O cotidiano da Cidade de Natal na Segunda Guerra Mundial (1942-1945)

Este trabalho trata de uma circunstância histórica específica: as transformações da Cidade do Natal durante a II Guerra Mundial.

Naquele momento, a cidade era pequena, tanto nas suas dimensões territoriais, como nas populacionais. Em 1940, ocupava uma área menor do que representam os atuais bairros Ribeira, Cidade Alta, Rocas, Petrópolis e Alecrim, , além das povoações do Passo da Pátria, Quintas, Guarapes e as praias da Redinha e Areia Preta, tinha aproximadamente 90 km2 e 50 mil habitantes, além de algumas residências e chácaras, espassadas fora deste limite urbano mais adensado.

O aumento da população foi ocasionado pela chegada de militares, de comerciantes– ávidos para obter lucros com a venda de mercadorias para os americanos – e a vinda de muitos flagelados da seca que assolava o estado do Rio Grande do Norte. Em 1940, a cidade de Natal possuía 54.836 habitantes, atingindo, em 1950, o total de 103.215 moradores. Em 10 anos, o incremento populacional foi de 88,2%

Governava o estado Rafael Fernandes de Gurjão, administrando até 1943, e o prefeito de Natal era o engenheiro Gentil Ferreira de Souza. As principais atividades econômicas do Rio Grande do Norte eram a agricultura (produção de cana-de-açúcar, frutas e algodão), o extrativismo (sal e scheelita) e a pecuária. As casas de exportação desses produtos localizavam-se no bairro da Ribeira e ligavam a capital ao interior. A inserção de Natal na Segunda Guerra Mundial provocou mudanças na sociabilidade da cidade, com a criação de vários bares e a proliferação das casas de meretrício.

Quando a Segunda Guerra Mundial iniciou na Europa, em setembro de 1939, a administração do estado do Rio Grande do Norte estava nas mãos das oligarquias locais, que estavam integradas às instituições componentes do regime ditatorial do presidente brasileiro Getúlio Vargas. O Brasil entrou na guerra mundial após acordo firmado com os Estados Unidos da América. Nesse pacto, o governo americano financiaria a construção da Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda, no Rio de Janeiro, e os Estados Unidos construiriam uma Base Aérea Americana e uma Base Naval na cidade de Natal. O governo brasileiro rompeu relações diplomáticas com Alemanha, Japão e Itália, e declarou seu apoio aos Estados Unidos. Segundo os discursos das elites natalenses nos principais jornais da capital, a escolha da cidade para sediar a base americana ocorreu devido a sua importância estratégica e relação com a aviação mundial.

É provável que tenha sofrido mais impactos com a II Guerra Mundial do que outras cidades brasileiras, dado ter localizadas em seu território as instalações da Força Aérea Norte-Americana, além de diversas Unidades Militares das Forças Armadas Brasileiras, que representou a presença de, aproximadamente, 25 mil soldados que circulavam pela cidade.

No seu cotidiano, a cidade, entre os anos de 1943 e 1945, conviveu com:

  • centenas de aviões a sobrevoar seu espaço aéreo, dia e noite, pousando e decolando de Parnamirim Field (distante 20 Km do centro);
  • um Jornal em Inglês, o Foreign Ferry News, distribuído na Base Americana e com repercussões na Cidade;
  • uma Estação de Rádio Local com programas produzidos nos Estados Unidos, a WSMS;
  • auto-falantes nas praças, para transmitir pela BBC de Londres as últimas notícias da Guerra;
  • uma Base Marítima no rio Potengi, para abrigar os grandes hidroaviões, que bombardearam Tóquio;
  • Salas de Cinemas lotadas e com as exibições do Cinema Holywoodiano, estimulada pela propaganda e pela presença de artistas, que passeavam pelas suas ruas (Humprey Bogart, Marlene Dietrich e Bruce Cabot, por exemplo);
  • milhares de soldados norte-americanos, que frequentavam bares e cabarés, namorando e comprando com dólar, ou promovendo escambo com os enlatados.
  • Foi dessa época também a construção da primeira Fábrica de Coca-Cola da América Latina.

Natal, até então permeada por alguns elementos ainda provincianos, passou a entrar em contato direto e estreito com o cenário internacional. As influências foram significativas na organização dos espaços, nas formas de diversão, na linguagem, na gastronomia, nos hábitos de consumo, entre outros aspectos.

ANTECEDENTES

O que seria este enunciado sobre Natal? O que representou a II Guerra Mundial para essa cidade? Ela estava fincada em uma região estratégica, o extremo do Continente Sul Americano que mais se aproximava fisicamente do Continente Africano, onde, no início dos anos 40, as tropas do Eixo avançavam suas conquistas. Esta peculiar localização parecia não interessar à elite natalense que pouco se preocupou com os diversos Acordos
estabelecidos entre os Estados Unidos da Améerica e o Brasil, entre os Presidentes Roosevelt e Getúlio Vargas, centrados na defesa da Democracia Mundial (Clementino, 1995).

Nada, no entanto, evidenciaria o que justifica a relevância deste acontecimento para a cidade do Natal. Em se tratando do espaço da Cidade, sua importância pode ser vista apenas no seu interior, no qual se realizaram ou não as expectativas criadas na e para a Cidade, na sua vida cotidiana, no emaranhado de acontecimentos que destroçaram seu lento crescimento. Não podemos deixar de ressaltar que, ao longo das primeiras décadas do século XX, este “progresso” sempre foi desejado pelos intelectuais e governantes: o que se consubstanciava nos seus discursos, nos Planos Urbanísticos, nas intervenções realizadas no espaço (Dantas, 1998; Ferreira, 1996; Lima, 2000; Oliveira, 2000).

A instalação dos norte-americanos na Cidade pode ter adquirido um significado de reconhecimento do lugar. Porém, aos norte-americanos interessava não apenas a cidade, mas todo o litoral nordestino, de onde se ressaltava o “saliente do Nordeste”, um triângulo que compreendia as cidades de Natal, do Recife e o arquipélago de Fernando de Noronha, cuja designação no mapeamento dos americanos era o “Trampoline to Victory”. Entretanto, as autoridades militares brasileiras privilegiavam a concentração dos Meios Militares na Região Sul, na fronteira com a Argentina, pois acreditavam que qualquer tentativa de ataque ao Território Nacional só poderia dar-se no extremo sul, destacando-se a compreensão de que o Nordeste pobre e pouco urbanizado apresentava poucas atrações (Clementino, 1995).

A política externa brasileira nos primeiros anos da Segunda Guerra Mundial definiu-se pelo pragmatismo. O governo Vargas negociava vantagens econômicas para o Brasil, assinando acordos comerciais com a Inglaterra, com os Estados Unidos e com a Alemanha. Somente com a entrada dos Estados Unidos na guerra, em 1941, a balança da política externa brasileira começou a pender para o lado dos Aliados. O alinhamento definitivo deu-se em 1942. A participação do Brasil limitou-se, a princípio, à cessão de bases militares no Norte e Nordeste do país e ao fornecimento de matérias-primas. Em reunião entre os presidentes Vargas e Roosevelt, em Natal (RN), foi decidida uma participação mais efetiva do Brasil.

Apesar disso, em 1941, o Governo Brasileiro criou o “Teatro de Operações do Nordeste” em que a Marinha iniciou a construção das Bases Navais e o Exército organizou seus Regimentos de Infantaria e ocupou e fortificou a Ilha de Fernando de Noronha.

PRAÇA PIO X – Localizada no centro da cidade, foi construída entre os anos de 1946 e 1947 pela prefeitura em terreno da Diocese do Natal, no qual existia um abrigo anti-aéreo. Atualmente, está edificada a Catedral Nova. Cartão Postal, da década de 50. Autor da foto: Jaeci Acervo: José Valério.

A LUTA DIPLOMÁTICA PELO CAMPO DE PARNARNAMIRIM

Com a queda da França para a Alemanha na Segunda Guerra, o governo dos Estados Unidos preocupado com o estabelecimento de bases do Eixo em territórios franceses nas Américas, passa a ocupá-los, e como o Brasil era um país soberano aqui não puderam fazê-lo, portanto, em 1941, a alternativa foi um acordo com o governo brasileiro no qual uma empresa americana – Pan Am – através de sua subsidiária Airport Development Program (ADP) ocuparia esses aeroportos com o intuito de desenvolve-los. A obra começa em Parnamirim em julho de 1941, mas na realidade todo o dinheiro empregado pela ADP vinha do governo norte-americano que tinha interesse em ter pistas de pouso na rota da África para exportação de aviões destinados aos ingleses, que já combatiam os italianos e alemães no norte daquele continente desde 1940.

A mesma situação vivida pelos franceses e italianos, entre maio e junho de 1940, “inimigos e vizinhos”, voltou a se repetir quando chegam os americanos em 1941 para desenvolver Parnamirim sob a administração do ADP. Embora não inimigos declarados, na realidade os EUA estavam totalmente do lado inglês contra o Eixo, do qual a Itália fazia parte. No desenrolar, os americanos começam a construir as pistas novas e são regularmente espionados pelos italianos que sobrevoavam a obra para fotografar. Começou o embate diplomático afim da expulsão da LATI pelo governo brasileiro sob o pretexto de espionagem, mas antes disso, em dezembro de 1941, os Estados Unidos entram na guerra e cortam totalmente os suprimentos de combustível dos italianos, agora inimigos declarados que sem alternativa fogem deixando para trás aeronaves, edifícios, enfim tudo.

Tem início então, o que seria a ser Parnamirim Field, a maior base americana fora dos Estados Unidos. Uma vez em guerra não havia mais a necessidade de disfarçar os motivos pelos quais os civis americanos realizavam obras, então começa a chegar os primeiros militares do Air Corps Ferrying Commands (ACFC). O primeiro de todos, o então segundo-tenente Marshall Jamison que no início comandava a si próprio com a missão de dar apoio logístico as tripulações a caminho da África, em janeiro de 1942, ocupando o hangar dos franceses.

Já o hangar da LATI, que estava vago e ainda equipado inclusive com um avião, foi ocupado pelo Exército Brasileiro. Missão: espionar o movimento dos americanos. Essa situação não se estendeu por muito tempo por dois fatores; o primeiro é que todas as instalações existentes (LATI e Air France) com a pista, passaram a ser a Base Aérea de Natal (Bant) criada em março de 1942 e o segundo é que os primeiros prédios da base americana conhecida como Parnamirim Field já haviam sido completados. Vale ressaltar que o Brasil, nesta época, ainda não estava em guerra, contudo, permitiu a operação dos americanos devido ao Tratado de Havana, assinado em julho de 1940.

Tal acordo, previa que qualquer nação do continente americano que fosse atacada por um país não-americano, todas as outras se aliariam contra o atacante. Após 8 de dezembro de 1941, quando os EUA entram oficialmente em guerra, era de se esperar que o Brasil também o fizesse, mas opta em apoiar o americano sem declarar guerra. O fato criou um mal estar com os alemães, que diplomaticamente assim como os Estados Unidos, passaram cobrar uma posição dos brasileiros, quando em janeiro de 1942 o governo do Brasil rompe relações diplomáticas, entretanto, a decretação do estado de guerra viria a ocorrer oito meses depois.

Campo Parnamirim no ano de 1941. Fonte: Arquivos da ALA-10.
Hangar abandonado pelos italianos e já ocupado pelos brasileiros. Foto de Marinho Neto.

OS ALEMÃES ANTES DOS AMERICANOS

Esta história tem início com a chegada da aviação comercial alemã no Brasil, em 1926, quando foram iniciados estudos técnicos para implantação de linhas aéreas na região. Neste mesmo ano, um hidroavião Dornier Wall, chegava ao Rio de Janeiro, realizando o primeiro vôo comercial no país. Diferentemente dos franceses, os alemães, pouco deram atenção à região Nordeste, tanto que a empresa Sindikat Condor, estabeleceu em 1927 linhas aéreas entre Porto Alegre e o Rio de Janeiro e outras linhas para o interior do estado gaúcho, com serviços de transportes de passageiros e cargas.

Apenas em 1930, conduzido pelo diretor Fritz Hammer, o hidroavião “Guanabara” chegava a Natal e este alemão vinha com a missão de instalar uma base de hidroaviões na cidade. O então governador Juvenal Lamartine apoiou incondicionalmente o projeto, isentou de taxas a empresa e apoiou a instalação de uma base próxima à foz do rio Potengi, na conhecida Praia da Limpa (Montagem). Em fevereiro de 1930 é inaugurada a linha entre Natal e Porto Alegre, em Março deste mesmo ano tem início os planejamentos para uma ligação entre a América do Sul e a Europa.

Em 3 de fevereiro de 1934, a Deutsche Lufthansa implanta o primeiro serviço aéreo transoceânico do Mundo, onde em dois dias e meio, um passageiro viajava entre Berlin e o Rio de Janeiro, um avanço espantoso para a época. O defeito deste sistema estava no fato dos aviões necessitarem amerissar no meio do Oceano Atlântico, ser o hidroavião içado por um navio-catapulta, abastecerem e serem catapultados em direção a Natal. Algum tempo depois este sistema foi desativado com a entrada de novos aviões. A atuação dos alemães crescia fortemente na região, chegando a ponto de, em 1936, estarem transportando quase 16.000 pessoas. Sobre este dado é importante lembrar que a capacidade de transportes de muitos aviões neste período, não era superior a 20 passageiros.

Em Natal os vôos da Condor eram semanais, com o fechamento da mala postal às dezoito horas da quarta-feira e a partida na quinta, sempre às cinco da manhã. A empresa prometia que o passageiro estaria no Rio de Janeiro em um dia e em Buenos Aires em dois dias. Já o serviço transatlântico era uma operação conjunta Condor-Lufthansa, com saídas ás dezoito horas da quinta-feira e chegada em quatro dias a Europa, com escalas em Bathust (na atual Gâmbia), Las Palmas (Ilhas Canárias), Sevilha, Barcelona (Espanha) e Frankfurt (Alemanha). Muitas vezes os horários e dias de partida mudavam, onde a propaganda nos jornais locais sempre solicitava aos interessados, entrar em contato com o agente das empresas na cidade, que em 1935, tinha esta função exercida pela firma Filgueira & Cia.

Em 1939, os alemães implantaram no serviço de transporte transatlântico o avião que provou ser o mais confortável, o mais silencioso e o mais caro do mundo na sua época, o quadrimotor Focker Wulf 200. Transportava 4 tripulantes, 28 passageiros e era considerado um fantástico salto de qualidade em termos de viagens aéreas. Para efeito de comparação seria como Natal, nos dias de hoje, fosse rota normal para o novo super-avião Airbus 380.

Em 2 de janeiro de 1939, o piloto Ernst Wilhelm Modrow, de 30 anos, natural de Stettin (atualmente Szczecin, na Polônia), recebia a sua autorizarão de viagem para Natal. Provavelmente este não era o primeiro pedido de ingresso de Modrow em Natal, pois desde 1930, ele já trabalhava na América do Sul, primeiramente na empresa aérea colombiana SCADTA, uma empresa de aviação com controle alemão e a partir de 1937, como responsável pelas rotas turísticas da Lufthansa.

Seu trabalho na América do Sul durou até agosto de 1939. Neste período, a aviação se profissionalizava cada vez mais. Em Natal o movimento de aviões seguindo para o sul do país, ou em direção a Europa, fazia parte do dia a dia, bem como a presença de pilotos e equipes de apoio na cidade. Muitos deles aproveitavam as benesses da cidade, principalmente às praias de águas quentes.

Lendo os jornais da época, percebe-se que os aviadores alemães, talvez pela sua própria natureza mais comedida, não interagiam tão fortemente com a população. Diferentemente dos franceses e italianos, os germânicos ficavam alojados na sua base na Praia da Limpa, mais distantes da convivência direta com a cidade.

Em relação a Modrow, poucas foram às informações sobre a estada deste piloto em Natal. Era apenas mais um, dos muitos pilotos estrangeiros de passagem pela cidade. A partir de setembro de 1939, com a eclosão da guerra, Modrow é convocado para a Força Aérea Alemã (Luftwaffe). Entra no serviço de transporte de tropas, suprimentos e material bélico na Noruega, Itália e norte da África.

Devido as suas habilidades, em 1943 é transferido para um grupo de caça noturna, que tinha a função de destruir bombardeiros ingleses que atacavam diretamente o coração da Alemanha. Ao ás Modrow foi creditado 34 vitórias, em 259 missões, incluindo 109 missões como piloto de caça noturno. Na década de 1950, com a reconstrução das Forças Armadas Alemãs, Modrow juntou-se à Bundesluftwaffe, a nova Força Aérea Alemã, onde permaneceu até sua aposentadoria em 1964, quando passou para a reserva no posto de tenente-coronel. Ernst-Wilhelm Modrow faleceu de causas naturais na cidade portuária de Kiel (Alemanha) aos 82 anos de idade, em 10 de setembro de 1990.

Um dos modelos de aviões pilotados por Modrow sendo posicionado no Rio Potengi. Ao fundo a Praia da Redinha.
Foto da ficha de entrada de Modrow em território brasileiro.

OS EVENTOS E A OMISSÃO DA IMPRENSA

As informações publicadas pelo Jornal A República sobre as operações militares na Cidade do Natal são marcadas pela omissão. Poucas dizem respeito ao que acontecia à cidade e à população. Porém, as notícias dão cobertura às visitas oficiais e militares e, a partir de 1942, passam a se referir às sucessivas festas que passam a ocorrer com muita frequência.

O conhecimento da notícia de que o Governo de Getúlio Vargas havia declarado o país em Estado Nacional de Guerra, em 1º de setembro de 1942, se fez acompanhar em Natal pelas comemorações da Semana da Pátria e de uma grande manifestação de apoio a estado decisão. As festividades públicas contaram com a participação de “todas as entidades esportivas e estabelecimentos de ensino da capital” (AS GRANDES comemorações da semana da Pátria nesta capital: a parada da mocidade e da raça – tomarão parte todas as organizações esportivas e educandários da cidade – as festas do dia 7 – hora da independência. A República, Natal, p. 1, 1 set. 1942, p.1).

AS GRANDES comemorações da semana da Pátria nesta capital: a parada da mocidade e da raça – tomarão parte todas as organizações esportivas e educandários da cidade – as festas do dia 7 – hora da independência. A República, Natal, 1 set. 1942. Foi montado um palanque na Praça Pedro Velho, onde se realizaram solenidades durante uma semana, com discursos e cortejos e desfiles escolares e militares. Autoridades civis e militares se revezavam a cada dia, manifestando-se nos microfones e assistindo aos desfiles.

Nos primeiros dias do mês de setembro daquele ano, o Comando da Brigada de Infantaria de Natal comunicou, em nota oficial, que a população da
cidade passaria a conviver com o escurecimento “de várias ruas e praças, cuja iluminação seria altamente prejudicial à organização da defesa da cidade” (GUARNIÇÃO de Natal: nota do Comando da 2ª Brigada de Infantaria. A República, Natal, 3 set. 1942, p.1). Especificamente nestas áreas, as residências deveriam evitar a saída de luz para o exterior, assim como os automóveis que por elas transitassem deveriam apagar os faróis. Sem maiores explicações, a nota da Guarnição de Natal informava que o cumprimento ficaria sobre a vigilância da Polícia Civil e a desobediência a esta determinação seria punida com a detenção dos infratores. Percebe-se que algo acontecia na cidade, cuja segurança exigia existência de algumas zonas especiais onde as Forças Armadas operavam de maneira sigilosa.

A varredura das páginas dos exemplares do Jornal A República a partir deste momento até meados de 1943, encontrou poucas informações que, além disso, eram superficiais e não esclarecia o que estava ocorrendo na Cidade do Natal. Poucas referências sobre a Base Aérea Brasileira e a Base Naval de Natal, porém um permanente acompanhamento das obras do Quartel do Exército, localizado no bairro Tirol. Além deste equipamento, a Maternidade de Natal foi transformada em Hospital Militar, o qual estava de prontidão com todas as condições para oferecer em caso de alguma eventualidade.

Escola Januário Cicco. Projeto considerado grandioso, sua construção teve
início em 1932. Durante a Segunda Guerra, funcionou como Hospital Militar. Em 12 de fevereiro de 1950, a Maternidade é entregue ao povo natalense e em 1º de março, recebeu o nome de Januário Cicco.
A Maternidade Januário Cicco foi transformada em hospital militar.
O Hospital de Caridade Juvino Barreto (hoje, Onofre Lopes) foi ampliado e reequipado.

Outras referências às atividades das Forças Armadas ou sobre suas instalações militares na cidade eram escassas e se restringiam às solenidades,
almoços e recepções de autoridades, especialmente no Campo de Parnamirim, que continuava sendo nomeado dessa forma e onde, sabe-se atualmente, já estava instalada e em funcionamento a Base Aérea dos Estados Unidos. No período de novembro de 1942 a abril de 1943, estiveram em Natal os Generais José Pessoa, Diretor da Arma de Cavalaria do Exército; Fiúza de Castro, Comandante da Artilharia Regional da 7ª
Região Militar; Newton Cavalcanti, Comandante da 7ª Região Militar e Presidente da Comissão de Coordenação da Produção Agrícola; e o Marcondes Filho, Ministro do Trabalho, da Justiça e Negócios Internos.

Outros eventos foram noticiados e envolveram a população da cidade. Estes ocorriam, em geral, na Base Naval de Natal, no Alecrim e contavam com grande participação da população mais pobre da cidade. Ao longo desse período, verificou-se a cobertura a várias comemorações, como a festa de criação da 3ª Companhia Regional de Fuzileiros Navais (formada na totalidade por norte-riograndenses), em novembro de 1942 (TERCEIRA Cia. Regional de Fuzileiros Navais: a solenidade de hoje de juramento a bandeira. A República, Natal, 28 nov. 1942); o Dia do Reservista, em dezembro de 1942 (FRANÇA. Aderbal. Na base naval. A República, 18 dez. 1942m.); o aniversário da Batalha Naval do Riachuelo e o dia do Marinheiro, respectivamente em junho e dezembro de 1944 (TRANSCORRE amanhã o Dia do marinheiro: homenagens serão promovidas nesta cidade, pela Base Naval – Missa na Catedral às 7,30 horas e visitação pública à Base – Outras notas. A República, Natal, 10 jun. 1944). Enquanto isso, no outro lado da cidade, no bairro do Tirol, na estrada de Parnamirim e na Base de Parnamirim, as festividades eram frequentes e envolviam apenas as elites locais e, sobre estas, o jornal apresentava muito menos detalhes ou informações.

Por fim, observou-se também que as notas que informavam sobre estes acontecimentos, em geral, eram pequenas e antecediam aos eventos. Nelas, eram descritos o programa e as atividades previstas, porém depois do acontecido nada mais era divulgado.

CONTROLE DA INFORMAÇÃO

As fontes de informação que expressam o cotidiana em Natal deste período faziam parte de forma essencial do controle exercido pelo DIP a nível
nacional, como já foi colocado aqui em Brasil (1939) e pelo Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda (DEIP) a nível estadual, que antes era intitulado Imprensa Oficial, sendo o DEIP criado ao dia 28 de junho de 1941, praticamente seis meses depois que o órgão oficial e maior já exercia seu papel nacionalmente.

Entende-se como era a estrutura desejada para que fosse possível fazer o controle da informação dentro do Rio Grande do Norte. Com essa intenção de ser possível censurar e silenciar o rádio, imprensa, propaganda e publicidade, já que mais efetivamente esses são canais de informação cotidiana, por outro lado, ser responsável no estado pelas festividades e turismo para difusão nacionalista do Estado Novo.

Analisar sobre isso, requer uma consciência sobre a população da cidade de Natal, a escolaridade/alfabetização é fator preponderante para o entendimento e o acesso a determinados tipos de informação, principalmente quando se trata do meio imprenso, já que a leitura faz parte da experiência do acesso à informação em determinados tipos de dispositivos, principalmente impressos, onde as marcas textuais se relacionam com a construção de sentido do texto.

Em 1920, o censo escolar havia revelado que 81% dos 547.000 habitantes do estado eram analfabetos. Na década de 1930, o índice continua praticamente inalterado. Em 1933, por exemplo, por ocasião da Assembleia Constituinte, a população do estado era de 764.571 habitantes, sendo que apenas 18.959 puderam se inscrever para votar. Em 1934, menos de 2% dos 22.000 jovens em idade escolar tinha acesso à escola. No censo de 1940, o índice de analfabetismo continua praticamente o mesmo (80% da população), e algo em torno de 90% das crianças em idade escolar continuavam não tendo acesso à escola […]. (COSTA, 2015, p. 87).

A primeira rádio do estado é fundada em 1941, a Rádio Educadora de Natal – REN. Esse empreendimento foi subsidiado por Carlos Lama e Caros Farache, fruto que partiu da Casa Carlos Lemos, comércio que vendia entre outras mercadorias, aparelhos RCV Victos e Vitrolas, onde durante o fim de 1930 e começo dos anos 1940, criou um processo adaptativo da população com o rádio, fazendo demonstrações dos rádios em locais públicos como a sorveteria que servia de ponto de encontro no centro da cidade e na praça Pedro Velho ponto de concentração da parte nova e moderna da cidade, como já citado aqui.

Pode-se perceber a possibilidade do natalense ao acesso à informação no decorrer das ondas sonoras, que foi um veículo de comunicação cotidiana que durante a guerra, além das notícias sobre os acontecimentos, era responsável pela difusão dos ideais norte-americanos, levando em consideração as configurações de “boa vizinhança” que era assumida principalmente depois da declaração de guerra do Brasil ao eixo. Além disso, o uso do rádio era registrado, havia um controle de sua operacionalização, como mostrou o jornal A República, no dia 28 de Março de 1943,
que anunciava prazo até 1º de Abril para renovar o registro e evitar que fossem apreendidos.

Os jornais serviam como modo de demostrar nuances escolhidas no cotidiano da cidade, podemos situar três jornais de maior circulação, impacto e propaganda política, o A República (1889), O Diário (1939) e A Ordem (1935) – esse também responsável pela disseminação de informações de cunho religioso, os interesses desses são a projeção dos interesses, para além de difundir informação e ideias, o próprio capital econômico e os benefícios de manutenção social.

Com o notável desenvolvimento das comunicações, a cidade saiu cada vez mais do isolamento, o Diário, surgiu em 1939, fundado por Rui Paiva e Rivaldo Pinheiro, com função de noticiar a guerra, era redigido, composto e impresso nas instalações do A República. Foi vendido ao Rui Moreira e em 1945, período depois passou a fazer parte aos Diários Associados virando em 1947 o Diário de Natal, assim como a Rádio Educadora (MELO, 2015; SMITH JR, 1992; AVELINE, 2006).

Com uma maior consolidação da base norte-americana, um jornal o Foreign Ferry News, começou a circular em língua inglesa com informações relativas e importantes a vivência dos soldados norte-americanos naquele espaço, segundo Pedreira (2012) com funcionamento entre maio de 1943 a maio de 1945, Melo (2015, p. 45) traz a fala de Waldemar Araújo – conhecido como Waldemar Praeiro, ex-secretário do A República: “Esse jornal era composto e impresso lá na República mesmo. Os americanos traziam as matérias e nós fazíamos as composições nos linotipos, a paginação, a revisão e a impressão.”.

