lyra, recebendo 2:233.000 réis.
Em artigo publicado em julho de 1930, Carmen Portinho, engenheira que representou o Rio Grande do Norte no IV Congresso Pan-Americano de Arquitetura, comentou outros pontos do Plano de Sistematização, que foi exposto no referido congresso ocorrido no Rio de Janeiro. Portinho destacou que na região entre o rio Potengi e o oceano Atlântico seria criado um novo bairro jardim, que deveria assemelhar-se aos bairros ingleses, seria feito o “’zoning’ moderno, sendo evitada a super lotação e os habitantes seriam convidados a se pronunciarem sobre a administração do seu bairro, fixando ainda o número e a localização de lojas e armazéns” (PORTINHO, Carmen V. A remodelação de Natal. A Republica, Natal, 13 jul. 1930.). Esse bairro abrangeria as regiões de Rocas, Areial, Limpa, Canto do Mangue, Chama-maré e outros assentamentos considerados populares nessa área (DANTAS, George. Linhas convulsas e tortuosas retificações. Op. cit., p.132). No novo bairro também seriam abertas largas avenidas. As casas de operários existentes nas proximidades do cais na entrada da cidade e em terrenos baldios seriam demolidas, e um “bairro operário inteiramente novo, um pouco afastado do centro” (Idem) seria construído. Os indivíduos que tivessem seus casebres derrubados em decorrência da aplicação do plano receberiam um lote de terreno e uma planta para edificação no novo bairro. Esse bairro operário também seria planejado seguindo o modelo de bairro jardim. É possível constatar, portanto, que o planejamento encomendado pelo prefeito incluía uma espécie de novo “bota abaixo”, desapropriando famílias, derrubando casas que não seguissem os novos padrões e realocandoos para o novo bairro popular criado.
Ainda sobre as obras do calçamento, vale lembrar que foram em torno delas que mobilizaram-se as acusações e processos judiciais e administrativos no período pós-outubro de 1930. O’Grady seria acusado de improbidade, malversação dos recursos da intendência, com o suposto superfaturamento da reforma do cais Tavares de Lyra e do contrato para aquisição de paralelepípedos, entre outras. (Cf. A República, Natal, 22 mar. 1931, 06 maio 1931, 17 maio 1931.) No início de 1932, o ex-prefeito seria absolvido, como registrou o Jornal A República. (Idem, n.356, p.01, 09 jan. 1932.).
O Cais Tavares de Lira sofreu uma reforma, sendo reativado como local de embarque e desembarque de passageiros, que fazem a travessia Ribeira-Redinha-Ribeira. Voltou o cais a ser utilizado, tanto pela população natalense como pelos turistas, que passaram assim a contar com mais uma opção de lazer, navegando pelas águas mansas do Potengi. Atualmente, esse transporte fluvial de passageiros no Cais Tavares de Lira não existe mais.
AVENIDA DO CAIS
Em 1908, foi lançada pelo Governo Estadual, a proposta de construção da avenida do porto, projeto idealizado por Pedro Velho, que havia falecido no ano anterior. O projeto consistia na abertura de uma nova avenida, entre a Tavares de Lyra e a Rua Sachet (MELHORAMENTOS da cidade. A Republica, Natal, 12 de fev. de 1908.). A construção desta avenida, em frente ao cais, favorecia o passeio público por essa região, estimulando parte da população a visitar o cais, para contemplar o rio Potengi e os navios que desembarcavam no porto. Essa proposta de avenida nos mostra, como o porto passava no Período Republicano a ser pensado, pelos grupos dirigentes locais, como um espaço integrado totalmente à cidade, sendo um ponto obrigatório do itinerário de visitas na capital.
A preocupação com a reforma do cais, nomeado de Tavares de Lyra, demonstra um pouco dos novos sentidos que passaram a ser atribuídos ao porto no Período Republicano. Desembarcar no cais, não deveria ser apenas um processo rotineiro no itinerário do viajante, mais a oportunidade para visualizar um ponto fundamental na cidade, visto como sua “sala de espera”: o porto.
Um dos projetos pensados pelos administradores norte-rio-grandenses para promover essa integração do porto frente a cidade foi avenida do porto, idealizada por Pedro Velho, líder do Partido Republicano e da oligarquia que se manteria por vinte e cinco anos no controle do estado. A avenida do porto, era um dos sonhos do ex-senador e governador, para tornar o porto, a “sala de espera da cidade” , exibindo, para os viajantes, uma longa avenida, “com uma curva elegante,
toda arborizada e exibindo de frente para o rio edificações seguindo os padrões do urbanismo moderno.”
A Avenida do Cais, porto seguro de quem parte ou chega a Natal, era também lugar de passeio das moças natalenses. Segundo Tinôco (1992), “as calçadas da Tavares de Lyira transformavam-se em passarelas, lugar de passeio de moças da Ribeira e até da Cidade Alta”. Podemos deduzir desta informação, que a moda feminina de Natal passava na Avenida Tavares de Lyra.
A Avenida Tavares de Lyra, ainda guarda um importante acervo arquitetônico/histórico, encontram-se diversas edificações apresentando em suas fachadas marcas de tempos passados. Um destes exemplares é o antigo Grande Hotel, segundo Jeanne Nesi (1994) uma edificação de muita importância para a cidade, tanto pelos seus traços arquitetônicos, como pela sua evidência social.
Também existe, na esquina da Avenida Tavares de Lyra com Avenida a Duque de Caxias, a antiga sede do Banco do Estado do Rio Grande do Norte – BANDERN. Construção dos anos 1930, este edifício apresenta características arquitetônicas que o distingue do cenário urbano da capital. A Avenida Tavares de Lyra é bem representativa da Belle Époque em Natal. O obelisco supracitado, erguido todo em granito, registra em cada lado, datas significativas para a história. Está inserida na Zona Especial de Interesse Histórico. Caminho do cais, a avenida Tavares de Lyra é lugar de memória, Patrimônio Histórico de Natal.
Cascudo fascina a seus leitores demonstrando um conhecimento detalhado acerca do antigo traçado da cidade. Ele parece saber exatamente onde se localizava cada coisa na Natal antiga. Esta desaparecera, sobrevivendo, moribunda, apenas através de alguns elementos que iam sumindo da paisagem, mas o autor passava a impressão de preservar um mapa imaginário dela. Cada recôndito escondido, cada rua ou beco, eram descritos e localizados com clareza.
“A Avenida Tavares de Lira, atualmente da Praça José da Penha ao cais Tavares de Lira, interrompia-se pelo prolongamento da Rua Dr. Barata que se estendia, depois do ‘Expresso 56’, esquina, até o prédio de M. Martins & Cia, onde havia um bequinho ligando com a Rua do Comércio.” “Este beco denominava-se Beco de José Lucas mas o povo dizia-o, com a licença da palavra, Beco do Mijo. Era cimentado e de mau odor insuportável.”
“Esse trecho da rua, dividindo a atual Tavares de Lira, constava de algumas casas, sendo a maior residência do Padre Constancio, capelão do Exército. Nesta casa funcionou, muitos anos, A República.”
“Diante estavam as grandes gameleiras, dando sombra e pouso para conversa. Ficava a primeira gameleira paralela ao Café Abolicionista, depois batizado por Café Socialista, ponto de boêmia, bebidas e saídas de serenatas, com violões e tenores auto-suficientes.” (CASCUDO, Luís da Câmara. Avenida Tavares de Lira. A República, 12 de dezembro de 1958.).
A PRAÇA DO CAIS
A praça, em frente ao cais, foi toda arborizada, sendo desejo do governador Tavares de Lyra, para que, no futuro, o cais pudesse ser “um ponto agradável de reunião e recreio” (PARTE oficial: Governo do Estado. A República, Natal, 13 de jan. de 1905). O cais, inaugurado em 1905, ganhou o nome do governador do Estado desse ano, Augusto Tavares de Lyra, fato que gerou grandes reclamações por parte do jornal Diário de Natal, periódico da oposição. Segundo o Diário, a substituição do nome do cais e da praça, que honravam a memória de uma das principais figuras políticas do país na proclamação da República, o Marechal Deodoro da Fonseca, era uma ingratidão dos atuais administradores do Estado, que mostravam “do que eram capazes.” (DIARIO de Natal, Natal, 08 jan. 1905.).
A preocupação com a reforma do cais, nomeado de Tavares de Lyra, demonstra um pouco dos novos sentidos que passaram a ser atribuídos ao porto no Período Republicano. Desembarcar no cais, não deveria ser apenas um processo rotineiro no itinerário do viajante, mais a oportunidade para visualizar um ponto fundamental na cidade, visto como sua “sala de espera”: o porto. Como nos lembra Alain Corbin, a partir do final do século XVIII, a visita ao porto passou a ser estimulada e apreciada pelas elites locais europeias, integrando os novos guias de viagem que orientavam o itinerário da visita na cidade (CORBIN, Alain. Território do vazio: a praia no imaginário ocidental. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 212.).
Em 1906 Eduardo dos Anjos, intendente entre os anos de 1923 e 1925, realiza reparos na praça e no Cais Augusto Lyra, recebendo do já referido contratante o valor de 2:233$000 (dois contos e duzentos e trinta e três mil réis) (A REPUBLICA, Natal, 10 nov. 1906).
A visita ao cais, permitiria, para os grupos dirigentes locais, que os transeuntes pudessem admirar o rio, que na República, figuraria nos discursos dos administradores locais, como uma das principais forças capazes de projetar Natal no mercado mundial e no caminho das cidades que eram consideradas como modernas e civilizadas.
Na foto acima, tirada em 1904 por Bruno Bougard, podemos visualizar o início do processo de arborização da praça em frente ao cais, idealizado pelo governador. A questão das árvores na cidade perante o processo de modernização mobilizado no espaço urbano rendeu várias matérias nos principais periódicos natalenses, que viam como essencial a sua manutenção na capital. A presença destas, no tecido urbano, representou, para uma parte dos natalenses, a sobrevivência de uma Natal antiga, da tradição e dos valores associados ao tecido urbano que não poderiam se perder com as mudanças promovidas pelo estado, na capital. Além disso, a presença das árvores era considerada importante, para o embelezamento da área urbana e para a saúde dos corpos.
CAIS DO SALGADO
Durante o século XIX, foi constante, nos relatórios de presidente de província a reclamação das condições precárias do porto. Reivindicações ao poder central, por verbas para os melhoramentos do porto, foram feitas pelos grupos dirigentes locais, sendo, no entanto, sempre negadas. Diante da falta de recursos, para promover maiores intervenções sobre a área portuária, pequenos serviços foram feitos e custeados com a própria renda da província, para amenizar a situação. As obras para construção do cais do Salgado, foram um exemplo, não sendo estas levadas adiante, pela falta de material necessário aos serviços, bem como, de profissionais considerados adequados para geri-los, neste caso, um engenheiro. (SIMONINI, Yuri. Ribeira, técnica versus natureza: transformações em prol de um projeto de modernização (1860 – 1932). (2011) Dissertação – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2011. p. 93.).
Alguns esforços, foram empreendidos pela província, utilizando-se da própria renda arrecadada nas alfândegas, para construir o chamado cais do Salgado, situado no alagado existente entre os bairros da Ribeira e da Cidade Alta. No entanto, a falta de verba enviada pelo governo central, e de um profissional adequado para conduzir os serviços, neste caso, um engenheiro, foram apontados pelo presidente de província como os principais fatores, para não levar adiante as obras do cais do Salgado. (SIMONINI. op. cit., p. 93.).
CAIS DO PORTO
Em 1816, o viajante inglês, Henri Koster, publicaria seu livro Travels of Brasil, que ganharia, em 1942, a tradução feita pelo intelectual Luís da Câmara Cascudo de Viagens ao Nordeste do Brasil. Nessa obra, Koster, apresentava as impressões colhidas na passagem por diversas cidades do país. Entre elas estaria Natal.
Em seu relato sobre o porto de Natal, Koster direcionaria o seu olhar para a barra do Potengi, entrada situada na costa da cidade, por alguns rochedos, entre eles, o principal, chamado de Baixinha. Em suas impressões, Koster, não menciona a existência de um cais, nem de armazéns, espaços fundamentais dentro de uma noção moderna de porto, em voga nos principais centros urbanos europeus. Na descrição desse viajante, o porto parecia não fazer parte da cidade, sendo apenas um local de entrada e saída de mercadorias e passageiros, isso, sem estar integrado de uma maneira harmônica a Natal.
A barra do Potengi é muito estreita, mas tem profundeza para os navios de 150 toneladas. A margem setentrional avança consideravelmente e, por essa razão, é necessário que o navio rume ao sul para entrar. O canal, no meio dos arrecifes que ficam a pequena distância da praia, requer conhecimento. Enfim, o porto é de acesso difícil. O rio é muito seguro, quando se haja vencido a barra. A água é profunda e completamente tranquila, e nesse ponto há amplitude para que dois navios possam entrar. Adiante o fundo é raso e, num espaço de algumas milhas, a profundeza é extremamente diminuída. Imagino que seis ou sete navios podem estar perfeitamente no porto. Não se deve penetrar em barras formadas entre bancos de areia como esta senão com bons pilotos, porque elas mudam sempre de lugar e de fundura. Quando a maré se eleva, as margens do norte são inundadas até uma milha a entrada do porto e o mar cobre uma grande extensão de terra que, à maré vazante, fica constantemente úmida e lodacenta, mas permitindo suficiente passagem. (KOSTER, Henri. Viagens ao Nordeste do Brasil. Tradução: Luís da Câmara Cascudo. São Paulo-Rio de JaneiroRecife-Porto Alegre: Companhia Editora Nacional, 1942.p.220.).
A percepção deixada por Koster, sobre o porto de Natal, predominaria no discurso político-administrativo norte-rio-grandense ao longo do século XIX. Apenas na década de 1860, a preocupação com a construção de um cais, apareceria no discurso dos grupos dirigentes locais. O projeto do Cais do Porto de Natal foi aprovado em 14/12/1922, mas só dez anos depois foi autorizado o início da obra pelo governo Getúlio Vargas. A obra foi coordenada pelo engenheiro Hildebrando de Góis.
