USO’s – Organização dos Serviços Unidos
Nos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial, havia inúmeras organizações de serviços individuais, instituições de caridade e clubes que ofereciam recreação e atividades de elevação do moral para os homens e mulheres das Forças Armadas dos EUA. Chefe, e maior, entre eles estava o USO. Durante a Segunda Guerra Mundial, a USO era uma grande organização que procurava fornecer uma vasta gama de serviços muito necessários para militares e pessoal de apoio em todo o mundo. A USO tornou-se tão sinônimo de ajuda e recreação para os soldados que, com o tempo, “uso”, uma marca muito específica, tornou-se um termo genérico para descrever qualquer clube, cantina ou organização de militares ou militares, independentemente da afiliação real da USO. Aqui, estamos preocupados estritamente com a marca USO e não com muitas outras organizações que emularam ou seguiram o exemplo oferecendo serviços semelhantes.
A United Service Organizations for National Defense foi criada por ordem presidencial em 4 de fevereiro de 1941. A USO foi incorporada no estado de Nova York como uma organização privada sem fins lucrativos, mantida por cidadãos e corporações.
O presidente Franklin D. Roosevelt queria que o moral do pessoal militar permanecesse alto e acreditava que as organizações de serviço atuais seriam mais adequadas para o trabalho do que o Departamento de Defesa. O Departamento de Defesa sentiu que deveria controlar todos os aspectos da vida do soldado, no entanto, os presidentes do Exército de Salvação, Conselho de Bem-Estar Judaico (JWB), National Catholic Community Service (NCCS), Young Men’s Christian Association (YMCA), Young Women’s Christian Association (YWCA) e a National Traveler’s Aid Association sentiram que suas organizações eram mais adequadas para a responsabilidade.
No final, chegou-se a um acordo. As seis organizações de serviços civis estariam no comando, e os militares forneceriam materiais de construção, locais e mão-de-obra quando necessário e disponível. Por exemplo, em uma cidade que não tinha um prédio adequado para ser usado como clube, os militares construíam uma estrutura usando suprimentos e mão de obra da base militar local.
A USO originalmente pretendia oferecer assistência apenas em comunidades que não podiam suportar o grande fluxo de pessoal de serviço, pois era isso que seu orçamento e capacidade de arrecadação de fundos permitiam. Logo após a concepção e a integração inicial da USO em várias comunidades, ficou evidente a necessidade premente de mais operações em mais comunidades. Isso levou à criação das Operações Conduzidas pela Comunidade (CCO). Os CCOs nasceram do desejo de um indivíduo de ter uma presença e programas USO em sua comunidade.
O USO Nacional permitiu a franquia dessas operações para atender às necessidades da comunidade individual, desde que seguissem todas as regras, regulamentos, idéias e padrões do USO Nacional. Isso permitiu uma padronização das políticas USO. Em 1943, todos os CCOs foram integrados à estrutura nacional da USO.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a USO era uma organização que supervisionava e fornecia serviços de recreação e ajuda para os homens e mulheres das Forças Armadas dos Estados Unidos. Os tipos de serviços oferecidos pela USO foram: Clubes, Lounges e Serviço de Ajuda ao Viajante, Serviço Móvel e de Manobras, Hospitalidade Domiciliária, Serviço aos Trabalhadores da Guerra, Serviço às Mulheres nas Forças Armadas, Serviço aos militares afro-americanos, Serviço aos Marinheiros Mercantes, Serviço a membros das forças armadas dos Aliados dos EUA enquanto temporariamente nos Estados Unidos, Serviço no Exterior e Camp Shows Inc.
A USO não estava interessada em mudar as normas sociais da época. A integração e cooperação das várias organizações religiosas (católicas, protestantes e judaicas) foi revolucionária por si só. Se os clubes fossem localizados em uma igreja ou sinagoga, era necessário que todos os credos fossem bem-vindos e fosse fornecida literatura informativa sobre todas as organizações religiosas da comunidade. Todas as corridas foram bem-vindas nos clubes e eventos da USO. Nas comunidades segregadas, os clubes USO também foram segregados e nas comunidades não segregadas foram integrados.
Em mais de 3.000 comunidades no Hemisfério Ocidental, os clubes USO foram estabelecidos e se tornaram um “lar longe de casa” para muitos militares e trabalhadores da indústria em tempos de guerra. A estrutura organizacional da USO foi altamente estruturada nos níveis nacional e local.
As grandes cidades que tinham representação de uma ou mais das seis agências fundadoras como parte de seu Comitê Executivo/Conselho de Administração eram conhecidas como Conselho USO. Em pequenas comunidades que não tinham essa representação, esses grupos de cidadãos escolhidos para representar a USO eram conhecidos como USO Committees.
Cada clube foi financiado em nível local e nacional por meio de Community War Chests, The National War Fund e doações individuais. Os clubes eram responsáveis pelos padrões e regulamentos da National USO. Dependendo do tamanho da comunidade e de suas necessidades, pode haver mais de um clube, cada um com sua clientela específica. Os clubes teriam operações especializadas com base nas necessidades e interesses do militar.