Nenhuma dessas fontes estava imune ao controle do Estado Novo, em 1943 um setor de censura foi designado para a base em Parnamirim, é Natal já havia um serviço desse, que se limitava a comunicação Brasil, com as informações internacionais submetidas a Recife ou Rio para aprovação. As comunicações telegráficas que chegavam para a imprensa era subordinadas à prévia aprovação de Edilson Varela, diretor da parte de Serviços da Imprensa e Propaganda locais e também diretor do jornal A República, só por conseguinte era feito a divulgação (SMITH JR, 1992).

Havia ainda a censura a telegramas, aqueles que eram para circulação dentro do Brasil eram censurados durante o dia por Mario Melo, já à noite, por funcionários encarregados da Companhia Nacional de Telégrafos. A Western Union – empresa americana que oferecia serviço de telégrafos – só enviava seus telegramas com prévia censura e aprovação dos mesmos (SMITH JR, 1992).

Diretor do DEIP e Jornal A República em entrevista no Rio de Janeiro ao Jornal A Manhã. Fonte: Jornal A Manhã

A CIDADE TRANSFORMADA NUMA PRAÇA DE GUERRA

A Cidade do Natal era considerada pelo Jornal A República como a “principal trincheira do Atlântico”, por se encontrar numa encruzilhada entre os dois mundos e, por isso era preparada diariamente para guerrear ou para enfrentar qualquer eventualidade ou surpresa.

Apesar disso, a cidade continuava desprotegida e, nesse sentido, percebe-se um ressentimento nas palavras escritas pelas elites locais. Estas esperavam que o Governo tivesse agido com maior presteza, ou não tivesse medido esforços para proteger e aparelhar a cidade da melhor maneira possível ou ainda, que lhes tivesse dado condições para enfrentar aquela situação (NATAL e a realidade da guerra: palpitante entrevista com o General Gustavo Cordeiro de Faria – Educados na verdadeira da guerra – O triângulo da defesa do importante porto, grande trincheira do Atlântico sul. DIÁRIO DA NOITE apud A República, Natal, 17 nov. 1942.). Além das improvisações, restava a expressão do medo e da apreensão entre ricos e pobres, que procuravam alento diante do inexplicável.

Encerrando as últimas preces, seguindo os últimos cânticos, que elevam o espírito sobre os mistérios da vida, surgiu o fervor da hora presente, de apreensões e sacrifícios; da hora que chama todos os brasileiros; o hino nacional, envolto na sonoridade mística da igreja, unindo o homem à Deus e à Pátria. Ele reteve no fim da missa, numa genuflexão, que era surpresa e orgulho, todos os devotos, que tinham na alma a doçura da liturgia e sentiam, também, o segredo do amor à terra e à família (FRANÇA. Aderbal. A missa. A República, Natal, 4 nov. 1942l, p.7).

Indistintamente, os moradores da cidade podiam depositar suas esperanças na fé, talvez creditando a esta a solução para impedir que sofressem com as batalhas, ou aliando-se aos militares estadunidenses.

Diante do pânico que se instalou, os comandantes brasileiros tentavam garantir aos moradores a tranqüilidade para que acreditassem que, apesar de tudo, estavam seguros e esclarecidos da gravidade e, principalmente, que saberiam como agir diante de algum imprevisto. Os militares davam sinais de que estavam cientes de suas responsabilidades e conclamavam a todos para que se tornassem partícipes e contribuíssem para transformar a cidade numa “autêntica praça de guerra”. O sucesso só se tornaria possível com a colaboração dos moradores, além do apoio dos poderes civis e militares.

O ambiente inaugurado em Natal é o da guerra vista em todas as suas brutalidades; da guerra tal qual ela é, com todo o seu rosário de cruezas, desesperos e atrocidades. Como chegar-se a esse ponto? Eis o que me competiria provar. Experimentei os meus homens em inúmeras provas. A satisfação foi completa. A mentalidade do momento perigoso em que vivemos, sem chegar, é lógico, aos extremos, é a de que estamos, em realidade, dentro da guerra (NATAL e a realidade da guerra: palpitante entrevista com o General Gustavo Cordeiro de Faria – Educados na verdadeira da guerra – O triângulo da defesa do importante porto, grande trincheira do Atlântico sul. DIÁRIO DA NOITE apud A República, Natal: 17 nov. 1942, p.9).

A cidade estava, literalmente, na guerra. Aos moradores restava acreditar que, mesmo sem abrigos, estavam protegidos por modernos equipamentos de prevenção contra ataques aéreos e pelos treinamentos diários a que eram submetidos. Para as elites, Natal transformou-se definitivamente na “porta do Brasil”, onde se armaram “os trampolins da vitória transatlântica” (AS PORTAS do Brasil, JORNAL O GLOBO apud A República. Natal, 4 dez. 1942, p.1) e, a partir dela, seria impulsionado o reforço que as forças aliadas estavam necessitando no outro lado do oceano.

De acordo com Itamar de Souza, entre 1938 e 1946, Câmara Cascudo ainda exerceu um cargo burocrático no Tribunal de Apelação do Estado do Rio Grande do Norte. E, segundo Nestor Lima, durante a participação da cidade do Natal na Segunda Guerra Mundial (1942-1945), Cascudo também foi chefe da Defesa Aérea Civil. Cf. SOUZA, Itamar de. Câmara Cascudo: vida & obra. Diário de Natal, Natal, 30 dez. 1998. v. 3. p. 46. LIMA, Nestor. Esboço biográfico. LUIZ da Câmara Cascudo: depoimentos. Homenagem dos seus amigos. Natal: Centro de Imprensa, 1947. p. 6.

A essa altura, as elites locais já haviam incorporado os discursos dos militares e disseminava-os e representava-os nas palavras escritas no Jornal A
República. Sem dúvidas, o ano de 1942 foi o mais difícil, “um ano de terríveis provações”, quando a população de Natal se viu diante de uma “situação de uma guerra cruel” e esperando enfrentar “inimigos que a cada dia atesta[va]m sua inaudita covardia” (FILGUEIRA FILHO. Quarenta e três. A República, Natal, 1 jan. 1943, p.7). Por outro lado, também foi o ano em que sua importância para o cenário de guerra mundial foi reconhecida, pois sua existência como uma base militar estadunidense deixou de ser segredo. Segundo o Jornal A República (PORTA do mundo futuro. A República, Natal, 9 jan. 1943a.), a imprensa estadunidense se referia à Natal como uma cidade que deveria ser observada, que representava mais do que um país e que o Continente Americano estava dependendo de sua defesa. De repente, esta parecia representar internacionalmente mais do que seus próprios moradores podiam saber a respeito dela.

Porém, o ano de 1942 chegou ao fim e a contra-ofensiva aliada já avançava no norte da África. As batalhas retrocediam e os moradores da Cidade do Natal iniciavam mais ano com melhores perspectivas, avaliando que o perigo de ataque não precisava mais ser considerado e que a possibilidade de invasão do território brasileiro era coisa do passado.

foto da visão panorâmica do Rio Potengi foi feita no período da Segunda Guerra mundial, ou em algum ano logo após a este conflito
Natal em 1943 – Área do porto e da Rampa. Quatro dias após o ataque a Pearl Habor e declaração de guerra norte-americana ao eixo, Natal recebe os primeiros aviões da US Navy que se instalam na Rampa.
Vista aérea de Natal.
Forte presença militar em Natal/RN na Segunda Guerra Mundial. Neste vemos o registro do fotógrafo da Revista Time, Hart Preston, em 1941, na Ribeira. Notem que pela ângulo da foto ele fez alguns registros do alto do Grande Hotel. Vemos em destaque a Duque de Caxias e a Tavares de Lira.
Desfile militar durante a Segunda Guerra, em Natal/RN.

O PRIMEIRO AMERICANO EM NATAL

O militar da reserva do Exército dos Estados Unidos, Marshall Jamison, o primeiro militar americano a pisar em solo potiguar, antes mesmo dos norte-americanos entrarem na Segunda Guerra Mundial.

Uma vez no Rio Grande do Norte, ocupando a patente de 2º tenente se tornou “oficial de controle” ou oficial comandante do Army Air Corps Ferry Command (ACFC) – Comando de Transporte do Corpo Aéreo do Exército, em Parnamirim Field. Quando o militar chegou em Parnamirim, observou que o campo de pouso ainda era utilizado pela Panair do Brasil, Linee Aeree Transcontinentali Italiani (Lati) e Air France – embora não voasse mais desde junho de 1940 mantinha uma instalação completa com hangar, avião e funcionário. Sua função era dar assistência logística aos americanos que passavam por Parnamirim em direção ao norte da África. Nessa época, a posição estratégica de Natal mais uma vez foi reconhecida, tendo em vista que a rota mais curta e viável para abastecer as tropas que lutavam no front africano era pelo nordeste brasileiro.

O primeiro contato dele com Natal ocorreu em 17 de dezembro de 1941, o que para ele foi um alívio, pois as ordens originais era de embarcar para Serra Leoa também conhecida como “cemitério de estrangeiros”.

Devido ao seu trabalho de assistências, Marshall ocupou o hangar da Air France onde montou verdadeiros alojamentos militares, sempre observado por militares brasileiros que estavam baseados no hangar da Lati, empresa recém expulsa do Brasil, numa área ainda mantida hoje dentro das instalações da Base Aérea de Natal (Bant). Desempenhando esta função ele permaneceu em Natal até julho de 1942, quando comandava 200 oficiais americanos como capitão do Exército e foi substituído por um coronel aviador.

Após essa estada, ele retorna mais uma vez no ano de 1943, desta vez como oficial meteorologista e piloto do Exército Americano, permanecendo por mais um ano. Depois da guerra, sua admiração por Natal continuou chegando a residir no Brasil por um longo período e desde que se aposentou retornou a passeio por diversas vezes.

Marshall tem uma ligação muito forte com a cidade e se considera “natalense de coração e alma”, por isso retornou diversas vezes pós-guerra ao ponto de se tornar professor da principal instituição de ensino superior federal do Estado. 

Marshall na porta de acesso do prédio que abrigava o Grande Hotel, no bairro da Ribeira, em sua visita a Natal em 2007. Foto de Marinho Neto.
Sentado no que resta da primeira pista de asfalto entre Natal e a Base Aérea, construída pelos americanos em 1942. Foto de Marinho Neto.
Hangar da Lati, o qual viu em funcionamento quando chegou a Parnamirim Field, em 1941.Foto de Marinho Neto.
Marshall, então comandante da Bant, coronel Carlos Eduardo, e demais militares da unidade. Foto de Marinho Neto.

A CHEGADA DOS MILITARES ESTADUNIDENSES A NATAL

As autoridades diplomáticas e militares estadunidenses circulavam pela Cidade do Natal desde 1939. Desde o início do conflito mundial, os Estados Unidos já tinham ciência da importância estratégica da cidade e do Nordeste brasileiro e já demonstravam seu interesse de instalar alguma estrutura militar de suas forças militares nessa região do Brasil.

Para Smith Junior (Bynum E. Weathers. A study of the methods Employed in the Acquisition of Air Bases in Latin America for the Army Air Force in World War II. Dissertation, U. of Denver, 1971 In: SMITH JUNIOR, Clyde. Trampolim para a vitória: os americanos em Natal-RN/Brasil durante a Segunda Guerra Mundial. Natal/UFRN: EDUFRN, 1992, p.23), estes sabiam que “a única solução prática para o problema da defesa seria a construção e melhoramento dos aeroportos” nordestinos. E, entre agosto e novembro de 1940, enviaram uma missão militar formada por técnicos à Cidade do Natal para realizarem um levantamento exaustivo e elaborarem estudos para a construção de uma base aérea e uma estrada entre Parnamirim e Natal.

Levantamentos das Forças Armadas Estadunidenses na Cidade do Natal. Fonte: Smith Junior (1992, p.43 e 47).

Em 1941, chegou o primeiro “olheiro” americano, o Sr. Marshall Jamison que veio, viu e gostou do local, tendo a ocupação de Parnamirim começado com a chegada da primeira Fortaleza Voadora em nossa terra. Nossa base passaria então a ser usada pelas forças do Exército, Marinha e Aeronáutica dos Estados Unidos da América do Norte.

E nasceu logo o grande entendimento entre os dois países. O ministro da guerra, no momento o general Eurico Gaspar Dutra, chegou a se referir a isso pela imprensa do sul do país. Começava assim aquele auxílio mútuo, que iria até o fim do conflito, na maior base militar do mundo, superada em tamanho, só depois, na Ilha de Guam, hoje ocupada pelos Estados Unidos, na guerra contra o Japão.

Desde as primeiras missões estadunidenses à Cidade do Natal que seus integrantes procuraram as autoridades locais e realizaram reuniões secretas, que naturalmente foram omitidas pelo Jornal A República. Para Smith Junior (1992, p.25) , “a população de Natal, evidentemente, sabia o que estava no ar”, pois nas ruas seus soldados e técnicos militares transitavam e se movimentavam sem reservas. É sensato imaginar que os militares estadunidenses não agiriam com tanta desenvoltura caso não estivessem respaldados pelas autoridades locais. O levantamento detalhado foi concluído, os planos e projetos foram elaborados e estes, por fim, deram início às obras físicas que pretendiam e contrataram a mão-deobra local. Seu andamento ocorreu sem sobressaltos, particularmente entre os anos de 1940 e 1942 e, o que se sabe ao final, é que os Estados Unidos construíram em Natal a que foi considerada a sua maior base militar fora do seu território e que esta entrou em operação em 7 de julho de 1941 (SILVA, Josimey Costa da. A palavra sobreposta: imagens contemporâneas da Segunda Guerra Mundial. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 1998), um ano antes do Brasil entrar na Segunda Guerra Mundial.

Neste mesmo ano, 6 de novembro, realizaram o asfaltamento da estrada de Parnamirim, a qual passou a ser chamada Parnamirim Road e interligou a Base Aérea ao Porto de Natal. Esta construção também foi acompanhada pela instalação de um oleoduto de 20 quilômetros, que se seguiu à sua margem. A rapidez como foram executadas revelaram a urgência como os militares estadunidenses viam a necessidade de se instalar Brasil. Para isso, despendiam qualquer esforço como, por exemplo, a construção da estrada e do oleoduto durou apenas vinte e dois dias e contou com a contratação de “aproximadamente 6.000 operários” (SMITH JUNIOR, 1992, p.67).

Era final do ano de 1941, a apropriação uso não autorizada do território brasileiro por outro país passava à frente do portão principal do Quartel do Exército, localizado à Avenida Hermes da Fonseca, o que evidencia que o Exército Brasileiro tinha conhecimento dos acontecimentos. É possível inferir, inclusive, que estavam se beneficiando com aquelas iniciativas e poderiam receber alguma contrapartida local pela permissão. Além disso, a historiografia nacional informa que, nesse período, a cúpula do Exército Brasileiro recebeu treinamento nos Estados Unidos da América (BANDEIRA, Moniz. Presença dos Estados Unidos no Brasil (dois séculos de história). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978). Portanto existia um relacionamento próximo entre as duas forças armadas.

Soldados Estadunidenses atuando no patrulhamento da Cidade do Natal. Fonte: Smith Junior (1992, p.139).
Foto vintage de 1944, a ‘cidade’ em patrulha em Natal, Brasil, dos Soldados da Base Aérea de Natal. Esta planta desempenhou um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como base estratégica para aeronaves que voavam entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.

Em 11 de dezembro de 1941, quatro dias após o ataque japonês à base estadunidense de Pearl Harbor, nove aeronaves chegaram à cidade para deixar ilitares estadunidenses que, a partir de então, se estabeleceram na “base no Rio Potengi” (SMITH JUNIOR, 1992, p.29). Neste local, o contingente do Esquadrão de Patrulhamento da Marinha dos Estados Unidos aproveitou a infraestrutura aeronáutica existente e iniciou as operações de patrulhamento do litoral do Rio Grande do Norte. Em janeiro seguinte, receberam um reforço para expandir suas ações e este passou a “atuar como polícia militar na cidade e vigiar os aviões no Campo de Parnamirim” (SMITH JUNIOR, 1992, p.31). Em Natal estavam instalados cerca de 200 fuzileiros navais estadunidenses que ficavam sitiados entre a Rampa e os hangares do Campo de Pouso Parnamirim.

As mudanças nos rumos da Guerra Mundial ficaram claras no último mês de 1941. As forças aliadas reagiam nas frentes de batalhas em território africano e europeu e conseguiam barrar o avanço das tropas alemãs. O Japão bombardeou a Base de Pearl Harbor no Oceano Pacífico criou uma nova conjuntura e, com ela, é possível imaginar e entender o porquê da pressa como os Estados Unidos em fazer funcionar sua estratégia de defesa em Natal e no Nordeste Brasileiro. Era necessário organizar a definitivamente a defesa da costa do Atlântico para se dedicarem à defesa do Canal do Panamá. Para isso, precisavam oficializar suas operações no Nordeste brasileiro e iriam fazê-lo independente do Governo Brasileiro. Para Clementino (CLEMENTINO, Maria do Livramento M. Economia e modernização: o Rio Grande do Norte nos anos 70. Natal: UFRN/CCHLA, 1995, p.198), naquele momento, “o perigo mais eminente partia, agora, dos próprios americanos”. Estes estavam com a estrutura física da base aérea concluída na Cidade do Natal e precisavam deslocar seu contingente de soldados que continuavam concentrando numa base improvisada na Guiana Inglesa. Para o Governo Vargas, a conjuntura também esgotou seu poder de barganha e, diante disso, era imprescindível agilizar para garantir as melhores condições para a assinatura do acordo.

Os acordos, enfim, foram assinados em março de 1942 e foi dada a autorização para que os Estados Unidos instalassem bases militares no território brasileiro (SMITH JUNIOR, Clyde. Op. Cit). Com isso, a situação se agravou para a vida dos moradores da Cidade do Natal, pois a nova conjuntura aumentou o temor de sofrer um ataque:

Nossa cidade não teria mais suas ruas tranquilas, seus ares e mares perturbados apenas por relâmpagos e trovões […]. Afigurava-se, a quem pensasse mais profundamente daquela noite em diante, que teríamos que ir à luta, acionados daqui como tantos outros teria que ser ou, o que era pior, recebendo, como cidade beligerante, a destruição que poderia vir pelo mar que banhava ou pelo céu, que era até então, sinônimo apenas de prêmio e de paz (MELO, João Wilson Mendes. A cidade e o trampolim. Natal: Sebo Vermelho, 2003, p.62).

Cada notícia era “como golpes na carne e no coração” (MELO, 2003, p.62-63) e aumentava o estado de tensão dos moradores da cidade. Estes sabiam que a cidade era visada pelas forças armadas em guerra, uma vez que estava muito próximo do litoral africano. Com a assinatura dos acordos, o Governo Brasileiro determinou que a coordenação das ações ficassem com o 16º Regimento de Infantaria.

Após a realização do acordo de utilização do Território Nacional, iniciou-se a construção da Base Naval de Natal e, assim, foi iniciada a progressiva ocupação dos espaços da cidade com as diversas instalações das Forças Armadas Brasileiras e Norte-Americanas e as que deveriam apoiar o
seu contigente.

O Quartel do 16º Regimento de Infantaria começou a operar em fevereiro de 1942.
Chegada dos militares americanos em Natal em 1942. Na ocasião apresentação da tropa em frente ao Palácio do Governo do RN, na Praça Sete de Setembro.
Antiga sede do observador naval da US Navy.

A HISTÓRIA DE UM PRACINHA NA RETAGUARDA

Manoel de Castro Affonso 2.º Batalhão de Carros de Combate Leves 3.ª Companhia Documento transcrito relativo ao Soldado, n.º 362O soldado, n.º 362 – Manoel de Castro Affonso – pertenceu à 3.ª Companhia e o relato que se segue, deve-se à sua ficha corrida enquanto esteve a serviço nessa Sub-Unidade. Relação das alterações ocorridas com a praça abaixo declarada, durante o tempo em que a mesma serviu nesta Sub-Unidade.

Fotos da época, de Natal no Rio Grande do Norte.As fotos mostram os tanques do 2º BCCL – Batalhão de Carros de Combate Leves do Exército Brasileiro, onde serviu o soldado n.º 362 – Manoel de Castro Affonso. Esse batalhão guarnecia a base aérea de Parnamirim, hoje Barreira do Inferno e chamado na época de Trampolim da África.

Soldado, n.º 362 – Manoel de Castro Affonso
Soldado, n.º 362 – Manoel de Castro Affonso
Natal /RN. – 1942 – Apreciando nossas praias, e vislumbrando no horizonte o local mais próximo do continente Africano.
Soldados embarcados / destinados a reforçar os quartéis em locais considerados mais viáveis de um possível ataque inimigo.
Soldados embarcados / destinados a reforçar os quartéis em locais considerados mais viáveis de um possível ataque inimigo.
O soldado 362, com amigos, em uma pausa para refeição e jogando conversa fora.
Tanques do 2º BCC – Batalhão de Carros de Combate. Abaixo momento de exercícios.
Tanques do 2º BCC – Batalhão de Carros de Combate. Abaixo momento de exercícios.
Tanques do 2º BCC – Batalhão de Carros de Combate. Abaixo momento de exercícios.
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Flagrantes de uma parada militar Natal / Rio Grande do Norte
Tanques do 2º BCC – Batalhão de Carros de Combate. Abaixo momento de exercícios.

CHOQUE DE COSTUMES

As roupas tradicionais dos natalenses, paletó, gravata e chapéu foram, pouco a pouco, mudadas para calça cinza e camisa esporte que, na época, tomou o nome de “sileque”. Começaram a usar mais verduras, influência dos “gringos”, como eram chamados os americanos, pelos natalenses e, todo dia, ia um avião até o Rio de Janeiro trazer alfaces, tomates e outros produtos hortigranjeiros. Era o avião das verduras, como chamavam em Parnamirim e é introduzida acoca – cola, fabricada na própria base.

O comportamento dos jovens também sofre mudanças. A informalidade dos yankees é imitada pelos rapazes da terra, que se tornam mais abertos, imitando beber líquidos na boca da garrafa, sentar no meio-fio para esperar os coletivos, botar os pés nas cadeiras, nos bares e outros comportamentos que alguns tradicionalistas da cidade discordavam e criticavam. A linguagem também começa a receber palavras novas, como “táxi”, ”my friend”, ”yes”, e ”ok” e ”senorita” para todas as mulheres da terra sem distinção de classe, “godeme”, palavra que significava “danado”, entre os soldados.

A grande batalha entre católicos e protestantes começa a diminuir, quando a igreja da base, recebia ao mesmo tempo, em horários diferentes, a missa católica, o culto protestante e os rituais judaicos. As praias da cidade, onde só ia aos domingos ou sob prescrição médica, foram invadidas pelos soldados que iam de manhã, de tarde e de noite, havendo até a criação de uma praia particular, no fim da Areia Preta, batizada Miami pelos americanos. Os clubes passaram a abrir todos os sábados, para festas oferecidas ao povo natalense, com excelentes orquestras de civis e militares yankees. Abriu-se um cassino atrás do Grande Hotel, na Ribeira, com todos os jogos tradicionais e uma boa banda onde brasileiros e americanos dançavam e se divertiam fraternalmente. No distrito da luz vermelha, foi instituído o exame periódico das mulheres para evitar doenças venéreas, com a criação de um documento que era chamado love card, por alguns engraçados da cidade, freqüentadores da “noite”.

A cidade, os transportes, os bares, estavam sempre cheios de soldados. O comércio multiplicou suas vendas e muitos comerciantes enriqueceram, junto com os motoristas de carros de aluguel. Os aluguéis subiram e comerciantes de meias de seda, perfume Channel e relógios de pulso, nunca venderam tanto.

Muitos veteranos americanos lembram de Natal não pela base, mas por alguns produtos comprados aqui enquanto iam ou voltavam do front de batalha. Um deles era as botas de Natal, ou Natal Boots, fabricadas por um artesão local e disputadíssima pelos militares, que acham mais confortáveis e práticas, apesar de contrariar o regulamento oficial. Outro produto que não parava nas prateleiras das lojas locais eram as meias de seda. Devido ao esforço de guerra e a seda ser produto indispensável na fabricação de paraquedas, as meias não eram encontradas com facilidade nos Estados Unidos.

As moças de Natal, que só iam às festas acompanhadas de um membro da família, com a chegada dos rapazes de fora, mudaram de vida e aderiram a informalidade dos “gringos”, no uso de roupas mais leves e o costume de beijar os amigos no meio da rua, o que era um verdadeiro escândalo antes da guerra. E também os pais exigentes, começaram a permitir a saída das filhas, assim como, oferecendo “festinhas” em casa aos amigos das meninas.

Os comerciantes mais sabidos botaram moças bonitas para atender no balcão e atrair os novos fregueses e muitos ficaram ricos, mesmo agindo honestamente. Que foram explorados, todos sabiam, inclusive eles, mas davam pouca importância ao assunto, pois muitos sabiam que não voltariam da guerra. Abriram-se cursos de inglês em Natal e também de português para os americanos, na ânsia de melhor se comunicarem com os amigos do norte. Nos bares gritava-se “bia”, “Tom Collins” (gin com tônica), coca-cola e também chocolate gelado que os natalenses nunca tinham visto e o “whiskey” era pedido “on the rocks” (sobre o gelo puro).

Em 1944 o jornal americano Foreign Ferry News anunciava as novas instalações da fábrica da Coca-Cola em Parnamirim Field para atender a demanda pela bebida na Base Aérea de Parnamirim.
NATAL, BRASIL – JUNHO DE 1943: Uma visão como os soldados americanos falam com uma mulher local em Natal, Brasil. (Foto de Ivan Dmitri / Arquivos de Michael Ochs / Imagens Getty) *** Legenda local ***
Casamento passando pela Av. Tavares de Lira
Descida da Avenida Rio Branco na época da Segunda Guerra mundial na lente dos militares americanos. Enquanto é observado por garotos da redondeza, o soldado americano posa pra foto na descida da Av. Rio Branco sentido Ribeira. Fotógrafo: Não informado. Ano: 1943
Possivelmente convidados a sair na foto, os garotos, antes observadores, agora se juntam aos amigos americanos para serem todos fotografados.
Um detalhe que se pode observar aqui é que, apesar da aparente simplicidade, sem muitos recursos dos garotos, era comum, quase que imprescindível o uso de calças e camisas, que geralmente eram brancas, pelos homens a partir de certa idade, 14 ou 15 anos talvez.
Fotógrafo: Não informado. Ano: 1943
Após parada pra foto, soldados seguem pela Rio Branco sentido Ribeira. Nessa época, quem estivesse passando por essa avenida teria, nesse trecho, fácil acesso ao terreno desse colégio. Há cerca de 11 anos, com o falecimento de Ignez Barreto, o terreno da antiga vila Barreto passava para as mãos dos padres Salesianos. Com isso, parte do terreno foi cortado pelo prolongamento da Rio Branco. Agora essa via passava pelo meio da antiga propriedade da família Paes Barreto. Ao fundo se vê as belas palmeiras imperiais do colégio Salesiano. Fotógrafo: Não informado. Ano: 1943
Soldado americano posa pra foto na Av. Rio Branco no bairro da Ribeira.
Nessa época, quem estivesse passando na Av. Rio Branco por traz do Salesiano, teria fácil acesso ao terreno desse colégio. Há cerca de 11 anos, com o falecimento de Ignez Barreto, o terreno da antiga vila Barreto passava para as mãos dos padres Salesianos. Com isso, parte do terreno foi cortado pelo prolongamento da Av. Rio Branco. Agora essa via passava pelo meio da antiga propriedade da família Paes Barreto. Ao fundo aparece a Estação da EFCRGN. Fotógrafo: Não informado. Ano: 1943

ESPIONAGEM

Não sei com que armamento se combaterá a III Guerra Mundial, mas a IV Guerra Mundial será combatida com paus e pedras. (A. Einstein)

Existem diversos relatos de espiões sendo detidos em Natal durante a guerra, até mesmo o registro oral de execuções por fuzilamento na margem oposta do Rio Potengi. Uma das estórias pouco conhecidas é de um padre alemão detido na praia de Jacumã. De acordo com moradores da época, este padre chegou e se estabeleceu na praia, pregando na pequena igreja que existe até os dias de hoje, contudo, duas coisas chamavam a atenção das pessoas. Primeiro o sotaque carregado do padre e andar sempre com um guarda-chuva, como se esperasse uma chuva a qualquer momento.