O Governo Estadual e a Prefeitura da cidade também reformaram o Mercado Público da Ribeira, calçaram com paralelepípedo a ladeira da Praia do Meio, e revitalizaram a Praça André de Albuquerque e a Praça em frente ao Cais do Porto (As primeiras instalações do Porto de Natal foram inauguradas em 24 de outubro de 1932, embora seu projeto tenha sido aprovado por Decreto (nº 15.277) em 14 de janeiro1922. In: http://www.transportes.gov.br/bit/portos/natal/ deponatal.htm).
E o cronista do século XX continua na mesma toada. “Natal não é assim não”. É uma cidade cotidiana, “tão brasileiramente humana” que, apesar de ser capital, e percebe-se que é uma cidade capital, ainda mantém o seu “conforto praceano”, aquele “ar de chacra, [dum] descanso frutecente”. (Andrade, M., 1976, p.232-33., “Natal, 16 de dezembro” de 1928.) Uma cidade cuja beleza se descobre aos poucos, ao entrar em seu ritmo urbano – bem distinto do ritmo da metrópole de “Paulicéia desvairada”.
“… mal a barca traz a gente de bordo pra escadinha do cais, sobre-se a escadinha e se está em plena ‘city’. O centro é ali mesmo, Hotel Internacional, restaurantes, barbearias, redações, bancos, casas de comércio, telégrafo. É tudo ali mesmo, na rua que a escadinha abriu no meio do arvoredo, com todos os bondes e ônibus da cidade-passando”. (Andrade, M., 1976, p.232-33., “Natal, 16 de dezembro” de 1928.).
As transformações urbanas que ocorreram durante a guerra e as reformas implementadas na gestão do prefeito Sylvio Pedroza, iniciaram, mesmo
que timidamente, uma política de visibilidade turística da cidade. O calçamento de ruas, a abertura e reordenamento de vias de acesso e principalmente, a construção da Avenida Circular – com início na Praia do Meio chegando até a Praça do Cais do Porto, na Ribeira –, considerada a principal obra da gestão. O Prefeito referido no texto é Silvio Pedrosa, de formação escolar londrina, administrou Natal entre os anos de 1946-1951. Após esse período assumiu o cargo de governador do estado do Rio Grande do Norte. O investimento que fez na orla marítima se destacou entre seus feitos. Teve como seu secretário de cultura o representativo Folclorista e Historiador da cidade de Natal Luís da Câmara Cascudo, autor do livro “História da Cidade do Natal” de 1947, que foi distribuído pela administração de Silvio Pedrosa em várias cidades do Brasil.
CAIS DA ALFÂNDEGA
Em 09 de junho de 1863, foi concluído o primeiro cais da antiga Alfândega custando 2.790$000, tendo como encarregado o engenheiro hidráulico chamado Berthott. (CASCUDO, Luís da Câmara. História da Cidade do Natal, p.134).
Depois de aguardar por longas semanas o embarque para o sul do país, o 1º Corpo de Voluntários da Pátria do Rio Grande do Norte, formado por 463 homens, “distribuídos por 4 Companhias, sob o comando do tenente-coronel da Guarda Nacional, José da Costa Vilar”, embarcou no Jaguaribe, a 9 de junho de 1865, depois de desfilar pela rua da Palha (atual Vigário Bartolomeu), largo da Matriz, rua da Conceição, “donde partiu para o local do embarque que foi o cais da Alfândega, na rua do mesmo nome, atual rua Chile” (CÂMARA, 1998, p. 183-184). Cascudo apresenta outros dados: 2.197 norte-rio-grandenses foram enviados para os campos de batalha platinos, dos quais “500 perderam a vida na defesa da Pátria” (1984, p. 180).
No ano de 1867, outros dois cais foram construídos: um na Ribeira, o da 10 de junho e outro na Cidade Alta; o do Passo da Pátria, também chamado Porto da Cidade, que durante parte do século XIX, foi o principal ponto de abastecimento interno do comércio da capital, pela feira que existia próxima ao cais. (SILVA, Luís Barbosa da. Relatorio apresentado à Assemblea Legislativa do Rio Grande do Norte. Recife: Typ. do Jornal do Recife, 1867. p. 26.). No entanto, a estrutura do cais, nos pontos de embarque e desembarque, era bastante limitada, não havendo uma grande diferenciação entre cais e ancoradouro. Alguns reparos, sobre esses cais, foram promovidos pela província, havendo inclusive o desejo de unificá-los, estendendo o cais do Passo da Pátria até o da Alfândega, projeto este que não foi levado adiante.
O cais da Alfândega desempenhava também um importante papel de integração – no caso do abastecimento interno – da cidade com o rio. Tanto que é proposto em 1873 o prolongamento deste até o Passo da Pátria, obra que não foi realizada pela falta de recursos da Província.
Por volta de 1874, chegou a Natal um enviado do Governo Imperial, o inglês Sr. John Hawshaw, para fazer a drenagem da barra do Potengi e vencer os recifes. (SOUZA, Itamar, A República Velha no Rio Grande do Norte, p. 67).
A atual Rua Chile foi a de maior movimento na Ribeira. As maiores empresas comerciais, industriais e exportadoras se instalaram naquela rua. No antigo Cais da Alfândega era desembarcado todo o tipo de mercadoria, movimento que desapareceu, motivado peta utilização de caminhões como meio de transporte de carga.
Depois de assumir o cargo de deputado federal, Junqueira Aires só retornou uma vez a Natal, em fevereiro de 1896, sendo então recebido, no cais da Alfândega, por amigos e representantes de todas as classes sociais.
A chegada do vapor planeta em 1902, um dos menores vapores da companhia, foi acompanhada por uma grande festa de recepção, toda noticiada pelo periódico republicano. Por volta das seis da manhã, parte da população natalense se dirigiu para o cais da alfândega, principal ponto de desembarque antes do cais da Tavares de Lyra ser efetivado para o posto de cais exclusivo de desembarque de passageiros.
À noite, a bordo do navio, foi dada uma festa, que reunia as figuras mais “ilustres segundo o jornal A República, da sociedade natalense”. O periódico não deixou de relatar os detalhes mais chamativos do evento, entre eles, o fato do navio ser todo iluminado com energia elétrica. É importante lembrar, que nesse momento, na cidade, o serviço de energia elétrica ainda não havia sido introduzido no espaço urbano.
No dia 15 de fevereiro de 1903, o senador Pedro Velho volta a Natal, sendo preparada uma festa para sua recepção. Logo ao amanhecer, às quatro horas da manhã, as bandas de música do batalhão de segurança e da Philarmônica Luiz Coelho, percorreriam as ruas tocando músicas em homenagem ao viajante ilustre. Enquanto caminhavam pelas ruas da cidade, uma salva de tiros era dada na Praça Augusto Severo, anunciando a chegada do viajante ilustre. (SENADOR Pedro Velho. A República, Natal, 15 de fev. de 1903.).
Várias embarcações, se reuniriam em frente ao cais da Alfândega, muitas delas, com flâmulas e ornamentações. Aqueles que desejassem receber Pedro Velho, embarcariam nesses navios, já que a embarcação, na qual vinha o senador, não tinha condições de entrar na barra. No rebocador, Augusto Severo, que recebia o nome do irmão de Pedro Velho, embarcou o governador do estado, seu secretário e ajudante de ordens, junto também a comissão do Partido Republicano, formada pelo desembargador Moreira Dias, pelo comandante Arthur Lisboa, Manoel Dantas, coronel Pedro Soares e Francisco Câmara.
Em cada uma das pequenas embarcações dispostas próximas ao cais da Alfândega, embarcaram representantes de serviços importantes da cidade, para compor a recepção, no mar, a Pedro Velho. A galeota Natal, foi responsável por buscar Pedro Velho. À bordo desta embarcação, o senador daria uma volta pelo porto, passando pela draga, onde estava o chefe da comissão de melhoramentos do porto, o engenheiro Pereira Simões. Ao desembarcar no cais, o senador, junto ao governador Ferreira Chaves, foi recepcionado por parte da população, que o aclamou soltando pequenos foguetes. Uma marcha, formada por Pedro Velho, Ferreira Chaves e algumas figuras políticas importantes da capital, seguiu pelas ruas do comércio e pela travessa da Alfândega.
Até 1903, por exemplo, o cais da Alfândega era o principal ponto por onde os passageiros desembarcavam na capital norte-rio-grandense.
Conflitos também, entre a leva de flagelados aglutinada no cais da alfândega, durante a seca de 1904, à espreita dos navios com alimentos que chegavam até Natal, trazendo o medo dos saques e da desordem pública no porto, aos administradores locais. Denúncias de saques no mercado público e às mercadorias que chegavam no cais da alfândega explodiam na imprensa, alertando o poder público para a ameaça dos flagelados. Muitos desses morriam próximos ao cais ou adoeciam nas proximidades do prédio da comissão de melhoramentos do porto. Um deles, foi socorrido próximo ao cais da Alfândega pelos empregados da comissão de melhoramentos do porto, após ter desmaiado em frente ao cais.
Itamar de Souza destacou que, em 1904, esses retirantes atacaram a firma comercial Mello & Companhia, sendo imediatamente reprimidos pela polícia. Segundo o referido autor, esses retirantes, dias depois, também atacaram uma lancha pertencente à firma comercial Alves & Companhia, que descarregava farinha no cais Tavares de Lyra. Todavia, o autor apenas apresentou essas informações, não citando as fontes que foram consultadas. Ver: SOUZA, Itamar de. A República Velha no Rio Grande do Norte. Op. cit., p.320.
O cais da Alfândega, construído em 1863, era, até 1904, um dos principais pontos de embarque e desembarque de passageiros em Natal. (CASCUDO, Luís da Câmara. História da cidade do Natal. 4. Ed. Natal, RN: EDUFRN, 2010, p. 182.).
Em qualquer um dos “portos” presentes na capital norte-riograndense, como o do Passo da Pátria, Pedra do Rosário, ou o da 10 de Junho, os passageiros que vinham para Natal, poderiam desembarcar sem haver, por parte do poder público, uma maior regulamentação sobre as atividades desenvolvidas nesses locais. Mercadorias e passageiros circulavam nesses mesmos pontos de embarque e desembarque espalhados pela cidade, não havendo exigências dos grupos dirigentes locais em relação à especialização dos mesmos.
No entanto, em 1904 o governador do Estado, Alberto Maranhão, decidiu investir verbas na reforma do cais da Praça Deodoro da Fonseca, o antigo cais da 10 de Junho. Esse cais se tornaria, pelo edital publicado pela intendência municipal no ano de 1905, o ponto exclusivo, em Natal, para o desembarque de passageiros. (INTÊNDENCIA municipal: resolução n. 98. A República, Natal, 5 de jan. de 1905.) Nele, foi construída uma rampa de desembarque, junto a uma grade de ferro que permitiria as pessoas se aproximar da margem do rio Potengi.
Os trabalhos de dragagem do ancoradouro interno em 1905, gerariam reclamações do agente da Harrison Line, Fabricio Pedrosa, que argumentava que, devido ao intenso serviço dragagem próximo ao cais da alfândega, um de seus navios haviam tocado o fundo do rio Potengi.
RUA CHILE
No ano de 1850, foram construídos diversos prédios na Rua do Comércio (atual Rua Chile) e, em 1869, o Cais 10 de junho (atual Tavares de Lira).
Até a primeira metade do século XIX existiram poucos moradores na ladeira. Em 9 de dezembro de 1859 foi expedido pelo Palácio do Governo, um ofício assinado por João José de Oliveira Junqueira, dirigido aos vereadores da Câmara Municipal do Natal. O referido ofício recomendava a construção de casas particulares no lado do poente da Rua do Aterro até o rio, local considerado “próprio para edifícios de casas particulares em um bairro comercial que tanto carece delas”. Entretanto, exigia-se que fossem respeitados os alinhamentos das casas já existentes e conservado um espaço de 60 palmos, entre as edificações e o rio, visando à construção de uma rua e do cais.
Assim, começaram a ser construídos os primeiros prédios de pedra e cal na Rua da Praia (Também denominada de Rua da Alfândega, Rua do Comércio, Rua Tarquínio de Souza e atual Rua Chile (NESI, 2002; IPHAN, 2007), na área ribeirinha, destinados ao comercio atacadista, especialmente de açúcar e algodão. Em 1860 iniciaram-se as obras para implantação do porto, com reestruturação do cais de embarque (Cais do Salgado), seguidas de obras de acesso ao ancoradouro interno, o que se estendeu até meados do século seguinte.
Recomendava-se também que os moradores de tais casas ficassem obrigados a fechar seus quintais com muros. O alinhamento dos muros deveria ser rigorosamente regular e em uma das extremidades do aterro ficaria uma rua com 50 palmos, comunicando-se com o cais.
A rua Chile, considerada uma das mais movimentadas do bairro, trouxe relevantes fatos para a Província. A rua acima, passou por várias denominações tais como: rua da Praia. Topônimo surgido pela primeira vez, em um registro de concessão de terra, de 21 de novembro de 1769, devido à presença do rio Potengi constituiu-se o caminho natural para a Fortaleza dos Reis Magos. Provavelmente, após o ano de 1863, essa rua passa a ser chamada rua da Alfândega, devido à construção do primeiro cais da Alfândega. Com o intenso movimento de negociantes na rua da Alfândega, o topônimo é modificado para a rua do Comércio.
A Rua da Praia teve a sua denominação, posteriormente mudada para a rua da Alfândega, provavelmente após 1863, ano da construção do primeiro cais da Alfândega, naquela rua. O imenso movimento de negociantes na Rua da Alfândega, mudou mais uma vez o topônimo para Rua do Comércio.
CAIS DO PASSO DA PÁTRIA
Historicamente situado na faixa de terra entre o rio e o casario que dá início à Cidade Alta, o Passo da Pátria depois da segunda metade do século XIX se caracterizava por duas funções principais: por ser o cais da Cidade Alta, fazendo a comunicação entre esse bairro e o Rio Potengi – transportando mercadorias de Natal para o entreposto de Guarapes e para a cidade de Macaíba – e por abrigar uma feira tradicional que abastecia grande parte do bairro alto.