Um clube pode ter tido entretenimento mais animado, como danças, torneios esportivos e passeios. Outro pode oferecer uma creche e atividades para esposas e filhos de soldados estacionados nas proximidades. Mulheres soldados e enfermeiras poderiam ter seu próprio clube, onde se sentiriam mais relaxadas. Por fim, War and Industrial Workers pode ter tido seu próprio clube, aberto vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, para acomodar todos os turnos 24 horas por dia com danças, passeios matinais e outros serviços relacionados à indústria do tempo de guerra.
As atividades e instalações fornecidas e coordenadas pelos USO Clubs podem incluir, mas não estão limitadas a: equipamento atlético, tiro com arco, clube de arte, materiais de arte, auditório, badminton, beisebol, basquete, danças de celeiro, festas na praia, bingo, ringue de boxe, bridge clube, Camera club, cantina, jogos de cartas, Damas, Verificando, clube de xadrez, Clubmobile/mobile canteen, Concertos, trabalhos manuais, loja de artesanato, croquet, Instrução de dança, Clube de dança, Creche, Restaurantes, Clube de teatro, Equipamento de pesca, Povo dançando, futebol, instrução em língua estrangeira, sala de jogos, Glee club, equipamento de ginástica, passeios de feno, programação de férias, passeios a cavalo, quadra de ferradura, festas em casa, informações de habitação, patinação no gelo, juke-box, cozinha, biblioteca, revistas, remendar kits, minigolfe, filmes, instrumentos musicais, biblioteca de música, sala de música, jornais, pista de dança ao ar livre, churrasqueira ao ar livre, pátio ao ar livre, teatro ao ar livre, jogos, câmara escura fotográfica, piano, instalações para piquenique, piqueniques, pingue-pongue ng, mesas de sinuca, instalações de prensa, telefone público, saco de pancadas, PX, rádio, sala de leitura, toca-discos, informações religiosas, patinação, instalações de costura, equipamento de barbear, engraxate, chuveiros, shuffleboard, lanchonete, danças sociais, salão social, softball, quadrilha, natação, piscina, jogos de mesa, tênis, tether ball, ingressos para teatro, bailes e festas temáticas, auxílio viagem, instrução de digitação, máquina de escrever, serviço de manobrista, vôlei, gravações de voz (“cartas” em registros ), casamentos, assados de salsicha e instalações para escrita.
O serviço de qualquer entorpecente em qualquer USO Club, Lounge, Mobile Canteen ou em qualquer festa ou função social sob os auspícios do USO era absolutamente proibido. A política do USO em relação aos encargos do pessoal de serviço era fornecer todos os serviços gratuitamente, exceto aqueles que não poderiam ser oferecidos a menos que alguns encargos fossem cobrados, como maços de cigarros. O Exército preferia que doces, cigarros e alimentos fossem vendidos nas USO Snack Bars da mesma forma que o Exército vendia esses itens em suas próprias Post Exchanges. “É importante que não sejam instituídas práticas que possam prejudicar o auto-respeito dos militares.” (Manual da USO Community Conducted Operations, 38).
Em cada clube havia um Diretor remunerado e, dependendo do tamanho do clube, também um Diretor Adjunto que era contratado pelo comitê executivo ou diretoria, com a aprovação do USO Nacional. Ocasionalmente, o National USO nomeou diretamente um diretor de clube.
A National USO forneceu o treinamento apropriado para todos os Diretores e Diretores Adjuntos. Esses indivíduos eram responsáveis pelas operações gerais do dia a dia do clube, pelas comunicações com outras organizações de serviço em sua comunidade local e pela implementação da política nacional de USO dentro do clube.
Diretores e diretores adjuntos eram os únicos cargos remunerados dentro dos clubes. Outro cargo importante dentro do clube USO era o de Recepcionista Sênior, um cargo voluntário. Em geral, eram casados e/ou com 35 anos ou mais, com referências comunitárias válidas. As recepcionistas seniores recrutadas individualmente precisavam fornecer pelo menos duas referências de caráter. Recepcionistas seniores recrutadas de forma organizacional, funcionando como um grupo ou designadas para representar especialmente o grupo, foram consideradas aceitáveis se sua associação fosse em um clube reconhecido e aceito pela USO.
A USO afirmou que, “uma vez que a USO é uma agência civil, é desejável que representantes de agências não-membros usem roupas civis enquanto estiverem a serviço da USO”. (USO Manual Community Conducted Operations, 43) Os requisitos de treinamento para recepcionistas seniores incluíam orientação e treinamento em serviço. Essas mulheres eram presidentes e membros de comitês; os membros do comitê escolheram acompanhantes para bailes, festas e outros eventos sociais. Outras responsabilidades dentro do clube eram recepção, cantina e refresco, sala de jogos, biblioteca, informações, verificação e serviços similares (USO Manual Community Conducted Operations, 41). Eles também resolveram problemas caso a caso e serviram como conselheiros de fato para muitos militares que visitavam os clubes da USO. Esperava-se que as anfitriãs sêniores fossem maternais e agissem de maneira não sexual (Winchell, 31).