Um dia, um forte esquema de segurança com militares brasileiros e americanos chegaram a localidade, inclusive com desembarque anfíbio, com objetivo de deter o padre. Ele foi acusado de ser um espião do eixo e vinha passando informações via rádio para um possível submarino. Este homem foi preso e trazido para Natal.

Pra não dizer que não existe um lugar em Natal ligado à guerra em que essa história esteja visível, tem o casarão de nº 184 da Rua Câmara Cascudo, na Ribeira, das principais artérias da cidade. O estabelecimento incorpora toda a importância histórica do local, construído pelo imigrante italiano Guglielmo Lettieri, que após ter sido nomeado cônsul da Itália no RN, em 1938, acabou preso acusado de espionagem nazista.

O italiano Guglielmo Lettieri – um rico comerciante dono da Cantina Lettieri e da única fábrica de gelo da cidade de Natal na década de 1930. Fascista e admirador do nazismo, Guglielmo se estabeleceu em Natal nas primeiras décadas do XX.

“Em dezembro comprei 11 canos de 4 metros cada. Abraços de Natal.”

Essa mensagem redigida e transmitida em junho de 1941 pelo italiano Guglielmo Lettieri foi interceptada por espiões americanos que tratavam na capital do Rio Grande do Norte uma batalha subterrânea contra agentes secretos alemães e fascistas.

Natal foi uma movimentada encruzilhada de arapongas durante a Segunda Guerra Mundial. A capital potiguar abrigava um dos maiores exércitos de espiões em ação fora da Europa. Assim como Casablanca ( Marrocos ), ali sabotagens foram tramadas, heróis de guerra fizeram escala e assassinatos foram encomendados.

A mensagem acima foi decifrada pouco tempo depois porque agentes da inteligência descobriram na casa de Lettieri um bilhete com os códigos que esclareciam o teor da mensagem:

Canos=aparelhos;

metros=motores e

abraços=aeroplanos.

O telegrama acima, enviado para o escritório de um italiano no Rio de Janeiro, avisava que , em dezembro daquele ano (1941), 11 aviões de quatro motores haviam aterrissado na cidade.

A ação do agentes das duas partes impressionava porque o Brasil só declararia guerra aos países do Eixo ( Alemanha, Itália e Japão ) no ano seguinte.

A cidade de Natal era tida como estratégica por nazistas e aliados. Ela foi, de fato, um centro importante para os serviços secretos durante a guerra. Pelo menos seis diferentes agências de informação montaram escritório na cidade.

Dois dos maiores protagonistas da história da espionagem mundial trocaram correspondência sobre os bastidores da espionagem em Natal.

Em 1941, John Edgar Hoover enviou uma mensagem que tinha como destinatário o coronel Willian Donovan alertando-o sobre a ação de três supostos agentes nazistas que agiam na capital potiguar.

Hoover e Donovam são figuras lendárias. O primeiro foi durante 40 anos diretor do FBI ( Federal Bureau of Investigation ). Donovam criou a CIA ( Central de Inteligência Americana ) e foi mentor doa arapongas americanos por mais de 30 anos.

Segundo os agentes do FBI, Richard Burgers, Ernest Luck e Hans Weberling, todos alemães, reuniam informações sobre o movimento de aviões e navios americanos baseados em Natal e repassavam para agentes nazistas localizados no Rio. Além de terem atuado na sabotagem de aviões do Exército dos Estados Unidos.

Depois de identificados, os agentes alemães foram presos por policiais do antigo Departamento de Ordem Social e Investigações. Denunciados à Justiça, o trio de alemães e o italiano Guglielmo Lettieri foram condenados por “verdadeiros atos de espionagem e atividades nazistas” em junho de 1942.

Ao longo dos interrogatórios, os agentes nazistas revelaram como eram os códigos de comunicação secreta. Na loja de ferragem de Ernest Luck, no centro de Natal, foram encontrados catálogos com os códigos e indicações detalhadas do número e características dos aviões e navios americanos no Rio Grande do Norte.

A Ribeira era um bairro de intensa frequência dos pracinhas estadunidenses durante a Segunda Guerra mundial. Em 2011 no prédio funcionou Consulado Bar que manteve a arquitetura antiga do casarão, inclusive um de seus pisos formado por ladrilhos com a cruz suástica, símbolo do nazismo. Imagens da época da guerra (reproduções de fotos e cartazes) decoram as paredes do bar. Foi assim um dos capítulos da Segunda Guerra Mundial em solo brasileiro.

» OUTROS LOCAIS EM NATAL LIGADOS À 2ª GUERRA

• Catedral Metropolitana – antes da construção, o local abrigou a Praça Pio X, onde existia também um abrigo antiaéreo da cidade.

• Base Naval de Natal – alguns prédios às margens do rio Potengi são remanescentes da base de hidroaviões da Air France. O hangar original existe e foi transformado em oficina.

• 17º Grupamento de Artilharia de Campanha – lá dentro, na margem do rio Potengi, estão os destroços da rampa de concreto que dava acesso à rampa alemã, base da Lufthansa e Sindicato Condor no Brasil.

• Grande Hotel – Hoje órgão da Justiça, no passado foi o principal ponto de hospedagem da cidade, tendo recebido visitantes famosos, como atores da Hollywood da década de 40.

• Setor Oeste da Base Aérea de Natal – lá nasceu a BANT, em 1942. Antes, em meados de 20, os franceses criam o campo de Parnamirim, dividindo espaço depois com os italianos da Line Aeree Transcontinentali Italiane (LATI)”

• Cais Tavares de Lira

• Cemitério do Alecrim

• Locais ligados à espionagem nazista

Josélia e José Avelino Costa, com a pequena Íris, aos nove meses (Acervo: Íris Lettieri)
J. Edgar Hoover, o maior detetive da história, monitorou passos de Guglielmo em Natal.
Sobrado de Guglielmo na Ribeira antiga

Em seu livro “História da Base Aérea de Natal” (Ed.Universitária, 1980), Fernando Hippólyto da Costa, trouxe à luz, a partir de documentos considerados secretos, fatos interessantes referentes à participação da Base no desenrolar do conflito mundial. A seguir, alguns trechos selecionados:

Avião abatido – o dia 15 de dezembro de 1942, o comando da Base recebeu o comunicado do prefeito do município de Pedro Velho, segundo o qual, uma aeronave caíra há poucos quilômetros daquela cidade, estandodois tripulantes completamente carbonizados e um gravemente ferido.

Uma equipe da BAN seguiu imediatamente para o local, providenciando a remessa dos corpos para Natal e a internação do sobrevivente, o Aspirante Aviador Mena Barreto, que viria a falecer três dias depois.

O Inquérito Sumário Técnico revelou que “os magnetos e o gerador não foram encontrados no bloco do motor, por haver sido retirados, indevidamente, por um tal Ananias, vigia da Companhia Rio Tinto”.E, mais adiante: “há indícios veementes de que o avião tenhas sofrido um ataque por rajada de metralhadora, partindo da terra”. O Fairchild era proveniente de Recife. E conclui o relatório: “Estamos apurando o sucedido, com a colaboração do Exército. Não sabemos se o triste acontecimento foi obra de algum submarino inimigo, na baía de Maranguape, ou se é devido à ação da quinta-coluna encapotada. O certo é que o avião abatido apresenta vestígios de 38 perfurações de carga estranha ao nosso equipamento bélico. Nesse avião deveria ter viajado o Brigadeiro Eduardo Gomes”.

Espionagem – Em 1º de julho de 1942, vazou para a imprensa um caso de espionagem em Natal. O jornal “A República” publicou com destaque o seguinte despacho procedente de Recife: “O engenheiro Luiz Eugênio Lacerda de Almeida foi detido pela Polícia por motivo de espionagem. O depoimento foi precedido das declarações dos espiões Sievert,Herbert Friedrich, Julius Von Heyer e outros. A função de Eugênio eraespionar as obras da Base Aérea de Natal”.

Quase um ano depois, a 19 de julho de 1943, “A República” volta a destacar o assunto sob o título: “Furtou e vendeu o plano da Base Aérea de Natal”, onde afirma que o plano geral da Base fora passado aos agentes da espionagem alemã, em Recife. Pesava ainda contra o engenheiro a gravíssima acusação de fornecer elementos sobre a partida de navios brasileiros, posteriormente afundados por submarinos nazistas.

Devido a declaração do advogado do acusado à imprensa, segundo a qual o seu constituinte “fora vítima de tremendo equívoco da polícia pernambucana”, a Chefia da Polícia resolveu dar publicidade às cópias dos principais documentos do processo, onde figurava a própria confissão do engenheiro. Lacerda, “uma dmirador das vitórias alemãs”, havia trabalhado durante cinco anos na firma alemã Herm Stoltz & Cia e viajara a Natal, por ordem do gerente Hans Sievert para “proceder uma completa observação das obras realizadas na Base”.

A PREPARAÇÃO DA POPULAÇÃO DA CIDADE PARA A GUERRA

O ALARME (crônica)

A guerra estava longe, mas o medo muito próximo. Estava mesmo dentro de cada um. Era noite. Precisavam de escuridão, mas havia luar. As sirenes alarmaram. De todas as casas fecharam-se rápidas as janelas. As poucas luzes que haviam foram apagadas. Expectativa. Todos os santos foram invocados. Os corações bons ou doentes aceleraram os ritmos. Outros órgãos humanos causaram dores e correrias para ambientes privados. Expectativa. O ronco dos motores de um avião, muito alto, sobre os céus da cidade. Medo maior. Mas, nenhum silvo, nenhum estrondo. Os minutos passaram devagar. Timidamente, algumas janelas abriram-se. Olhares para além das nuvens. Holofotes gigantes iluminaram um avião solitário: era dos nossos. Tratava-se, pois, de um exercício de preparação psicológica. Em plena tensão, aos poucos nos lembramos de um célebre poema de Edgar Poe: “Deve ser isto e nada mais”. Realmente, “never more” drama semelhante a cidade sofreria. Depois das janelas, as portas foram se abrindo. Saímos para o Grande Ponto. Bendito blecaute. O luar dominava a cidade. Suavemente fez voltar a calma, a esperança e o bom humor, até que o sol, horas depois, veio mostrar que a cidade era a mesma, salvo algumas ocorrências de urgência hospitalar. Durante muitos dias
após, cada habitante de Natal, sobrevivente ao susto, tinha uma história pra contar. Afinal, a guerra continuava distante (MELO, 2003, p.77).

As operações de guerra na Cidade do Natal começaram efetivamente em fevereiro de 1942. Neste mês, surgiram os primeiros sinais, depois de tantos meses de espera, de que as expectativas das elites políticas e dos moradores se concretizariam. A partir delas, passaram a acompanhar o desenrolar dos acontecimentos na Europa com mais atenção, pois de lá chegava segundo França:

[…] o temor de uma possibilidade nefasta, surge a visão sombria de duros combates, contra a felicidade dos nossos lares e a inocência dos nossos filhos. Brasil, terra de paz e de progresso; norte-riograndenses, criaturas sãs de espírito e boas de coração. […]. É preciso pensar que nada nos acontecerá. Deus protegerá o nosso destino (FRANÇA. Aderbal. Deus protegerá o nosso destino. A República, Natal, 12 fev. 1942d, p.12).

Desde janeiro de 1942, como o anúncio da ruptura das relações diplomáticas brasileiras com os países do Eixo, os moradores da cidade contavam regressivamente o tempo para escutarem os bombardeios. Os Estados Unidos já estavam com suas forças organizadas na cidade e já operavam na costa brasileira, uma vez que, para estes, “a área de Natal era, realmente, crucial para a defesa dos Estados Unidos continental e do Canal do Panamá contra forças hostis” (SMITH JUNIOR, 1992, p.23). Mesmo antes do ataque à “Pearl Harbor, Natal tinha sido considerada um dos três pontos mais prováveis de ataque pelas Forças do Eixo“ (SMITH JUNIOR, 1992, p.34).

Entre outras providências anunciadas em janeiro de 1942, o Governo Federal autorizou que o Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda (DEIP) e as Forças Militares Brasileiras iniciassem a preparação dos moradores da cidade das cidades com a aplicação dos Exercícios de Defesa Passiva. O programa de treinamento previa dotar a população brasileira de informações elementares para sua defesa por meio de procedimentos de organização e disciplina. Em Natal, a primeira notícia desses Exercícios foi divulgada antes do carnaval de 1942.

AVISO À POPULAÇÃO – Hoje entre 14:30 e 16:30 horas, serão feitas experiências de funcionamento de sirenes, em vários pontos desta capital. Às 17 horas, haverá uma experiência geral de todas as sirenes instaladas na cidade. Pede-se a quem deixar de ouvir o sinal das 17 horas, a fineza de comunicar-se, na segunda-feira próxima, com o major Domingos Moreira, na construção do quartel do 16º R.I., no Tirol, ou na Chefia de Polícia, indicando o informante o local em que se encontrava naquele momento (AVISO à população. A República, Natal, 7 fev. 1942, p.1).

O Jornal A República, juntamente os demais órgãos da imprensa, juntamente com os Governos Estadual e Municipal e as forças militares, começaram a organizar a defesa da população da cidade. A notícia do primeiro exercício chegou à população e, no primeiro instante, espalhou-se um grande pânico. Era a confirmação de que a guerra estava mais próxima. Até mesmo alguns representantes das elites intelectuais demonstravam sua estupefação diante da circunstância de medo que se espalhou sobre a cidade, uma vez que esta se baseava na compreensão de que nada e ninguém sobrariam para contar a história.

Vê-se de súbito a cidade dos Três Reis Magos convertida em praça de guerra, eriçada de canhões voltados para o céu e atenta às possíveis advertências das sirenes de alarma. O sonho da paz sedesvanece, mas a iminência do perigo restaura a velha atitude da capital lendária que, na hora da provação, se prepara para cumprir a sua missão renovada de atalaia do Brasil e de sentinela avançada do Novo Mundo (NATAL. A República, Natal, 25 fev. 1942, p.3).

A população da cidade passou a ser despertada pelas sirenes dos alarmes e sua esperança desvaneceu. Mesmo tendo acompanhado as construções militares, estes reagiam como se os fatos estivessem acontecendo inesperadamente. Mesmo diante da presença das guarnições e dos seus treinamentos diários, que podiam ver nas praias e nas proximidades da cidade, a nova situação estava apresentando uma realidade que não se sentiam preparados para enfrentar.

A pavimentação da estrada entre Natal e o município de Macaíba (era uma das principais vias de acesso da capital ao interior do Estado, particularmente em direção à região do Seridó) já estava concluída, assim como já haviam procedido a limpeza da barra do Rio Potengi; o recobrimento do piso da Ponte sobre o Rio Potengi; a transformação da Maternidade de Natal em Hospital Militar de Natal e o funcionamento pacial do Quartel do Tirol. A infra-estrutura requerida parecia já estar presente, mas a população continuava despreparada. Para as elites, só restava “encarar as coisas, pacatamente, como no modo todo potiguar de aceitar os fatos, aguentando firme e sem ‘estrilos’ “ (CÂMARA, Clementino. Telefones automáticos. A República, Natal, 28/07/1942, p.3). Quanto a estas, tudo parecia acontecer à sua revelia, inclusive as ações modernizadoras, que continuavam se efetivando, porém para atender às necessidades da defesa, as quais requeriam condições estruturais adequadas e comunicações ágeis.

O sistema telefônico existente era antiquado e operava com a intermediação de uma telefonista. O que estava sendo instalado era automático e requereu a construção de uma Estação Central na Rua 13 de Maio, onde ficou a central, e foi gerenciada pela Companhia Força e Luz Nordeste do Brasil. Inicialmente foram instalados quinhentos terminais telefônicos na área urbana cidade e existia a promessa de que seriam duplicados em pouco tempo.

Em meados de fevereiro, foi dado seguimento ao treinamento da população com a publicação da segunda instrução do treinamento da população.
Esta tratou do controle das luzes e, embora o Interventor Federal e o Comando da Guarnição tenham ressaltado que não existiam indícios de ataque aéreo naquele momento, também insistiam na necessidade da prevenção para enfrentar as eventualidades.

O povo norte-rio-grandense, que tem sabido se manter tão calmo e disciplinado ante o desenrolar dos acontecimentos, deverá conservar essa mesma atitude em qualquer circunstância. A obediência absoluta por parte da população às recomendações das autoridades, será a sua melhor cooperação para a defesa da cidade (CONSELHOS a população: iluminação. A República, Natal, 14 fev. 1942, p.1).

Cada família deveria aprender os procedimentos de controle de luzes e adotá-los em suas residências ante a presença de algum avião inimigo sobre o espaço aéreo das cidades. O aprendizado era considerado importante, pois dele dependia a visão dos aviões inimigos e, consequentemente, dos seus bombardeios. O Governo se encarregava da iluminação das ruas, edifícios públicos, farol da barra e navios que, por ventura, estivessem atracados no Cais do Porto. Os procedimentos eram divulgados pela imprensa local que, ao mesmo tempo, tentava abrandar o pânico que se instalava entre os moradores da cidade.

Nos dois primeiros procedimentos de defesa, a população aprendeu a atender ao barulho das sirenes e vedar todas as frestas para que as luzes no interior das residências não se espalhassem pelo exterior. Evidentemente, percebia-se uma desolação entre os moradores, uma vez que os discursos que pretendiam orientar desorientavam a todos e a realidade discursiva do treinamento envolvia a sobrevivência de todos.

O medo refletia a observação de que faltavam providências governamentais. A orientação da defesa dizia que, em caso de um ataque, os moradores deveriam procurar os abrigos antiaéreos para que ficassem melhor protegidos e, na Cidade do Natal não existia, até aquele momento, qualquer abrigo. O Jornal A República informava que estes seriam construídos brevemente pela Prefeitura e ressaltava que as famílias poderiam se antecipar e construir seu próprio abrigo residencial. As instruções técnicas para essas iniciativas estavam disponíveis na Guarnição Federal:

O sinal com silvos interrompidos indicará a aproximação dos aviões, e com silvo longo, fim de alarme. Desde que ouça o sinal, a população deverá dirigir-se ao abrigo mais próximo, munido de merenda e água, pois não é possível prever quanto tempo durará o alarme. Ninguém deve permanecer nas ruas enquanto não for dado o sinal de fim do alarme, porque os estilhaços da artilharia antiaérea podem causar vítimas. Os abrigos devem ser ocupados com calma e obediência ao que for determinado pela autoridade que estiver fazendo o policiamento. É proibido fumar e manter conversas alarmantes ou derrotistas, assim como sair antes do sinal de fim de alarme. As pessoas que estiverem em bondes e automóveis devem abandonar os veículos, apagar as luzes e correr para os abrigos. Nas sessões de cinema, teatros ou outro qualquer lugar onde haja aglomerações de pessoas, é preciso conservar absoluta calma, a fim de evitar atropelos que dificultem a saída para procurar os abrigos (CONSELHOS a população de Natal: abrigos. A República, Natal, 15 fev. 1942, p.1).

Era evidente que as instruções normativas haviam sido copiadas pelas autoridades militares. Estas devem ter sido retiradas de outra realidade que não era a da Cidade do Natal. Por sua vez, os moradores perceberam que não estavam sendo cumpridos os procedimentos mais adequados que lhes garantissem a segurança. As notas não esclareciam em quanto tempo os abrigos seriam construídos, os discursos informavam a proximidade do perigo e que todos se mantivessem “sempre num estado de vigília, a fim de [não serem] surpreendidos pelos propósitos criminosos de quem quer que tente afetar a soberania e a integridade territorial do país” (EM ESTADO de alerta. A República, Natal, 15 fev. 1942, p.3)273. Para as elites políticas e para as Forças Armadas, no entanto, essas exigências era tratadas como uma atitude prudente:

As notas estão sendo divulgadas hoje na mesma forma como poderiam ter sido divulgadas há muito tempo, porque o seu objetivo é exclusivamente o de ensinar ao povo, instruí-lo sobre a eventualidade de um ataque aéreo contra a cidade. As coisas, na nossa época, acontecem de um modo brusco e imprevisto. A guerra de destruição em que o mundo se acha envolvido é a dolorosa característica do momento angustioso em que vivemos. A arma principal dessa guerra é a aviação, em face da qual são ainda, infelizmente, pequenos os nossos recursos de defesa (CONSELHOS a população de Natal. A República, Natal, 19 fev. 1942, p. 3).

As autoridades civis e militares reiteravam a necessidade de a população permanecer prevenida e preparada, e que aprendessem a reagir com rapidez diante de imprevistos. Por outro lado, compreendia-se que a posição geográfica da Cidade do natal exigia que seus representantes saíssem na frente das demais cidades brasileiras, pois dela dependia a defesa do Continente Americano.

Natal tinha a particularidade de ser um alvo real, porque nela estava um aeroporto cujas condições eram reconhecidas internacionalmente e cuja posição estratégica facilitaria a investida de um provável ataque às Américas.

O movimento musical de Natal no ano de 1942 foi bastante fraco, comparado com os anos anteriores. Isso se deve ao ambiente menos propício proporcionado pelo agravamento da situação internacional decorrente do recrudescer da Segunda Guerra Mundial. Esse ambiente deveria se tornar ainda mais tenso nos anos seguintes; a partir do mês de fevereiro foram afundados vários navios brasileiros, sendo que cinco deles postos a
pique em águas do nosso litoral, o que levou o governo federal a declarar guerra aos chamados “países do eixo” – Alemanha, Itália e Japão – a 31 de agosto.

Não existia a certeza do perigo, mas, simplesmente, a sua possibilidade. ”Estamos longe do teatro dos acontecimentos e, portanto, dos ataques de suas armas. Devemos, porém, desde já, concordar que é dever do governo e das autoridades militares realizarem a campanha de instrução prévia da defesa do país. Era isso que estava acontecendo em outros estados. (DIÁRIO DE NATAL,03/03/1942,p.1).

Vista aérea do bairro de Petrópolis. Acervo: Diário de Natal.
Bases militares (1943). Fonte: A República.

A EXPERIÊNCIA DO “BLACK-OUT”

A última etapa do treinamento agregou todos os procedimentos apreendidos e esta se operacionalizou no exercício do “black-out”. Nesta etapa, os
moradores foram informados que teriam que conviver com a eventualidade de serem surpreendidos com a paralisação de todas as atividades na cidade e que precisavam aprender a sobreviver nestas condições.

Em toda a Europa, muito antes ainda das forças agressoras do nazifascismo provocarem a guerra, já era o “black-out” conhecido de todas as populações, sendo praticado tanto nas grandes e suntuosas capitais como nos burgos pequeninos e humildes, também da mesma forma ameaçados pelos raids aéreos. Agora a conflagração alastra-se assustadoramente por todos os recantos da terra e as possibilidades mais longínquas devem ser previstas. E nessa situação, Natal é no Brasil a cidade que, em conseqüência de sua própria posição geográfica, mais reclama medidas preventivas contra os ataques aéreos (MÁXIMO, Luis. Teremos Black-out. A República, Natal, 26 fev. 1942, p.3).

As comparações com outras cidades ressaltavam a condição da Cidade do Natal que, semelhante às pequenas cidades europeias, poderia ser arrasada repentinamente por um bombardeio das forças inimigas. As elites locais e os demais moradores da cidade precisavam se convencer de que estavam no meio do caminho da entrada da América e, consequentemente, não escapariam de enfrentar as batalhas da guerra.

O primeiro “black-out” na cidade ocorreu no dia 1º de março de 1942 e foi planejado pelo Comando da Segunda Brigada de Infantaria sediada em Natal e divulgado através da imprensa da cidade. Este seria um teste no qual a população seria avaliada e, posteriormente, todos as autoridades militares procederiam novas instruções e sas providências necessárias para aperfeiçoar a defesa da cidade.

À aproximação da esquadrilha as sirenes soarão dando o sinal de alarme. Imediatamente serão apagadas as luzes das ruas e residências e todos os veículos devem estacionar com os faróis igualmente apagados. Ninguém deve permanecer nas ruas e devem ser evitados todos os ruídos desnecessários. É indispensável que não seja vista do exterior nenhuma fresta de luz, partida das casas. Nessa situação se permanecerá até que seja, pelas sirenes, dado o sinal do fim de alarme, quando se reacenderão as luzes e se retornará à vida normal da cidade. NOTA – Não estando ainda construídos os abrigos antiaéreos, todos devem permanecer em suas casas. Aqueles que, por qualquer circunstância se acharem nas ruas, deverão procurar manter-se parados e próximos às paredes ou muros das casas; e os que se encontrarem nas estradas, deverão deixá-las livres, mantendo-se nas suas orlas (EXERCÍCIOS de defesa antiaérea: instruções da 2ª Brigada de Infantaria. A República, Natal, 27 fev.1942, p.1).

Ao final da primeira noite de “black-out”, o Comando da Guarnição avaliou positivamente o exercício e exaltou a colaboração exemplar da população (FRANÇA, 1942g, p.8). No dia anterior à realização do primeiro “black-out” foi inaugurado o primeiro abrigo antiaéreo da cidade. As instalações subterrâneas foram construídas na residência do Sr. Amaro Mesquita que era um importante comerciante da cidade e cuja iniciativa foi festejada pelas elites, que esperavam que fosse seguido por outros “capitalistas e proprietários de recursos” In: FRANÇA. Aderbal . O primeiro abrigo. A República, Natal, 03 mar. 1942g. A segurança da cidade parecia estar caminhando para o êxito do que fora planejado.

No dia 2 de março de1942 houve o primeiro exercício de simulação de ataque aéreo na cidade, realizado com êxito. No mesmo dia, o Presidente da República criava a Base Aérea de Natal e era inaugurado o primeiro abrigo antiaéreo, construído em uma residência particular.v

Na sequencia dos primeiros meses de 1942, a defesa da cidade foi se aperfeiçoando diariamente com exercícios pontuais e sem avisos prévios, o que garantia testar a eficiência do que estava sendo aprendido pela população. Entre os dias 6 a 9 de junho, foi aplicado um “black-out” com maior duração e que se estendeu às cidades vizinhas (Macaíba, São José de Mipibú e Papari). A intenção dos militares era submeter a população a um regime de restrição e de atenção permanente, “como se estivessem na expectativa de sofrer ataques aéreos, diurnos e noturnos, tão comuns na guerra moderna (DEFESA passiva antiaérea. A República, Natal, 2 jun. 1942, p.1). O objetivo também era fazer uma aproximação com a realidade por meio das simulações de ataques.