Depois que a cidade desceu para a Ribeira, aí ficou mais de dois séculos. Entre a Cidade Baixa (Ribeira) e a Cidade Alta, a ligação era feita através de uma ponte sobre o rio Salgado, que continuava por um aterro. Esse aterro sofria cada ano repetidas erosões. Uma solução vinha sendo preconizada desde vários anos, conforme justificou o Diretor de Obras Públicas, engenheiro Feliciano Francisco Martins:
“A prolongação do cais desta cidade ate o lugar denominado Passo da Pátria é um melhoramento da reconhecida utilidade; e, com efeito, além de facilitar o trânsito entre o bairro alto e o baixo da cidade, e dar um melhor aspecto ao porto, trazia ele consigo a aquisição de um terreno, que, por ser alagado diariamente nas preamares, nenhum préstimo tem hoje.
Convém que se proceda ao calçamento de toda a área do cais para evitar a lama que sobre ele formam as chuvas; que se coloquem varandas de ferro pelo lado do rio para embaraçar que inconvenientemente se faça desembarques de volumes. Estas obras que não são mais que o complemento das que estão feitas, servirão para conservação e aformoseamento do cais que tem esta cidade.
O investimento inicial do Governo Geral na estrada foi de 9:000$000 réis (Correspondência da Província do Rio Grande do Norte, 31 de dezembro de 1850). Em 1849, já havia sido feito um cais de pedra lavrada mais o telheiro, além de levantadas muralhas laterais para o início do aterro. Em 1850 são destinados 1:200$000 réis para continuação das obras, que substituiriam a estacada de madeira dos taludes por paredes de pedra.
O engenheiro responsável pelo setor de Obras Públicas da província, Sr. Ernesto Augusto Amorim (apud CASCUDO, 1999 [1946], p; 251), em 1866, relatava a constituição da comunicação entre o Passo da Pátria e a Cidade Alta da seguinte maneira:
A falta de uma ladeira que se prestasse ao fácil trânsito entre a Cidade e o Porto do Rio Salgado era reclamado instantemente pelos habitantes desta Cidade. Foi em virtude disto que o antecessor de V. Excia. ordenou-me que organizasse um orçamento para proceder-se ao calçamento da ladeira que passa pelo oitão do Hospital da Caridade, a qual recebeu o nome de Passo da Pátria.
Em 1867, o Presidente pede recursos ao Governo Imperial para a construção de um cais no Passo da Pátria, já que a obra era um complemento indispensável para a ladeira. Em 1870 o cais do Passo da Pátria e o da Praça da Alfândega estão bastante deteriorados, o que faz com que o Presidente autorize orçamento para as despesas necessárias para o conserto dos dois.
A feira e as mercadorias que chegavam pelo cais abasteciam a Cidade Alta e movimentavam financeiramente a localidade do Passo. Itamar de Souza (2008, p. 125) afirma que “tudo era desembarcado ali, procedente de Macaíba, São Gonçalo, Redinha e outras povoações”.
A feira do Passo da Pátria se degradou paulatinamente nos anos subsequentes. Dois motivos principais são apontados: o primeiro é devido ao fato de que emergiram novos polos comerciais na cidade – como no caso do Alecrim – que originaram as suas próprias feiras; o segundo é relativo ao prejuízo da comunicação existente entre a Cidade Alta e o Passo, especialmente no tocante à ladeira e ao cais, causado pela passagem da estrada de ferro entre os dois núcleos. Tanto a feira, como o cais iriam declinar nas décadas seguintes.
No projeto da avenida do porto de Natal, entre os vários objetivos manifestados pelos grupos dominantes potiguares com esse projeto, encontramos a preocupação com a construção de um cais comercial. Esse cais unificaria o da Tavares de Lyra, ponto exclusivo para chegada de passageiros a Natal, como o da Alfândega. Esse era um desejo antigo dos administradores locais norte-rio-grandenses, que, na segunda metade do século XIX, havia expressado nos relatórios de presidente de província, a intenção de unificar os pontos de embarque e desembarque espalhados na cidade.
Em 1873, o presidente de província da época apresentou o projeto de interligar o cais do Salgado até o do Passo da Pátria. No entanto, a falta de recursos não tornou possível que o plano fosse levado à frente. (CÂMARA, Bonifácio Francisco Pinheiro da. Relatório apresentado a assembleia legislativa do Rio Grande do Norte. Rio de Janeiro: Thipografia americana, Rua dos ouvires, 1873. p. 63.).
A passagem, que partia do lado esquerdo do rio em direção ao Cais da Tavares de Lyra, trazia movimento para o bairro baixo e, conseqüentemente, lucros consideráveis para os comerciantes ali residentes. Os principais comerciantes da Ribeira logo manifestaram seu descontentamento com a mudança, enviando um abaixo-assinado (com 22 assinaturas) para o presidente Manuel Januário Bezerra. Na falta de um engenheiro o presidente pediu um parecer da Câmara Municipal do Natal, que foi categórica em dar razão à cidade alta. Os argumentos da Câmara a favor da transferência da passagem para o Passo da Pátria são convincentes. Segundo o parecer do documento, os comerciantes do interior que vêm vender os seus produtos (gêneros de abastecimento interno) na capital não encontram um local fixo e com as devidas acomodações para expor seus produtos na Ribeira. Sabendo-se que já havia um mercado público na cidade alta e um telheiro com uma feira já estabelecida no Passo da Pátria, e na impossibilidade financeira da província construir outro mercado na Ribeira, era mais viável transferir a passagem para o local com estrutura mais adequada.
Ainda em 1873, são feitos os seguintes melhoramentos: construção de um telheiro para abrigo das mercadorias no valor de 725$600 réis, construção de sarjetas para desviar as águas das chuvas por 72$000 e conserto dos degraus que ligavam o telheiro ao rio por 24$000.
Conforme o Relatório da Província, de 1878, o Vice-Presidente Manoel Januário Bezerra Montenegro descreveu que por dois séculos o Bairro da Ribeira seria a parte mais “desenvolvida” da Cidade do Natal. O prolongamento do seu cais até o denominado Passo da Pátria, localizado onde hoje é a Capitania das Artes, fazendo ligação com a Cidade Alta foi considerado de fundamental importância uma vez que facilitou o trânsito entre estes dois bairros e melhorou o aspecto do porto, tendo sua área calçada por causa da lama das marés e cercada com varandas de ferro com o objetivo de impedir o desembarque de volumes. Estas obras servirão para conservação e aformoseamento do cais que tem essa cidade.
Até então, uma grande parte das ruas da cidade não eram calçadas, e o caminho de ligação entre os dois bairros apresentava um solo arenoso, tornando-o difícil e prolongado. Tratando-se da capital eram necessários melhoramentos. Além do embelezamento das ruas que foram calçadas e arborizadas, conseqüentemente o trânsito e a comunicação dos dois bairros tornaram-se mais rápidas.
Com esses melhoramentos, os moradores da Ribeira, receosos de que a Cidade Alta atraísse o fluxo de negócio valorizando seus terrenos, solicitaram do governo provincial que restaurasse apenas, o aterro do rio Salgado. O pedido foi atendido pelo presidente Bezerra Montenegro, e o aterro foi realizado pelo capitão Manuel Joaquim Teixeira de Moura. Esta obra teve benefício imediato para a sociedade, ocupando os emigrantes desempregados como mão de obra (RELATÓRIO do Vice-Presidente Manoel Januário Bezerra Montenegro à Assembléia Legislativa Provincial , 4 dez. 1878.).
Nas resoluções publicadas pela intendência municipal, podemos visualizar o esforço de organização e especialização das atividades portuárias, principalmente, em relação à questão das funções de cada “porto” espalhado no espaço urbano. Na Resolução n. 40, publicada ainda em 1900, foi definido que, “as embarcações na pesca do peixe destinado ao consumo desta capital, devem aportar no local chamado de Passo da Pátria, local designado pela capitania do porto, até que a mesma designe para tal fim um porto definitivo.” (RESOLUÇÃO Nº 40. A República, Natal, 08 de jun. de 1900. Extraído de: ARRAIS, Raimundo Pereira Alencar;
ROCHA, Raimundo Nonato Araújo da; VIANA, Hélder. (Orgs.). A intendência e a cidade: fontes para o estudo da gestão da cidade de Natal (1892 a 1919). Natal: EDUFRN, 2012. p.25.).
Dez anos antes, no começo da República, a intendência proibira o desembarque de tijolo, telha, lenha e outros materiais transportados para capital, por pequenas embarcações que não fossem nos pontos indicados, que eram o Passo da Pátria, a Pedra do Rosário, o cais dos Menores, o cais da Alfândega e o barracão da Capitania do Porto (RESOLUÇÃO Nº 3. A República, Natal, 07 de jan. de 1893. Extraído de: ARRAIS, Raimundo Pereira Alencar; ROCHA, Raimundo Nonato Araújo da; VIANA, Hélder. (Orgs.). A intendência e a cidade: fontes para o estudo da gestão da cidade de Natal (1892 a 1919). Natal: EDUFRN, 2012. p.13.). A imagem a seguir, mostra esses vários cais presentes na cidade, que passaram na República a serem hierarquizados:
É interessante notar, como a partir da República, o termo “porto de Natal” passou a ser associado, cada vez, mais a um cais específico da cidade, neste caso, o da avenida Tavares de Lyra.
Os melhoramentos do Passo continuam durante todo o final do século XIX, e até o início do século XX o telheiro e o cais continuavam com considerável movimentação comercial, de acordo com fotografias desse período.
No começo do século XX, a falta de recursos para construir o cais unificado, continuou a ser um entrave para os grupos dominantes do estado. Para suprir essa carência de verbas, uma das soluções encontradas foi incentivar os comerciantes que possuíam armazéns próximos ao rio Potengi a realizarem por iniciativa própria a edificação de uma parte do cais, referente ao seu armazém. O sonho de, pelo porto, alavancar um processo de modernização, esbarrava nas condições do estado, que ocupava uma posição periférica na economia nacional, um dos fatores que possivelmente justificaria a dificuldade de envio de verbas do Governo Federal para os melhoramentos do porto de Natal.
De 1907 a 1908, Antônio José de Melo e Souza governou o Estado do Rio Grande do Norte. O seu governo teve as seguintes metas: construiu o Cais da Passagem, o Grupo Escolar “Augusto Severo” – hoje, Secretaria de Segurança Pública do Estado que custou aos cofres do Estado à importância de 50.201 .$508 contos de réis, e entregue no dia 24 de março de 1908; a casa do Passo da Pátria que servia para acomodar os passageiros que vinham da Redinha e regiões circunvizinhas; iluminou a gás acetileno as ruas do Comércio, José Bonifácio entre outras.
Sobre a primeira regata realizada em Natal, registrou ‘‘A República’’, de 16/11/1915 – ‘‘Todo o Cais, desde o Passo da Pátria até o elegante Pavilhão destinado aos convivas em frente à Praticagem, estava repleto de famílias do qual tomariam parte seis embarcações, todas elas tripuladas por competentes timoneiros e vigorosos mancebos. Os navios ancorados no Porto apitavam freneticamente; ao largo, embarcações da Praticagem do Porto; da Escola de Aprendizes Marinheiros, e uma lancha da Capitania dos Portos que conduzia o Governador, o Capitão do Porto, outras autoridades e alunas da Escola Doméstica de Natal que, ao término de cada páreo, premiavam as guarnições vencedoras com medalhas, ainda no leito do Potengi’’.
O esporte náutico praticado na beleza de um Rio Potengi menos poluído teve grande desenvolvimento a partir da fundação do Centro Náutico Potengi e do Sport Clube de Natal. Em dia de regata toda cidade ficava em festa. A rivalidade era grande, assemelhada a um clássico de futebol nos dias atuais. As embarcações alvinegras e rubro-negras faziam disputas duríssimas com a participação animada das torcidas que se acomodavam principalmente no Cais Tavares de Lira e no Passo da Pátria. O terceiro clube náutico criado em Natal foi o Riachuelo com padrão alviazulino.
O “Diário de Natal” publica em 1931 uma matéria reivindicando medidas de intervenção urgentes sobre o cais contra a situação de “desasseio e completo abandono em que se acha o trapiche do Passo da Pátria” (DIÁRIO DE NATAL, 1931).
CAIS DE GUARARAPES
O porto de Guarapes teria uma participação efetiva em 19863 como importante praça comercial importadora e exportadora da província. No entanto, as obras do cais e do aterro de Guarapes param neste mesmo ano, pois consumiam muitos recursos do governo, cujo contrato com os empreiteiros estava sob sua administração. Paradoxalmente, também contribuiu para isso a concorrência comercial de Guarapes.
Ao contrário do que se previa, a praça comercial da capital enfraquece ainda mais com os investimentos, já que agora todo fluxo de comércio ia diretamente para Macaíba e Guarapes: “O commercio desta capital, que tem ultimamente fugido para os portos de Guarapes e Macahiba, cada dia se reduz á mais simples expressão.” (Relatorio do Presidente Silvino Carneiro da Cunha de 05 de outubro de 1870, p. 25) Mesmo depois do fechamento da casa comercial de Guarapes em 1872, o local continuaria a ser considerado como o provável sítio da nova sede da província, devido a sua localização estratégica, reunindo várias facilidades de comunicação, tanto terrestres como fluviais.
CONFLITOS PELO CAIS
Na década de 1870, os dois “portos” (um na Ribeira, o da 10 de junho e outro na Cidade Alta; o do Passo da Pátria, também chamado Porto da Cidade) principais no abastecimento interno na cidade, o do Passo da Pátria e da Alfândega, estiveram em disputa, promovida pelos comerciantes dos bairros onde esses estavam situados.
Como falamos anteriormente, em Natal, no século XIX, haviam vários pontos de embarque e desembarque espalhados na cidade, que eram chamados de “portos”. O porto de Natal era o conjunto desses portos existentes na capital, não havendo uma regulamentação maior por parte do poder público, em relação às atividades desenvolvidas nesses locais. É interessante notar que, a noção de porto, presente no discurso dos administradores locais da província, ainda guardava forte relação com a percepção construída sobre o espaço portuário no Período Colonial. O porto era pensado como um mero local de entrada e saída de mercadorias, não havendo nenhuma hierarquização desses “portos” na cidade, mediante as atividades estabelecidas neles.
Os conflitos ocorridos entre os comerciantes da Ribeira e da Cidade Alta, envolvendo esses portos, nos mostram como essa percepção, herdada do Período Colonial, ainda estava bastante presente no discurso político-administrativo norte-rio-grandense. Em 1878, o presidente de província, José Manuel Bezerra, havia manifestado o interesse em construir uma nova passagem para o Salgado, na margem esquerda do Potengi, substituindo o aterro do Salgado que estava bastante deteriorado. Esta nova passagem estaria de frente para o cais do Passo da Pátria.