Linha do tempo USO
4 de fevereiro de 1941 A USO é constituída sob as leis do Estado de Nova York.
30 de outubro de 1941 USO Camp Shows, Inc. é estabelecido para fornecer entretenimento às tropas em todo o mundo.
28 de novembro de 1941 O primeiro clube USO construído pelo governo é inaugurado em Fayetteville, N.C.
Janeiro de 1942 O USO Overseas Department é estabelecido para estabelecer clubes em pontos do Hemisfério Ocidental fora dos Estados Unidos continentais.
29 de janeiro de 1942 As primeiras unidades USO móveis são introduzidas em serviço para servir militares em manobras e em locais remotos.
31 de dezembro de 1947 Todos os clubes e instalações da USO são fechados, e a organização recebe uma dispensa honrosa do presidente Harry S. Truman.
Janeiro de 1951 O USO é reativado para a Guerra da Coréia sob um Memorando de Entendimento entre o presidente e o Departamento de Defesa
20 de dezembro de 1979, o presidente Jimmy Carter assina o recém-concedido alvará do Congresso da USO
Presente USO opera nos Estados Unidos e internacionalmente.
NATAL ANTES DOS USO’s
Em 1939, ainda possuíam pouca infra-estrutura, da qual se destacavam os clubes esportivos – Aero Clube e Associação Feminina de Atletismo (AFA) –, o parque infantil e as quadras esportivas na Praça Pedro Velho.
A instalação da maior base militar norte-americana fora dos EUA ocorreu em Natal, mais precisamente, entre 7 de julho de 1941 (data oficial do início das atividades) e 1946, ano ao longo do qual os norte–americanos foram deixando gradativamente a base, por fim administrada somente por brasileiros (CLEMENTINO, 1995, p. 15). Segundo estimativas de Câmara Cascudo (1980, p. 401), um contingente de 10.000 americanos, sem contar os militares brasileiros, aportou em Natal, numa época em que a cidade tinha cerca de 55.000 habitantes. Ou seja, 18% da população, num período de tempo muito curto, passaram a ser constituídos por estrangeiros em trânsito pela cidade.
Assim foi a II Guerra em Natal: um tempo de emoções intempestivas, de alegrias e tristezas fora de hora e de contexto. Entre 1942 e 1945 aqui funcionou o principal quartel general dos países aliados no hemisfério sul. Por ser das cidades brasileiras a mais próxima do continente africano – 3 horas de voo em jatos de hoje e 8 horas para os aviões de 1943 de Natal a Dakar no Senegal – era uma “ponte” para todos os voos americanos que levavam militares das três Armas rumo à África ou aos combates no Atlântico Sul. Em 1943, no auge do conflito, Parnamirim era dos mais congestionados aeroportos do planeta, com até 800 pousos e decolagens num dia de pico.
A “corrente” que demarcava o limite da cidade, ficava no cruzamento da Avenida Hermes da Fonseca com Alexandrino Alencar. A Base Aérea e a “pista” ligando Natal a Parnamirim foram construídas em tempo recorde envolvendo 6 mil trabalhadores. A Base Naval também foi construída nesse período.
Os clubes passaram a abrir todos os sábados, para festas oferecidas ao povo natalense, com excelentes orquestras de civis e militares yankees. Nestes clubes os visitantes bebiam, e dançavam com as moças da terra, filhas das famílias mais “pra frente”, numa camaradagem, como se tudo já tivesse sido ensaiado.
A cidade mudou: Em pouco tempo, Natal deixou de ser uma pacata capital de estado nordestino, assumindo ares de uma cidade cosmopolita. Agora as ruas centrais fervilhavam de pessoas e com o tráfego de veículos. O comércio apresentava os melhores resultados de todos os tempos. Inauguravam se novos bares, restaurantes, prostíbulos, clubes e hotéis. Pela primeira vez, em sua história, a cidade vivia o burburinho da multidão, como nas metrópoles. (LIMA, 2001, p. 72).
Em “Parnamirim Field”, ainda foram construídos depósitos subterrâneos para água e combustível, armazéns para grandes estoques de sobressalentes e de materiais que seriam transportados para outros destinos; um pipeline com mais de 20 Km de extensão desde o Porto de Natal e da Base Marítima da Rampa, pois eram consumidos 100 mil litros de gasolina por dia na Base; e a “Parnamirim Road”, conhecida como “a pista”, reduzia o trajeto de 3 horas para 20 minutos. Através do Jornal Foreign Ferry News, verificou-se a existência de restaurantes e cafeterias, com capacidade de servir 500 pessoas de cada vez (06/06/1943, Vol.1, p.4); uma padaria (16/06/1943, Vol.1, p.5); uma fábrica de coca-cola (18/04/1944, Vol.2, p.6); um supermercado; um hospital com disponibilidade de 178 leitos; uma biblioteca com 5 mil volumes; discoteca; sorveteria; capela para 400 pessoas; quadras de beisebol e de diferentes esportes; escritório de seguros; escritório de câmbio; teatro; clubes para oficiais e subalternos, os USO’s, tanto na Base como na Cidade; e Emissora de Rádio – USMS, com programa direto pela Columbia Broadscasting System de Nova York (Melo, 1993).