Nesses dias, enfim, os ataques ocorreram sem aviso, as sirenes soaram intermitentes, a qualquer hora do dia e da noite, e a população foi constantemente pressionada a atender aos sinais sonoros. Os militares das Forças Armadas brasileiras e estadunidenses e a Polícia Civil da cidade ficaram nas ruas vigiando o cumprimento dos procedimentos. Ao final, foi previsto que os intervalos entre as simulações deveriam ser alternados e ocorreram até mais de uma vez a cada turno. O Coordenador da operação, General Cordeiro de Farias, novamente avaliou positivamente em entrevista ao Jornal A República, porém apontou a necessidade de adaptações e correções:

A população precisa controlar-se. No caso real, a primeira coisa a fazer é correr para o abrigo. Poderão me perguntar onde estão eles. É assunto que escapa à minha alçada. Eles são de absoluta e urgente necessidade. Simples valas de 60 centímetros de largura por um metro e sessenta centímetros de profundidade e comprimento que se arbitrar são de um resultado extraordinário. Está provado que elas diminuem o perigo de cerca de 40 %. Sei que há muitas pessoas que não acreditam neste gênero de abrigos. Mas estou certo também que na hora crítica, correrão para eles. […]. É uma imprudência enorme, correr para a rua sem destino. É preciso controle e convicção de que aquele que corre para a rua, arrisca-se a
ser morto […]. Houve casos de caminhões transitarem com famílias que alarmadas abandonaram seus lares. São fatos que não admitem comentários, tal imprudência e perigo revelam. No momento do alarme em algumas casas, seus habitantes, alarmados, acenderam as luzes e saíram apressadamente, deixando as portas abertas e iluminadas, outras abriram imprudentemente as janelas, lançando jorros de luz, verdadeiros faróis guias para a aviação inimiga. Esta população por mim tão estimada que tão bem aceita os meus conselhos, […] deve atender a mais este pedido: DOMÍNIO SOBRE SI MESMA PARA EVITAR UM MAL MAIOR (A MARGEM do último exercício de escurecimento e disciplina de luzes de Natal. Fala a República o General Cordeiro de Farias – O que nos disse o ilustre militar – Mais um apelo à população: domínio sobre si mesma. A República, Natal, 11 jun. 1942, p.7).

Não foi objetivo deste estudo avaliar as conseqüências psicológicas que podem ter sido desencadeadas nos moradores, porém há que se inferir que podem ter sido desastrosas. De qualquer maneira, percebeu-se que a população da cidade foi treinada para viver a guerra e sofreu com esta experiência. Experimentavam uma simulação de guerra, enquanto acompanhavam a devastação que a guerra real promovia nas frentes de batalhas. O acompanhamento lhes era possível porque os noticiários dos rádios descreviam minuciosamente as conseqüências trágicas, os requintes de crueldades que a cada dia se aperfeiçoavam. Por outro lado, era-lhes exigido que mantivesse o controle do medo e de seu despreparo, uma vez que estavam recebendo o treinamento necessário para enfrentá-los.

Percebeu-se também, o descaso das autoridades civis e militares brasileiras, bem como dos militares estadunidenses, para com a sobrevivência da
população natalense. Na cidade, priorizou-se a construção de obras infra-estruturais sofisticadas, utilizando-se a tecnologia moderna para o serviço da guerra, porém, a construção de abrigos antiaéreos, que poderia não requerer grandes recursos, não ocorreu. Parece até que as vidas humanas norte-rio-grandenses eram irrelevantes ou sem grande importância.

O que as elites locais já haviam conquistado por meio de seus esforços havia garantido, no passado recente, que acreditassem que a antiga e provinciana Cidade do Natal tivesse se tornado numa “miniatura de grande cidade moderna” (MARANHÃO, Petracha. Natal. A República, Natal, 31 maio 1942, p.4). Estas acreditaram no futuro, quando transformaria a capital num empório cosmopolita. Agora, ainda tinham a chance de acreditar que se tornaria a base mais movimentada das Américas. Enfim, em meados de 1942, percebe-se que o plano das elites políticas era unir para sobreviver, esperar o pesadelo passar ou se contentar com a chegada de outro futuro nunca antes esperado.

Mesmo com a notícia de que a guerra estava recuando sobre os territórios conquistados da África, o Jornal A República informava que as Forças
Armadas e as elites locais ainda consideravam a possibilidade de um ataque a Natal.

A Liga de Defesa Passiva de Natal era a responsável pela manutenção da atenção e controle da tensão que se espalhava entre os moradores, pois “o êxito na luta depend[ia] fundamentalmente do estado psicológico da população civil, pois ela representa também uma linha de combate” (FUNDADA…, 1942, p.8). Uma das primeiras iniciativas do Governo Federal foi cumprir a portaria 271 do Ministério da Educação e Saúde que, entre outras, determinava a organização de cursos de defesa para professores das escolas públicas. Em Natal, os cursos foram ministrados no Teatro Carlos Gomes por militares do Exército e intelectuais norte-riograndenses, entre eles Luis da Câmara Cascudo, e seu objetivo era formar “Alertadores” da Defesa do País.

O primeiro grupo de “Alertadores” foi formado por “senhoras e senhoritas da sociedade local” que tinham por missão ajudar “junto aos lares, às pessoas de suas relações, estabelecer uma verdadeira rede de fiscalização relativos ao escurecimento, abrigos, incêndios, educação moral em face do perigo” (AS ALERTADORAS do serviço de defesa passiva. A República, Natal, 8 nov. 1942, p.4), além de agir como socorristas, na remoção de feridos, assim como de outros procedimentos emergenciais caso a cidade sofresse algum ataque.

Outra formação que estes cursos fizeram foi a de bombeiros voluntários. Sua ação deveria se dar juntas das “alertadoras” e ambos seriam imprescindíveis no momento do ataque inimigo. Para as elites políticas, as defesas gerais e particulares precisavam ser organizadas porque os alemães poderiam utilizar bombas incendiárias,

Pesando de dois a cinco quilos apenas, as bombas incendiárias são atiradas aos milhares sobre o objetivo. São extremamente perigosas pela quantidade e amplidão das áreas que se transformam em fogueiras crepitantes. Se, ao ataque incendiário, alia-se o pavor, então este age sem obstáculo, semeando a destruição que desorganiza a vida normal da população. O essencial é esperar o assalto e antecipar a preparação da defesa, anulando o golpe dos nossos implacáveis inimigos (PARA combater o incêndio. A República, Natal, 10 nov. 1942, p.3).

As notícias sobre as bombas eram publicadas cheias de detalhes minuciosos. Eram citadas as bombas incendiárias, fabricadas com substâncias
betuminosas, que se projetariam depois da explosão; as carregadas com fósforo, que provocariam chamas esverdeadas; e as com líquidos inflamáveis que poderiam ser apagadas com extintores de incêndio. No entanto, eram as de “Termite” (óxido de ferro e alumínio) e as de “Electron” (alumínio e magnésio) que mais causavam preocupações, pois produziriam um calor fortíssimo e deveriam ser combatidas com máscaras. Dentre as orientações, era sugerido aos moradores que conservassem “alguns caixotes com areia, terra solta, pás, uma picareta” em suas casas e estivessem dispostos “a uma luta sem trégua, com as armas da inteligência, da calma e do sangue-frio, fatores que são decisivos para essas batalhas” (PARA combater o incêndio. A República, Natal, 10 nov. 1942, p.3).

A cidade foi submetida a esse estado de tensão durante todo o ano de 1942, porém os moradores davam sinais de que estavam tornando aquela situação numa rotina, na qual tratavam os procedimentos de defesa com displicência. Mesmo que sua obediência continuasse sendo exigida, estes davam sinais de exaustão e relaxamente na disciplina. Mesmo alguns jornalistas d’A República davam sinais de impaciência com a demora do Estado de assumir sua responsabilidade de, por exemplo, construir os abrigos antiaéreos.

Segundo o jornal Diário de Natal realizou-se em 02/03/1942 as 10h00 a inauguração do primeiro abrigo antiaéreo construído em Natal. “Esse acontecimento corresponde ao apelo do governo e das autoridades militares desta capital como recurso de segurança individual e coletiva em casos de ataques aéreos contra a cidade, em vista da ruptura das relações diplomáticas entre Brasil e as potencia do Eixo e da situação geográfica em que se encontra a capital do Rio Grande do Norte”(DIÁRIO DE NATAL,03/03/1942, p.1).

O abrigo era de propriedade do Sr. Amaro Mesquita, chefe da firma Galvão, Mesquita & Cia, comerciante respeitado na capital potiguar e ficava no terreno da sua residência na Av. Hermes da Fonseca, no Tirol e foi construído de acordo com a planta fornecida pelo major Domingos Moreira e por este administrada a construção.

O abrigo oferecia todas as condições de segurança e constituía mais um serviço que o major Domingo Moreira prestava a capitão. O Sr. Amaro Mesquita, era um comerciante muito conceituado e conforme o Diário de Natal “demonstrou por sua vez, a mais perfeita compreensão da utilidade dos conselhos e instruções sobre as eventualidades do momento, dando a sua família a certeza de um ponto certo de defesa contra qualquer perigo” . (DIÁRIO DE NATAL, 03/03/1942, p.1).

Sei que você desejou perguntar-me: “Onde estão os abrigos?” Não lhe falta razão para isso. Porque você, como todos nós, procura os abrigos com os olhos e não com o instinto. E sobretudo porque não temos ainda abrigos. Nem para as nossas vidas, nem para os nossos ideais e as nossas convicções. Ainda não compreendemos que há valores muito mais importantes do que a vida. […]. Os abrigos estão em nós, em nossos nervos, na força dos nossos instintos, em nossa vontade de vencer, na calma com que nos conduzirmos. Mas, eles devem estar também nas ruas, nas oficinas, em toda parte, em forma concreta. É muito mais difícil vencer a guerra do que fazer abrigos para proteger os exércitos da segunda frente. Nós, o povo, teremos de fazê-los (PINHEIRO, Rivaldo. Abrigos. A República, Natal, 9 set. 1942a, p.3).

Embora as elites locais continuassem afirmando que os abrigos antiaéreos seriam construídos, até meados de 1942, o Governo Federal não autorizou a liberação dos recursos. No Jornal A República foram observadas manifestações dos que não aceitavam as desculpas que eram repetidas. A apreensão se espalhava principalmente entre os setores das classes médias e comerciantes. Estes últimos começaram a construir seus próprios abrigos nas suas residências, enquanto a maioria da população cidade continuou vulnerável, sem proteção e dependendo de iniciativas individuais.

Era certo que precisavam de abrigos e que estes deveriam ser construídos antes que as bombas começassem a cair. “Não duvidamos que algum dia os teremos. Desejamos apenas que não cheguem tarde demais” (PINHEIRO, 1942a, p.3). O governo estadual, juntamente com o Comando da Guarnição Federal, diante da pressão, tomou algumas iniciativas e construiu valas (ou fossos) em diversas ruas da cidade.

Em Natal, o abrigo-fôsso, aparentemente primitivo e desprotegido, é o mais aconselhado pela técnica, provado pela observação de militares e resultados em Londres, Chung-King, Malta, etc. […]. Estamos em guerra! A conservação, higiene e segurança dos abrigos públicos é uma condição de vitória, um elemento de vida ou de morte. Defenda o Abrigo Público! Talvez esteja defendendo um lugar humilde que o livrará da mutilação ou da morte! (DEFENDA o abrigo público. A República, Natal, 6 nov. 1942, p.3).

As valas eram buracos estreitos e rasos com sessenta centímetros de largura, onde podia deitar-se uma pessoa. A iniciativa do Governo foi considerada uma afronta e foi imediatamente rejeitada pelos moradores. Os protestos se manifestavam na depredação ou destruição dos buracos. Esta repercutiu no surgimento uma alternativa que encontrou boa recepção, inclusive, nas páginas do Jornal A República. Eram adaptações do modelo apresentado pelo Comando da Guarnição que utilizavam materiais de construções baratos e, embora se tratasse de uma alternativa, eram considerados tão seguro quanto os que foram construídos em concreto armado e aço: nas residências dos comerciantes locais.

A minha simpatia partiu irresistivelmente para a benemérita iniciativa do Sr. Carlos Serrano, presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio Grande do Norte, fazendo expor na sede dessa instituição, onde poderá ser observada por todos os interessados, a planta de um daqueles modestos abrigos. Não preciso muito recurso para construir um deles, e há até pessoas que os construíram dotados de comodidades surpreendentes, com uma despesa relativamente ínfima. Eles servirão da mesma forma para dar uma agradável sensação de segurança, certamente igual a que oferece o sólido abrigo de aço construído em sua residência pelo Sr. Ismael Pereira, e que tive ontem a ocasião de visitar.
Este é uma bela construção de concreto armado, revestida por dentro com uma grossa placa de aço, dotada de grande conforto, provida de todos os requisitos urgentemente solicitados no lar, de iluminação elétrica e de um sistema de ventilação natural. Felizmente tudo parece indicar que o Sr. Ismael Pereira, que dessa forma dá um exemplo digno de ser imitado, não terá necessidade de refugiar-se no seu abrigo com o pensamento dolorosamente preso à destruição e à miséria que se propagam lá fora (PINHEIRO, Rivaldo. Ainda em torno dos abrigos. A República, Natal, 19 nov. 1942b, p.11).

A proposta podia significar que os moradores da cidade tomaram para si a responsabilidade de se protegerem contra os bombardeios aéreos. As construções, a partir de meados de 1942, parece que foram adotadas por muitos setores da sociedade, fossem empresários, trabalhadores, sindicatos classistas ou escolas particulares. O Colégio Imaculada da Conceição, uma instituição de ensino para mulheres, ligada às Irmãs Dorotéias, congregação religiosa da Igreja Católica, construiu seu próprio abrigo para proteger as suas alunas In: FRANÇA. Aderbal. O Colégio da Conceição. A República, Natal, 9 mar. 1943c. Nesse meio tempo, as instruções e normas de defesas continuavam sendo divulgadas e exigidas seu cumprimento diariamente. Era uma realidade que mais parecia uma ficção, que deve ter deixado marcas profundas e precisariam ser mais bem investigadas posteriormente por outros trabalhos.

OS ESTADUNIDENSES, A BASE DE PARNAMIRIM FIELD, A BASE DE HIDROAVIÕES DE NATAL E A CIDADE

As instalações militares norte-americanas, enfim, foram a Base Marítima ou “Rampa” e a Base Terrestre Parnamirim Fiel ou “Campo”, como eram chamadas popularmente esses dois locais pela população de Natal.

Quanto às Bases Estadunidenses no Nordeste Brasileiro, tudo indica que, ainda em meados de 1943, o Governo Brasileiro continuava tratando-as como se não existissem. A imprensa nacional referia-se às bases militares estadunidenses instaladas em Natal desde julho de 1941 como de propriedade duvidosa, insinuando que estas não eram brasileiras. O Governo Federal, por sua vez, esclarecia que todas as bases no Nordeste eram brasileiras e que as Forças Armadas dos Estados Unidos estivavam utilizando-se destas instalações. O secretário do Itamaraty procurava esclarecer que o Governo do Estado Novo procedera com responsabilidade e que a condução de sua política internacional não permitia que a soberania do Estado fosse atingida por qualquer ameaça:

Posso assegurar – foram ainda palavras suas – que não existem entre o Brasil e os Estados Unidos outras bases de cooperação, que não sejam as de ordem puramente moral, decorrentes de suas afinidades e objetivos comuns nesta guerra […]… […] os Estados Unidos não têm e nunca tiveram intenção de ocupar permanentemente nenhuma base que afete o território de qualquer república americana (BASES brasileiras para a defesa da América. A MANHÃ apud A República, Natal, 13 set. 1942. p.4).

No entanto, desde 1941 que, em Natal, as Forças Armadas Estadunidenses haviam montado um escritório no centro da cidade, onde contratavam os empregados, compravam o material de construção para suas bases, abasteciam e supriam as necessidades de gêneros para seus soldados. O escritório era tido como da Panair do Brasil, porém todos pareciam saber que era onde operava a “US Army/Air Force”. Em determinados momentos, o escritório fazia “todo tipo de pagamento, […] de pessoas, variando entre 8 a 12 mil homens, […] de todo material adquirido na praça local para atender as obras de construção da Base de Parnamirim e da Rampa” (Depoimento de Rui Garcia Câmara, funcionário aposentado da Base Aérea. In: MELO, Protásio Pinheiro. Contribuição norte-americana à vida natalense. Brasília: Senado da República, 1993, p.89).

As Forças Armadas estadunidenses instalaram duas bases em Natal, a que foi utilizada pelo seu Exército e outra, pela Marinha. Ambas operavam com atividades aéreas: aviões de guerra de grande porte e com pequenos hidroaviões e navios.

Parte da Base Naval foi destinada à acomodação dos norte-americanos, assim como às instalações do Hidroporto localizado no rio Potengi, conhecido como “Rampa”, de propriedade da Air France. Dessa maneira, o dique flutuante, a barca oficina, os aviões anfíbios, os dirigíveis e os aviões de bombardeio de patrulhamento de terra, usados para proteger comboios e submarinos de combate, podiam ser vistos a partir do pacato centro da cidade do Natal. Foram ainda construídos três Quartéis na área urbana da Cidade: o Grupamento de Artilharia de Campanha, o 16º Regimento de Infantaria e o Batalhão de Engenharia de Combate, para abrigar as tropas do Exército Brasileiro: o Batalhão de Caçadores; 3o
Regimento de Artilharia Anti-Aérea; o 2o Batalhão de Carros de Combate Leve; a Companhia de Transmissão; o GEMAC; o Batalhão de Engenho (fazia parte da Infantaria); e a 7ª Companhia de Engenharia.

A Base Marítima era uma Base Aeronaval, às margens do rio Potengi, que servia de abrigo para os hidroaviões anfíbios (transportes de carga) e os “ clippers” (passageiros), além de coordenar as ações de caça aos submarinos inimigos no litoral. Ao seu redor, no bairro das Rocas, houve uma transformação violenta com a construção de cais, armazéns, casas de diversão noturna e hotéis.

Com a instalação da Base Naval no Alecrim, proíbe-se que as linhas férreas cruzem áreas militares. O trajeto sofre uma pequena alteração: ao invés da linha seguir pelo riacho do Baldo, ela desce na altura do riacho das quintas, contornando a Base Naval. O parque vira um local estratégico, onde se fazia a armazenagem e o transporte de combustível e armamentos para as forças aliadas. O leito da estrada chegou a ser preparado e algumas obras de infra-estrutura (como cortes de terrenos e aterros) foram construídas, mas abandona-se o trajeto definitivamente após o término da Guerra, pois os custos com o prosseguimento da integração não compensavam mais (Entrevista concedida pelo Engenheiro aposentado da RFFSA
Marcos Aurélio).

A Base Aérea do Exército Estadunidense, denominada Parnamirim Field, desenvolvia suas atividades dividindo a mesma pista com a Base Aérea brasileira, porém, suas instalações eram separadas e suas administrações independentes. Do mesmo modo, a Base de Hidroaviões da Marinha, que ficou conhecida como “Rampa”, ficava localizada nas proximidades da Foz do Rio Potengi, no bairro das Rocas (COSTA, 1980, p.68), e seu uso era exclusivos de seus militares.

Natal com esta vocação histórica e diante do cenário de conflito surgido com a
eclosão da Segunda Guerra Mundial é escolhida para sediar uma nova base naval.
O objetivo era garantir a defesa do litoral brasileiro neste período de beligerância.
Base Naval Almirante Ary Parreiras. Foto: arquivo da SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo

Distante 20 Km do centro, existia o Campo de Parnamirim, que foi construído em 1928 pela Air France e Lufthansa (L.A.T.I.) e, desde então, era utilizado para pouso de aviões comerciais dessas companhias. Resumia-se a poucas instalações fisícas, depósitos de Combustíveis e uma pista asfaltada.

Devido às suas condições, este local foi escolhido pelas Forças Aéreas Brasileira e Americana para suas instalações e, com isso, em setembro de 1942, foi dado início à construção de “Parnamirim Field”. O Headquarter da Força Aérea dos Estados Unidos no Atlântico Sul funcionou, de agosto de 1943 até julho de 1945, e era uma estrutura grandiosa que incluia: duas pistas de pouso com capacidade de operação irrestrita de aeronaves; doze áreas de estacionamento; dez hangares e 700 edificações (Melo, 1993). Era uma Base de trânsito e apoio para homens, armas e equipamentos, que operava em constante ampliação, 24 horas por dia, com um trânsito diário estimado em 400 a 600 aeronaves (Costa, 1980, p.79), ou com saída de 300 aviões rumo à África (Cascudo, 1980); ou com a descida ininterrupta de aviões de cinco em cinco minutos (Aldo Fernandes em depoimento). Sempre houve mistério envolvendo a Base de “Parnamirim Field”.

O Departamento de Estado Norte-Americano, por razões de segurança, nunca divulgou o número oficial de militares que nela se instalaram (Foreign Ferry News, 23/07/1943, Vol.2, No. 17). Para alguns, em “Parnamirim Field” viveu permanentemente com um contingente de 10 mil soldados americanos (Cascudo, 1980 e Pinto,1976), o que correspondia a 20% da população de Natal.

Em “Parnamirim Field”, ainda foram construídos depósitos subterrâneos para água e combustível, armazéns para grandes estoques de sobressalentes e de materiais que seriam transportados para outros destinos; um pipeline com mais de 20 Km de extensão desde o Porto de Natal e da Base Marítima da Rampa, pois eram consumidos 100 mil litros de gasolina por dia na Base; e a “Parnamirim Road”, conhecida como “a pista”, reduzia o trajeto de 3 horas para 20 minutos. Através do Jornal Foreign Ferry News, verificou-se a existência de restaurantes e cafeterias, com capacidade de servir 500 pessoas de cada vez (06/06/1943, Vol.1, p.4); uma padaria (16/06/1943, Vol.1, p.5); uma fábrica de coca-cola (18/04/1944, Vol.2, p.6); um supermercado; um hospital com disponibilidade de 178 leitos; uma biblioteca com 5 mil volumes; discoteca; sorveteria; capela para 400 pessoas; quadras de beisebol e de diferentes esportes; escritório de seguros; escritório de câmbio; teatro; clubes para oficiais e subalternos, os USO’s, tanto na Base como na Cidade; e Emissora de Rádio – USMS, com programa direto pela Columbia Broadscasting System de Nova York (Melo, 1993).

Para Smith Junior (1992, p.201), Parnamirim Field foi “a maior base aérea do Brasil e algumas vezes a de maior movimento no mundo”. O seu plano inicial previa a construção de alojamentos para 500 militares, o que se mostrou insuficiente logo no início de seu funcionamento. Quando esta dificuldade foi constatada, “um novo plano foi proposto, no qual constava um projeto para a construção de alojamentos para 2.500 pessoas” (SMITH JUNIOR, 1992, p.80). De qualquer maneira, a demanda foi aumentando progressivamente e foram sendo construídos mais “barracos” à medida que o contingente ia chegando. Em verdade, as instalações construídas pelos estadunidenses em Parnamirim eram improvisadas (COSTA, Fernando Hippólyto da. História da base aérea de Natal. Natal: Editora Universitária, 1980).

Para Melo (1993), a construção da base foi iniciada em setembro de 1941, quando o material e os primeiros militares estadunidenses chegaram à cidade e estes se fixaram como moradores. Embora só tenha tido condições de funcionamento como Base Aérea em 22 de agosto de 1942, foi a partir de sua existência e da natureza de suas operações dentro da guerra, que foram criadas as condições para que os Estados Unidos instalassem o Quartel-General do Atlântico Sul em Parnamirim.

Apesar da construção das bases serem anteriores a 1942, elas começaram a ser amplamente divulgadas apenas nesse ano. O “A República” de 6 de Março, que publicou nota com “O decreto que criou a base aérea de Natal”, saído no diário oficial ao dia 5 do mesmo mês:

Fica criada a base área de Natal, que será guarnecida, inicialmente, com um corpo de base aérea de terceira classe. Os elementos que se tornem necessários para a constituição dêsse corpo de base área serão recrutados ou transferidos de outras unidades da FAB. A companhia de infantaria de guarda, sediada em Nata, passa a fazer parte do efetivo desta base área.

O primeiro oficial do Exército dos Estados Unidos chegou a Natal em dezembro de 1941, sendo conselheiro militar do Programa de Desenvolvimento dos Aeroportos a diplomata, oficial de operações e anfitrião das celebridades em trânsito, hospedando-se no Grande Hotel em sua chegada, ato comum entre os oficiais e patentes superiores que passaram pela cidade nesse período de guerra (SMITH JR, 1992).

Quando a Base de Parnamirim Field entrou em operações, existia “cerca de 700 barracos e outras obras menores” (COSTA, 1980, p.68), onde se previa abrigar 2.700 soldados, além dos alojamentos fixos para 1.800 oficiais e 178 leitos do Hospital de Base. Algumas informações a respeito da Base Aérea Norte-Americana parecem imprecisas, talvez em função dos segredos que a cercavam ou da inexatidão como os dados eram registrados. Na historiografia, determinados aspectos são citados de maneira a se contradizerem. Por exemplo, o registro no número de edificação, para Smith Junior (1992, p.106) eram “243 edificações de várias formas e tamanhos”. Porém, no auge do seu funcionamento, que pode ter sido em novembro de 1942, a Base hospedava cerca de “cinco vezes mais o total previsto”. As informações a este respeito são imprecisas, no entanto, em determinadas ocasiões, a Base de Parnamirim Field pode ter alojado em torno de 15 a 20 mil soldados estadunidenses e, nestas ocasiões, eram “armadas barracas de campanha em toda a área disponível, cada uma abrigando cerca de 10 homens” (COSTA, 1980, p.78).