Tal medida, gerou a revolta dos comerciantes da Ribeira, pois o aterro do Salgado, que se situava na margem esquerda do Potengi, em direção ao cais da 10 de junho, gerava um importante movimento no bairro. Esses realizam um abaixo-assinado que foi enviado ao presidente da província, José Manuel Bezerra, argumentando que a mudança prejudicaria bastante os seus negócios. Na falta de um engenheiro para dar o parecer, o presidente solicitou o parecer da câmara municipal sobre o assunto, tendo o órgão dado causa ganha aos comerciantes da Cidade Alta. (RODRIGUES, Wagner do Nascimento. Dos caminhos de água aos caminhos de ferro: A construção da hegemonia de Natal através das vias de comunicação (1820-1920). 2006. Dissertação – Programa de pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2006. p. 68.0).
Porém, o receio de ir de encontro aos comerciantes da Ribeira, levou, o presidente da província, a decidir por realizar os reparos nos dois pontos. Além das relações de poder existentes nessa questão, podemos notar que, a ausência de uma organização e hierarquização desses portos, processo esse que só se daria no Período Republicano. Em qualquer um desses pontos de embarque e desembarque, embarcações trazendo passageiros e mercadorias poderiam atracar na cidade, não havendo nenhum tipo de regulamentação do poder público sobre as funções de cada um desses portos. O porto de Natal, era apenas o conjunto de vários pontos de entrada e saída de mercadorias e pessoas, com cada um desses pontos, podendo exercer a mesma função.
O porto também não era considerado como um espaço intrínseco à cidade, não sendo ainda a sua “sala de espera,” como veremos no Período Republicano. O porto estava fora do tecido urbano, promovendo uma rápida ligação dos navios com a cidade, não estando, no entanto, integrado de forma efetiva à capital. A passagem de alguns engenheiros por Natal, na década seguinte, endossaria ainda mais essa questão do porto como um espaço fora do domínio da cidade.
No entanto, podemos ver neste conflito que, a questão dos limites do porto, passou a ser abordada pelos grupos dirigentes locais. Era necessário organizar o espaço portuário, estabelecendo funções para cada uma de suas “partes”. Os vários cais espalhados no espaço urbano, ganhariam funções específicas, sendo hierarquizados. O cais da Tavares de Lyra, por receber passageiros, era evidenciado como o principal, enquanto que o cais da Pedra do Rosário, do Passo da Pátria, da Olynto Meira e do Porto do Padre, eram tidos como locais secundários, sendo as mercadorias direcionadas para esses pontos. Mesmo no descarregamento das mercadorias, havia uma hierarquização dos locais de desembarque. Os carregamentos mais importantes, referentes a grandes comerciantes, como Fabricio Pedrosa e Júlio Von Sosten, iam diretamente para o cais da alfândega, onde os armazéns desses comerciantes estavam instalados.
Em novembro de 1910, o governador Alberto Maranhão anunciou o projeto para desapropriar “amigavelmente” os moradores da região próxima ao cais da Tavares de Lyra, para a abertura da avenida do porto. Essas desapropriações renderam fortes críticas da Folha Oposicionista, o Diário de Natal, que criticava o governo do estado por querer expulsar os moradores das suas antigas residências sem ao menos propiciar a estes, novas moradias em condições apropriadas.
Apesar da postura crítica, os jornalistas do Diario do Natal não eram contrários aos ‘melhoramentos’ implementados em Natal. Afinal, a chegada do progresso à capital do Estado era clamada por toda a elite letrada do período. O que o jornal questionava era o modo como os melhoramentos estavam sendo conduzidos pelo governo. Esta posição aparece claramente em uma nota do Diário do Natal sobre a construção de duas novas avenidas em 1907. A primeira deveria seguir desde o Cais Augusto de Lyra até a rua Bom Jesus, e a segunda da praça Augusto Severo até a rua Silva Jardim. A nota do jornal diz respeito às desapropriações das residências que atrapalhariam as obras. Deste modo, o jornalista se põe na seguinte posição: “Não somos contrários aos melhoramentos da cidade, mas [que sejam] sem prejuízo dos seus actuais proprietários, na sua maioria pobres”. (NOVAS avenidas. Diário do Natal, Natal, 1 out. 1907.).
O bairro operário, possivelmente numa proposta de reestruturação do bairro popular do Alecrim, existente desde o final do século XIX (oficialmente desde 1911), surgiria da remoção das precárias casas dos operários e das classes mais pobres que existiam junto ao cais, na entrada da cidade e nos terrenos baldios que tanta má impressão causavam aos visitantes que em Natal aportavam (Lamartine, 1930.).
O movimento revolucionário comunista foi deflagrado no dia 3 de outubro de 1935 e rapidamente se alastrou. No Nordeste, Juarez Távora, Juraci Magalhães e Jurandir Bizarria Mamede articularam a sublevação dos quartéis e a organização dos movimentos que depuseram os governadores. Dois dias depois, “o 29º Batalhão de Caçadores marchou sobre Natal e efetivou a deposição sem resistência do governador Juvenal Lamartine que, sabendo ser impossível resistir, fugiu, de forma alucinada, tão apressadamente que arrancou parte do cais Tavares de Lira onde estava a embarcação encostada” (FURTADO, 1976, p. 71). Comandava as forças revolucionárias que invadiram o estado o major Luís Tavares Guerreiro.
OS ARMAZÉNS DO CAIS
Na rua do comércio, por onde Pedro Velho seguiu com a comissão de recepção para sua casa, havia alguns dos principais armazéns de Natal, destinados a receber os grandes carregamentos de mercadorias que vinham dos outros pontos de embarque e desembarque existentes na Ribeira. As mercadorias que desembarcavam nos portos secundários, como o da Alfândega e o da Olynto Meira, vinham para estes armazéns, que eram da propriedade de importantes comerciantes locais, como Fabricio Pedrosa, Nicolais Bigois, Ângelo Roseli, ou firmas importantes como a Machado & Cia.
Outro comerciante importante na cidade, que também mantinha armazéns na Rua do Comércio, era Júlio Von Sohsten. Agente da Harrison Line, tal como Fabricio Pedrosa, Von Sohsten exportava farinha e algodão pelo vapor inglês Matador. Dono de uma empresa de pesca, A Baleia, na Paraíba, Von Sohsten trouxe para Natal, a “pesca moderna”, inaugurando essa atividade em 1910, junto ao governador, Alberto Maranhão, a bordo da embarcação que homenageava o governador com seu nome (NAVIO Alberto Maranhão. A República, Natal, 19 de jul. de 1910). À bordo, fora realizado uma festa, tendo como convidados, além do governador e o próprio, as figuras mais “ilustres” da sociedade natalense, segundo o jornal A República, além de parte da imprensa, que também fora convidada para a festa. Von Sohsten, também era dono da lancha Progresso, construída em solo potiguar para realização das atividades envolvidas na pesca.
O porto não se resumia ao cais. O porto era formado por uma rede de espaços necessários para seu funcionamento, onde era fundamental a presença de armazéns dedicados a receber parte dos grandes carregamentos que vinham nos navios. Esses edifícios, também fariam parte desta “sala de espera”, que o porto representava, sendo necessário que, a arquitetura desses prédios, estivesse de acordo com aquilo que fosse visto como algo digno de uma cidade moderna, fornecendo ao viajante, que desembarcasse em terras potiguares, uma boa impressão. Os antigos trapiches deveriam, para os administradores locais, dar lugar aos edifícios construídos, segundo os padrões do urbanismo moderno, ou pelo menos, daquilo que era entendido pelas elites locais, como representativo de uma arquitetura moderna.
Depois do cais e dos armazéns, dando prosseguimento a nossa visita, podemos direcionar nosso olhar para a chamada parte “externa” do porto. A partir do período republicano, os administradores locais potiguares, buscaram definir os limites do porto, deixando clara a divisão do porto em suas partes, a externa e a interna.
Os tripulantes das catraias do cais Tavares de Lira e os estivadores ali se reuniam nas horas em que nada tinham a fazer e a conversa girava sempre em torno de assuntos escabrosos. Além do mau cheiro do melado que escorria das centenas de sacos de açúcar bruto, a inhaca da cachaça saindo pelos poros dos seus consumidores. Junte-se a isso as discussões com vocabulário do baixo calão e que, às vezes, terminava em empurrões, murros e coisas piores.
Espaços como o cais, as docas e os armazéns, apareciam, em alguns momentos, como elementos secundários e sem urgência. O conflito entre o que deveria ser o porto para os administradores potiguares se fez presente nas intervenções promovidas sobre a região portuária. Em alguns momentos, integrar o porto ao tecido urbano, dirigindo a atenção para sua estrutura interna, parecia ser o foco do Estado em seus discursos, principalmente nas mensagens de governador apresentadas a Assembleia Legislativa. Em outros, a mesma noção presente no século XIX, que considerava o porto apenas como todos os pontos de embarque e desembarque espalhados na cidade, com sua entrada demarcada com o recife chamado de Baixinha, figurariam nas falas dos grupos dirigentes locais, que viam o porto resumido a esse melhoramento.
A ESTRADA DE FERRO DO CAIS DO PORTO
O projeto “modernizador” para a cidade do Natal esteve vinculado, a partir do movimento da Estrada-de-ferro e do cais do Porto, no Bairro da Ribeira, principalmente, a partir da segunda metade do século XIX (1877- 1897), pois foi ali, que se estabeleceu os armazéns de compra e venda do açúcar e algodão para exportação.
O espaço do charco, ou alagadiço da Praça da República é objeto de um aterro parcial no sítio destinado a abrigar o parque ferroviário da Estrada de Ferro de Natal a Nova. O aterro posteriormente reclamado seria aquele referente à área em frente à estação, que continuaria alagada. Os primeiros estudos realizados para instalação da estação acontecem em 1878 na época em que a companhia responsável pela construção da via férrea era a Imperial Brazilian Natal and Nova Cruz Railway Company e o aterro inicialmente não havia sido planejado (RODRIGUES, 2006). Esses estudos determinavam que os trilhos passariam por cima do chamado Cais do Salgado – muro de arrimo construído entre o Rio Potengi e o alagadiço – e terminariam nas proximidades da Alfândega, permanecendo ainda o charco que, posteriormente, seria aterrado. Entretanto, essa proposta não é levada adiante.
A Estação Central da Natal Nova Cruz vai ter um papel fundamental como principal referência no processo de urbanização do alagadiço nos próximos anos, contribuindo para demarcar as novas fronteiras da cidade com o rio, tornando o local a nova porta da cidade, não mais dos caminhos de água, agora dos caminhos de ferro. Os primeiros estudos para instalação da estação já acontecem em 1878. Pelo visto, o aterro não estava planejado no início da construção. Em estudos realizados pela Imperial Brazilian Natal and Nova Cruz Railway Company os trilhos passam por cima do cais do salgado e terminam nas proximidades da alfândega, permanecendo ainda o alagadiço.
Grande parte do espaço delimitado pelo “Caes do Salgado”, destinado primitivamente ao futuro passeio público, foi ocupado pelas instalações da companhia. Esse parque, com uso restrito às manobras e instalações ferroviárias, interrompe a histórica relação que a cidade tinha com o rio, 30 como salientado principalmente na primeira parte deste trabalho, ao mesmo tempo que a estrada de ferro entra para competir com os tradicionais meios de transporte fluviais e afirmar a centralidade de Natal. Uma nova porta se abre no mesmo espaço.
No ano 1881 – ano também da inauguração das atividades da via férrea – é iniciada a construção de “um aterro de 70 mil metros quadrados sobre o alagadiço, agora área da marinha, para conseguir-se o espaço necessário ao parque ferroviário, com edifícios destinados aos vagões, mercadorias, locomotivas, carpintaria, oficinas de máquina e casa de fundição” (RODRIGUES, 2006, p. 127). Dessa forma, o espaço ocupado pelos equipamentos se torna uma nova fronteira para a cidade. No entanto, apesar da instalação do complexo, a área frontal, correspondente à Praça da República, continua a ser objeto de constantes reclamações.
No que diz respeito à separação que a mesma via férrea provocou, um exemplo bastante ilustrativo da separação está no cais e feira do Passo da Pátria, local, que como vimos, foi ponto de abastecimento da Cidade Alta desde, pelo menos, o século XIX.
Além do porto, em 1904 foi construído o percurso ferroviário que se estende de Igapó a Ceará-Mirim. As estações que ligavam essa ferrovia foram inauguradas em 1906, elas foram traçadas pelo engenheiro Sampaio Correia (SOUZA, 2008: 67-321).
Ainda em relação ao porto, uma das obras que beneficiaria a cidade era a reforma e ajardinamento do cais de desembarque que se situava provavelmente no fim na rua que seria posteriormente denominada de Tavares de Lyra, local que era ponto fluvial de entrada da Cidade e que, por isso, concentrava vários estabelecimentos comerciais, principalmente voltados para a importação e exportação (como a Walter Pedrosa S/A de exportação de algodão). Um local que serviria, nas palavras do próprio governador, como “um ponto agradável de reunião e recreio” (RIO GRANDE DO NORTE. Mensagem lida perante o Congresso Legislativo do Estado do RN em 14 de julho de 1904, p.6).
A Praça Augusto Severo e a estação de trem se tornam, a partir dos melhoramentos, no local das principais cerimônias cívicas e militares do Rio Grande do Norte. Um exemplo disso é decoração da estação da Great Western para receber o Presidente Afonso Pena em 1906 (A REPUBLICA, Natal, ano 16, 09 jun. 1906b., p. 01). Não apenas a estação, mas a praça também é decorada. A importância das vias férreas para a cidade é também exemplificada por essa visita, uma vez que o presidente eleito vinha à cidade justamente para inaugurar o primeiro trecho da Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte, de Natal a Ceará-Mirim. As atenções que antes se voltavam ao porto e ao cais da ladeira do Passo da Pátria no século XIX – elementos que conectavam a cidade às outras regiões através do rio – passaram, com as reformas empreendidas, para a Praça Augusto Severo, “onde a estação de trem protagonizava esse novo pórtico, o que veio a modificar sensivelmente a noção de centralidade dentro do espaço urbano de Natal” (RODRIGUES, 2006, p. 142).