Esses estrangeiros não estavam confinados nas bases militares. Ocupavam, rotineiramente, pelo menos dez outros lugares, como o Marine Corpus, as staff houses para pilotos, as casas do cônsul e comandante da base, o FirstAid e os clubes USO – United Service Organizations, todos espalhados pelos bairros da cidade, além da Fazenda Milharada (CLEMENTINO, 1995, p. 11).
Durante a presença dos americanos, o montante de dinheiro em circulação aumentou; mesmo depois, a população local continuou crescendo: passou de 55.000 para 103.000 habitantes em apenas dez anos, entre 1940 e 1950.
Neste sentido a instalação da base aérea norteamericana é responsável por um grande crescimento da expansão urbana da Capital Potiguar.
Segundo Mariz e Suassuna (2002, p. 327), Natal: Mesmo sendo uma cidade pequena, contava com entidades científicas como o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, localizado na Rua da Conceição, 622, a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, o Aero-Club do Rio Grande do Norte, localizado na Av. Hermes da Fonseca, onze clubes esportivos, três jornais – A República, A Ordem e o Diário (18-09-1939) – e o Grande Hotel, único hotel em Natal na época, que pertencia ao Estado mas fora arrendado a Theodorico Bezerra.
Os soldados e os oficiais dos Estados Unidos frequentavam a Cidade do Natal e a vida das elites, particularmente nos clubes sociais e nas residências. Na Cidade Alta e na Ribeira, “os cafés e bares enchiam-se da alegre juventude que, nos intervalos de trabalho, vinham aumentar os lucros dos comerciantes e proporcionar, com suas presenças, uma nova feição à pacata cidade dos Reis Magos” (MELO, 1993, p.23-24).
A partir de 1943, os militares estadunidenses organizaram uma estrutura própria dentro da cidade para entreter seus soldados, que oferecia uma programação cultural e social permanente, que se chamavam USO’s – Organização dos Serviços Unidos. Os Estados Unidos instalaram os clubes nas cidades que abrigavam suas bases na América e na África, a qual foi “idealizada e preparada material e tecnicamente, para dar assistência aos soldados do Tio Sam, que se encontram a serviço da Pátria longe de seu país” (A INAUGURAÇÃO hoje do USO – Town Club. A República, Natal, 24 mar. 1944.). Em Natal a entidade responsável por esses locais era denominada U.S.O. Overseas Department in Natal.
O lazer era feito nos vinte e cinco clubes recreativos existentes, no Teatro Alberto Maranhão, e nos cinemas, Rex, Rio Grande, Nordeste, São Luiz, São Pedro, São Sebastião, São João e Potengi, além do passeio de barco a motor e a vela até a praia da Redinha, com saída do porto flutuante do Canto do Mangue.
USO DA AVENIDA GETÚIO VARGAS
Em Natal, foram instalados o USO da Avenida Getúlio Vargas, no bairro de Petrópolis, inaugurado em 1º de março de 1943, destinado à oficialidade. Estava localizado no fim desta via. Era denominado de USO praia.
Não foram encontradas referências no Jornal A República quanto ao início das atividades do USO da Getúlio Vargas. Suas instalações eram tidas como requintadas e as atividades eram reservadas. Era frequentado apenas por autoridades estadunidenses residentes ou de passagem pela cidade, além de um pequeno grupo das elites locais, particularmente membros do governo e do comércio.
Segundo o norte-americano William L. Highsmith, que serviu em Natal entre abril de 1943 e agosto de 1945, era normal na sede do U.S.O. de Petrópolis existir redes de dormir armadas em um alpendre e ele algumas vezes descansava nesse local após o turno da noite anterior na Base de Parnamirim (Clyde Smith Junior – Trampolim Para a Vitória. 2. Ed. – Natal-RN: Ed. Universitária, 1999, Páginas 32.)
Avenida Atlântica (Getúlio Vargas) nas primeiras décadas do Século XX. Imagem em segundo plano da Ponta do Morcego. Em destaque para o bonde. O registro pode ser feito a partir do Hospital Miguel Couto (Hospital Universitário Onofre Lopes).
USO TOWN CLUB
foi inaugurado em 1º de março de 1943, o USO Town Club, localizado na Praça Augusto Severo, onde é hoje a firma Limarujo, no bairro da Ribeira, e voltado à recreação de soldados e marinheiros. Era denominado de USO cidade.