Construção da base pelo fotografo da Revista Life Hart
Preston.
AVIÃO POUSANDO DURANTE A CONSTRUÇÃO DA BASE AÉREA DE PARNAMIRIM. FOTO: HART PRESTON, 1941
Fotos do início da construção de Parnamirim Field. Arquivo: LIFE
Campo de pouso na base de Parnamirim.
Em termos estratégicos, Parnamirim Field foi a base de um triângulo que apontava para o teatro de operações (o norte da África e o sul da Europa), onde a sorte dos aliados contra os nazistas estava sendo lançada. Este triângulo era identificado nos mapas estratégicos norte-americanos como Trampoline of Victory (trampolim da vitória). Mas foi somente em outubro de 1946, dezessete meses após a rendição alemã, que a Base Leste foi entregue à Força Aérea Brasileira. No mesmo ano foi inaugurada a Estação de Passageiros da Base Aérea de Natal, elevada à condição de Aeroporto Internacional Augusto Severo, em 1951.
Parnamirim Field (Base Aérea de Parnamirim). Fonte: Smith Junior (1992, p.127).
A instalação da Base Norte Americana e a chegada das tropas na capital, no ano de 1942, além da entrada de uma grande leva de imigrantes na cidade – atraídos pelo “progresso econômico” evidenciado pelas novas ofertas de emprego e pelo aumento do dinheiro circulante – resultaram em um considerável crescimento populacional de Natal.
Fotografia vintage de 1944, homens alistados na Base Aérea de Natal Messhall, em Natal, Brasil. Esta instalação aérea teve um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como uma base estratégica para aeronaves que voavam entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.
Fotografia vintage de 1944, Teatro do Exército na Base Aérea de Natal em Natal, Brasil. Esta instalação aérea teve um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como uma base estratégica para aeronaves que voavam entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.
Fotografia vintage de 1944, Soldado em Frente à Capela da Base Aérea de Natal em Natal, Brasil. Esta planta desempenhou um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como uma base estratégica para aeronaves voando entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.
Foto vintage 1944, Soldado em frente ao refeitório do oficial na Base Aérea de Natal em Natal, Brasil. Esta planta desempenhou um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como uma base estratégica para aeronaves voando entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.
Foto vintage 1944, Soldado em frente ao Post Natal na Base Aérea Exchange em Natal, Brasil. Esta planta desempenhou um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como uma base estratégica para aeronaves voando entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.
Fotografia vintage de 1944, Teatro do Exército na Base Aérea de Natal em Natal, Brasil. Esta instalação aérea teve um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial como uma base estratégica para aeronaves que voavam entre a América do Sul e a África Ocidental. Fonte: fotografia original.
Portão em Parnamirim Field, guarnecido por brasileiros e americanos
Quartel-General Estadunidense do Atlântico Sul, localizado em Parnamirim. Fonte: Smith Junior (1992, p.215). Na foto, oficiais brasileiros em visita a base americana. O prédio original foi demolido, restando apenas as fundações.
Uma nova estrada foi aberta e pavimentada, em apenas seis semanas, ligando o porto de Natal a Base, para agilizar o transporte de cargas. A conta de todo o projeto foi paga pelo governo dos Estados Unidos. Seis mil trabalhadores se revezaram dia e noite, a um custo 9,5 milhões de dólares, para concluir os trabalhos.

Por sua vez, a Base de Hidroaviões de Natal, a “Hidrobase da Rampa” também dispunha de uma infra-estrutura significativa. Em parte, os edifícios da base foram adaptados a partir do que existia anteriormente.. Era conhecida popularmente como “Rampa” porque as empresas comerciais que ali operavam, haviam construído uma rampa para que os seus hidroaviões tivessem acesso ao hangar, onde ficavam estacionados (CASCUDO, Luís da C. História da Cidade do Natal. Prefeitura do Município de Natal, 1947. 3. ed. Natal: RN Econômico, 1999, p.421). Em data não identificada pela pesquisa, esta área foi desapropriada pelo Governo Brasileiro e cedida à Marinha dos Estados Unidos que, entre 1941 e 1942, ampliou suas instalações, particularmente as rampas e os hangares, e dotou o local de uma “capacidade para operações ilimitadas de bombardeios médios de patrulha, tipo anfíbio, ou outras aeronaves anfíbias de peso bruto equivalente” (COSTA, 1980, p.85).

O Governo dos Estados Unidos financiou todas as ampliações da Rampa, que eram: um terminal de passageiros; paiol de munições; estacionamento pavimentado – com cerca de 45 mil metros quadrados –; depósitos de suprimentos; lavanderia; frigorífico; posto de correio; supermercado ou PX; usina “diesel-elétrica”; além do cais flutuante para ancoragem das aeronaves e alojamentos (MELO, 1993, p.93).

Obras do porto e Rampa dos hidroaviões por fotografo da Revista
Life Hart Preston
Sequência de fotos do momento de embarque|desembarque de passageiros na Rampa. Os hidroaviões amerissavam no Rio Potengi, que funcionou como hidrobase entre 1922 e 1945, até o final da Segunda Guerra Mundial. O primeiro aeródromo de Natal surgiu em 1927, mas era localizado no atual município de Parnamirim, distante cerca de vinte quilômetros da cidade de então, e só vai ter um papel realmente fundamental com a Segunda Guerra Mundial, quando se torna uma importante base aérea norte-americana e brasileira.
Localizada à margem direita do Rio Potengi, a Antiga Base de Hidroavião conhecida como A Rampa, é um lugar repleto de significados históricos. Local de chegada dos aviões da Panair do Brasil, na década de 30 do século passado. Exerceu, também, importante papel durante a Segunda Guerra Mundial, servindo de
base para os aviões de patrulha da Marinha Americana (NESI, 1994).
Pátio da Rampa e seus hidroaviões. Fonte das fotos – U.S. Navy
Embarque. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Desembarque. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Um piloto da U.S. Navy e seus óculos Ray-Ban. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Natal em uma das principais rotas aéreas durante a Segunda Guerra Mundial, o “Trampolim da Vitória”. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Hidroavião subindo a rampa. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Hidroavião na água. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Flutuante da Panair, onde os hidroaviões eram amarrados. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Os barcos típicos do rio Potengi. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Decolagem no rio Potengi. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Um hidroavião Martin PBM Mariner sendo baixado para o Rio Potengi pela rampa existente na Naval Air Station Natal (NAS Natal), local hoje conhecido simplismente como Rampa. Fonte das fotos – U.S. Navy.
Natal, 1943, instrutor americano ensinando a mecânica de motores de um PV-1 Ventura, durante os famosos cursos do USBATU (United States Brazil Trainning Unit).
Natal em 1943.
Na década de 1940, II Guerra Mundial em curso, base de forças americanas instalada em Parnamirim, vai ser das Rocas que será bombeado o combustível necessário às aeronaves que cruzavam o Atlântico para a conquista do norte da África. Dali, os aliados retomariam o sul da Europa, dominado pelo Eixo. Em menos de um mês, seis mil homens construíram o gasoduto de vinte quilômetros de extensão, Pipe Line a cruzar a cidade para abastecer com combustível depósitos do Parnamirim Field. Finda a guerra, Pipe Line foi desativada.

ACIDENTES AÉREOS

Lendas sobre navios e aviões supostamente existentes no fundo dos mares do nordeste, existem muitas. Há quem assegure até ter visto um B-17 americano amerissar em frente à Praia dos Artistas em Natal embora, em local algum exista comprovação do fato.

Já ouvimos, também, alguém afirmar que uma carcaça de embarcação existente no Potengí, do lado da Redinha, seria de um submarino alemão da Primeira Guerra Mundial ! Pois é… a propensão ao chute é universal. Basta alguém dar a partida que a coisa vai longe. Mas é claro que com toda aquela movimentação em Parnamirim durante a II Guerra, os acidentes ocorreram e em quantidades apreciáveis.

Na travessia pelo “corredor” para a África, são incontáveis os aviões desparecidos e, em terra, episódios semelhantes também foram inúmeros, principalmente nas rotas Trinidad-Belém e Belém-Natal, onde a intertropical cobrava pesado tributo aos inexperientes aviadores americanos.

Por essas e outras, é que, sem dar muito crédito, começamos a pesquisar rumores sobre a existência de aviões afundados na barra do Rio Maxaranguape, ao norte de Natal, e na Baía da Traição na Paraíba (cerca de 50 milhas ao Sul de Natal). Com respeito ao primeiro, realmente não houve muita dificuldade. Há registro detalhado de um Catalina americano que caiu ao norte do Potengi em junho de 1943, quando chegava, com outros cinco aparelhos do Esquadrão VP-83 da US Navy vindos de Belém.

Na Baía da traição uma expedição particular encontrou destroços que levou a conclusão ser de um PV-1 Ventura da US Navy e que o acidente ocorrera em tempo de guerra. A US Navy operou durante a Guerra cinco Esquadrões de Ventura no Brasil, que se alternaram entre as Bases do Pici em Fortaleza, Parnamirim, em Natal, Ibura, no Recife e Ipitanga, em Salvador.

Em determinado momento da guerra, a cidade de Natal passou a conviver com as constantes quedas de aeronaves, o que também despertou a atenção dos militares americanos que operavam os aviões a partir da base aérea de Parnamirim Field. Após investigações, os americanos chegaram a prender um natalense que trabalhava como civil dentro da base, acusando-o de colocar açúcar no tanque de combustível, o que teria provocado a queda e a consequente morte dos militares a bordo.

De fato, o acidente ocorreu e teve um natalense preso, porém nunca comprovaram a história do açúcar. Esta pessoa ficou algumas horas (ou dias) detida e foi liberada, mas nunca conseguiu se livrar do rótulo. Sabe-se que ele deixou a cidade e foi visto anos depois na Bahia.

B-24 Naval acidenta-se em Parnamirim Natal – RN.
A foto ilustra militares americanos ao lado de
destroços de um avião de guerra que caiu na praia de Genipabu.

A CONFERÊNCIA DO POTENGI

Os poucos agentes do Eixo em Natal foram presos ou transferidos para fora do Estado, o refletor disso tudo, foi o encontro do Presidente Franklin D. Roosevelt e o Presidente Getúlio Vargas, o episódio marcando como Conferência do Potengi, ficou conhecido o selo do acordo entre os países, se deu no retorno do presidente Roosevelt da Conferência de Casablanca, sendo o encontro protagonizado em Natal ao dia 28 de janeiro de 1943 (SMITH JR, 1992).

O dia 28 de janeiro de 2022 marcou os 79 anos da Conferência do Potengi, quando os presidentes brasileiro e americano, Getúlio Vargas e Franklin Delano Roosevelt, respectivamente, se encontraram em Natal, no ano de 1943, para discutir os rumos dos seus países na segunda guerra mundial.

O Brasil e os Estados Unidos estreitavam de vez os laços entre os países. No fim de janeiro de 1943, em Natal, no Rio Grande do Norte, Getúlio Vargas, então presidente brasileiro, e Franklin Roosevelt, presidente americano, se encontram em plena Segunda Guerra Mundial para fechar os acordos entre as duas nações, entre eles o envio de uma força militar aero-terrestre constituída na sua totalidade por 25.834 homens e mulheres da Força Expedicionária Brasileira (FEB) para combater na Europa. A reunião, denominada Conferência do Potengi, em referência ao rio Potengi, que margeia parte da capital potiguar. A primeira tropa da FEB embarcou para lutar na Itália em junho de 1944.

O que pouca gente sabe é que a primeira vez que um presidente americano fez viagem oficial em uma aeronave foi a que passou por Natal, na volta de Casablanca, no norte da África, onde havia conferenciado com o primeiro ministro Winston Churchill.

Natal. Manhã de 28 / jan / 1943. Um enorme barco voador camuflado com libré da Marinha dos EUA pousou suavemente nas águas do rio Potengi. Eram 07:50. O avião gigante com envergadura de 152 pés e comprimento de 106 pés tinha dois níveis, três lemes e quatro motores.

Os cidadãos de Natal que já viviam mais perto da Guerra Mundial estavam acostumados com o rugido dos aviões militares que pousavam e decolavam no rio. No entanto, essa aeronave era um pouco diferente em seu indicativo, não um logotipo do Esquadrão ou uma insígnia da Marinha, mas as letras NC 18605 na cauda, ​​Pan American Airways na fuselagem e duas grandes bandeiras americanas no nariz e no leme central.

Na chegada, após alguns procedimentos incomuns, um barco veio buscar os passageiros que partiram às pressas para o USS Humboldt, atracados em um píer próximo, em vez da recentemente aberta estação de passageiros Panair do Brasil, um edifício novo com arquitetura em 8 arcos, uma atracação cais para os Barcos Voadores e uma torre de observação no terceiro andar. Aquele edifício de passageiros é agora o famoso “Prédio da Rampa”. 25 minutos se passaram quando outro barco voador da mesma cor, mas com um número de cauda diferente NC 18604, aterra com um motor emplumado. Agora, as coisas pareciam suscitar suspeitas de que algo incomum estava acontecendo. O presidente americano ficou alojado a bordo do Humboldt e ao meio-dia almoçou com Vargas.

Esses aviões eram dois Boeing B-314 Clippers da Pan American Airways requisitados pela marinha dos EUA para executar a SM 71, Missão Especial 71, com o principal objetivo de transportar o Pres. Franklin Delano Roosevelt, da Conferência de Casablanca, para uma cúpula com o Pres. Getúlio Vargas, em Natal, antes de partir para Miami, de onde a comitiva, que incluía Harry Hopkins, o Contra-Almirante R. McIntyre e o Capitão J. McCrea, seguiria de trem para Washington. A missão SM 71 começou em Bathurst, na Gâmbia britânica. Os aviões tinham tripulantes pan-americanos em uniformes da US Navy Reserve, o NC 18604 batizado como Atlantic Clipper foi pilotado por Richard Vidal e NC 18605, o Dixie Clipper foi pilotado por Howard M. Cone Jr e teve como co-piloto Frank J. Crawford.

Cada avião carregava 10 tripulantes. O “Dixie” carregava o Pres. Roosevelt e 8 assessores. Esse mesmo avião já havia feito história quando, em 1939, abriu voos regulares da América do Norte para a Europa. Os passageiros VIP desfrutaram inicialmente de um voo turbulento, até que os pilotos foram obrigados a descer a uma altitude mais baixa, quase 1000 pés, pelo resto da rota, compreendendo 2.962 km (1841 milhas) até Natal.

Quando o litoral brasileiro apareceu, um vazamento de óleo foi observado na aeronave NC 18604 no Motor nº 3 e, diante da situação, o engenheiro de vôo Donald R. Fowler recomendou ao piloto que desligasse o motor e ficasse com a hélice emplumada. Depois de partir de Bathurst às 11h36, horário local, em 27 de fevereiro de 1943, a aeronave ganhou 3 horas na travessia do Atlântico devido a ventos de cauda muito favoráveis.

O NC18604, que partiu antes, chegou a Natal 25 minutos depois, devido ao motor emplumado e aterrissou após o NC 18605. Mas mais alguns desenvolvimentos estavam a caminho. Afinal, onde estava o presidente brasileiro Vargas? O mesmo teria uma cúpula com o presidente Roosevelt em Natal.

Em absoluto segredo, ele já havia pousado nas primeiras horas de 28 th , em um vôo que partiu do Rio de Janeiro com as autoridades militares norte-americanas entre eles Adm. Ingram, comandante da Quarta Frota, e o embaixador americano Jefferson Caffery. No final da manhã do dia 28, a equipe do Presidente Vargas anunciou sua presença quando estava a bordo do USS Jouett. As notícias agitaram a cidade.

O presidente Getúlio Vargas desembargou em Natal no dia 28 de janeiro de 1943, a 1h da madrugada. Já o presidente norte-americano Franklin Roosevelt chegou às 7h30. Os dois ficaram hospedados em navios que estavam atracados no rio Potengi. Roosevelt voltava de Casablanca (África), onde tinha se encontrado com o primeiro ministro britânico Wiston Churchil, enquanto o brasileiro vinha do Rio de Janeiro, orientado pelo ministro de relações exteriores, Oswaldo Aranha, a oferecer o envio de tropas para o conflito armado, como prova de maior envolvimento do País. Os americanos já mantinham base na cidade desde 1941.

O encontro histórico ocorreu no final da manhã do dia 28, quando Vargas e Roosvelt almoçaram juntos, acompanhado de diversas autoridades militares. Logo em seguida, eles seguiram de barco pelo rio. Após sair do porto, que fica na Rua Chile, o Roosevelt conheceu a Rampa, base militar dos Estados Unidos que foi instalada na cidade, cenário da fotografia imortalizada, com os dois sobre o “Jeep 7” e os arcos da Rampa ao fundo, dando início a inspeção de todas as instalações militares americanas existentes na cidade, como a base de hidroaviões da Marinha dos Estados Unidos, hoje 17º Grupamento de Artilharia e Campanha (17º GAC) e Parnamirim Field, atualmente Base Aérea de Natal (Bant), acompanhados pelo interventor Fernandes, o Almirante Parreiras o Brigadeiro do Ar, Eduardo Gomes.

A visita foi curta, apenas um dia, em 28 de janeiro de 1943, mas o clima do encontro foi particularmente amigável e a depois chamada “Conferência de Natal” rendeu uma foto histórica em que os presidentes aparecem às gargalhadas, a bordo de um jipe, onde até o oficial que serve de motorista também sorri.

Na boca miúda, corria a versão de que ele teria perguntado onde seria o almoço, e alguém mencionou o Maria Boa, famoso bordel da capital. Tudo especulação, “of course”.

Talvez essa foto nunca tenha sido vista por Roosevelt, pois seu fotógrafo oficial tirou outra, mais sisuda, que representa os presidentes no mesmo jipe. O presidente americano achou essa imagem boa o suficiente para resolver mandar uma cópia para seu colega, no Rio de Janeiro, que havia encontrado anteriormente por um único dia, em 1936. Roosevelt faz sobre a foto uma dedicatória cordial ao seu “velho amigo” Vargas, e a envia com uma carta em papel oficial da Casa Branca, ambas reproduzidas nesta página.

A população da cidade, naturalmente, envolveu-se com o que acontecia com os militares estadunidenses. Esta era dia-a-dia seduzida pelas novidades que estes colocavam, inclusive, à disposição nos supermercados das suas bases. Entre tantos acontecimentos, em janeiro de 1943, a população da cidade também foi surpreendida pela visita dos presidentes Franklin Roosevelt e Getúlio Vargas, cujo encontro ganhou repercussão nacional e, posteriormente, na historiografia brasileira sobre a Segunda Guerra Mundial.

Bom, a cidade, então, tomou conhecimento de que havia qualquer coisa de anormal, qualquer coisa de extraordinário. Os dois presidentes passavam pelas ruas de Natal naquele jipão enorme. E na volta, já depois da Conferência, o presidente Roosevelt voou para os Estados Unidos, de avião. Ele usou o hidroavião para a travessia do Atlântico, mas aqui ele ia voando em aviões. Talvez lhe fosse mais conveniente. E Getúlio, também de lá, tomou o avião e voltou para o Rio de Janeiro (LIRA, Carlos (Coord.). Memória viva de Américo de Oliveira Costa. Natal: EDUFRN, 1998. Memória Viva, p.29-30).

Voltaram à Rampa em um sedã preto pela Praça Pedro Velho, quando ambos foram vistos pela autora brasileira Lenine Pinto, que escreveu vários livros sobre esse período. Com o inesperado mau funcionamento de um Atlantic Clipper, a Marinha dos EUA ordena que outro substitua, o American Clipper, mas Roosevelt não pôde esperar. Nas primeiras luzes da manhã de 29 / fev / 43, a comitiva presidencial parte às 05:10 para o Campo Parnamirim, onde dois Douglas C-54 os esperam por um longo vôo para Trinidad, onde dois Clippers dariam a perna final para Miami.

Às 16:35 em Jan 30 1943, ambos os Clippers pousou suavemente em Miami, de onde partiu em janeiro o 11 º no SM 70 para essa viagem longa histórica para o Norte de África e no Brasil, cujo primeiro destino foi Bathurst (British Gâmbia) via Porto de Espanha, Trinidad e Belém, Brasil. Missão cumprida.

Entre os assuntos tratados no encontro, estavam a proteção do Atlântico Sul e o incremento da produção da borracha e outros insumos na Amazônia, fundamental para a fabricação de material bélico pelos Estados Unidos. Também discutiram uma participação mais efetiva do Brasil no combate. Eles visitaram as obras da base aérea de Parnamirim e do porto de Natal, utilizados pelos norte-americanos para envio de aeronaves e suprimentos para os frontes na África e Ásia.

Nessa diplomacia, a potência mundial ganhou trânsito num pedaço privilegiado de um planeta em pé de guerra, e o Brasil, capital para financiar a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), catapulta para a industrialização no país.

Os presidentes divulgaram uma declaração conjunta, onde afirmavam: “Tivemos ocasião de estudar a segurança das Américas. Estamos convencidos de que cada uma das repúblicas americanas está nela igualmente atingida e interessada. A força está na unidade”.

Até aquele momento, a Argentina era o único país do continente que não se havia posicionado ao lado dos Estados Unidos na guerra contra os países do Eixo. O país se manteria oficialmente neutro até praticamente o fim do conflito.

O encontro também resultou na transformação da Rampa em uma base aérea militar utilizada durante a Segunda Guerra Mundial sendo utilizada até 1944. A Rampa é uma antiga estação de passageiros e de transporte de correspondências, utilizada como base para receber hidroaviões. Seu posicionamento estratégico, em Natal, Rio Grande do Norte, a tornou de indubitável valor durante o transcorrer da Segunda Guerra Mundial, na década de 40, quando veio a se tornar a primeira base a operar missões da guerra na América do Sul.

É importante destacar que, neste período, transitava em Parnamirim Field “uma média de 800 aviões por dia” (SMITH JUNIOR, 1992, p.209) e nas suas instalações ficavam armazenados centenas de aparelhos e equipamentos de guerra, que aguardavam o momento para serem embarcados para as frentes de batalhas na Europa (HÁ UMA GRANDE unidade de vista e pensamento entre as forças armadas e o povo de Natal: o interventor Rafael Fernandes fala à imprensa, no Rio. A República, Natal, 4 mar. 1943, p.1).

Em que pese toda a divulgação desse encontro, o Jornal A República (TIVEMOS ocasião de estudar a segurança das Américas: os assuntos abordados na Conferência de Natal – Os problemas da Guerra – o esforço bélico conjunto do Brasil e dos Estados Unidos – Declarações aos eminentes chefes de estado. A República, Natal, 30 jan. 1943, p.1) deu destaque ao fato de que o Presidente estadunidense declarou que o seu país não considerava mais a possibilidade de ataque nazista às Américas. Porém, posteriormente, o Presidente Vargas, em entrevista dada na cidade do Rio de Janeiro, voltou a enfatizar o fato de que os países aliados ainda continuavam empenhados “para uma guerra longa, não querendo manter assim demasiado otimismo, pois na guerra há imprevistos” (POSSO asseverar que foi completo o nosso acordo: presidente Getúlio Vargas transmite aos jornalistas a impressão geral da sua conferência com o presidente Roosevelt em Natal – Ressaltado por S. Excia. O espírito de cooperação entre brasileiros e americanos. A República, Natal, 31 jan. 1943, p.1). A partir de então, inferiu-se ter sido esta a razão porque os analistas locais, apesar do alívio que deixavam transparecer nas páginas do Jornal local, voltaram a escrever sobre a necessidade de a população da cidade continuar em estado permanente de alerta.

Boeing B-314 Dixie Clipper que trouxe Roosevelt ao Brasil em 1943. Pouso no Rio Potengi.
Natal. Manhã de 28 / jan / 1943. Um enorme barco voador camuflado com libré da Marinha dos EUA pousou suavemente nas águas do meuip rio Potengi. Eram 07:50. O avião gigante com envergadura de 152 pés e comprimento de 106 pés tinha dois níveis, três lemes e quatro motores.
Os cidadãos de Natal que já viviam mais perto da Guerra Mundial estavam acostumados com o rugido dos aviões militares que pousavam e decolavam no rio. No entanto, essa aeronave era um pouco diferente em meuip seu indicativo, não um logotipo do Esquadrão ou uma insígnia da Marinha, mas as letras NC 18605 na cauda, ​​Pan American Airways na fuselagem e duas grandes bandeiras americanas no nariz e no leme central.
Oficiais alinhados no Parnamirim Field para inspeção por Roosevelt e Vargas em janeiro de 1943. Foto gentilmente enviada por William DeArmond.
Getúlio Vargas (esq.) e Franklin D. Roosevelt conversam a bordo de um destróier americano USS Humboldt, em Natal, em 1943. A faixa preta no braço Roosevelt era um luto pelo filho que havia morrido na guerra.
De L. a R. Presidente dos EUA Assistente Especial Harry Hopkins, Pres. Vargas montar loja virtual e Pres. Roosevelt ficou do lado de seu embaixador no Brasil Jefferson Caffery.
Presidentes dos Estados Unidos e do Brasil. Fonte: Smith Junior (1992, p.95).
Os dois presidentes vistos no jipe. No banco de trás, o presidente Vargas está ao lado do vice-almirante Ingram, o quarto comandante da frota.
Pres. Roosevelt é visto no “Jeep 7” e no banco de trás é visto no Pres brasileiro. Vargas ficou do lado do almirante Jonas Ingram. Ambos os presidentes fizeram uma excursão no Parnamirim Field e em outras instalações militares, incluindo o hidroavião “Ramp”. Vargas e Roosevelt passaram o dia 28 juntos, depois de visitarem primeiro o Esquadrão VP-74, que ficava na antiga parte alemã da Rampa, base do Condor Syndikat, companhia aérea alemã no Brasil até 1939, ao lado das instalações da Panair do Brasil. De lá, a carreata foi inspecionada em estabelecimentos militares brasileiros e americanos, culminando com a visita ao Campo de Parnamirim, e o Comando de Transporte Aéreo da Sede do ATC, asa do Atlântico Sul, incluindo o Esquadrão VP-83, que alguns dias antes havia afundado o primeiro U-boat nas águas brasileiras, U-164.
Pres. Roosevelt é visto no “Jeep 7” e no banco de trás é visto no Pres brasileiro. Vargas ficou do lado do almirante Jonas Ingram. Ambos os presidentes fizeram uma excursão no Parnamirim Field e em outras instalações militares, incluindo o hidroavião “Ramp”. Vargas e Roosevelt passaram o dia 28 juntos, depois de visitarem primeiro o Esquadrão VP-74, que ficava na antiga parte alemã da Rampa, base do Condor Syndikat, companhia aérea alemã no Brasil até 1939, ao lado das instalações da Panair do Brasil. De lá, a carreata foi inspecionada em estabelecimentos militares brasileiros e americanos, culminando com a visita ao Campo de Parnamirim, e o Comando de Transporte Aéreo da Sede do ATC, asa do Atlântico Sul, incluindo o Esquadrão VP-83, que alguns dias antes havia afundado o primeiro U-boat nas águas brasileiras, U-164.
Presidente Roosevelt de bom humor, enquanto vice-almirante Ingram balança de rir.
Por outro ângulo é possível ver o oficial da Marinha ao lado de Vargas.
Documento do Governo dos EUA no qual não aparece o nome do motorista nem do oficial que ia atrás. Na foto o Presidente Roosevelt está no carro, enquanto o Presidente Vargas é visto atrás.
Jornais brasileiros e americanos encabeçam a montar loja virtual reunião entre os dois presidentes de Natal.
Jornais brasileiros e americanos encabeçam a montar loja virtual reunião entre os dois presidentes de Natal.
Há alguns anos a cena é remontada pelos integrantes da Fundação Rampa, criada em 2001 para preservar as edificações da antiga base de hidroaviões remanescente do início da década de 40.
“É importante não só para a cidade, como para o mundo. A aviação de cargas e passageiros do Brasil surgiu neste local”, diz Marcelo Azevedo, que interpreta Franklin Roosevelt.

A PRIMEIRA DAMA DOS EUA EM NATAL

Eleanor Roosevelt falou vigorosamente em favor da política externa de seu marido. Depois que os Estados Unidos entraram formalmente a Segunda Guerra Mundial em dezembro de 1941, ela fez várias viagens ao exterior para impulsionar os espíritos de soldados e de inspecionar as instalações da Cruz Vermelha.