Os melhoramentos advindos da instalação do parque ferroviário abrangeriam a construção da ponte de Igapó, que viria a ser símbolo de modernidade e de um muro de arrimo que serviria de cais atracável para o porto e de ramal de ligação da linha com o parque ferroviário (BRASIL…, 1912). Dessa maneira, o parque objetivava a integração entre porto e ferrovia “sem rupturas, e de maneira a facilitar a fluidez e continuidade da rede de transportes” (RODRIGUES, 2006, p. 118).
A questão das disputas fundiárias alimentadas no processo de implantação do complexo ferroviário na Esplanada Silva Jardim é reforçada, posteriormente, no ano de 1918. No dia 25 de julho de 1918, é publicada por “A República” a sentença do juiz federal Meira e Sá, julgando improcedente a ação de manutenção de posse proposta pelo Dr. Bruno Pereira – advogado de Julius von Sohsten, arrendatário dos terrenos – contra a Companhia de Viação e Construções, empreiteira da E. F. Central do Rio Grande do Norte. A disputa judicial pela posse das terras tem início a partir do momento que é iniciada a construção de um cais – feito do enrocamento de pedras – e de um depósito de materiais para a estrada de ferro pela Construtora Ferreira e Cia. no referido terreno. Esse cais seria responsável pela nova comunicação da linha da Central com o seu complexo viário, em detrimento da antiga conexão, que passava pela Rua do Comércio, na Ribeira. O arrendatário dos terrenos à margem do rio, Sr. Julius von Sohsten, entra, então, com ação contra as benfeitorias que vinham sendo realizadas pela companhia da estrada de ferro.
Os autuantes afirmavam, entretanto, que possuíam benfeitorias – entre elas um trapiche – construídas na área. Em defesa aos réus o juiz dispõe que o cais construído pela Construtora Ferreira e Cia. ficava sobre o rio – não tocando o referido terreno em causa – e que a construção da linha da E. F. Central não se encontrava sobre terreno da Marinha, mas de terreno “acrescido” por meio de aterro e, portanto, não incluso nas disposições de possíveis escrituras e cartas de aforamento que eventualmente os autuantes pudessem possuir. Essas conformações são aprovadas por peritos engenheiros que realizaram uma planta do local (A REPUBLICA, Natal, ano 30, n.166, 27 jul. 1918c.). Meira e Sá afirmou que as obras dispostas pela companhia na construção do cais e da linha férrea seriam legais em virtude de serem públicas e de “gozo geral”.
A relação das linhas das estradas de ferro – Central e Great Western – com o porto era intrínseca. Os cais que eram construídos para atracação das embarcações, também davam passagem aos trens, que neles desembarcavam ou embarcavam mercadorias que eram transportadas pela ferrovia. No relato da situação dos principais projetos para o porto de Natal, o superintendente Décio Fonseca destaca os projetos para esse cais de atracação, elaborados pelos engenheiros Souza Bandeira, José Garcia e Lothario Hehl.
Construcção de quatrocentos metros de caes começando defronte da casa n. 26 da rua do Commercio e terminando defronte da rotunda da estação da E.F. da Great Western passando por fora da Alfandega (A REPUBLICA, Natal, ano 31, n.96, 03 maio 1919a. p. 01).
Com a elaboração dos novos projetos, as obras do cais de atracação são reiniciadas em 19 de maio de 1919, sob a responsabilidade da Companhia de Viação e Construções, concessionária da E. F. Central e do cais do porto (A REPUBLICA, Natal, ano 31, n.108, 19 maio 1919b., p. 02). A lógica de aproximação entre ferrovias e porto é uma prática difundida no planejamento dos mecanismos ferroviários para as cidades portuárias.
O complexo da E. F. Central de certa maneira, depois de consolidado, passa a exercer o papel de limite entre a Ribeira e as Rocas. Esse fato é reforçado quando é noticiado em outubro de 1925 o novo sistema de numeração das edificações na área urbana da cidade. Nele, é estabelecido como referência dois eixos imaginários formados pela Rua Silva Jardim e o seu prolongamento – norte-sul – e outro perpendicular à Silva Jardim tangenciando o Cais Tavares de Lyra – leste-oeste (NUMERAÇÃO da cidade A Republica, Natal, ano 37, 5 abr. 1925.).
Para Brandão, a proposta da linha de contorno teria sido um erro desde o início. A ligação com o parque poderia ter sido realizada mais facilmente a partir da desapropriação de parte da Rua do Comércio, ou, então, com o prosseguimento do cais projetado pela companhia então arrendatária da Central, porém, não concluído. O cais seria de fácil construção, feito a partir de pedras jogadas, apenas tendo como paramento a maré mínima. Ao ser perguntado sobre o porquê da não conclusão da proposta do cais no momento de então, Heitor Teixeira de Brandão responde que seria mais difícil uma vez que as instalações pertencentes à Estrada de Ferro Central na cidade de Macaíba, onde seriam conseguidas as pedras, haviam sido entregues às Obras do Porto. Além disso, o terreno destinado ao cais já vinha sendo ocupado pela construção de um novo armazém, no âmbito da reforma do Porto de Natal. Contudo, apesar das dificuldades, o engenheiro ainda julgava a construção do cais como a mais adequada à “melhor estética de Natal”, apontando-a também como a mais apropriada à ligação das instalações do porto às linhas da Central e da Great Western (ESTRADA de ferro Central do Rio Grande do Norte, A Republica, Natal, ano 66, n.979, 21 mar.).
As diversas alternativas de ligação com o parque, contudo, não são colocadas em prática. A conexão com o parque continua a ser efetivada através da Rua do Comércio e pelo trecho parcialmente construído do cais de atracação até a paralisação dos serviços ferroviários na década de 1950.
Enquanto algumas áreas se consolidam como residência operária, as frações centrais continuam a receber investimentos por parte do poder público, como por exemplo, com a construção de edificações emblemáticas e há muito reclamadas pelas elites político-intelectuais da cidade, como o Grande Hotel de Natal, localizado “em um dos pontos de maior movimento da nossa ‘urbs’” (CHRONICA…, 1937b). Esse ponto corresponde justamente ao cruzamento de duas das principais avenidas da cidade: a Avenida Sachet (Atual Duque de Caxias.), construída no triênio de 1905 a 1907, e que interligava a Praça Augusto Severo – onde se localizava o parque da Great Western – à Esplanada Silva Jardim – localização do parque da E. F. Central – e a Avenida Tavares de Lira, importante artéria onde se localizavam vários equipamentos como a sede dos telégrafos, da Repartição de Serviços Urbanos, o Banco do Brasil e o Cais Tavares de Lira. Ambas essas avenidas eram servidas pelo transporte intra-urbano dos bondes elétricos.
O CAIS E DOS BONDES
Os serviços de implementação das linhas férreas dos veículos nas ruas também geram problemas em relação ao acúmulo de detritos nas vias, como por exemplo, na Avenida Tavares de Lyra, uma das mais movimentadas da cidade, defronte ao Cais Tavares de Lyra.
A avenida Tavares de Lyra, um dos mais bonitos pontos desta cidade, é onde se nota maior movimento á qualquer hora do dia, augmentando quando em nosso [cais] ancoram navios vindos do norte ou sul. Em todo caso, á Avenida Tavares de Lyra não se vota o cuidado merecido e vemol-a entulhada de materiaes de troços imprestáveis que concorrem para o seu afeiamento e difficultam o transito (VARIAS, A Republica, Natal, ano 25, n.28, 26 maio 1913b. p. 01).
Além dos melhoramentos materiais já mencionados na administração de Ferreira Chaves, outros também se faziam sentir tanto em relação à organização territorial do estado – como a continuidade do prolongamento da Central – como a nível intra-urbano com a ligação da estrada com a Estação Central nas Rocas e a construção do cais (A REPUBLICA, Natal, ano 31, n.122, 5 jun. 1919d.). Apesar de todo o avanço nas diversas áreas, a crítica à situação dos serviços da Tração Força e Luz retorna com veemência.
O mau funcionamento da infraestrutura dos bondes faz com que os acidentes se tornem cada vez mais constantes. Em 14 de abril de 1937 é noticiado mais um descarrilamento de bonde no cruzamento entre as avenidas Rio Branco e Ulisses Caldas – trecho pertencente à linha Alecrim – Cais do Porto – ponto movimentado da cidade, devido à falha no freio comum do veículo número 17 (O BONDE pulou fora dos trilhos, A Republica, Natal, ano 68, 14 abr.1937.). A única linha tida como em estado satisfatório de funcionamento é a Alecrim – Cais do Porto.
Até mesmo a afirmação de que a linha Alecrim – Cais do Porto trafegava de maneira satisfatória gera discórdia. A posição do cronista Danilo, de “A República”, ocasiona contestações por parte de outros colaboradores do próprio folhetim, que relatou que essa linha seria uma das mais problemáticas (A REMODELAÇÃO…, 1937).
Até mesmo as linhas mais movimentadas, como a do Cais do Porto-Alecrim, sofriam com a irregularidade dos horários e com a carência de novos carros em circulação. Enquanto que nos horários de pico, entre 10 horas e meio-dia e das 4 às 6 da tarde, a circulação se dá normalmente, embora os poucos carros trafeguem abarrotados, “transbordando de pingentes”, nos demais horários a ausência de veículos faz com que os usuários tenham que esperar “durante meia hora” a passagem de um novo bonde (NATAL…, 1937).
CAIS COMO ESPAÇO DE SOCIABILIDADE
Os grupos dirigentes almejavam tornar o porto um local onde os indivíduos poderiam também ficar, seja para contemplar, na beira do cais, os navios, que aportavam na capital, seja para praticar esportes, como o remo (a regata), indispensáveis para o cuidado da saúde e dos corpos, ou mesmo, seja para o simples passeio público. Ao viajante que desembarcasse em Natal, a primeira impressão, era aquela do porto, um espaço organizado, racionalizado, longe dos focos de insalubridade, e regulado pelas leis e editais da intendência municipal, que buscariam garantir, por meio da legislação, o estabelecimento de práticas no porto, tidas como modernas e civilizadas.
Em Natal, as práticas esportivas começam a receber atenção dos intelectuais na década de 1890. Em 1897, quase um mês depois da publicação do artigo de S., foi anunciada no jornal A Republica a realização da primeira regata da cidade. (REGATA, A Republica, Natal, 18 maio. 1897.). Até a década de 1910, a maioria das regatas organizadas na cidade não se destinava a grupos de atletas profissionais, nem mesmo aos sócios de clubes oficiais, o que mostrava o caráter informal dessas competições. A realização da regata, além de divertir os participantes amadores e profissionais, divertia também as pessoas que se reuniam na beira do cais ou em pequenas embarcações às margens do rio a fim de assistirem às competições. As pessoas que se encontravam à beira do cais assistiam, sem sequer levantar um músculo, às competições esportivas nas quais se destacavam os remadores.
Em 1905, foi construído um pontão, pelos empregados da comissão de melhoramentos do porto de Natal, uma estrutura sobre a água, suportada por estacas para ajudar a suportar as dragas, um guindaste de cinco toneladas e um bate-estaca do serviço do porto. Também conhecido como pier, sua construção foi comemorada pela comissão de melhoramentos do porto de Natal, com a realização de uma regata, a regata do pontão Augusto Severo, nome dado em homenagem ao irmão do ex-governador e chefe de Partido Republicano, Pedro Velho. (REGATA do porto. A República, Natal, 9 de fev. de 1905.).
A regata foi realizada no dia 18 de fevereiro de 1905, sendo assistida por parte da população natalense, que havia sido convocada pelo Jornal A República, para prestigiar o evento. Os empregados da comissão de melhoramentos do porto, participariam da regata ao lado de profissionais do esporte, sendo assistidos pela população que acompanhava a regata do Cais da Alfândega, e pelos representantes da “sociedade natalense”, que poderiam prestigiar o evento de barracos montados próximo ao cais, para os convidados especiais acompanharem a regata. (REGATA do porto. A República, Natal, 18 de fev. de 1905.).
A Avenida Tavares de Lyra, por sua condição de Avenida do Cais, era o portal de entrada daqueles que chegavam à cidade pelo Rio Potengi. Esta característica fez desta avenida um dos lugares mais movimentados da velha Ribeira. Foi, inclusive, local de realização dos primeiros carnavais de rua. A concentração do corso na Avenida Tavares de Lyra, consolidou o carnaval na Ribeira. Ali eram travadas as famosas batalhas de confete, que animavam os festejos momescos e coloriam todo o logradouro (NESI, 2002, p.119).
A Avenida, antigamente, foi local de ebulição cultural, local onde a elite política e econômica se reunia nos diversos cafés e bares. Em Natal do Meu Tempo, Guimarães (1999, p.135) lembra alguns destes lugares.
A Cova da Onça, o Anaximandro, o Aero Bar, a Rotisserie e o Café de Oscar Rubens, atraíam a freguesia seleta durante todo o dia, e à noite, até as dez horas. Desta hora em diante, porém, continuavam abertos, contando com a freqüência dos que gostavam de festejar a noite, […] achando mais gosto na ‘prosa’ do que na bebida.
O bote “Jacaré” era uma figura muito popular no ambiente do cais da Avenida Tavares de Lira. Tinha uma grande qualidade – só mentia quando estava bêbado. Era o encarregado de transportar da casa até o convés do navio a bagagem da maioria das pessoas que embarcava em Natal.
Os clubes esportivos moviam a vida social não apenas dos sócios que pagavam as mensalidades e frequentavam as suas sedes sociais, mas sim uma vasta camada da população que passou a identificar-se com os clubes, formando os coros das torcida, ocupando a rua em festa nos dias de jogos de futebol nos anos 1920 e enchendo o cais Tavares de Lyra nos dias de competição dos clubes náuticos na década de 1910. Dessa maneira, o esporte marca uma nova maneira de usar os espaços públicos da cidade.