A inauguração do USO Town Club, voltado para os soldados e marinheiros, teve uma grande cobertura do Jornal A República. As suas instalações ficavam no antigo Cinema Politeama, no bairro da Ribeira, cujas instalações foram reformadas, O antigo auditório foi decorado e no palco foi instalada uma orquestra, dispondo de espaço para apresentações. Foram colocadas mesas que circundavam a parte central do salão, onde as pessoas dançavam e confraternizavam. Além disso, o clube ainda possuía um terraço e um “buffett”, onde eram servidas as bebidas e comidas (A INAUGURAÇÃO hoje do USO – Town Club. A República, Natal, 24 mar. 1944.). A finalidade do clube era
[…] oferecer distrações úteis a marinheiros e soldados norteamericanos. Serviço de natureza evidentemente louvável. Camaradagem sem a presença de hábitos maléficos. Ambiente instrutivo, onde há leitura e palestra agradáveis. Onde paira um espírito de comunicabilidade necessário ao esforço de guerra (FRANÇA. (Aderbal. USO em Natal. A República, Natal, 16 set. 1943j.).
A programação do USO Town Club, em geral, iniciava-se entre 18:30 e 20 horas e se estendia até a meia-noite. Alguns funcionários das forças armadas
estadunidenses foram destacados para trabalhar nos clubes e vieram para Natal para organizar as recepções e festas, que eram preparadas com musicais e jantares. Alguns eventos recebiam as autoridades locais como convidados, particularmente políticos, comerciantes, jornalistas e intelectuais da cidade. O USO também promovia campanhas assistenciais e no período natalino de 1943 realizou a campanha “Natal das crianças pobres”, que pretendeu oferecer “aos soldados americanos, longe de sua pátria, a oportunidade de presentear as crianças brasileiras, como se assim estivessem praticando com seus próprios filhos” (AS CRIANÇAS pobres, o USO e as forças armadas americanas. A República, Natal, 24 dez. 1943.).
O entrosamento entusiasmava as elites locais e aos jornalistas do Jornal A República, que justificavam aquela sintonia porque a “maioria dos soldados que frequentam o clube […] são convocados e pertencem às melhores famílias dos Estados Unidos” (FRANÇA. Aderbal. Função social na guerra. A República, Natal, 27 jun. 1944b).
Grandes festas foram animadas pelas Bandas de Jazz do Exército Norte Americano, em que predominavam o jazz, o twist e o rock. No período mais crítico da falta de habitação para alugar, algumas famílias chegaram a hospedar, em suas próprias residências os oficiais e os soldados norte-americanos, enquanto aguardavam o término da construção das habitações. Para os soldados de baixa patente eram improvisadas barracas como moradias e o seu lazer se desenvolvia no bairro das Rocas e da Ribeira, onde foi construído um USO para os soldados, instaladas muitas casas de diversão e onde proliferavam os cafés, os cassinos e os cabarés (Melo, 1993).
As festividades também são um acontecimento à parte do cotidiano da cidade, conhecidas no período por reunirem brasileiros e americanos, dos bailes às festas de carnaval, no dia 14 de maio de 1943 realizou-se o primeiro baile no clube U. S. O (SMITH JR, 1992).
Os grandes clubes da cidade como Aeroclube e Hípico reuniam as confraternizações de oficiais e civis graduados da Base, dançava-se de tudo, de afoxés a jazz (MELO, 2015). Quanto aos festejos carnavalescos, no período havia uma preocupação em manter as especificidades potiguares, desde fantasias como a dos grupos papangus e as modinhas genuinamente regionais (PEDREIRA, 2012). Essas são partes que constituem e formam a cotidianidade de Natal durante o período de 1941 a 1943, com o advento do Estado Novo e da guerra se tornou notório como as estruturações das coisas dos anos 1930 para 1940 ganharam outros contornos que se tornaram mais solidificados com a vivência da cultura de outros, com mais reflexos dos acontecimentos de guerra da convivência com esse contingente.
Existem, em jornais natalenses, informações de festas realizadas nesses ambientes, que contaram com a presença de autoridades brasileiras e norte-americanas. No jornal A Ordem, edição de 15 de abril de 1944, na 1ª página, temos informações de como foram as festividades em comemoração ao dia “Pan-Americano” no U.S.O. da Ribeira. Uma data bem oportuna e característica daquela época, em que se buscava a união entre os povos do Brasil e dos Estados Unidos. Nesse evento esteve presente o General Fernandes Dantas, natural de Caicó, que nessa época era o interventor no Rio Grande do Norte nomeado por Getúlio Vargas.
USO EM PONTA NEGRA
Segundo Smith Junior (SMITH JUNIOR, Clyde. Op. Cit., 1992, p.183), no início de 1945, o USO também montou uma casa de praia em Ponta Negra com uma cantina que oferecia aos banhistas, militares e membros das elites locais, equipamentos de praia, jogos, material para leitura e escrita. A Cidade do Natal virou uma cidade de festa e suas elites se desdobravam para estar presentes nas inúmeras atividades dos clubes da Ribeira, Petrópolis, Tirol e Parnamirim.