Eleanor Roosevelt visitou o Brasil entre 14 e 17 de março de 1944, onde visitou Belém, Natal e Recife. Na capital potiguar ela visitou a Base de Parnamirim, esteve com autoridades locais. Esteve na sede do USO, o clube de recreio dos militares americanos, que ficava na praça Augusto Severo, por trás da antiga Rodoviária, no bairro da Ribeira. Ali ela foi reconhecida e ovacionada por muitos natalenses. Esteve também na Base Naval de Natal, onde elogiou as instalações.

Um fato interessante foi que para os jornalistas a Sra. Eleanor Roosevelt afirmou (e assim foi reproduzido) que a base aérea de Parnamirim era “A mais bem equipada do Mundo”. Mesmo reproduzindo o que ela disse, os jornalistas locais claramente se empolgaram e lascaram em letras destacadas “A maior base do Mundo”. E parece que a coisa pegou.

O jovem jornalista Aluízio Alves entrevistou a 1 dama americana Eleonor Roosevelt que esteve em Natal para pedir votos aos soldados para reeleição do marido. Ele ficou impressionado com a sua aparência pouco atrativa.

Condecorando oficiais da US Navy em Parnamirim Field

A BATALHA DO ATLÂNTICO SUL

Quando o Ministério da Aeronáutica foi criado, em 20 de janeiro de 1941, o Decreto-Lei N° 2.961 já citava a criação da “Forças Aéreas Nacionais”, que deveriam reunir aeronaves e militares das aviações da Marinha e do Exército Brasileiro. Em 22 de maio daquele ano, um novo Decreto-Lei, N° 3.302, mudou a denominação da arma aérea, que passaria a se chamar “Força Aérea Brasileira”.

Exatamente um ano depois, a FAB já mostraria a sua razão de existir e teria o seu batismo de fogo. Em 22 de maio de 1942, um avião B-25 atacou com bombas o submarino Barbarigo, da marinha italiana.

Com 73 metros de comprimento, velocidade de até 30 km/h, dois canhões de 100mm, quatro metralhadoras e oito tubos para lançamento de torpedos, o Barbarigo havia atacado o navio brasileiro Comandante Lyra quatro dias antes. Era a oitava embarcação do País atingida pelas forças do Eixo, mesmo antes da entrada do Brasil na guerra.

Ao longo de três anos, 71 embarcações foram atacadas em águas brasileiras por submarinos inimigos. No total, o país perdeu mais de 30 navios ao redor do mundo na batalha do Atlântico Sul, a maior parte deles no próprio litoral, a um custo de quase 1.500 vidas. A declaração de guerra veio em agosto de 1942, quando o submarino alemão U-507 afundou seis navios e matou 627 pessoas em apenas três dias.

Com apenas um ano de criação, e em fase de reestruturação, a Força Aérea Brasileira foi convocada para patrulhar o litoral brasileiro. “A guerra submarina, perversa e implacável, prossegue num crescente vertiginoso”, escreveu Ivo Gastaldoni, piloto de patrulha da Força Aérea e veterano da Segunda Guerra.

No esforço de guerra, o Brasil criou novas bases aéreas, recebeu equipamentos e treinamento por meio de convênio firmado com os Estados Unidos. Unidades aéreas americanas foram enviadas ao país. A instrução em voo era feita sobre o mar para que as tripulações já pudessem vigiar as águas brasileiras, com artilheiros com o dedo no gatilho, prontos para atirar. Nascia a aviação de patrulha.

As dificuldades eram de toda ordem: de língua, de auxílios para instrução, além das ordens técnicas e manuais de operação em inglês, ininteligíveis para 90% do pessoal. Some-se a isso a heterogeneidade de pilotos e mecânicos e pode-se ter uma visão do quadro caótico”, escreveu Gastaldoni, ao falar do início dos trabalhos com as tripulações.

Na medida em que a recém-criada aviação de patrulha da FAB aumentava sua eficiência no Nordeste, os submarinos inimigos iam descendo para sul do país. Agora, aeronaves Catalina ajudavam nos combates. Unidades americanas, espalhadas de norte a sul, apoiavam a campanha. No dia 31 de julho de 1943, o então Aspirante Alberto Martins Torres foi o primeiro brasileiro a afundar um submarino, a apenas 87 Km ao sul do Pão de Açúcar, cartão-postal do Rio de Janeiro.

Na guerra contra os submarinos, os pilotos brasileiros realizaram cerca de 15 mil patrulhas. Onze submarinos (veja arte) foram atingidos, mas um número maior de ataques ocorreu, não tendo sido possível a confirmação de avarias. Dos cerca de 3.000 navios mercantes afundados na Segunda Guerra, mais de 50% foram vítimas de submarinos.

Durante a Campanha Antissubmarino no Litoral do Brasil (1941-1945) o Consolidated Vultee PB4Y-1 107-B-4, “Macahyba Maiden” teve grande destaque, apÓs a “Donzela” (Maiden) afundar seu primeiro submarino, ela não era mais virgem, e, consequentemente, foi modificado para Macahyba “Madam” (senhora). Este avião foi usado para afundar dois submarinos U 598 e U 848. Machyba era uma cidade pequena perto do campo de pouso de Parnamirim Field, e assim fora dos limites para militares. O prefeito desta cidade enviou uma carta ao esquadrão para agradecer por nomear este avião.
Linha de vÔo em Parnamirim Field, Natal, em 1943, onde aparecem 7 PB4Y-1 Liberators do VP-107 e um PV-1 Ventura. A segunda aeronave na linha É o “Macahyba Maiden”.
O “Macahyba Maiden” e sua tripulaÇão em Natal, 1943.
Avião Catalina dos Estados Unidos na Base Aérea de Natal embarcando tripulantes do submarino alemão U-598, afundado no litoral do Rio Grande do Norte dia23/7/1943 – Foto/Fonte – Blog Nilson Montoril – Arambaé
Pontos de localização dos embates entre submarinos do eixo e aviões brasileiros.
Vatalina
Navio torpediado
Formação de B-25 brasileiros em patrulha

A ESTRATÉGIA MILITAR PARA O ENTRETENIMENTO

A partir de então, o comando das forças militares brasileiras em Natal demonstrou que pretendia continuar o estado de guerra e de alerta máximo para a população, assim como davam a impressão de que passava a ser uma necessidade ocupar o tempo livre dos soldados militares sitiados na cidade. Para Coogan (James Alan Coogan, diretor da United Press no Brasil, deu uma entrevista falando sobre uma viagem jornalística que fez ao aeródromo de Parnamirim, cuja divulgação foi feita pela Agência Nacional. In AS IMPRESSÕES do Diretor da United Press: o espírito de camaradagem no aeródromo de Parnamirim. A República, 25 fev. 1943, p.3), este aspecto estava “sendo um dos principais problemas a resolver [tendo] em vista da localização do aeródromo”. Em Parnamirim, o contingente aquartelado já dispunha de

[…] rádio de ondas curtas, jogos de cartas, cinema, no posto, ou a cidade de Natal, além de partidas esportivas entre equipes do corpo aéreo e da armada. O aeródromo agora oferece um aspecto inteiramente diverso do grande areal com pistas improvisadas que os norte-americanos encontraram em junho passado (AS IMPRESSÕES…, 1943, p.3).

A guerra já saíra da África e as missões militares a partir de Natal perderam importância. A tensão que ocupava o tempo dos soldados em Parnamirim, havia deixado de existir e as ocupações disponíveis na base pareciam ter se tornado insuficientes para distrair o contingente que ficava esperando embarcar para a guerra ou voltar para seu país. Os militares estadunidenses, por isso, começaram a participar mais ativamente da vida da cidade e a frequentar as páginas do Jornal A República, principalmente nos eventos de caráter cívico que o Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda organizava. Entre as festividades, a população da Cidade do Natal passou a compartilhar datas comemorativas importantes e alusivas à cultura daquele país:

As comemorações [do Dia Panamericano] serão revestidas de grande brilhantismo, sendo de ressaltar que as de hoje têm uma significação ainda mais alta pelo momento que atravessamos, empenhados que nos vemos numa guerra na qual participa outras Repúblicas irmãs. Em Natal, muito especialmente temos motivos para o realce dessas festividades, dada a importante posição em que nos encontramos em face do conflito internacional, hospedando em nosso meio as forças diretamente ligadas à grande luta contra os inimigos da civilização (COMEMORA-SE hoje o dia panamericano: as festas nesta capital: um programa especial na Rádio Educadora de Natal: falarão as altas autoridades do Estado. A República, Natal, 14 abr. 1943, p.1).

O Dia Panamericano de 1943 mobilizou a estrutura administrativa do Governo do Estado do Rio Grande do Norte e a cerimônia previu, inclusive o hasteamento das bandeiras brasileira e estadunidense, assim como a execução dos dois hinos nacionais. Segundo o exemplar do Jornal A República, as escolas públicas da cidade adaptaram seus currículos para que seus alunos entendessem o significado desse momento e a Rádio Educadora de Natal (REN) preparou uma programação especial que incluía a participação de cantores estadunidenses.

Esse momento também inaugurou o predomínio das transmissões das musicais estadunidenses na emissora local, assim como palestras e discursos de suas autoridades civis e militares residentes na Cidade do Natal (COMEMORA-SE…, 1943). Nos anos que se seguiram, a Cidade do Natal ainda comemorou o “Independence Day”, dia da emancipação política dos Estados Unidos, cuja organização contava com a intensa colaboração do gabinete do Interventor Federal e parte dos festejos ocorria nas ruas da cidade (COMO será comemorado, nesta capital, o independence day: solenidade promovida pela Coordenação de Assuntos Inter-Americanos: a adesão da ZYB-5: um cocktail no Consulado dos Estados Unidos da América: outras notas. A República, Natal, 3 jul. 1944, p.12).

“(…). Entraram em plena confraternização com as moças da terra e fizeram camaradagem com os filhos das famílias da melhor sociedade, freqüentando as suas residências e dançando nas festas dos clubes. Nadavam em nossas piscinas e bebiam cerveja nos ‘cafés’, como eram chamados os bares naquela época. Recebi também vários deles em minha casa e alguns até me procuravam como advogado, para aconselhamento, no caso de encrencas e envolvimento amoroso com moças da terra. Conheci também militares de outras armas e bati ‘longos papos’ com os que passavam para a África. Falava-se inglês no Grande Hotel e também nas ‘staff-houses’ (casas de descanso dos militares) (…). Havia duas ‘staff-houses’ e ali fomos tomar cerveja, a convite dos gringos, falar inglês e informar a melhor maneira de se comportarem em nossa pequena província. (…). Alugamos até um piano de nossa propriedade que, por sinal, ficou arruinado depois da barganha. (…)” (Melo, 1993:37).

A adesão do Governo do Estado foi completa e podemos inferir que a partir de meados de 1943, os membros das elites da Cidade do Natal foram
chamados a contribuir com o entretenimento dos soldados estadunidenses. Para Branco (BRANCO, Tenente Lourenço. Círculo Militar de Natal. A República, Natal, 2 abr. 1944., p.4), “um dos aspectos marcantes dessa contingência que domina os cidadãos que vestem o uniforme das forças armadas é a dificuldade de suas relações com o mundo civil”, por isso era imperioso criar distrações para suas horas de folga e para facilitar o contato dos oficiais com os civis da cidade.

Aos 27 dias de Junho de 1943, o “A República” já noticiava as boas-vindas ao General Antônio Fernandes Dantas, recebido pelos militares com festas e corso pela cidade, até mesmo o Aero Clube sediou festa ao novo interventor, enquanto salientavam o árduo trabalho ao longo de oito anos de administração do interventor Rafael Fernandes, conhecido por ter feito parte de todo o processo de tornar o Rio Grande do Norte uma rota militar efetiva.

Esse foi o caminho político construído entre as esferas de sociabilidade da Primeira e Segunda República na cidade e no estado. A criação de ambientes propícios, que desmistificou o fato da cidade ter entrado para o progresso e para o novo só a partir da convivência com os norte-americanos na década de 1940 (PEDREIRA, 2012), esse acaba por ser um contato que criou míticas vivências diferenciadas como explicitado por Melo (2015), já que se aprofundou o contato com o American Way of Life – estilo de vida americano.

Zé Areia, um desses personagens, ganhava a vida como barbeiro e vendedor de rifas e encontrou nos americanos e nas diferenças culturais possibilidades de obter alguma vantagem. Ele não foi apenas um expectador do que então ocorria, mas um participante ativo. A guerra trouxe transformações substanciais para a cidade, e seu fim possibilitou mudanças significativas do ponto de vista político, com o processo de redemocratização.

[Zé Areia] desde os tempos da guerra, tornara-se uma figura lendária, pelos golpes que aplicara nos americanos, na venda de papagaios, macacos, passarinhos, até corujas. […] A um my friend que viera reclamar a venda de papagaio cego, perguntou: Afinal, você quer papagaio pra falar ou pra assistir cinema? Atribuem-lhe até a da coruja […]. Quando o americano veio reclamar que o bicho não falava, ele consolou o comprador: Não fala, mas presta uma atenção! (GARCIA, 1985, p. 95).

Zé Areia com soldados americanos

Na década de 1940, os cinemas eram os estabelecimentos de entretenimento mais procurados pela juventude natalense. Os cinemas, as confeitarias, as sorveterias, os cafés e os bares mais badalados estavam no Grande Ponto. Manoel Procópio de Moura Júnior definiu o Grande Ponto como ―[…] uma parte no centro da cidade, localizada na Rua João Pessoa, precisamente entre a Av. Rio Branco e a Rua Princesa Isabel‖49. Após assistir aos filmes nos cinemas Rex e Rio Grande, os expectadores circulavam pelo Grande Ponto, comparecendo às sorveterias, cafés e bares.

O teatro também era uma opção para a diversão na cidade de Natal. Na segunda metade da década de 1940 e nos anos de 50, existiam vários grupos teatrais que encenavam peças na capital potiguar, tendo como exemplos o Conjunto Teatral Potiguar, o Teatro de Estudante, o Grêmio Dramático de Natal, o Teatro Experimental de Arte e o Teatro de Cultura de Natal. O espaço principal para as encenações era o Teatro Carlos Gomes50. As atividades teatrais estavam ligadas às atividades intelectuais. Muitos autores dos textos teatrais eram literatos e poetas que escreviam para os principais jornais locais. Sandoval Carlos Wanderley, além de jornalista, poeta, diretor, ator teatral e fundador do Conjunto Teatral Potiguar em 1941, dirigiu a Imprensa Oficial do estado do Rio Grande do Norte, em 1931. Francisco Ivo. Cavalcanti era professor, jornalista e advogado. Ele escreveu diversas peças de teatro, que foram encenadas pelo Grêmio Dramático de Natal. Como jornalista, Francisco Ivo colaborou com A República, Diário de Natal, A Razão, O Democrata e o Jornal do Comércio.

No último dia do ano, retornava a Natal o pianista Oriano de Almeida, a primeira vez depois de sua transferência para o Rio de Janeiro. Desembarcava na Base Aérea de Parnamirim a bordo de um avião militar, em companhia do violinista polonês Henryk Szeryng. Vinham em turnê, apresentando-se para os soldados americanos sediados no Brasil durante a Segunda Guerra. Haviam tocado em Salvador e tocariam em Natal, Recife e Belém.

O Grande Ponto (Av. Rio Branco com Av. João Pessoa) em 1941 pelo fotografo da Revista Life Hart Preston. No espaço da urbe, um ponto interessante e relevante da vida social o “Grande Ponto”. Segundo Pedreira (2015), esse local tinha sido uma casa comercial do centro
da cidade, à esquina da Rua João Pessoa com a Avenida Rio Branco, que fechou nos anos 1930, mas se tornou um ponto de referência mesmo depois de seu desaparecimento.

A cidade de Natal passou por vários momentos de desenvolvimento, e o que mais se destacou ocorreu durante a 2ª Guerra Mundial, onde Parnamirim sediava a base militar e que servia como ponto estratégico para os aliados, principalmente os Estados Unidos. Nesse momento, a população da cidade de Natal aumentou significativamente, em relação aos demais períodos. Os militares que aqui se instalaram foram os primeiros a descobrir e aproveitar as belezas desta cidade, que antes eram apenas frequentadas por pescadores e pessoas com baixo poder aquisitivo, que moravam no entorno da área.

Com a vinda dos norte-americanos durante a Segunda Guerra, Ponta Negra começou a ser utilizada como praia de veraneio. Seu desenvolvimento deu início na década de 1940 e, desde então, este vem se transformando continuamente.

Americanos em Ponta Negra
Mulheres/meninas locais e soldados norte-americanos na icônica
praia de Ponta Negra

A PROXIMIDADE DAS ELITES COM OS MILITARES ESTADUNIDENSES

Dentro da política de proximidade que se estabeleceu entre a oficialidade estadunidense e as elites locais, predominou atividades que privilegiavam a amabilidade, recepções e homenagens. Os Estados Unidos, assim, começavam a implementar uma política de relacionamento que pretendia tratar bem aos moradores e que, consequentemente, poderia interferir na cultura local. Por meio do Cônsul Harold Sims, o Governo dos Estados Unidos, inicialmente, anunciou a criação do Comitê Regional da Coordenação dos Negócios Interamericanos e, dentre sua programação, a primeira atividade mais popular, foram as projeções de filmes. Estes mostravam imagens da guerra que estava transcorrendo na Europa e encontravam grande repercussão entre os moradores de Natal e a mostrava em detalhes.

A obra destruidora dos tanques e dos canhões, dos torpedos saindo das bocas de fogo, a perseguição ao inimigo. Trípoli, a cidade que era um sonho dourado de Mussolini; Tunísia que era um apoio invencível de Hitler; Stalingrado, que tornou uma epopéia russa. Não é só a terra fumegante, o mar explodindo, o tanque vencendo, […]. É o soldado na ação de investida, são os heróis na travessia dos desertos, são os quadros da fatalidade da guerra, onde há vencidos e vencedores, onde a vida se confunde com a morte (FRANÇA. Aderbal. O cinema e a guerra. A República, Natal, 18 jul. 1943h, p.6).

Tratava-se de pequenas películas que condensavam imagens filmadas em diversos momentos da guerra e a projeção iniciou pela residência do Interventor Federal, localizada na Praça Pedro velho, quando estiveram presentes autoridades dos dois países para assistirem na parte externa, ao ar livre. As imagens eram projetadas por um projetor portátil numa tela branca e, posteriormente, estes equipamentos passaram a percorrer os bairros da cidade. Os filmes puderam ser assistidos nas praças e concentravam uma multidão, assim como nas unidades militares brasileiras.

A partir da segunda sessão de filmes do Comitê, ficou acordado que a primeira exibição deveria se realizada para as autoridades do DEIP e alguns
convidados da imprensa local. Em seguida, poderia ser levada aos locais públicos (COMITÊ de Coordenação em Natal: filmes exibidos em acampamentos de soldados brasileiros: sábado uma sessão especial para a imprensa e o rádio. A República, Natal, 24 mar. 1944). Segundo o Jornal A República, a programação chegou a concentrar cerca de duas mil e quinhentas pessoas somente na Praça Pedro Velho.

O Comitê ainda promoveu um curso de inglês, que foi transmitido pela Rádio Educadora de Natal (REN) e era chamado “Vamos aprender inglês”. A Rádio Educadora de Natal, a partir deste momento, também passou a se chamar ZYB-5. O professor do tal curso chamava-se Claude L. Hulet e era um soldado estadunidense que tinha conhecimento da língua portuguesa e que fora especialmente convocado para servir na Base de Parnamirim. As aulas também tiveram grande repercussão entre os moradores e eram transmitidas todas as terças e quintas-feiras durante quinze minutos.

Nunca o conhecimento da língua inglesa foi tão imperioso entre nós do que nestes últimos tempos. Passou de simples interesse comercial ou motivo de vaidade, para uma necessidade social. As razões desse imperativo são claras. Vieram com a presença dos nossos amigos norte-americanos em serviço de guerra, tornando a cidade um centro comum de convivência entre norte-americanos e brasileiros. Apesar das dificuldades da diferença de línguas nativas já existe forte corrente de relações pessoais e muita gente que se entende no esforço de aprender (FRANÇA. Aderbal. Estamos aprendendo inglês. A República, Natal, 1 jan. 1944a., p.6).

Indistintamente, a população da cidade podia assistir às aulas e revelavam interesse em aprender o idioma. O método visava ensinar a quem não tinha qualquer noção e foi bem aceito por todos. As elites o considerava um avanço para o “conhecimento cultural” dos moradores da cidade e este atributo passou a ser tilizado para justificar as aproximações com os militares estadunidenses que, segundo Melo (1993), se firmavam em festas e recepções sociais, em visitas à Base de Parnamirim e suas instalações, assim como na permissão para frequentar os clubes de oficiais e o PX (supermercado).

Um dos pontos prediletos dos visitantes era justamente a cantina, o PX, onde se vendia quase tudo: perfumes, cigarros, doces, biscoitos, chocolates, cremes para barbear, sabonetes, giletes, cosméticos, pulseiras, relógios, além de manterem secções para lanches rápidos, bares, barbearia. Os ianques também costumavam convidar os amigos para jantar ou almoçar em seus restaurantes, completando, assim, o programa de recepção (AGUIAR, José Nazareno Moreira de. Cidade em black-out: crônicas referentes à Segunda Guerra Mundial – 1939-1945. Natal, UFRN. EDUFRN, 1991. , p.28-29).

Os soldados e os oficiais dos Estados Unidos, por sua vez, também freqüentavam a Cidade do Natal e a vida das elites, particularmente nos clubes
sociais e nas residências. Na Cidade Alta e na Ribeira, “os cafés e bares enchiam-se da alegre juventude que, nos intervalos de trabalho, vinham aumentar os lucros dos comerciantes e proporcionar, com suas presenças, uma nova feição à pacata cidade dos Reis Magos” (MELO, 1993, p.23-24). Enfim, a partir de 1943, os militares estadunidenses organizaram uma estrutura própria dentro da cidade para entreter seus soldados, que oferecia uma programação cultural e social permanente, que se chamavam USO’s – Organização dos Serviços Unidos. Os Estados Unidos instalaram os clubes nas cidades que abrigavam suas bases na América e na África, a qual foi “idealizada e preparada material e tecnicamente, para dar assistência aos soldados do Tio Sam, que se encontram a serviço da Pátria longe de seu país” (A INAUGURAÇÃO hoje do USO – Town Club. A República, Natal, 24 mar. 1944, p.8).

Em Natal, foram instalados o USO da Avenida Getúlio Vargas, no bairro de Petrópolis, inaugurado em 1º de março de 1943, destinado à oficialidade, e o USO Town Club, localizado na Praça Augusto Severo, no bairro da Ribeira, e voltado à recreação de soldados e marinheiros. Não foram encontradas referências no Jornal A República quanto ao início das atividades do USO da Getúlio Vargas. Suas instalações eram tidas como requintadas e as atividades eram reservadas. Era frequentado apenas por autoridades estadunidenses residentes ou de passagem pela cidade, além de um pequeno grupo das elites locais, particularmente membros do governo e do comércio.

Estrutura Militar e equipamentos de Lazer na Cidade do Natal (1942-1945). Fonte: SEMURB/PMN Nota: Elaboração do autor sobre base atual da cidade.

Por outro lado, a inauguração do USO Town Club, voltado para os soldados e marinheiros, teve uma grande cobertura do Jornal A República. As suas instalações ficavam no antigo Cinema Politeama, no bairro da Ribeira, cujas instalações foram reformadas, O antigo auditório foi decorado e no palco foi instalada uma orquestra, dispondo de espaço para apresentações. Foram colocadas mesas que circundavam a parte central do salão, onde as pessoas dançavam e confraternizavam. Além disso, o clube ainda possuía um terraço e um “buffett”, onde eram servidas as bebidas e comidas (A INAUGURAÇÃO hoje do USO – Town Club. A República, Natal, 24 mar. 1944, p.8). A finalidade do clube era

[…] oferecer distrações úteis a marinheiros e soldados norteamericanos. Serviço de natureza evidentemente louvável. Camaradagem sem a presença de hábitos maléficos. Ambiente instrutivo, onde há leitura e palestra agradáveis. Onde paira um espírito de comunicabilidade necessário ao esforço de guerra (FRANÇA. (Aderbal. USO em Natal. A República, Natal, 16 set. 1943j., p.6)).

A programação do USO Town Club, em geral, iniciava-se entre 18:30 e 20 horas e se estendia até a meia-noite. Alguns funcionários das forças armadas estadunidenses foram destacados para trabalhar nos clubes e vieram para Natal para organizar as recepções e festas, que eram preparadas com musicais e jantares. Alguns eventos recebiam as autoridades locais como convidados, particularmente políticos, comerciantes, jornalistas e intelectuais da cidade. O USO também promovia campanhas assistenciais e no período natalino de 1943 realizou a campanha “Natal das crianças pobres”, que pretendeu oferecer “aos soldados americanos, longe de sua pátria, a oportunidade de presentear as crianças brasileiras, como se assim estivessem praticando com seus próprios filhos” (AS CRIANÇAS pobres, o USO e as forças armadas americanas. A República, Natal, 24 dez. 1943, p.3). O entrosamento entusiasmava as elites locais e aos jornalistas do Jornal A República, que justificavam aquela sintonia porque a “maioria dos soldados que freqüentam o clube […] são convocados e pertencem às melhores famílias dos Estados Unidos” (FRANÇA. Aderbal. Função social na guerra. A República, Natal, 27 jun. 1944b, p.7).

Os preços subiram com o uso do dólar como moeda oficial na cidade, especialmente nas casas noturnas, o que era uma realidade. Não se pedia mais cerveja nos bares e sim “bia” ( de beer, cerveja). As ruas viviam cheias de jeeps e caminhões o que aumentou extraordinariamente o trânsito na capital.

Além das festas semanais, nos clubes natalenses, incluindo o Hípico, recém-fundado, onde confraternizavam natalenses ricos e yankees havia o mais perfeito entendimento. Os americanos tinham seus clubes, além de excelente cassino, dentro da base, onde brasileiros eram convidados e circulavam figuras do cinema hollywoodiano, do showbusiness e outros. Na cidade havia 2 clubes. Um na praça Augusto Severo, onde é hoje a firma Limarujo e o outro no fim da avenida Getúlio Vargas. Eram denominados, respectivamente, de USO cidade e USO praia. Nestes clubes os visitantes bebiam, e dançavam com as moças da terra, filhas das famílias mais “pra frente”, numa camaradagem, como se tudo já tivesse sido ensaiado.
Muito usado no esforço de guerra, era o jeep, invenção dos americanos, viatura segura e fácil de dirigir que resolvia quase todos os problemas de transportes.