Até a década de 1910, a maioria das regatas organizadas na cidade não se destinava a grupos de atletas profissionais, nem mesmo aos sócios de clubes oficiais, o que mostrava o caráter informal dessas competições. A realização da regata, além de divertir os participantes amadores e profissionais, divertia também as pessoas que se reuniam na beira do cais ou em pequenas embarcações às margens do rio a fim de assistirem às competições. Quando essas passaram a ocorrer no espaço público, deram margem a uma outra forma de sociabilidade, que não a exercida pelos competidores. As pessoas que se encontravam à beira do cais assistiam, sem sequer levantar um músculo, às competições esportivas nas quais se destacavam os remadores. Esses espectadores são motivados por uma outra lógica, que era a lógica da ação e da saúde que movia os atletas: era a lógica do espetáculo. O esporte para os espectadores, que participam da cena, assistindo, torcendo, viria a se tornar entretenimento. A regata triunfou na cidade por conseguir unir os ideais de força e saúde, característicos da modernidade, com a boa aceitação do público.
Em 1917 dentro das comemorações do centenário de Padre Miguelinho ocorreu um páreo tendo como ponto de partida o Paço da Pátria e como chegada o Cais da Alfândega, foram organizados seis páreos nos quais em diferentes modalidades as agremiações competiram, na seguinte ordem: 1° páreo – Riachuelo; 2° páreo – Instituto Histórico; 3° páreo Clara de Castro; 4° páreo – Miguelinho; 5° – páreo André de Albuquerque; e 6° páreo – Centenário. A bordo da lancha “Natal”, fundeada no ponto de chegada, a banda de música do Batalhão de Segurança tocou durante a festa, e ao final das competições (o 1° pareo correu às 14 horas e o último às 16), uma comissão de senhoritas fez a entrega aos vencedores de medalhas de prata, mandadas confeccionar pelo Instituto Histórico especialmente para a ocasião.
Nessa mesma avenida, estavam localizados cerca de 50% dos clubes e cafés do bairro, e nos dias de competições náuticas, era no Cais Tavares de Lyra, ao fim da mesma avenida, que se agrupavam todos os competidores e torcedores dos clubes náuticos de Natal.
Além dos espaços de sociabilidade a cidade crescia economicamente promovendo também melhorias em relação às vias de comunicação com outras localidades, essas vias é que possibilitavam uma maior intercomunicação de Natal com outros centros, fazendo com que se intensificasse a entrada de mercadorias. Podemos destacar desde o século XIX a importância do Porto de Natal que passou por melhoramentos em 1918 por iniciativa de Augusto Tavares de Lira então Ministro da Viação e Obras Públicas. O engenheiro contratado na época Manoel Carneiro de Souza Bandeira teria traçado medidas de melhoramento como a construção de um cais de atracação, três armazéns, sendo dois de 80 metros e com largura de 150 metros, dentre outras melhorias físicas em termos de reformulações naturais.
Os boêmios frequentavam os botecos do Passo da Pátria. As comemorações do centenário da Independência do Brasil, em setembro de 1922, movimentaram os habitantes da cidade de Natal. Dentro dos festejos, três barcos de pescadores da Colônia José Bonifácio fizeram uma arriscada viagem ao Rio de Janeiro (Cf. GALVÃO, 2009, p. 88-90.). A iniciativa mobilizou governantes e populares a comparecerem ao cais da Avenida Tavares de Lira para prestigiar a partida dos aventureiros à capital federal. Finalizadas as comemorações do centenário de Independência do Brasil, no Rio de Janeiro, os pescadores natalenses, a bordo do navio Maranguape, retornaram a sua cidade no dia 19 de outubro de 1822.
Os sinos da Catedral de Natal repicaram alegremente para anunciar a próxima chegada do marquês e aviador italiano Francisco Di Pinêdo, que pousou no Rio Potengi numa manhã de fevereiro de 1927. Milhares de pessoas entusiasmadas se deslocaram para recepcionar o herói. Um corso de automóveis comandado pelo prefeito Omar OGrady discursaram. O problema é que Di Pinêdo estava muito cansado devido à penosa travessia e aos problemas no voo que o obrigaram a pousar antes em Fernando de Noronha. Ele decepcionou a população com seu mau humor e foi apenas protocolar nas solenidades.
Cinco entusiasmados remadores natalenses imaginaram, em 1932, fazer um raid a remo. Distância do percurso: 1.700 milhas – construíram o barco em 1937 e passaram 15 anos aguardando permissão para a largada espetacular. Além do ineditismo dessa proeza, o impressionante é que o mais novo dos remadores envolvidos já tinha 39 anos de idade quando iniciou a epopeia. E decorreram 20 anos para a concretização do sonho.
Ao passarem em frente ao Cais do Porto, dezenas de esportistas e familiares aflitos aplaudiram os corajosos remadores, que conduziam a imagem de Nossa Senhora da Apresentação, a Santa padroeira de Natal. Barcos, canoas e jangadas acompanharam a saída dos aventureiros a partir do Cais da Tavares de Lira.
No bairro da Ribeira, os boêmios visitavam vários bares, como a Confeitaria Delícia e o Tabuleiro da Baiana, situados na Praça Augusto Severo e o quiosque do cais da Avenida Tavares de Lira. A esquina da Avenida Tavares de Lira com a Rua Doutor Barata era um importante espaço de sociabilidade natalense nas décadas de 1940 e 50. Nesse espaço, havia a Confeitaria Avenida, nº. 56, e o Clube e Bar Carneirinho de Ouro, nº. 54, e, próximo dali, a Peixada Potengi. O Grande Ponto e a esquina da Avenida Tavares de Lira com a Rua Dr. Barata eram espaços de intensas relações sociais. Muitas pessoas procuravam seus bares e cafés para conversar, obter informações e notícias sobre os principais acontecimentos da cidade de Natal, do estado do Rio Grande do Norte e do mundo.
Já no início dos anos 1960, aos domingos logo cedinho o programa preferido do natalense era ir de lotação ou a pé até a Ribeira. No estuário do Rio Potengi acompanhavam as regatas e torcíamos pelo Centro Náutico em sua batalha semanal contra Sport e Riachuelo. Imagens marcantes, beleza plástica inesquecível. Os espectadores chegavam bem cedo, de visitar antes o Cais do Porto, de ver os navios recém-chegados, de nos explicar as bandeiras e respectivas nacionalidades. Acompanhavam atentamente os preparativos que antecediam a competição e nos explicava o significado de tudo. O esporte náutico estava envolvido mais diretamente a classe média nos anos 1930 e 1940, que o público feminino acompanhava as competições de perto.
O botequim é o bar frequentado pela população pobre, trabalhadores do cais do porto, biscateiros ou moradores de rua, que compareciam ao lugar quase diariamente para beber e fazer suas refeições. As fontes não nos permitiram avançar numa discussão a respeito da boemia das camadas populares, que ocorria nas zonas de baixo meretrício (Ribeira), nos bares do Beco da Lama (Cidade Alta), nos botequins do Canto do Mangue (Rocas) e nos botecos situados no Cais da Avenida Tavares de Lira e nos bairros da Ribeira e do Alecrim.
Os botecos do bairro da Ribeira se confundiam com as casas de meretrício. À noite, as ruas e travessas da Ribeira eram vivenciadas por farristas, moradores de rua, boêmios e prostitutas, senhores e senhoras dominantes das artérias desse antigo bairro natalense. Após o encerramento do expediente (das 7h às 11h e das 13h às 17h) dos funcionários das casas comerciais e dos servidores públicos, desaparecia o movimento do comércio e a intensa circulação de pessoas pela Ribeira. Nesse bairro, passavam a transitar indivíduos frequentadores dos bares, a exemplo do reservado da Confeitaria Delícia, e dos botecos no Cais da Avenida Tavares de Lira. Nas últimas horas da noite, o destino seria as casas de meretrício da cidade de Natal e bares que ficavam abertos durante as vinte e quatro horas do dia.
Em muitas de suas crônicas, Navarro insere-se como personagem principal, ao declarar que estava em uma mesa de bar quando observava o movimento do fim da tarde em uma rua da cidade de Natal ou no Cais da Avenida Tavares de Lira, bebendo com pescadores e contemplando o rio Potengi. Nesses casos, a crônica é produto de sua própria vivência, visto que muitos de seus textos eram escritos no momento em que ele experimentava sua boemia.
Seus textos indicam seu profundo descontentamento com o estilo de vida burguês, por isso ele preferia vivenciar o cotidiano dos subúrbios da cidade de Natal (Rocas, Canto do Mangue, o cais da Avenida Tavares de Lira) e as ruas escuras do bairro da Ribeira nas noites de boemia.
No jornal A República, Newton Navarro escreveu acerca do cotidiano de bares e restaurantes de Natal, associando a sua vivência nesses lugares ao cotidiano da cidade. O autor era frequentador de praias e de bares dos bairros da Ribeira, de Santos Reis e das Rocas, por isso os principais temas de suas crônicas eram os logradouros da Ribeira e de Santos Reis, o rio Potengi, o Cais do Porto na Avenida Tavares de Lira (Ribeira), o Canto do Mangue (Rocas) e as praias da Redinha e de Ponta Negra. Esses espaços eram, ao mesmo tempo, objeto de suas crônicas e os lugares de sua boemia.
Em nota publicada no livro Do outro lado do rio, entre os morros (1974), de Newton Navarro, o jornalista Nilo Pereira referiu-se ao autor: ―onde está Newton, com a sua esplêndida inteligência, a sua arte e a sua sensibilidade, aí está a ausência de ordem, no melhor sentido da palavra. Ordem burguesa. Ordem convencional‖ (NAVARRO, 1974, s/p.). Nesse texto, Nilo Pereira refere-se às crônicas de Navarro que priorizam, nos seus escritos, os subúrbios e as pessoas simples do Cais do Porto, do Canto do Mangue e da Praia da Redinha, individualizando-as na medida em que dava nomes às pessoas e relatava suas características particulares.
Nos anos de 1950, a Ribeira possuía uma grande variedade de bares, cafés e confeitarias, sendo alguns surgidos no período da Segunda Guerra Mundial. Muitos bares estavam situados na esquina da Avenida Tavares de Lira com a Rua Doutor Barata e ruas adjacentes.
Newton Navarro também era frequentador da Confeitaria Delícia. Ele saía do bar de Olívio para os botecos no cais da Avenida Tavares de Lira, lugar representativo da boemia de Navarro, ligada ao prazer de estar junto ao mar, ao rio e às pessoas simples que circulavam nas redondezas. O Beira-rio era a denominação que Navarro dera aos botecos à margem do rio Potengi, situados no cais da Avenida Tavares de Lira. Os botecos eram frequentados por marinheiros, trabalhadores do cais do porto, boêmios e prostitutas. Nesse estabelecimento comercial, nas palavras de Navarro, ―chegam três mulheres de vestidos vistosos. Aceitam, sem reservas, uma ‗chamada‘. Estão à espera dos homens do navio estrangeiro, que logo mais chegarão para o festival da noite‖ (NAVARRO, 2011, p. 56.).
Na sua obra Do outro lado do rio, entre os morros (1974), Newton Navarro descreveu a paisagem da Praia da Redinha e também o panorama do Cais do Porto, este situado no bairro da Ribeira, onde os botes e as barcas transportavam os passageiros e as mercadorias para a Praia da Redinha. Desde meados século XIX, os natalenses atravessam o rio Potengi rumo a tal praia. O tenente de milícia Joaquim Manoel Açucena costumava ir com amigos à Redinha saborear peixadas, e à Praia de Genipabu ouvir o poeta Miguel Vieira de Melo (Cf. CASCUDO, 1989, p. 66.).
As crônicas de Newton Navarro abordavam o cotidiano dos subúrbios da cidade de Natal, a exemplo dos bairros de Santos Reis e das Rocas, do Cais da Avenida Tavares de Lira (Ribeira) e das praias (Redinha e Ponta Negra). Nesses locais, o cronista buscava a sua boemia, que era a da tradição, do tempo em que a noite era iluminada pela lua cheia, em que se escutavam os sons de ―pinicados de viola‖, assistiam às danças folclóricas, participavam das festas populares, saboreavam deliciosos peixes a beira-mar, sentindo o cheiro do mar e do rio Potengi. Ao resgatar, nos seus textos, a boemia da tradição, Navarro se mostrava um descontente com as transformações urbanas que ocorriam na cidade de Natal.
OBELISCO DO CAIS
Um monumento em forma de obelisco foi fixado próximo ao Cais Tavares de Lira, no bairro da Ribeira. Talhado em Paris e inaugurado em 1913, durante o segundo governo de Alberto Maranhão (1908-1914), o monumento tinha como função exaltar o nome do ex-governador do estado e uma das lideranças do republicanismo potiguar, Augusto Tavares de Lyra. Nele havia uma efígie em bronze do homenageado, e abaixo dela a inscrição “Avenida Tavares de Lira, administração do Governo Alberto Maranhão, 1908-1914”. (Souza (2008b, p. 292-293).).
No monumento estavam gravadas, sobre a pedra dura, as legendas com as efemérides que os cidadãos natalenses jamais deveriam esquecer: 25 de dezembro de 1599, data da fundação da cidade de Natal; 12 de dezembro de 1633, data da retomada pelos portugueses do Forte dos Reis Magos, antes sob domínio holandês; 7 de setembro de 1822, data da Independência do Brasil; e 15 de novembro de 1889, data da Proclamação da República no país. As efemérides chamavam atenção para os marcos históricos de fundação da cidade – o momento em que teve sua autonomia restaurada, sua ligação com as lutas mais gerais de independência nacional e de estabelecimento do regime republicano no país. A referência à presença holandesa na capitania do Rio Grande do Norte, por exemplo, atestava a preocupação dos republicanos com a necessidade de vigilância constante sobre as conquistas alcançadas, sob pena de que algum invasor viesse usurpá-las.
O CAIS DA EUROPA
Não se questionava mais a centralidade de Natal em relação ao estado do qual era capital. Essa cidade era o exemplo de progresso a ser seguido pelas municipalidades do interior do Rio Grande do Norte. A gestão de Omar O’Grady transformara Natal que, agora, podia sonhar com um destino maior. Sua natureza privilegiada e o desenvolvimento material pelo qual passava levavam a cidade a ser, potencialmente, um símbolo de progresso e centro de atividades do Nordeste. E como não há limites para o sonho, por que não pensar a cidade como o cais da Europa?
Em 21 de dezembro de 1922, o “Sampaio Correia”, proveniente de Nova York e pilotado pelo brasileiro Euclides Pinto Martins e pelo americano Walter Hinton amerissaram no Potengi. Os pilotos entraram na cidade pelo cais da Tavares de Lyra. (VIVEIROS, 2008: 65-66).