Há exatamente 70 anos, um novo local de entretenimento das tropas militares americanas, localizadas aqui, começou a funcionar na Praia de Ponta Negra. Na verdade, o que foi noticiado pela imprensa, era a instalação de um “beachhead” naquela ainda distante praia ao sul de Natal. Talvez o significado aqui do nome “beachhead” não fosse o mesmo daquela operação das tropas em combate, que, ao chegar na costa do território inimigo, ele possa ser apreendido e mantido, para assim, garantir o contínuo desembarque das tropas e dos materiais.
Esse beachhead era quase no estilo dos USOs já existentes na cidade. Uma extensão na verdade. Foi com a aprovação das autoridades de Parnamirim, que um serviço de cantina foi estabelecido, possibilitando aos banhistas ótimo atendimento. Com a praia aberta a qualquer hora, eram servidos sanduíches e bebidas frias. Cadeiras de praia, esteiras e ainda espreguiçadeiras estavam disponíveis para os usuários.
Eram ainda ofertados equipamentos esportivos adequados para uso na praia, jogos como Xadrez, damas, cartas, jornais, revistas, etc. Com a instalação desse novo local de divertimento, a senhorita de nome, Margaret Weiher, antes trabalhando em um dos USOs da cidade, fora designada a operar esse novo serviço de expansão dos USOs. “Peggy” já era bem conhecida por militares nesta área, tendo trabalhado por vários meses na lanchonete do, “Town Club”, USO localizado na Praça Augusto Severo.
Agora as atividades desse programa estariam sendo introduzidas em Ponta Negra pelo Serviço Móvel do USO. Foi noticiado que, na tarde do dia 25 de março de 1945, aconteceria na praia uma grande festa no estilo da “Coney Island Carnival” . Seria para marcar o inicio desse novo serviço móvel e chamar a atenção de todos os militares para o local.
Lutas de boxes, competições esportivas, músicas, um concurso de beleza de banho e outras atrações seriam oferecidas no carnaval. Mesmo antes da inauguração, já havia projeto para ampliação das instalações. Um pavilhão com amplo espaço para relaxamentos e jogos seria adicionado em um futuro próximo. Um verdadeiro local de paz e alegria, muito diferente do que estava acontecendo no outro lado do Atlântico.
MIAMI
As praias da cidade, onde só ia aos domingos ou sob prescrição médica, foram invadidas pelos soldados que iam de manhã, de tarde e de noite, havendo até a criação de uma praia particular, no fim da Areia Preta, batizada Miami pelos americanos.
Os militares americanos tinham até uma praia para chamar de sua. Na verdade chamaram de Miami Beach. Trata-de da atual Areia Preta. Construíram até uma casa de veraneio.Registro do fotógrafo da Revista Time, Hart Preston, em 1941. Aos poucos este hábito foi incorporado pelos Natalenses que chamaram a prática de veranear (estar de férias na praia durante o verão). A cidade começou a se expandir para o litoral deixando aos poucos de ser ribeirinha.
CASA DOS INGLESES
Pesquisa mostra que prédio do TCE foi erguido onde era a Casa dos Ingleses durante Segunda Guerra.
O terreno da avenida Getúlio Vargas, 690, que no presente sedia o prédio do Tribunal de Contas do Estado – TCE, foi residência, no passado, durante a 2ª Guerra Mundial, de um comandante da Força Aérea do Exército dos Estados Unidos. Considerado local estratégico no conflito, por conta da aproximação com a África e a Europa, os americanos instalaram uma base militar no município de Parnamirim, sob o comando geral das tropas do Exército dos EUA (US Army) tendo a frente o Major General Robert LeGrow Walsh, que fixou residência na “Casa dos Ingleses”, como ficou conhecida, na região do antigo Belo Monte, depois bairro de Petrópolis.
Em junho de 1942 o General Walsh foi nomeado comandante da Força Aérea do Exército dos EUA (USAAF) para toda a região do Atlântico Sul (South Atlantic Wing). Foi responsável pelo comando do Air Transport Command (ATC), ou seja, todas as questões envolvendo o transporte aéreo nesta parte do mundo estavam sob suas ordens. Devido à intensa movimentação de aeronaves em Natal, o ATC foi transferido do Caribe para o Rio Grande do Norte, ficando a sede administrativa em Parnamirim Field, e a residência do comandante sob as dunas do Belo Monte, defronte a bela vista do mar.
A história está sendo resgatada graças a uma ação do Ministério Público Federal do Rio Grande do Norte, que acatou a solicitação de uma audiência extrajudicial, feita pelo representante do Instituto dos Amigos do Patrimônio Histórico e Artístico Cultural e da Cidadania – IAPHAC, Ricardo da Silva Tersuliano, proposição acatada pelo Procurador da República e titular do 10º Oficio do Núcleo de Cidadania e Ambiental (NCA), Victor Manoel Mariz, com objetivo de tratar de assuntos pertinentes à adoção de medidas necessárias para resgatar, preservar e valorizar o patrimônio histórico do Rio Grande do Norte relativo ao período da Segunda Guerra Mundial. A primeira audiência ocorreu no dia 14 de março de 2019, num processo que vem sendo acompanhado em decorrência da situação de abandono do patrimônio em vista do potencial histórico, turístico e cultural que representa.