Por outro lado, as elites tentavam mediar o relacionamento da população da cidade com os soldados, tentando amenizar os conflitos que eram observava na sua convivência diária. Segundo Pinto (PINTO, Lauro. Natal que eu vi. Natal: Imprensa Universitária, 1971) e Melo (1993), houve muitos confrontos físicos entre brasileiros e estadunidenses nos bares da cidade e, para Smith Junior (1992, p.149), os militares estadunidenses sentiam que os natalenses “não gostavam dos americanos e se ressentiam da atitude destes com relação à população local”. Ainda para Melo (1993), as reações se expressavam nos espaços públicos da cidade, onde os soldados estadunidenses se portavam com desrespeito, uma vez que

Sem nenhuma perspectiva de resistência ao invasor, a cidade era um maná para os marines. Compravam tudo com as suas maravilhosas cédulas verdes e, para variar quebravam o pau por qualquer razão. Treinados para matar com golpes de mão, claro que sempre levavam vantagem nos entreveros com os caboclos (Depoimento de Nei Leandro de Castro, jornalista e poeta In: MELO, Protásio Pinheiro. Op. Cit, p.86).

O policiamento da cidade, por incrível que pareça, era feito por apenas dois jeeps com 4 homens em cada um. Era a Polícia do Exército, os famosos M.P’s. Um jeep ficava no Grande Ponto, com telefone pronto para atender e outro no Grande Hotel, na Ribeira. Havia uma obediência total dos soldados soltos pela cidade e nunca se ouviu falar em qualquer incidente entre eles. Assisti uma vez, um exemplo da sua eficiência. Num dia de festa no Aéro-clube, como membro da diretoria, sou chamado ao bar, onde estava havendo uma “confusão”. Um oficial da Marinha, estava embriagado, quebrando copos e chamando nome feio ao dono do bar. Cheguei, vi o tamanho da “fera” – uns 2 metros de altura e, calmamente telefonei para o Grande Hotel. Dentro de exatamente 10 minutos, os M.P’s chegaram, falaram baixinho no ouvido do militar e tudo foi resolvido sem barulho.

Na vida noturna da cidade, até às 21 horas, “os americanos eram donos dos bares e senhores absolutos do terreno, como também dos restaurantes, pensões de mulheres e bebidas, tudo enfim, à custa dos ricos e inesgotáveis dólares” (6 Depoimento de Nei Leandro de Castro, jornalista e poeta In: MELO, Protásio Pinheiro. Op. Cit., p.82) e, nesses lugares, quando esse horário limite se aproximava, montava-se uma “praça de guerra” que explodia por motivos insignificantes e pela intolerância que existia entre ambos, revelando um lado da convivência que a imprensa e a historiografia oficial não registraram e deixaram poucos indícios para o presente.

Em meados de 1943, as Forças Armadas Brasileiras também passaram a promover atividades culturais com as mesmas características dos shows
organizados pelos clubes estadunidenses. Estes eram patrocinados por empresários brasileiros e excursionavam pelas bases nordestinas. Eram shows itinerantes que foram considerados como mais um “serviço de guerra a ser oferecido aos soldados americanos e brasileiros” (FRANÇA. Aderbal. Urca-Tupi em Natal. A República, Natal, 2 jul. 1943g, p.6). Dentre estes, o primeiro chamou-se “Show da Vitória”, foi organizado pelos Diários Associados e reuniu artistas da Rádio Tupi e do Cassino da Urca.

A programação de shows intensificou na cidade e acontecia tanto nos clubes locais como nos estadunidenses. A cidade passou a ser frequentada por artistas famosos, que se exibiam prioritariamente na Base de Parnamirim Field e nos USO’s, porém, eventualmente, se apresentavam nas unidades militares brasileiras (EM NATAL…, 1944). Os primeiros grupos brasileiros contratados foram os Cassinos da Urca e Icaraí do Rio de janeiro
In: EM NATAL, artistas dos cassinos da Urca e Icaraí: exibições para os soldados de terra, mar e ar sediados nesta capital. A República, Natal, 31 out. 1944. Posteriormente, a partir de junho de 1944 (NOVA fase de realizações para os USO Clubs: para um melhor entendimento – Programas de
intercâmbio brasileiro-americano – O apoio da Rádio Educadora – Fala-nos Miss Gertrude Dondero, alta funcionária dessa organização, em Nova York. A República, Natal, 4 jun. 1944), a direção dos clubes também começou a contratar artistas brasileiros e locais para seus espetáculos.

Na cidade, além dos tradicionais Aero Clube e Teatro Carlos Gomes, surgiram o Cassino Natal, o Círculo Militar, o Clube Hípico de Natal. Todos integravam uma “cadeia de promoções” e ofereciam sucessivas festas e bailes. O Cassino Natal, que foi inaugurado a 20 de outubro de 1943, estava localizado vizinho ao Grande Hotel e promovia reuniões sociais e shows. Era tido como um espaço luxuoso, onde as pessoas freqüentavam vestidas a rigor. O Circulo Militar era o clube das Forças Armadas Nacionais, que fora organizado pelas diversas Guarnições Militares do país e tinha como objetivo “criar e manter um ambiente social, promovendo reuniões familiares e festividades”, assim como contribuir com “o espírito de cordialidade entre os oficiais das várias armas e suas famílias” (FRANÇA, 1944c, p.7). Suas atividades eram basicamente bailes que ocorriam no Aero Clube.

Tanto os americanos como o Exército Brasileiro construíram Vilas Militares, além das “Staff Houses” e dos clubes “USO’s”. Nos bairros de Tirol e Petrópolis, eixo da “pista” que ligava a Natal a Parnamirim, instalaram-se os oficiais e militares de alta patente. Os espaços de convivência e de lazer eram compartilhados com a elite local, que se deslocava para Parnamirim, quando era convidada para os eventos festivos, assim como disponibilizava suas residências, o Aero Clube, o Teatro e os Cinemas da cidade para eventos comuns.

Grandes festas foram animadas pelas Bandas de Jazz do Exército NorteAmericano, em que predominavam o jazz, o twist e o rock. No período mais crítico da falta de habitação para alugar, algumas famílias chegaram a hospedar, em suas próprias residências os oficiais e os soldados norte- americanos, enquanto aguardavam o término da construção das habitações. Para os soldados de baixa patente eram improvisadas barracas como moradias e o seu lazer se desenvolvia no bairro das Rocas e da Ribeira, onde foi construído um USO para os soldados, instaladas muitas casas de diversão e onde proliferavam os cafés, os cassinos e os cabarés (Melo, 1993).

“A presença dos galegos (designação usada pelo homem do povo para identificar qualquer estrangeiro) motivou a aprendizagem da língua inglesa,
ao ponto de que, já ao término da guerra, muitos natalenses falavam e escreviam corretamente esse idioma. Tornara-se comum o livrinho ‘Safaonça’ (dicionário com as frases mais comuns para se conversar e traduzir a língua inglesa, com a grafia e a pronúncia figurada), verdadeira tábua de salvação para aqueles que tinham necessidade de conviver com os americanos, principalmente mocinhas que sonhavam casar com oficiais de Tio Sam, ou espertos comerciantes de rua” (Aguiar, 1931:32).

E, por último, o Clube Hípico de Natal, que estava localizado na Estrada de Parnamirim e foi criado para promover provas hípicas e congregar as elites da cidade e a oficialidade das forças armadas brasileiras e estadunidenses. Foi inaugurado apenas com as instalações do salão de festas, mas previa a construção de um parque esportivo com quadras (tênis e voleibol) e piscinas. Para Danilo (DANILO (Aderbal de França). O hipismo em Natal. A República, Natal, 23 mar. 1944d, p.7), tratava-se de uma “porta de um novo progresso” que poderia atrair “impressões diferentes para os turistas que passa[ss]em pela estrada do Tirol em busca de sensações”. Na festa de inauguração, a programação foi organizada pelo USO Town Club. Nesta foi organizada uma demonstração da “Caça à Raposa”, uma atividade esportiva que, posteriormente, passou a ser “praticada pelas elites, particularmente nas confraternizações com as tropas americanas” (CONFÚCIO, 1944, p.7).

Segundo Smith Junior (CONFÚCIO. Club Hípico de Natal. A República, Natal, 5 abr. 1944, p.183), no início de 1945, o USO também montou uma casa de praia em Ponta Negra com uma cantina que oferecia aos banhistas, militares e membros das elites locais, equipamentos de praia, jogos, material para leitura e escrita.

A Cidade do Natal virou uma cidade de festa e suas elites se desdobravam para estar presentes nas inúmeras atividades dos clubes da Ribeira, Petrópolis, Tirol e Parnamirim.

Esta vida é mesmo assim. Vou passar o carnaval soltando bomba em Berlim (Música carnavalesca, Zé Poeta, Diário, 1943).

Em decorrência da expansão nazista na primeira fase da II Guerra, com número elevado de baixas nos países aliados, foi discutida, na capital federal, a possibilidade de cancelar o carnaval no Brasil, em 1942. O Rio de Janeiro chegou a ficar sem carnaval. Essa possibilidade não teve o menor eco em Natal, pois foi rechaçada pela imprensa local e pelos foliões potiguares. A se considerar também o fato do então prefeito Gentil Ferreira ser também presidente da Federação Carnavalesca de Natal.

Os visitantes confraternizavam com os natalenses nas suas festas tradicionais. No dia 7 de Setembro, todos os anos, formavam vários pelotões da tropa americana, na comemoração de nossa festa maior da independência, o que dava um brilho todo especial ao evento, deixando o povo alegre e feliz. No carnaval, que nenhum deles conhecia e muitos nunca tinham ouvido falar nesse folguedo brasileiro, era uma loucura. Entravam nas danças de rua, pulavam, imitando os natalenses, cantavam, gritavam e tentavam dançar o“passo Pernambuco”, o que provocava divertimento e
alegria principalmente para as crianças. Há até a historia de um oficial que esteve na avenida Rio Branco, todos os dias e, na quarta feira de cinzas apareceu e perguntou, vendo a rua às escuras: “Porque não mais Cecília?” (referia-se ele a uma marcha vitoriosa daquele ano).

As festividades também são um acontecimento à parte do cotidiano da cidade, conhecidas no período por reunirem brasileiros e americanos, dos bailes às festas de carnaval, no dia 14 de maio de 1943 realizou-se o primeiro baile no clube U. S. O (SMITH JR, 1992). Quanto aos festejos carnavalescos, no período havia uma preocupação em manter as especificidades potiguares, desde fantasias como a dos grupos papangus e as modinhas genuinamente regionais (PEDREIRA, 2012).

Esses acontecimentos formaram um cotidiano do começo de 1940 “A convivência com os americanos e seu diferente modo de vida afetou o cotidiano de toda a população local (…) o que chama a atenção é a discrepância entre as múltiplas percepções sobre esse momento de intenso intercâmbio sociocultural (…)” (PEDREIRA, 2012, p. 114).

Os reflexos nacionais que Ferreira (2017) faz ao analisar o Rio de Janeiro no segundo semestre de 1942, são ao mesmo tempo um exemplo do que acontecia na pequena Natal, com reflexos protuberantes na vida dos pobres que no pouco acesso que tinham, passou a se restringir mais, sendo exemplo disso, como citado por Pedreira (2012) os flagelados da seca, que nesse período chegaram a capital buscando salvação das mazelas que a seca impregnou no interior do estado.

Com o objetivo de manter a população natalense num estado psicológico de mobilização permanente, a partir de 1941, até maio de 1945, a cidade viveu sob o impacto de várias campanhas: do alumínio, do estanho, do racionamento de combustível, da lancha torpedeira, da defesa passiva, e, finalmente do bônus de guerra. Isso sem falar na grande campanha em favor dos flagelados da seca 1942. (MELO, 2015, p. 13).

Flagelados da Seca (1943). Fonte: A República.

HOLLYWOOD EM NATAL

A Segunda Guerra Mundial foi o ponto de partida para Natal colocar-se no rumo da urbanização. As transformações não ocorreram apenas em nível de estrutura física e espacial. Culturalmente, a cidade é colocada em sintonia com o mundo, principalmente com a cultura americana, como indica o poema de João Cabral de Melo Neto (ver SANTOS, 1998. p. 36):

E de repente Natal
Virou mesmo Hollywood
Passeava o Rei Faissal
Tyrone Power e Roosvelt
Vão da Ribeira ao Tirol
Sugestões para que mude
O idioma nacional
Por um outro, very good.
Tão de repente Natal
Virou mesmo Hollywood

Natal foi, muito provavelmente, um dos lugares de melhor qualidade de vida para um soldado na Guerra. As pessoas cantarolavam jazz nas Ruas. A vida aqui era diferente, sofisticada, uma festa.

Natal tornou-se a cidade mais badalada do Nordeste na Segunda Guerra Mundial. Os cinemas militares, não raro, e sem que ninguém soubesse fora dali, recebiam convidados especialíssimos: os próprios astros de Hollywood. Ao longo de 1944, os USO’s trouxeram para Natal artistas do cinema e do rádio.

Humprey Boogart voou do Marrocos para animar uma sessão de Casablanca no teatro aberto da Base de hidroaviões. Os artistas eram pagos pelo governo americano para viajar pelos fronts do mundo todo. A presença deles servia para elevar o moral das tropas. Bette Davis, Al Johnson, Carole Landis, Martha Ray e muitos outros artistas de ponta dos anos 1940 também visitaram Natal.

Kay Francis chegou a enviar (publicado em 30/04/45) um bilhete de agradecimento ao colaborador do Jornal “A República” Venturelli Sobrinho pelo texto publicado em sua homenagem. Conta-se que Marlene Dietrich foi a primeira mulher a usar calças compridas em Natal.

Mussoline Fernades era repórter do “Diário de Natal” e não esquece da entrevista que participou com o famosíssimo ator Tyrone Power, que havia chegado pilotando um avião que a Fox lhe cedera por uma temporada.

Também estiveramem terras portiguares: Nelson Eddy, Jack Benny, Larry Adams, Ann Lee, Winnie Shaw, Marlene Dietrich, Tommy Dorsey. Nestes casos, os shows eram exibidos no Teatro da Base Aérea Estadunidense, no “Wing Headquarters Squadron”, e, em geral, o Jornal A República apenas fazia a divulgação do espetáculo. Em todos eles, no entanto, eram convidadas as “autoridades civis e militares e grande número de pessoas da sociedade” (A FESTA…, 1943, p.8)340, quando eram distribuídos convites e disponibilizados transportes a partir “da sede da Cruz Vermelha Brasileira, junto ao Rex”, na Avenida Rio Branco, Cidade Alta (A FESTA de hoje em Parnamirim. A República, Natal, 22 dez. 1943, p.8).

A orquestra de Glenn Miller tocou no recém-inaugurado Cinema Rex. O Rex passou a permitir entrada sem paletó e gravata.

Cinema Rex na Avenida Rio Branco em Natal.
Al Johnson
Martha Ray
Carole Landis
Kay Francis
Bette Davis
Humprey Boogart
Mussoline Fernades era repórter do “Diário de Natal” e não esquece da entrevista que participou com o famosíssimo ator Tyrone Power, que havia chegado pilotando um avião que a Fox lhe cedera por uma temporada.
Ator Tyrone Power em Natal. Acervo J. Alves de Melo. Fonte: Diário de Natal.

Para imaginar como eram aqueles anos em Natal, é preciso observar a guerra como um momento de liberação, um evento protagonizado por uma legião de jovens americanos reprimidos que nunca haviam saído de rincões rurais como Arkansas, Nevada, ou Montana. De repente, no meio do horror de um conflito mundial, eles se descobriram num lugar amistoso, tropical, encantador. O mar, a luminosidade excepcional da cidade, as relações pessoais, tudo era novo em suas vidas. Por vias tortas – a guerra – eles foram encaminhados para o paraíso.

Os branquelos gastavam seus dias de folga em banhos de mar nas praias de Areia Preta, se concentravam numa área próxima ao início da atual Via Costeira, que passou a se chamar “Miami”. Muitos pagaram um preço salgado pelo programa: terríveis queimaduras de sol.

Momento de lazer na Praia de Areia Preta (Miami)
Registro da Praia de Areia Preta (Praia de Miami Beach) feito pelo fotografo norte-americano Hart Preston para a revista Time-Life na época da Segunda Guerra Mundial.

VALSA CENTENÁRIA

Bastante conhecida pelos potiguares em festa publicas onde temos a presença da orquestra sinfônica. Mais poucos sabem que essa musica é de um potiguar ela foi feita em homenagem ao cinema Royal. A Valsa Royal era tocada antes e depois de cada apresentações. O Mestre Toneca Dantas (assim ele era conhecido) mesmo com toda a influencia e amizade nas rodas sociais da época e mesmo assim foi bastante injustiçado pelo poder publico da época e também os atuais já que seu nome é esquecido na nossa historia.

Royal Cinema foi composta em 1913, a pedido do famoso Cinema Royal. A valsa foi executada diversas vezes pela Orquestra da Rádio BBC de Londres, durante a Segunda Guerra Mundial, infelizmente executada como de “autor desconhecido”.

A Importância de Toneca Dantas ao cinema principalmente a popularidade que teve em todos as camadas sociais na época apesar do reconhecimento não conseguiu êxito financeiro no RN, fato que o fez procurar trabalho na Paraíba não ganhou dinheiro foi pobre, e na ultima fase da vida serviu como soldado raso na policia Militar.

Toneca Dantas
Royal Cinema ficava na cidade alta e era o primeiro no bairro na época e funcionava em um prédio de arquitetura inspirada na ‘art-nouveau’ francesa na esquina das ruas Vigário Bartolomeu com Ulisses Caldas, Cidade Alta, Natal/RN.

ECONOMIA

Durante os anos de 1942 até 1945, o Brasil sofreu uma desaceleração na sua economia, o que não afetou o desenvolvimento e crescimento econômico de Natal devido o incremento dado pela presença americana e a construção da base aérea de Parnamirim Field e a Base Naval. Dessa forma, é possível afirmar que: ―na Cidade do Natal o comércio cresceu de maneira vertiginosa e se refletiu na expansão dos estabelecimentos bancários e de crédito cooperativo, assim como no enriquecimento de muitos comerciantes.

Muitos negociantes, estabelecidos em Natal, constituíram fortunas devido ao comércio e a especulação imobiliária. O crescimento da capital potiguar se processou em direção ao bairro do Alecrim e das ocupações nos bairros de Tirol e Petrópolis. As construções que surgiram no contexto da Segunda Guerra Mundial, a exemplo da Base Aérea de Parnamirim, o Grande Hotel e a estrada asfaltada ligando a Base Aérea à Praça Pedro Velho, indicavam que a cidade tendia ao desenvolvimento do turismo no futuro. Essa percepção, presente nos artigos de A República, relacionava-se com o projeto de modernização propagado pelos intelectuais no período anterior ao conflito mundial

Por outro lado, a população da Cidade, entre 1941 e 1943, pode ter crescido em 50% e mais que duplicado seu comércio. Não existia residência em número suficiente e disponível que atendesse à demanda que se instalava, assim como infra-estrutura que permitisse o atendimento e o abastecimento das novas necessidades da cidade. Os transportes, os cinemas, os bares e as ruas estavam sempre tomados pelas pessoas. A
população podia sentir a transformação no seu cotidiano apenas com a circulação do contingente de Natal e do que estava aquartelado na ilha de Fernando de Noronha, que, nos seus horários de folga, frequentavam a cidade e circulavam por ela.

Nesse período, a população da cidade, que sempre fora predominantemente formada por funcionários públicos, teve sua vocação reforçada com a presença dos militares da Forças Armadas Brasileiras (o que permaneceu até os dias atuais) e viveu, durante este período, em função do acontecimento. A convivência com “os gringos” marcou os hábitos e os costumes da sociedade, introduzindo palavras do Inglês no vocabulário, nos gestos e nas bebidas: OK, o polegar da mão direita estendido para cima, milkshake, coca-cola, cuba libre, blackout, cigarrettes, my friend, all right, thank you e Hello.

A cidade do Natal viveu o seu momento de turbilhão: milhares de pessoas se deslocavam para a Capital, vindos de todos os lugares. Um grande contigente de população chegou à cidade motivado pela seca no sertão do Estado, flagelados, mendigos que foram rapidamente abrigados em lugares distantes, na periferia pobre da cidade. Muitos vieram estimulados pela divulgação da existência de empregos, pois era de conhecimento público que os americanos estavam contratando mão-de-obra para os serviços mais pesados, como a construção da Base Terrestre “Parnamirim Field” e da pista “Parnamirim Road” e também pela divulgação dos investimentos que fiziam para suprir as Bases com gêneros alimentícios.

Grande parte dos alimentos de que necessitavam eram importados, transportados por navios e aviões até a Base, porém estavam comprando grandes propriedades e destinando-as para a criação de gado leiteiro e de corte, assim como para a plantação de cereais e de árvores frutíferas. Um parque da cidade, por exemplo, a Lagoa Manoel Felipe, foi transformada em aviário para produção de galetos em grande escala. Da mesma forma, incentivavam e investiam em pequenos e grandes proprietários de terras agricultáveis ou com pasto disponíveis para que produzissem, pois a demanda da Base de “Parnamirim Field” era maior do que a quantidade que eles conseguiam trazer dos Estados Unidos.

Um outro fator que influenciou o deslocamento populacional para a Capital foi a possibilidade de enriquecimento para pequenos e grandes comerciantes de outras cidades. Foram muitos os comerciantes de todas as regiões do Rio Grande do Norte, que, com suas famílias, que se estabeleceram em Natal neste período. Comerciantes ficavam ricos do dia para a noite, especialmente no ramo dos serviços prestados pelos taxis e carros de aluguel.

Associada ao padrão de vida empreendido pelos norte-americanos, com a circulação de sua moeda, o comércio local cresceu, tanto em quantidade de dinheiro e produtos circulantes, quanto na diversidade das mercadorias oferecidas. A cidade do Natal tornou-se uma cidade inflacionada pela Segunda Guerra e pela convivência com os americanos. No entanto, desde o início do século XX, que a elite local costumava desdobrar-se para
adquirir bens de consumos industrializados. Desde a importação diretamente da França de quase todos os adereços de ferro e bronze para utilização na decoração dos edifícios e espaços públicos – gradis, luminárias, postes, relógios, entre outros -, como para usos privados e pessoais – vestuários, tecidos, equipamentos desportivos e outros (Oliveira,2000).

O período da Segunda Guerra apenas facilitou a aquisição destes produtos porque sua chegada era facilitada à cidade. “A cidade, os transportes, os bares são lotados. O comércio ampliou-se. Abriram-se novas casas de negócio, especialmente lojas de jóias e relógios, que os militares e civis compravam em profusão. Caríssimas se tornavam as residências. Todos queriam alugar seus imóveis aos filhos do Tio Sam, que pagavam sempre em dólar”. (Melo, 1982:15).

O enriquecimento de alguns que souberam tirar proveito dessa nova situação e a diversificação dos costumes foram marcas deixadas por esse período. A vida na cidade mudou com muita intensidade em um período de tempo muito curto. Surgiram novos tipos de lojas, como as Confeitarias que, para Danilo (25/03/1943), era uma “especialidade comercial que tem o luxo como característica” e se tornaram “necessárias para uma cidade
que ascende para o complexo da civilização”. A população sempre atualizada pelas informações da ZYB-5 que, com a colaboração de oficiais do Exército Norte-Americano nos seus estúdios, fazia de sua programação um instrumento de aculturação da cidade.

Sobre as questões econômicas, ainda em 1942, o estado se mantinha pobre e com base de subsistências pouco onerosas, o campo da agricultura ainda não mantinham atividades múltiplas e continuavam presos a monocultura do algodão, que absolvia cerca de 70% do trabalho, surgindo a necessidade de novas culturas agrícolas e de uma renovação comercial, onde o poder público precisava agir em
cooperação.

A capital, segundo relatos de Melo (2015) os natalenses tiveram do conflito novas fontes de renda e de ganho, o que lhe permitiam enfrentar o custo de vida em escala vertiginosa, que se tornou fruto dos problemas da guerra desde o começo de 1942 e dos cortes diplomáticos do Brasil com os países do eixo, o que causou embargos nas embarcações marítimas do país, que acarretou na chegada do contingente de guerra, fruto dos acordos projetadas entre Brasil e Estados Unidos, o refletindo diretamente na economia local, assim “O comércio duplicou, especialmente
lojas de joias e de relógios, que os “gringos” compravam em profusão. Caríssimo se tornou o aluguel das residências.” (MELO, 2015, p. 40).

A referida “febre de construções” retratava um quadro diferente do verificado em âmbito nacional, marcado pela crise na construção civil em decorrência da Lei do Inquilinato e da elevação dos preços dos materiais de construção, devido às altas taxas pagas para importação e a sua posterior interrupção devido à ocorrência da Segunda Guerra. Em Natal, a ascensão de valores dos produtos para edificação foi absorvida pelo custo dos aluguéis, contribuindo também para a sua elevação74. De acordo com os periódicos do período: “(…) tudo vai de acordo com a época; si o material era caro, consequentemente, o prédio também o seria, justificando os altos alugueis, compensadores para os construtores do período”
(EDIFICIOS…, 30/01/1945, p.08).

Os bairros do Alecrim, de Tirol e de Petrópolis se expandiam e, junto com esses, o comércio de imóveis na capital potiguar. O aumento populacional resultou no crescimento desordenado da cidade do Natal, resultando em assentamentos urbanos como Brasília Teimosa e Mãe Luiza, que foram os primeiros com características de favelas. O domínio do mercado imobiliário sob o espaço urbano natalense aumentava e não havia nenhum órgão urbanístico que orientasse e coordenasse projetos para novos loteamentos (Cf. FERREIRA; DANTAS, 2006, p. 263-264.).

A procura por casas nas praias para comprar e alugar também era grande. A Redinha entrou no rol da especulação imobiliária. A praia oferecia boa estrutura, tais como um novo clube social que proporcionava bailes aos veranistas, construído sobre o prédio antigo em 1943, e um mercado público, esse inaugurado em 6 de fevereiro de 1944 pelo prefeito José Augusto Varela. O clube da Redinha, atendendo aos padrões desejados pela elite natalense, era muito movimentado. Nas matinês dançantes aos domingos, as orquestras tocavam para aqueles que buscavam diversão.

O Grande Hotel tem uma significante importância, pois, passou a ser um centro de acontecimentos da vida natalense, principalmente daqueles que viviam aos arredores do mesmo, pois, era um dos principais pontos de encontro dos americanos, por ser o espaço que abrigava as patentes mais altas dos escalões militares:

Em 1935, o interventor Mário Câmara adquiriu o terreno e contratou o arquiteto francês, George Mouriner, para elaborar o projeto do prédio, o interventor Rafael Fernandes iniciou a sua construção em 1936, concluindoa em 1939 […] em 1942, o Grande Hotel foi arrendado ao Sr. Theodorico
Bezerra. Durante a Guerra, tosos os grandes acontecimentos da cidade realizavam-se ai: banquetes, recepções, homenagens etc… (SOUZA, 2015,
p. 12).

Os cafés mais procurados eram o Café Grande Ponto, na Cidade Alta, e o Café Cova da Onça, na Ribeira. O bar mais frequentado pela elite política, pelos intelectuais e pelos oficiais americanos era o bar do Grande Hotel. Durante o conflito mundial, os sócios Jacob Lamas e o italiano Amadeu Grandi estabeleceram um comércio na Praça Augusto Severo, denominado Confeitaria Delícia, que se tornou um espaço boêmio frequentado por jornalistas, professores, comerciantes e funcionários públicos.