A expressão teria sido proferida, primeiramente, pelo ministro Victor Konder, que ressaltara a posição estratégica da cidade, na esquina do continente, como fator importante para o seu desenvolvimento comercial. Ela foi usada em uma época em que Natal começava a se destacar como um importante campo de aviação, como afirma O’Grady nos relatórios municipais relativos aos anos de 1927 e 1928, destacando que a cidade caminhava para se tornar “um grande centro de aviação mundial” (INTENDENCIA Municipal. RELATORIO… 1928, p 15.). Para um jornalista d’A Republica, a capital potiguar vinha tendo “uma decisiva projecção na vida do Nordeste, quiçá do Brasil inteiro” (A REPUBLICA, Natal, 07 nov. 1928.) e logo elevaria o nome do Rio Grande do Norte para toda a nação.
O fato de as aeronaves não conseguirem percorrer grandes distância sem escalas, fazia de Natal uma parada estratégica nas rotas sul-americanas que seguiam rumo a Europa, razão pela qual o ministro da aviação apelidara Natal de “cais da Europa.” (AVIAÇÃO commercial no estado. Cigarra, Natal, ano 2, n. 3, p. 35, abr. 1929.).
Dentre os novos espaços que passaram a ser ocupados, estava o mar e o ar (onde se exibiam orgulhosos os pilotos formados pela escola de aviação do Aero-Club), sem mencionar o rio Potengi, onde se davam as regatas, competições esportivas que se transformavam em verdadeiras festas, contagiando uma multidão de torcedores apertados à beira do cais Tavares de Lyra, ou em lanchas particulares.
O investimento em estrutura urbana na capital surgiu de um esforço modernizador do prefeito Omar O’Grady (1924-1930) e dos governadores José Augusto de Medeiros (1924-1928) e Juvenal Lamartine de Faria (1928-1930), em uma busca por transformar a cidade no “Cais da Europa” (ARRAIS, 2012), já que recepção de fluxo de aviação (VIVEIROS, 2008) e navios, se tornava mais constante e projetava o desejo de expansão e visibilidade da cidade.
A efervescência desse momento se revela, inclusive no forte interesse que a elite político-administrativa e intelectual local tinha na modernização da cidade, na visão da qual ela estava destinada a ser o “cais da Europa” (DANTAS, 2003).
O Cais e a Avenida Tavares de Lyra (ou Lira) é mais um sintoma da importância crescente do bairro da Ribeira, a nova centralidade de Natal, citada anteriormente. Sua menção aqui tem a ver com o fato de ela permitir a proximidade dos moradores da cidade ao Rio Potengi e de ter sido porta de entrada da cidade de visitantes antes mesmo de pousarem os primeiros hidroaviões. Antigo cais Pedro de Barro, depois chamado, na década de 1910, de Cais Tavares de Lyra (SIMONINI, 2010: 88), esse cais e avenida foram objeto de várias intervenções, como as empreendidas pelos governadores Joaquim Ferreira Chaves em 1917 (MENSAGEM…1917: 27) e José Augusto Bezerra de Medeiros, dez anos depois (MENSAGEM…1927: 132). Eram obras de “embelezamento” ou “aformoseamento”, típicas de um período em que o desejo de modernização atingia de cheio a cidade e o bairro da Ribeira em particular, então em plena efervescência. Joaquim Ferreira Chaves, por exemplo, afirma em sua mensagem ter feito a “(…) reconstrução do cais ‘Tavares de Lira’ e arborização da avenida do mesmo nome”. A avenida, cujo cais sobre o Potengi – por onde chegavam os viajantes, primeiramente de barco e depois também, ainda que provavelmente menos frequentemente, também por hidroaviões – se tornaria um centro de sociabilidade da elite natalense até a Segunda Guerra Mundial
Vários locais ao longo do Rio Potengi serviram de pontos de desembarque dos aviadores que chegaram a Natal. Paulo Viveiros, que repertoriou dezenas de pousos tanto no aeródromo de Parnamirim quanto no Rio Potengi, provenientes de várias partes do mundo entre 1922 e 1939, identificou, para alguns desses voos, pontos de desembarque no rio, sempre na margem direita, do lado da cidade: Praia da Montagem, depois Rampa, o Cais da Tavares de Lyra, a Pedra do Rosário, e a Hidrobase da Compagnie Générale Aéropostale, francesa, (VIVEIROS, 2008: 63-192), depois da Air France, no Refoles, em 1939.
COLUNA CAPITOLINA
Esta coluna foi presenteada à cidade pelo então líder fascista italiano, Benito Mussolini para comemorar o vôo Roma/Natal, realizado em 1928, com a travessia do Atlântico sem escalas, pelos aviadores Arturo Ferrarin e Carlo Del Prete. O monumento é uma coluna extraída das ruínas do templo sagrado de Júpiter, cuja localização fica no Monte Capitólio, em Roma. Daí a sua tradicional denominação (NESI, 1994).
Inicialmente, a coluna foi instalada na esplanada do Cais do Porto, no bairro Ribeira. Segundo Nesi (1994, p.97), “a solene inauguração do monumento ocorreu no dia 8 de janeiro de 1931, na presença do general Ítalo Balbo, Ministro da Aeronáutica” da Itália.
Em 1935, com o levante comunista em Natal, o monumento foi ojerizado como símbolo do fascismo. Posteriormente, a Coluna foi chantada na Praça João Tibúrcio. Tempos depois, foi transferida para a Praça Carlos Gomes, no Baldo e, atualmente, encontra-se no Largo Vicente Lemos, em frente ao Instituto Histórico e Geográfico, na Cidade Alta. A Coluna Capitolina foi Tombada como Patrimônio Histórico Estadual em 17 de fevereiro de 1990.
De relevante valor artístico e histórico, a Coluna Capitolina foi tombada como Patrimônio Histórico Estadual em 17 de fevereiro de 1990.
CAIS DE LUZ PARA O PROGRESSO
As impressões descritas por Cascudo em suas reminiscências com relação à inovação “scintilante” transfiguraram a cidade; a presença de um holofote jogando luzes a grandes distâncias e em movimento abalou a tranqüilidade da cidade adormecida, construiu uma paisagem distinta, recortada por pontos de luz em movimento que deixou marcas em diversos lugares, revelando os espaços por trás do aspecto sinistro da escuridão. Deslumbramento foi a sensação descrita pelo autor, com o brilho daquela luz:
Foi um delírio de mêdo na cidade, o caes despovoou-se. A multidão correu espavorida, ullulando miséréres, estorcendo-se e pedindo perdão dos peccados, forçando, aos empurrões, puxadellas e hombradas, as portas das egrejas. Em casa o pavor era dominante. Com as velas accezas, as palinhas do ultimo domingo de Ramos, o pessoal da familia e creados ajoelhados, trêmulos, tínhamos o aspecto d’uma cidadella sitiada por uma arraçada mourisca. Só muito depois, quando meu pai regressou, é que nos fez recobrar o juízo e reatar relações cordiaes com o phenomeno. (CASCUDO, Luis da C. Histórias que o tempo leva… São Paulo: Monteiro Lobato & Co., 1924. [Coleção Mossoroense, série C, v. 757, 1991, p. 217 – 226.]).
A experiência rememorada pelo autor revela suas percepções em companhia das inovações técnicas que chegavam à cidade. A incompreensão relacionada àquela novidade encheu a todos de medo, desorientando a população que, assustada, deixou o local às pressas, despovoando o cais. Acendeu-se com as luzes o espetáculo da modernidade, a consciência de um mundo em transformação, a perda das referências para orientar a ação. É interessante notar que no desespero causado pelo evento, a população foi buscar a proteção divina, agarrando-se à segurança das tradições religiosas. Naquele período a vida da cidade era dominada pelos espetáculos lúgubres da religião, tendo o próprio Cascudo realizado muitos estudos sobre as festas religiosas populares (CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1984.).
À maneira dos planos de Jorge de Macedo Viera – profissional influenciado diretamente por Barry Parker à época da City, cujos inúmeros trabalhos a partir de 1920 revelam claramente a sua filiação – para as cidades de colonização do norte paranaense, como Maringá, e do plano de Goiânia, o Master Plan de Palumbo para Natal concebe a área central da cidade de modo clássico, interligada à estação ferroviária a ao hidroporto no rio Potengy.
O relatório de 1926, rico em quadros, tabelas e imagens da cidade, mostra que a cidade começava a ser remodelada por meio de diversas obras. Além da Avenida Atlântica, concluída naquele ano, e da estrada de rodagem que ligava o bairro das Rocas à região central da capital, o Conselho de Intendência investiu em diversas outras ações para aformosear a cidade, melhorar suas vias de comunicação e tornar mais racional seu traçado. Entre elas, estavam a construção do cais de desembarque na Tavares de Lyra, o novo calçamento na Praça Augusto Severo (ver imagem a seguir), a reconstrução da ponte de Guarapes, na estrada de rodagem que ligava a capital à cidade de Macaíba, além da construção de uma galeria para drenagem das águas pluviais na Avenida Junqueira Ayres, sempre
alagada nos períodos de chuvas.
Em 1927, a Intendência continuava a investir maciçamente em obras públicas, planejadas pelo próprio engenheiro presidente. Após a saída do engenheiro Paulo Leopoldo Pereira da Camara, a Diretoria de Obras continuou a cargo de Mathias Marinho, que “provisoriamente” ocupou o posto de Diretor até o final da gestão O’Grady. Nesse ano, as principais ações desenvolvidas pela gestão municipal para melhorar as feições da urbe foram a conclusão do cais de desembarque da Tavares de Lyra, do calçamento da Praça Augusto Severo, o novo calçamento da Junqueira Ayres, a construção de um novo cemitério para a cidade, na povoação de Ponta Negra e a abertura de novas estradas suburbanas.
A clara influência Beaux-Arts – de uma arquiteto formado na Escola de Paris e que, antes de fixar-se no Nordeste, trabalhou com o arquiteto neoclássico Heitor de Mello no Rio de Janeiro – presente no seu plano já estava claramente exposta na sua entrevista ao jornal A República, em fevereiro de 1929: defendia a abertura da cidade para o rio, que tão mal recebia os visitantes que por mar chegavam com suas fachadas feias e um minúsculo cais, propondo uma espécie de grande avenida-parque beira-rio-e-mar que partiria do cais Tavares de Lira, uniria-se ao Boulevard, circunscrevendo a cidade nos seus próprios contornos naturais. A reestruturação do bairro comercial da Ribeira, com retificações, alargamentos e a criação de novas avenidas axiais, revela esta influência de forma precisa.
Nesse contexto, foi elaborado o já citado Plano Geral de Sistematização por meio da Resolução no. 304, de 22 de abril de 1929, de autoria do arquiteto Giacomo Palumbo, pensado para uma cidade com aproximadamente 100 mil habitantes (DANTAS, 1929c, p.01). Esse Plano86, dentre outras ações, previa o zoneamento da cidade em “(…) quarteirões administrativo, commercial, industrial, a cidade recreio [bairro-jardim] e os bairros residencial e operario (…)” (PREFEITURA…, 1981a). Nele, estariam indicadas as localizações da iluminação pública, viação urbana, arborização, passeios, monumentos, abrigos, jardins, praças públicas, feiras, mercados, matadouros, cemitérios, dentre outros estabelecimentos (PREFEITURA de Natal. A Ordem, 27/01/1939, n.1014, p.04.). Previa-se também: uma reforma no Porto de Natal, caracterizada pelo aprofundamento e delimitação do canal, fixação de dunas, construção de um ancoradouro e outro cais; o projeto de um aeroporto; a organização de um horto para auxiliar na arborização das ruas e praças da capital; a mudança da nomenclatura das ruas, competida ao Instituto Histórico e Geográfico; o aumento do número de vias de acesso aos bairros de Cidade Alta e Ribeira; o aproveitamento dos monumentos históricos e belezas naturais da cidade; e a transformação de lagoas em piscinas públicas, como a de Manoel Felipe e a Lagoa Seca. Em todas as intervenções seria empregado o “estilo moderno” (DANTAS, 1998).
Além desse, haveria um bairro jardim de fato, “em moldes semelhantes aos ingleses”, diria a jovem engenheira, que esfarelaria os arruados das Rocas, Areial, Limpa, Canto do Mangue, Chama-maré e outros assentamentos populares na área delimitada pelo rio Potengi e pelo oceano Atlântico. Nesse bairro, chamado por Câmara Cascudo de “Cidade das Dunas” (Cascudo, 1929b.) – uma recriação de apelo mais envolvente ao imaginário local, da mesma forma que o jardim o era para o inglês–, seria “feito o ‘zoning’ moderno, sendo evitada a superlotação e sendo os habitantes convidados a se pronunciarem sobre a administração do seu bairro, fixando o número e a localização de lojas e armazéns. Largas avenidas serão rasgadas, indo terminar no Boulevard de contorno que parte do cais do porto, margina o rio e o Oceano”. (Portinho, 1930.)
Para a concepção do bairro operário citado no Plano de Sistematização, seria necessária a demolição de todas as casas populares existentes junto ao cais, assim como, a transferência de todas as moradias “pobres” situadas na entrada da cidade e das erguidas nos terrenos baldios, para aquele espaço. Um projeto residencial a ser elaborado de acordo com o número de habitantes averiguado nessas localidades após levantamento minucioso (PORTINHO, Carmem Velazcos. Os progressos constantes da aviação. A República, Natal, 16 abr. 1929, n. 85, p.02). No entanto, a ocorrência da Revolução de 1930 e o conseqüente afastamento dos administradores locais contribuíram para que o bairro não fosse implementado.
De acordo com jornal A Republica, ainda notavase alguns lugares da cidade com pouca iluminação, entre os quais foram apontados as praças Augusto Severo e André de Albuquerque, o cais Tavares de Lyra e a frente do Palácio do Governo, mas a maioria das ruas da cidade havia ficado “magnificamente illuminadas” com a nova iluminação (A INAUGURAÇÃO da nova illuminação pública da capital. A Republica, 23 de abril de 1931, p. 1.).
Para a concepção do bairro operário citado no Plano de Sistematização, seria necessária a demolição de todas as casas populares existentes junto ao cais, assim como, a transferência de todas as moradias “pobres” situadas na entrada da cidade e das erguidas nos terrenos baldios, para aquele espaço. As famílias receberiam os respectivos lotes e uma indenização referente ao seu deslocamento.