“A atuação do Ministério Público Federal no âmbito do Procedimento Administrativo 1.28.001950.2018-52, inclusive com a participação de diferentes parceiros, configura um instrumento fundamental para o resgate e proteção do patrimônio Histórico de Natal e Parnamirim. É importante lembrar que o nosso Estado teve importante participação no desenrolar do principal fato histórico do mundo, com consequências relevantes para a vida dos cidadãos potiguares. Ainda é tempo de valorizarmos e exaltarmos a nossa história. Como bem observou o primeiro-ministro inglês na época da guerra, Winston Churchill, sem a participação de Natal e Parnamirim, a guerra poderia ter durado mais uns 10 anos”, justificou o procurador Victor Mariz, que foi recebido no TCE pelo presidente Poti Júnior.
A partir da audiência, que contou com a presença de representantes de diferentes atores sociais, tais como SEBRAE, Emproturn, Funcarte e Instituto Histórico e Geográfico, foram definidas algumas diretrizes, entre as quais o mapeamento dos pontos históricos que possuem ligação com a participação do Brasil no conflito, tais como quartéis, hospitais, bares, cabarés, hotéis, clubes militares, companhias aéreas, residências de oficiais e do cônsul norte-americano, entre outros. O mapeamento constou de visitas in loco, com exposição em torno da importância do resgate da história como fator relevante no processo de identidade e desenvolvimento local. No Tribunal de Contas, foi realizada uma reunião neste sentido em outubro do ano passado, passando a instituição a constar do Relatório de Edificações Remanescentes em Natal no Período da Segunda Guerra Mundial, levantamento feito pelo pesquisador Rostand Medeiros.
A pesquisa foi transformada no livro “Lugares da Memória”, com informações e curiosidades de 27 locais considerados importantes durante a permanência dos americanos em Natal, centralizando nos bairros de Santos Reis, Rocas, Ribeira, Petrópolis e Tirol, entre os quais o local onde está sediado o Tribunal de Contas do Estado. A ideia, com apoio do Governo do Estado e das Prefeituras de Natal e Parnamirim, é que seja criada uma rota turística e histórica, focando o período da Grande Guerra, com todo o impacto e representação do que significou a presença dos militares americanos em Natal, além de outros projetos como a construção de um memorial da Segunda Guerra, entre outras iniciativas.
No caso do General Walsh, permaneceu em Natal de junho de 1942 a junho de 1944, quando foi anunciado como novo comandante geral do comando Oriental das Forças Aéreas Estratégicas dos Estados Unidos na União Soviética e membro da Missão dos Estados Unidos em Moscou. Durante sua permanência, foi caracterizado como um militar sério, correto e que mantinha uma boa relação com a comunidade local. Em alguns momentos, abriu para convidados o espaço do famoso aeródromo de Parnamirim, mostrando os refeitórios, hangares, armazéns de cargas, alojamentos de oficiais, praças, cinemas, enfim, todo o conjunto do “grande aeroporto de fama mundial”.
No caso da “Casa dos Ingleses”, após a saída dos americanos de Natal, o local foi utilizado como sede da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte a partir de 18 de setembro de 1947, permanecendo até os primeiros anos da década de 1960. Em 1965 o local passou a ser a sede do Tribunal de Contas do Estado, cuja atual edificação foi inaugurada no ano de 2002.
CANTINA DO COMBATENTE
Os militarem brasileiros também tinham locais específicos de apoio. Durante a Segunda Guerra Mundial Existiu na Capital Potiguar um local que muito ajudou os militares brasileiros que aqui estavam. Completamente esquecido nos dias atuais, era conhecido como Cantina do Combatente e foi um dos poucos locais criados para atender e apoiar as necessidades dessas pessoas. Um futuro governador potiguar se destacou no seu desenvolvimento.
Ao longo dos anos Darcy Vargas, então primei-dama presidencial, e a direção da LBA realizaram várias campanhas beneficentes como a Campanha da Madrinha dos Combatentes, ou as Hortas da Vitória, para incentivar a produção de alimentos pela população. Organizou também as Legionárias da Costura, que fabricavam materiais médico-hospitalares e roupas para serem doadas aos soldados. Na sequência instituiu a Cantina do Combatente, lugar de apoio e lazer para os soldados, cuja primeira unidade foi inaugurada no Rio de Janeiro em 20 de novembro de 1942.
Nos primeiros dias do mês de dezembro de 1942 desembarcou na Base de Parnamirim a Sra. Rosa de Mendonça Lima, uma das diretoras da LBA e esposa do general João de Mendonça Lima, então Ministro da Viação e Obras Públicas. Ela estava viajando pelo Nordeste para inaugurar as sedes da Cantina do Combatente em Salvador, Recife e Natal (Ver jornal A Noite, Rio de Janeiro-RJ, ed. 21/11/1942, pág. 1.).