A Ribeira, durante a Segunda Guerra Mundial, destacou-se como bairro destinado ao entretenimento. Cafés, bares, hotéis e pensões alegres proliferam na Avenida Tavares de Lira e ruas adjacentes, constituindo um grande atrativo para os soldados americanos. Cordeiro afirma: ―Mas ao mesmo tempo em que a cidade do Natal tornou-se cosmopolita, acabou afastando os natalenses do bairro da Ribeira‖. Em seguida, a autora aponta como razões para esse afastamento: ―[…] uns porque não tinham condições financeiras para frequentar esses locais e outros pela fama de lascívia e boemia que assolava o bairro (CORDEIRO, 2012, p.71.). O auge do bairro ocorreu no contexto da Segunda Guerra Mundial, quando atraiu milhares de soldados, brasileiros e norte-americanos, para o seu comércio e sua agitada vida noturna.

A Rua Dr. Barata, como toda a Natal, durante a Segunda Guerra Mundial, vivenciou grande movimentação. Uma Rua testemunha da história assistiu, nascer e desaparecer vários estabelecimentos, lugares de encontro da elite política e econômica da cidade.

Aspectos da vida cotidiana na Ribeira em 1941 por Hart Preston a serviço da Revista Time.
Americanos na Ribeira, rua Chile, principal centro de Natal à época.
Prédio da Associação Comercial. Concluído em 1944, em pleno contexto da Segunda Guerra Mundial, o prédio apresenta características arquitetônicas que o distingue no cenário urbano da capital, valorizando sobremaneira o conjunto de imóveis históricos situados em seu entorno
Com uma estimativa de 108 quartos, três andares, duas lojas e salão de visitas. Este hotel, localizado no bairro da Ribeira, Zona Leste de Natal, hospedou os militares norte-americanos de alta patente durante a Segunda Guerra Mundial, recebendo em dólares pelas estadias. O “Grande Hotel” teve suas atividades encerradas no ano de 1987 e hoje abriga o Juizado Especial Central de
Comarca de Natal.
Grande Hotel de Natal em 1942.
No Grande Hotel em 1941 pelo fotografo da Revista Life Hart Preston. Nesta foto a parte exterior do hotel, onde ao fundo, identifica-se a Praça José da Penha e a Igreja do Bom Jesus das Dores.
Nesta fotografia ao lado dos homens, encontra-se a imagem do desenho arquitetônico do Grande Hotel.
Armazém de algodão na Rua Chile na Ribeira em 1941. Foto da Revista Time, por Hart Preston. Fotos do a acervo digital de Adriano Medeiros.
Pelo Cais da Tavares de Lira chegava todo o tipo de iguarias aos americanos na época da Segunda Guerra Mundial. Pelo visto havia uma predileção por variados tipos de frutas. Registro realizado pelo fotógrafo da Revista Time, Hart Preston, em 1941.
Avenida Duque de Caxias (Antiga Sachet) na Ribeira em 1942 em plena Segunda Guerra Mundial. Local da passagem do progresso na capital potiguar naquela época. Em primeiro plano vemos na esquina da Avenida Duque de Caxias com a Avenida Tavares de Lira a antiga sede do Bandern que depois funcionou na sede do Procom.
Em primeiro plano o prédio onde funciona hoje a Defensoria Pública do RN. Hoje está totalmente desfigurado. Um crime.
Meu comentário é sobre esta criança. Personagem anônimo e uma testemunha ocular das transformações daquela época.
Passagem do bonde em sua entrada pela Avenida Tavares de Lira. Passagem era cara para época daí a ocorrência do uso de jumentos em plena capital potiguar.
Mesma esquina da Av. Duque de Caxias com Av. Tavares de Lira em de 1931. Eu restaurei a foto, reparando alguns trechos e melhorando a parte inferior da foto, que se clareou no decorrer do tempo. Na parte inferior esquerda, nota-se pessoas andando de bicicleta. No centro, um bonde percorre o local.
A Ribeira na Segunda guerra Mundial era nosso centro comercial. Dentro dessa, a rua Dr Barata era nossa “5ª Avenida”, uma referência a umas das principais avenidas de New York. E foi lá, na rua Dr Barata, que nessa época, surgiu o bar que comento agora. O Bar Nacional era o ponto de reunião e de divertimento dos militares da Royal Air France (RAF), que tinham mesa cativa no lado esquerdo do salão onde ficavam horas bebendo Tom Collins, uma mistura de gim, água tônica, limão e açúcar.
Bonde da linha Alecrim-Grande Ponto-Ribeira passando pelo avenida Rio Branco. Nessa época, por volta de fins de 1942 e início de 1943, já tínhamos algumas linhas de auto-ônibus fazendo frente aos velhos e cansados elétricos da Cia. Força e Luz.

CABARÉS

Outro comércio da época foi o sexual, mulheres foram exploradas de diversas formas, muitas memórias desse período mostram Natal por esse cunho festivo e de sexo, que se criou em torno dos vários cabarés que surgiram. A pensar em uma cidade com economia que mudou com esse fluxo novo de muitas pessoas, com crescimento constante e sem espaço para acolher com outros tipos de trabalho, as mulheres veem como saída de ida por esses espaços.

Durante a estadia dos americanos em Natal no período da Segunda Guerra Mundial, os atos de violência entre americanos e potiguares nos bares e cabarés da Ribeira e da Cidade Alta constituíam uma realidade.

Aumentara o número de cabarés em Natal em virtude da chegada dos americanos à cidade. Os cabarés e ―bas-fonds‖ eram os únicos locais onde havia movimento depois das 21 horas. Espaços como a Pensão Ideal, o Wonder Bar (Ribeira), o Bar Quitandinha (Alecrim), o Grande Ponto (Cidade Alta) e o Beco da Quarentena (Ribeira) eram frequentados por militares estrangeiros e brasileiros de baixa patente, sendo frequentes as brigas nesses locais da boemia natalense.

No contexto da Segunda Guerra Mundial, funcionou no local o Wonder Bar,
casa de diversão frequentada pelos americanos sediados na cidade (MELO, 1999).
Prédio em que funcionou o cabaré Arpège.

Os oficiais de alta patente frequentavam o Grande Hotel e o cabaré de Maria Boa, casa de luxo de Maria Oliveira de Barros, onde se encontravam as bebidas e as mulheres mais caras de Natal. Na Rua Doutor Barata, onde havia lojas, cafés e pensões alegres, hotéis e restaurantes, ocorreram casos de desavenças entre aqueles que os frequentavam, tanto americanos quanto potiguares, motivados pela preferência das mulheres em namorar os estrangeiros, provocando ciúmes nos rapazes natalenses.

Também eram comuns as brigas envolvendo norte-rio-grandenses e americanos por causa de prostitutas e de bebidas. Os jornais da época enfatizavam o fictício clima de harmonia e paz entre natalenses e americanos. Contudo, na verdade, os conflitos e as tensões entre ambos resultaram em casos de polícia, desmascarando a suposta cordialidade entre esses dois grupos.

multiplicaram-se as casas de meretrício na cidade, em virtude da presença de estrangeiros. A mais famosa foi o Cabaré de Maria Boa, instalado no bairro da Cidade Alta no período da Segunda Guerra Mundial.

O mais famoso cabaré de Natal foi a Casa de Maria Boa. Era um estabelecimento de luxo, o melhor da capital potiguar. A proprietária, Maria Oliveira Barros, chegou a Natal vinda de Campina Grande, com vinte anos, na década de 1940, período em que os americanos estavam em Natal em virtude da Segunda Guerra Mundial. A casa de Maria Boa ficava no bairro da Cidade Alta, próxima ao baldo, na Rua Padre Pinto e nas imediações do atual prédio da Cosern.

A casa hospedava prostitutas, muitas vindas do sul do país, que eram contratadas para trabalhar. O quadro de funcionárias era sempre renovado, de modo a manter mulheres belas e atraentes. No período posterior à Segunda Guerra Mundial, o cabaré continuou a receber os homens mais ricos e poderosos da cidade de Natal. Nas palavras do memorialista Ary Guerra Lima:

O Professor Antônio Pinto de Medeiros, frequentador assíduo do cabaré, costumava dizer que o estado do Rio Grande do Norte era governado em
Maria Boa, que era o único lugar onde se encontravam os Secretários de Estado, Deputados e Diretores de repartições, para discutir os problemas de Estado.

Os homens de melhor condição social, como as autoridades da administração pública e do poder legislativo do estado do Rio Grande do Norte, magistrados e empresários, frequentavam o ambiente. Os rapazes e senhores de menos recursos financeiros visitavam as casas de meretrício da Ribeira.

Dalcin, Lima e Barros (2012), em seu trabalho sobre o cotidiano do meretrício na cidade, deixam claras as relações de poder social que se estabeleciam nas diferenças de cunho econômico na transformação dessas relações, principalmente com o caráter marginal e excludente das profissionais do sexo, onde se estabeleciam cabarés de luxo como de Maria Boa e outros considerados de baixo escalão na Ribeira e beco da quarentena. Maria boa é considerada a maior figura de negócios do ramo, mantinha meninas selecionadas e treinadas, sob o cuidado de remédios para evitar doenças, manteve negócio de luxo durante todo o período da guerra.

Fotografia de Maria Oliveira Barros
Soldados americanos em bar 1941 pelo fotografo da Revista Life Hart Preston
Natal, por outro lado, ganhava ainda mais representações de uma “cidade menina com ares de grande”, pois, agora, o projeto de modernização ganhava sua maior forma e vigor, sendo “a antena receptora de todos os aviões que vem da Europa […] todas as aeronaves da América do Sul e do Velho Mundo…”.

OS PROBLEMAS DO CRESCIMENTO URBANO DESORDENADO

Cleantho Homem de Siqueira, ex-combatente da FEB, em entrevista (2002) na cidade de Natal à historiadora Pedreira (2015), diz:

Nossa cidade em 1939, quando iniciou a guerra, terminava no Aero Clube, pra lá não havia absolutamente nada, nada… Era mato. O quartel do 16º. RI [Regimento de Infantaria] foi inaugurado em 42, em 39 não tinha nada. O começo de tudo foi em 1942. O aspecto físico da cidade mudou, foi se expandido lá pros lados do Tirol em princípio […]. Houve uma mudança muito grande em Natal.

A coluna “Sociais” do “A República”, com o título de “Quantos habitantes tem Natal?”, questionou o pós recenseamento do Rio Grande do Norte em setembro de 1940, com então 54 000 mil habitantes, sendo o 17º menos populoso do Brasil, o que fez despertar tão questão sobre Natal:

O nosso território deve ter ganho muita gente. O movimento está visível a olho nú. Não é necessário esmiuçar por inquéritos nem métodos científicos. Uma prova desse andamento demográfico é a inferiodade crescente das coisas que se serve a população e ficaram estacionadas. O exemplo mais á vontade é o de serviço de transporte urbanos e depois, si não parecesse instável, o de hospedagem. Outros surgem á primeira observação o do abastamento, com preços aumentado dia a dia, juros que só são percebidos pelos ganham pouco, a capacidade, em plenitude dos Mercados Públicos, feitos para um futuro longinquo, e aumento das construções residenciais, o desenvolvimento progressivo dos bairros, a fração adventícia que se avoluma. (A REPÙBLICA, 1942).

Isso deixou evidente os problemas que Natal começa a sofrer nesse período, com a expansão do seu território e o aumento populacional, que estavam acontecendo sem controle e sem organização, haja vista que o transporte público de outrora, dos bondes, já não dava conta, principalmente em horários que o operário deixava suas tarefas, o fim do expediente em agências e repartições públicas, o que se refletia na
vida cotidiana da população menos abastada, a quem tivemos menos acesso a informações históricas sobre.

A exemplo das questões inerentes ao desenvolvimento urbano, pode-se citar o abastecimento de água e energia elétrica que implicaram em mudanças marcantes. Pedreira (2015, p. 31) diz que “[…] mesmo entre pessoas de famílias abastadas é recorrente a lembrança dos transtornos de quando ainda não havia água encanada”, o fornecimento em abundância de excelente água potável fora viabilizado também pela existência de lençóis freáticos baixos e de reservatórios de água que vinham das dunas próximas (SMITH JR, 1992).

Havia a necessidade de expansão de serviços básicos, afinal a população se tornava cada vez maior e menos abastada, o que deixava evidente a pobreza, no jornal “A Ordem” 45, em 20 de janeiro de 1943, já saia um apelo a Cia. Força e Luz para luz elétrica aos pobres, as dificuldades para aquisição do querosene e com seus preços cada dia mais altos.

Se tornava cada dia pior o acesso a combustíveis e seus afins com o cerceamento do governo no acesso dos combustíveis por meio marítimo por consequência dos ataques. A mesma matéria do jornal continuou a dizer “O recenseamento de 1940 veio provar que grande número de casas de nossa capital não tem iluminação elétrica. Hoje, com o aumento enorme da população, mais numerosos devem elas ser”, isso vem do apelo da igreja católica, do qual era produzido esse periódico.

Bonde em circulação pelas ruas de Natal durante a Segunda Guerra Mundial. Pelo visto absolutamente lotado com escoteiros.
Domingo 31 de Agosto de 1941. Fonte: A República

CRÔNICAS DE DANILO

Fica revelado um pouco da cidade do Natal da II Guerra Mundial, através do olhar de Danilo, cognome de Aderbal de França, considerado como pioneiro da Crônica Social no Jornalismo Norte-rio-grandense (Cardoso, 2000). Ele que foi um homem ligado à atividade jornalística por opção, que
ocupou Cargos como o de Diretor e de Editor-Chefe do Jornal “A República”, e que escreveu sobre o cotidiano da cidade durante quarenta e dois anos, em uma coluna diária que era nomeada segundo o conteúdo escrito.

Nasceu em Natal, em 05/01/1895 e faleceu em 25/05/1974. Estudou Medicina no Rio de Janeiro, quando foi Secretário do Senador Eloy de Souza, mas não concluiu sua formação, voltando para Natal para se dedicar ao Jornalismo. Foi fundador da Revista “’Cigarra’, primeira Revista dedicada à vida em sociedade (1928-30), e do jornal ‘O Diário’ (1939)”. Este último foi adquirido pelos Diários Associados, passando a se chamar “Diário de Natal”, cujo título mantém até os dias de hoje. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi Correspondente da Agência Nacional (Cardoso, 2000).

As Crônicas de Danilo, além de serem reveladoras, podem também ajudar a pensar a Cidade. No primeiro momento, manifestavam regogizo pelo seu crescimento, progresso e modernidade: festejavam as novidades e a prosperidade; para, em seguida, demonstrar surpresa e suspeição pelas mudanças, tornando-se quase alheias às notícias veiculadas pelo mesmo Jornal, relacionadas às inaugurações de abrigos anti-aéreos, aos treinamentos de defesa e aos exercícios de black-out.

As Crônicas escritas por Danilo entre os anos de 1940 e 1943, quando as Forças Armadas chegavam e começavam a se instalar em Natal, especialmente as que trataram de aspectos que diziam respeito ao espaço da Cidade, que falaram dos bairros, que observaram ou detalharam as transformações percebidas, as mais visíveis ou consideradasimportantes pelo autor, tanto que se deteve e discorreu sobre elas.

Até meados de 1941, demonstrou seu fascínio e admiração pela prosperidade observada, com as novas ruas que eram traçadas rapidamente na periferia da cidade sobre terrenos vazios e sitios arborizados, e com a evidente multiplicação de casas e vilas. Em “O bairro do Alecrim Prospera”
(15/09/1940), esta área da cidade, que havia sido regulamentada como bairro desde 1911, parecia estar consquistando sua autonomia, ascedendo à infra-estrutura urbana de maneira uniforme, água, energia elétrica, hospital, mercado público, feira, cinema e comércio diversificado.

Ou em “Petrópolis” (26/01/1941), ao ressaltar a superioridade aristocrática do bairro, os investimentos na antiga Avenida Atlântica (hoje Avenida Getúlio Vargas), o calçamento, as luminárias e o belvedere com vista para o mar, marcando o início da ligação da Cidade com a praia de maneira mais efetiva.

Ou, ainda, na Crônica “Mais um Hotel na Cidade” (14/06/1941), quando observou o seu despertar para o crescimento, que viveu nos anos imediatamente posteriores, quando a demanda por hospedagem “de qualidade” cresceu e vários comerciantes adaptavam seus edifícios, para que funcionassem como locais de hospedagem.

Neste caso, destacou a adaptação do “Edifício Varela”, uma edificação de dois andares na Av. Sachet, no bairro da Ribeira, com duas salas amplas térreas para restaurante e 60 quartos, com instalações próprias e próximo ao Cais do Porto.

Verificamos ainda em várias Crônicas, uma opinião que insinuava revelar suas dúvidas quanto à maneira como este “progresso” vai-se implantando na cidade, nas quais demonstrou preocupação com os possíveis desdobramentos. Em “Árvore e Sol”(10/01/1942), Danilo surpreendeu com uma reflexão sobre o desaparecimento das áreas sombreadas disponíveis na Cidade

Dentro deste mesmo enfoque, Danilo percebeu que estavam perdendo o controle sobre a cidade. Em “Estão Estragando o Bairro de Petrópolis” (11/02/1942), reafirmou seu lugar junto à elite, constatando a impoderabilidade do que as mudanças poderiam representar na lógica de ocupação do espaço da cidade. Através do olhar deste sujeito, podemos descortinar algumas novas cidades em Natal, no seu relato sobre fatos e mudanças
misturadas à explicitação de sua visão de mundo e de cidade, porém compartilhada por um grupo que exerceu o poder sobre o uso da cidade e as perspectivas de uso e construção da cidade.

Era uma elite que defendia a manutenção da setorização dos lugares de moradia que parecia estar arraigada na Cultura da cidade: Petrópolis, Tirol e Cidade Alta para os ricos, e o Alecrim e as Rocas para os pobres, que pode ter sido consolidada após o ano de 1945, quando o esforço de Guerra se encerrou na cidade. Nada poderia alterar essa lógica segregacionista, nem mesmo a dimensão relacionada à questão do Poder, do Legal e da
Verdade. O seu argumento discursivo revelou um sujeito que apresentava a versão dominante do uso do espaço da cidade, oferecendo as condições para que o processo de mudança dentro de outra lógica pudesse ser barrado.

Neste contexto, o sistema de abastecimento de água e esgoto da cidade, recém concluído pelo Escritório Saturnino de Brito, assim como o sistema de transportes coletivo de bondes, entraram em colapso. O bonde, apesar de ineficiente, passou a ser o principal meio de transporte da cidade e para todas as Classes Sociais, porque o País vivia uma crise de escassez de combustível, que obrigou ao Governo Federal a determinar seu
racionamento, sob pena de paralisar o funcionamento do Parque Industrial que se estabelecia no País.

O bairro do Tirol significou a expansão do limite urbano na direção da Base de “Parnamirim Field”, ao longo da “pista” (“Parnamirim Road”), muito distante do centro e próximo do fluxo e da movimentação dos caminhões, dos soldados e dos quartéis. Nesta distanciamento e isolamento do centro, os moradores de Tirol e Petrópolis costumavam participar das festas promovidas pelos oficiais americanos nos seus Clubes, assim como convidavam os soldados para fazerem refeições em suas residências.

As principais informações sobre os acontecimentos sociais estavam na coluna de Danilo, pseudônimo de Aderbal de França, que trazia as crônicas com riqueza de informações e referências sobre a cidade e as elites administrativas. As principais informações sobre os acontecimentos sociais estavam na coluna de Danilo, pseudônimo de Aderbal de França, que trazia as crônicas com riqueza de informações e referências sobre a cidade e as elites administrativas.

O FIM DA GUERRA

Enfim, o momento esperado por tantos: a 5 de maio de 1945 dava-se a queda de Berlim e a 8 a Alemanha rendia-se. Terminava a Segunda Guerra Mundial, que tanto prejuízo deu ao mundo e tantas modificações trouxe à vida da pequena Natal.

Da Times Square em Nova York à Praça Vermelha em Moscou, multidões comemoravam a vitória dos aliados na II Guerra Mundial. Nesse mesmo dia em Natal, foi programada uma solenidade à noite no Teatro Carlos Gomes.

No dia 10, outra sessão solene realizou-se no Teatro Carlos Gomes. Entre cada discurso ouvido, pianistas da cidade tocaram os hinos nacionais dos
países vencedores: Lygia Bezerra de Melo (“Fantasia sobre o Hino Nacional Brasileiro”, de Gottschalk), Moisés Roiz, (“Hino Nacional Polonês”), Ethel Mandel (“Estados Unidos”), Maria Célia Pereira (“Inglaterra”), Yara Bezerra de Melo (“França”).

Alvamar Furtado de Mendonça, então recém-formado em direito, foi convidado para pronunciar um discurso no Dia da Vitória. Ele se vestiu bem e caprichou na redação do discurso. Na hora em que olhou para a plateia, teve um choque: estranhamente, o teatro estava quase vazio.

Os organizadores do evento, temendo fracasso na solenidade, saíram pelo bairro da Ribeira e recrutaram uma legião de transeuntes – mendigos, boêmios, prostitutas – para ocupar pelo menos uma parte dos 600 lugares disponíveis. Alvamar enfim falou, mas um tom melancólico já tomara conta do teatro, das Ruas, das pessoas. A cidade parecia estar de luto. Por que a guerra havia acabado.

No dia 5 houve missa campal, visitas aos túmulos dos soldados americanos no cemitério do Alecrim e sessão solene no Teatro Carlos Gomes. O dia 8 foi feriado nacional.

A banda de música do Regimento Polícial Militar finalizou com o “Hino Nacional Brasileiro”. Faltou ser tocado o hino nacional da Rússia, país que desempenhou importantissimo papel na vitória dos aliados. Waldemar de Almeida, organizador do evento, não incluiu o hino russo por falta da sua partitura.

Talvez fosse mais certo considerar-se que Waldemar havia propositalmente excluído a Rússia dos festejos. Seus princípios religiosos católicos não combinariam com uma homenagem a um país comunista.

Natal e o fim da Segunda Guerra Mundial no Teatro Carlos Gomes, atual Albuquerque Maranhão.
Última edição de jornal, em inglês, editado em Parnamirim. Janeiro de 1946. “Nossa última ediação – Saudamos o Brasil”, diz a manchete.

O ÚLTIMO MILITAR AMERICANO EM NATAL

Até o final da Segunda Guerra Mundial centenas de cemitérios temporários haviam sido criados pelas forças armadas dos Estados Unidos em campos de batalha e locais de apoio ao redor do mundo.

Com o fim da guerra foi organizada uma grande operação para trazer aos Estados Unidos 233.181 americanos mortos, tudo sob a coordenação da American Battle Monuments Commission (ABMC), uma agência do governo americano criada em 1923 e destinada exclusivamente a tratar do repouso eterno dos guerreiros estadunidenses.

Grande parte dos cemitérios temporários foi desativada durante a operação de traslado dos corpos para os Estados Unidos, que se estendeu de 1945 a 1951. Às famílias que perderam filhos, irmãos e maridos no conflito foram respeitosamente ouvidos para instruir a ABMC onde queriam que os restos mortais de seus entes queridos ficassem enterrados. Muitas famílias acreditavam que seria mais apropriado para seus parentes descansarem junto aos seus companheiros de combate, perto dos campos de batalha onde eles haviam lutado e morrido. Assim 93.242 militares ficaram enterrados em alguns dos 24 cemitérios que os militares americanos decidiram manter permanentemente no exterior e que são até hoje mantidos pela ABMC.

Essa situação também aconteceu em Natal, que chegou a ter um destes cemitérios temporários.

Segundo consta no livro “História da Base Aérea de Natal”, de Fernando Hippólyto da Costa (Págs. 157 a 160), quase dois anos após o fim do conflito, no dia 10 de abril de 1947, um navio da marinha americana aportou em Natal, com uma equipe de especialistas destinados a trabalharem na remoção dos americanos aqui sepultados.

Segundo o autor, militar aposentado da Força Aérea Brasileira-FAB, esta operação contou com o apoio de aviões da FAB, que trouxeram de outras localidades brasileiras os corpos dos americanos ali enterrados. Para se ter uma ideia desta operação, o autor de “História da Base Aérea de Natal” informa que foram trazidos corpos de americanos que estavam sepultados até na cidade pernambucana de Petrolina.

A movimentação chamou a atenção da população natalense, que passou a denominar jocosamente o trabalho como “Operação Papa-defunto”. Mas um dos corpos não retornou para os Estados Unidos. Está sepultado no Cemitério do Alecrim.

A pedra tumular, já bem desgastada, é levemente arredondada na parte superior e nela encontramos uma cruz latina para os cristãos. Conforme se vê na inscrição inserida no mármore branco, ali repousa o sargento Thomas N. Browning, oriundo do estado de Ohio. Quando da sua morte ele era um jovem de apenas 22 anos, nascido em 25 de junho de 1922, um domingo e falecido coincidentemente em outro domingo, 18 de julho de 1943.

Mesmo sem o sargento Browning ter morrido em combate, derramando seu sangue em solo estrangeiro e tombando junto a seus companheiros de farda, algo fez com que a sua família da distante Ohio decidisse deixar seu parente em nossas terras.

O embarque no porto de Natal dos corpos dos militares americanos em 1947.
Visão da lápide do sgt. Browning.

IN MEMORIAM

Ex-combatente da Segunda Guerra Mundial, Alcindo Arnaldo da Silva completou 94 anos no sábado (18/07/2020) e morreu o domingo (1907/2020) de Covid-19 em Natal. Ele estava na UTI de um hospital em Natal e lutava há 15 dias contra a doença.

FONTE:

A CASA PRÓPRIA: SONHO OU REALIDADE? Um olhar sobre os conjuntos habitacionais em Natal. Prof. Dr. Márcio Moraes Valença. Orientador . NATAL – RN. 2007

A cidade e a guerra: a visão das elites sobre as transformações do espaço da cidade do Natal na Segunda Guerra Mundial / Giovanna Paiva de Oliveira. – Recife, PE, 2008.

Anuário Natal 2007 / Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – Natal (RN): Departamento de Informação, Pesquisa e Estatística, 2008.

Cantos de bar: sociabilidades e boemia na cidade de Natal (1946-1960) /Viltany Oliveira Freitas. – 2013.

Dos caminhos de água aos caminhos de ferro: a construção da hegemonia de Natal através das vias de transporte (1820-1920) / Wagner do Nascimento Rodrigues. – Natal, RN, 2006.

HABITAÇÃO SOCIAL: ORIGENS E PRODUÇÃO. (NATAL, 1889-1964). CALIANE CHRISTIE OLIVEIRA DE ALMEIDA. SÃO CARLOS. SETEMBRO, 2007.

História do Rio Grande do Norte / Sérgio Luiz Bezerra Trindade. – Natal: Editora do IFRN, 2010.

Luís Natal ou Câmara Cascudo: Luís Natal ou Câmara Cascudo: o autor da cidade e o espaço como autoria o autor da cidade e o espaço como autoria. Francisco Firmino Sales Neto. Natal/RN. 2009

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O Estado Novo no controle da informação cotidiana: o caso da cidade de Natal (1941-1943) a partir do jornal “A República” / Fernanda Carla da Silva Costa. – João Pessoa, 2019.

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