O CAIS DO SERTÃO
Olavo Medeiros Filho, em Terra Natalense, ainda faz referencia a Estevão Velho de Moura. Segundo o insigne historiador, documentos de doação de terras datados do século XVII, indicavam o domínio de terras do senhor Estevão de Moura, abrangendo parte dos atuais bairros de Bom Pastor, Quintas e Alecrim. Na primeira década do século XX, o bairro foi denominado “Cais do Sertão”, em razão dos imigrantes que vinham do interior e acampavam naquela área; E finalmente, passou a se chamar Alecrim, através do Decreto da Intendência Municipal de Natal, datado de 23 de outubro de 1911 e oficializado em 30 de setembro de 1947, na administração do Prefeito Silvio Piza Pedroza. A marcha demográfica foi se estendendo em direção as áreas afastadas dos bairros centrais, até serem, totalmente, incorporadas aos limites urbanos da capital Potiguar.
Logo recebeu a alcunha de “cais do sertão” por ser via de entrada dos imigrantes que vinham do interior do Rio Grande do Norte e, de outros estados, oprimidos pelas secas e atraídos pelas melhores condições de vida que a cidade ofereceria. Quando estes chegavam a Natal, o Alecrim era uma opção de abrigo.
No local onde hoje está a praça Gentil Ferreira existia uma ampla mangueira, nos limites da estrada que levava a São José, plantada por um senhor conhecido por nome de Manoel Lourenço. Nesse local, tempos depois, os carros de praça, carros fretados, “mistos” carregados de pessoas e objetos, e até mesmo as “marinetes” tinham seu ponto de apoio. Os que vinham do interior, em direção ao “cais do sertão” que era o Alecrim, faziam sua primeira parada em Natal na mangueira, que era como que um terminal, uma rodoviária improvisada, quase uma “parada obrigatória”.
ANTIGA BASE DE HIDROAVIÕES (A RAMPA)
Localizada à margem direita do Rio Potengi, a Antiga Base de Hidroavião conhecida como A Rampa, é um lugar repleto de significados históricos. Local de chegada dos aviões da Panair do Brasil, na década de 30 do século passado. Exerceu, também, importante papel durante a Segunda Guerra Mundial, servindo de base para os aviões de patrulha da Marinha Americana (NESI, 1994).
Os norte-americanos, para abrigar os grandes 24 PBY, de 36 horas de vôo autônomo, criaram uma base fluvial no Potengi, utilizando o local ocupado pelo Sindicado Condor. Transformaram o ambiente, fazendo surgir casas, estaleiros, cais de atração e subida para os aviões anfíbios, armazéns, hospitais, cassinos, com higiene, claridade, fartura de alegria e de entusiasmo. Era a Rampa da Limpa, […].
A antiga base de hidroaviões, a Rampa foi edificada em 1944. Lugar de memória, faz parte do Patrimônio Histórico Estadual, desde 17/02/1990, quando ocorreu seu Tombamento.
SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
Revelando suas ansiedades e preocupações com a segurança da cidade, uma vez que considerava, a ameaça de um ataque desde os primeiros momento de guerra. Em parte, suas intranqüilidades foram amenizadas em 14 de outubro com a chegada ao Cais do Porto de Natal do 31º Batalhão de Caçadores (CHEGOU…,1939). CHEGOU ontem a Natal o 31º Batalhão de Caçadores: valorosa unidade do Exército compõe-se de cerca de 600 homens, obedecendo ao Comando do Tenente Coronel Creso de Barros Monteiro. Milhares de pessoas afluíram ao cais para receber os bravos soldados – os cumprimentos do interventor e das altas autoridades. Somente hoje pela manhã desembarcará a disciplinada tropa. A República, Natal, 15 out. 1939.
As Crônicas escritas por Danilo entre os anos de 1940 e 1943, quando as Forças Armadas chegavam e começavam a se instalar em Natal, especialmente as que trataram de aspectos que diziam respeito ao espaço da Cidade, que falaram dos bairros, que observaram ou detalharam as transformações percebidas, as mais visíveis ou consideradas importantes pelo autor, tanto que se deteve e discorreu sobre elas. na Crônica “Mais um Hotel na Cidade” (14/06/1941), quando observou o seu despertar para o crescimento, que viveu nos anos imediatamente posteriores, quando a demanda por hospedagem “de qualidade” cresceu e vários comerciantes adaptavam seus edifícios, para que funcionassem como locais de hospedagem. Neste caso, destacou a adaptação do “Edifício Varela”, uma edificação de dois andares na Av. Sachet, no bairro da Ribeira, com duas salas amplas térreas para restaurante e 60 quartos, com instalações próprias e próximo ao Cais do Porto.
Cada família deveria aprender os procedimentos de controle de luzes e adotá-los em suas residências ante a presença de algum avião inimigo sobre o espaço aéreo das cidades. O aprendizado era considerado importante, pois dele dependia a visão dos aviões inimigos e, consequentemente, dos seus bombardeios. O Governo se encarregava da iluminação das ruas, edifícios públicos, farol da barra e navios que, por ventura, estivessem atracados no Cais do Porto. Os procedimentos eram divulgados pela imprensa local que, ao mesmo tempo, tentava abrandar o pânico que se instalava entre os moradores da cidade.
A Base Marítima era uma Base Aeronaval, às margens do rio Potengi, que servia de abrigo para os hidroaviões anfíbios (transportes de carga) e os “ clippers” (passageiros), além de coordenar as ações de caça aos submarinos inimigos no litoral. Ao seu redor, no bairro das Rocas, houve uma transformação violenta com a construção de cais, armazéns, casas de diversão noturna e hotéis.
E chegou a partida. Foi uma manhã de tristezas e de lágrimas quando o governo dos Estados Unidos mandou um navio para levar os corpos aqui sepultados de volta para a sua pátria. Foram mais de 50 ataúdes, cobertos com a bandeira nacional e embarcados no cais do porto, num ambiente de tristeza para as namoradas, os amigos e o povo em geral que durante toda a ocupação pacífica de Natal, tinha aprendido a conviver com a tropa aliada e passado, na sua quase totalidade, a estimá-los. Toda Natal, num gesto de alta significação para o moral da guerra, estava ali se despedindo de seus amigos do norte. Felizmente, o impacto não foi total pois, o resto da tropa foi saindo paulatinamente. E a cidade também se transformou. Aquele barulho esfusiante desapareceu. Voltamos aos nossos costumes do passado, é verdade, mas toda nossa alma estava mudada. Uma nova mentalidade se inseriu na velha cidade dos Reis Magos, pensando em quantos não mais voltariam a sua pátria de origem.
A necessidade de hotéis e pousadas na cidade devia-se ao movimento gerado pelo Porto. Situado no bairro da Ribeira, teve significativa importância na economia da cidade, durante as décadas de 50, 60,70. Com a frequência desse tipo de transporte pessoal e cargueiro, o comércio e os serviços de apoio a atividade portuária foram se instalando ao redor do Cais, tanto serviços de atendimento ao público em geral como Bares (o atual Bar das Bandeiras, tem seu nome ligado às diversas bandeiras dos países de todo o mundo trazidas ao porto pelos navios), Restaurantes, Pousadas, como também de atendimento a demanda dos navios que atracavam no Porto. Ali estavam os comerciantes de peças para navios, técnicos e etc. Diante da necessidade de transporte dessas cargas para destinos interestaduais e intermunicipais, a Rede Ferroviária Federal se fez presente: a linha férrea chegava até os armazéns do Porto. Obviamente que sua função não era apenas essa, como foi, relatada anteriormente.
CAIS DA REDINHA
No início do século XX, os natalenses começaram a utilizar as casas de praia como locais para descansar no veraneio. Nesse contexto, as praias de Areia Preta, do Meio, da Redinha e de Ponta Negra foram os primeiros trechos da costa potiguar apropriados e transformados em redutos de lazer durante janeiro e fevereiro.
Nas margens da praia da Redinha, existe os restos do que seria o cais em cima de muitas pedras, onde muitos natalenses até hoje nadam próximo as ruínas, em poucos metros do tradicional Mercado Público.
O cais foi construído em torno das décadas de 1920 e 1930, a praia da Redinha começa a se tornar outra opção para a construção de residências secundárias. Reza que o Dr. Francisco Xavier Pereira de Brito, foi possivelmente, o “descobridor” da Redinha, praia onde construiu uma casa de veraneio, cercada de latadas, ambiente em que realizava festas que “duravam cinco dias”. Pela sua distância da cidade, era uma praia mais calma, preferida para a estação de repouso.
O cais foi instalado como uma forma de atravessar a região da Redinha de barco, saindo do Porto de Natal. Na foto acima do título foi guardada no Instituto Histórico e Geográfico (IGHRN) e mostra um pouco como era o monumento.
Hoje um outro tapriche foi instalado próximo, onde ver o encontro do Oceano Atlântico com o Rio Potengi.
Foi o empresário Plínio Saraiva, veranista da Redinha, que instalou um motor de energia elétrica, passando a prover energia a sua casa de veraneio e a mais duas casas, de propriedade do Dr. Mario Lyra e Francisco de Albuquerque. Em 1944, o prefeito de Natal, José Augusto Varela, inaugurou o Mercado Público da Redinha.
De 1959 a 1968, a luz elétrica disponível para algumas casas de veraneio na Redinha era fornecida por um gerador a diesel, obra executada pelo prefeito Djalma Maranhão. A instalação de energia elétrica somente ocorreu em dezembro de 1968, na gestão do então prefeito Agnelo Alves.
A abertura da “Estrada da Redinha”, atual Avenida João Medeiros Filho, começou na gestão do prefeito Dr. Creso Bezerra, em junho de 1952.
A ESTAÇÃO DE PASSAGEIROS DO CAIS
Sabe aquelas lindas obras de melhoramento que seriam feitas em Natal e nunca saíram do papel? pois é, esta é mais uma pra coleção.
Trata-se da Estação de Passageiros do Cais da Av. Tavares de Lira no Porto de Natal.
Segundo o jornal Diário de Natal em 16/04/1974 estava concluído o projeto arquitetônico da Estação de Passageiros que seria construída no cais da avenida Tavares de Lira, na Ribeira, e que seria enviado a Superintendência Municipal de Obras e Viação para a realização do cálculo estrutural e do levantamento de custos para a execução até o final daquele ano.
A prefeitura de Natal já havia iniciado o processo de desapropriação de um velho armazém pertencente a Usina Ilha Bela onde seria construída a estação e uma praça com abrigo ale da recuperação do próprio cais.
De acordo com o citado jornal a futura praça deveria contar com 5 canteiros em formas retangulares e acima do nível da praça que serviriam como bancos. A arborização seria com plantas típicas.A área útil da praça, incluindo os passeios seria aproximadamente de 48 metros de extensão por 18 de largura em pedras portuguesas brancas com desenhos geométricos em co escura.
O projeto do abrigo obedeceria ao estilo de módulos em concreto armado prevendo a instalação de uma cabine para a venda de passagens, além de um serviço de lanche destinado aos usuários e visitantes. A área a ser arborizada seria desde o entorno da avenida Tavares de Lira com a rua Dr. Barata até o cais na margem do rio Potengi.
A construção da estação de passageiros e da praça fazia parte do plano de valorização do rio Potengi incluindo nas obras do Ano Municipal do Turismo.De acordo com o Secretário de Planejamento da Prefeitura de Natal após o projeto da estação de passageiros do cais da Tavares de Lira, a secretaria iniciaria o projeto de recuperação do pequeno cais da Redinha, que estava aquela época em estado de ruína e abandono.
Mesmo sem data oficial, o Secretário de Planejamento acreditava que a execução do plano de valorização do Potengi seria executado até o final daquele ano de 1974 (era muito otimismo numa notícia só) principalmente por representar uma obra que visaria aproveitar as potencialidades turísticas do rio que vinha sendo esquecida pelas administrações municipais (qualquer coincidência com os dias atuais não é mera coincidência).
Se alguém tinha ou tem esperanças de que algum dia essa linda e esplendorosa obras que serviria para contemplar o doce e onírico por do sol do rio Potengi suba e desça e de suas pretensões se esqueça, a mesma ficará somente nos projetos do mundo encantado dos políticos de outrora.
UM CAIS PARA O FUTURO
E vieram as perguntas, Natal é uma cidade com vocação portuária para transporte de cargas? Existe espaço para ampliação do porto, criação de área retro-portuária e rearticulação do porto ao ramal ferroviário através da Rua Chile onde trafegam veículos, caminhões de cargas e pedestres? É lógico transportar toda a produção de frutas que vem principalmente das Regiões Central e Oeste do Estado, bem como a barrilha quando a fábrica estiver concretizada e outros produtos até a Ribeira provocando congestionamentos em nosso já sofrível sistema viário? Ou criaríamos um novo porto junto a estas áreas produtivas onde as mercadorias estariam mais próximas do embarque, diminuindo os custos e transtornos do transporte até o porto em Natal? E por que não adaptarmos nosso porto com um terminal de passageiros ou o transformamos em um porto pesqueiro, liberando o Cais da Avenida Tavares de Lira e margens do Potengi para um projeto que busque a aproximação da Cidade com o Rio, o seu corpo d´água, a sua alma?
Mas as respostas têm sido políticas conflitantes, enquanto a Prefeitura Municipal planeja a reabilitação do bairro fundamentada na preservação e reabilitação do seu parque histórico construído o Governo do Estado apresenta projetos em sentido contrário como o de ampliação do porto e criação do terminal pesqueiro, basta ver ações como a demolição de parte do edifício do antigo frigorífico de Natal perpretada pela CODERN, que poderia ter sido restaurado e adaptado para funcionar como terminal de passageiros integrado ao Largo da Rua Chile com seus estabelecimentos comerciais de turismo e lazer. Ou a imagem assustadora do terminal pesqueiro a ser construído as margens da Rua Chile, abocanhando a margem do Rio em direção a Pedra do Rosário e Cais Tavares de Lira, a “Porta da Cidade”.
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Um artífice mineiro pelo país: formação, trajetória e produção do arquiteto Herculano Ramos em Natal / Débora Youchoubel Pereira de Araújo Luna. – Natal, Rn, 2016.
Um espaço pioneiro de modernidade educacional: Grupo Escolar “Augusto Severo” – Natal/RN (1908-13). Ana Zélia Maria Moreira. – Natal, RN, 2005.