Segundo o jornal natalense A Ordem, assim foi apresentada a Cantina do Combatente – “Instituição que visa o prolongamento do lar. Aí, os soldados brasileiros terão um ponto de diversão e assistência. Na cantina os militares terão cigarros, bebidas (não alcoólicas), leite, sanduiches e divertimentos, como livros, cinema, teatro, etc., tudo isso gratuitamente”. Uma ação muito apreciada pelos militares brasileiros era a existência de materiais para escrever e enviar cartas e o selo também era gratuito (Ver jornal A Ordem, Natal-RN, ed. 03/12/1942, pág. 1.). Percebe-se nitidamente o caráter assistencialista que a LBA colocava nessa ideia.
A festa aconteceu no final da tarde de sábado, 5 de dezembro de 1942, e a sede da Cantina ficava localizada na Rua Jundiaí, no bairro de Petrópolis. Busquei com pessoas que viveram naquela época detalhes dessa localização, mas não consegui uma informação concreta. Para alguns, esse local era na esquina da Rua Jundiaí com a Avenida Hermes da Fonseca. Para outros seria em uma grande casa, atualmente derrubada, onde se localiza a Fundação José Augusto.
Quem comandou o evento foi o jovem bacharel em direito Aluízio Alves, então Secretário Geral da Comissão Estadual da Legião Brasileira de Assistência, que discursou e participou de descerramento de placa e da “inauguração” do retrato de Getúlio Vargas. Após a cerimônia oficial os muitos soldados, marinheiros e fuzileiros navais presentes aproveitaram para jogar sinuca, ping-pong, consumir o que havia no bar, jantar no restaurante e, para os que sabiam ler, aproveitar os livros e revistas da biblioteca, que em breve receberia mais de 90 volumes da conceituada Livraria Ismael Pereira (Ver jornal A Ordem, Natal-RN, edições de 05/12/1942, pág. 1 e 22/05/1943, pág. 4.).
Para animar a soldadesca e os convidados civis, apresentou-se um conjunto musical do 2º Grupo Móvel de Artilharia de Costa (2º GCMA) e as bandas da Polícia Militar e da Associação de Escoteiros.
Um dado interessante e que bem mostra o espírito existente na época devido a guerra em Natal foi que 25 senhoritas “das mais proeminentes famílias da sociedade natalense”, ficaram servindo bebidas e comidas para os jovens militares. Não fosse as circunstâncias do momento, acredito que dificilmente essas meninas de pele clara dariam a mínima atenção a esses rapazes, a maioria deles morenos e vindos do interior.
O primeiro grande evento da Cantina do Combatente foi realizado dias depois, em 13 de dezembro, na comemoração do Dia do Marinheiro. Houve uma palestra proferida por Elói de Souza e a animação foi realizada pelo “grupo de Jazz” da banda da Polícia Militar[9].
Não consta em nenhuma das fontes pesquisadas que nas solenidades realizadas em dezembro de 1942 estivessem presentes os militares estrangeiros que serviam em Natal.
Observando os jornais da época disponíveis, percebemos que foram poucas as ocasiões que os gringos se fizeram presentes na Cantina do Combatente. Vale recordar que o primeiro de dois clubes recreativos que os militares norte-americanos montaram em Natal só seria inaugurado três meses depois da Cantina dos militares brasileiros.
Vejam o exemplo do nosso Exército – Natal foi sede:
do Comando da 14º Divisão de Infantaria (14º DI) (A 14ª Divisão de Infantaria (14º DI ) foi criada pelo Decreto Reservado nº 4.700-A, de 17 de setembro de 1942, sendo anteriormente conhecida como 2ª Brigada de Infantaria. Depois a 14º DI se transformou na Infantaria Divisionária da 14ª Divisão de Infantaria (Inf Div/14ª DI), pelo Decreto nº 6.177 e 6.180, de 06 de janeiro e Aviso Reservado nº 19-9, de 14 de janeiro de 1944.);
do 4º Grupo de Artilharia de Dorso (4º GADô) (Em dezembro de 1942 o 1º Batalhão de Engenharia (1ª/1º BE) se transformou no 1º/7ª Batalhão de Engenharia (1ª/7º BE));
do I Grupo do 3º Regimento de Artilharia Antiaérea (I/3ºRAAAé);
do 16º Regimento de Infantaria (16º RI);
da 1ª Companhia do 1º Batalhão de Engenharia (1ª/1º BE);
do 2º Batalhão de Carros de Combate (2º BCC) (Essa unidade blindada foi criada no Rio de Janeiro, através do Decreto nº 5.003, de 27 de novembro de 1942 e transferida para Natal.);
do 2º Grupo Móvel de Artilharia de Costa (2º GMAC);
da 14ª Companhia Independente de Transmissões, do Hospital Militar de Natal (HMN);
do 24º Circunscrição de Recrutamento (24ª CR), além de outras organizações menores, ou que passaram pouco tempo na capital potiguar.
A Marinha tinha a moderna e imensa Base Naval de Natal, com seus diversos departamentos, onde circulavam centenas de marinheiros. Havia ainda a Estação Rádio na Limpa (atualmente na área do 17º GAC), a 3ª Companhia Regional de Fuzileiros Navais, a Capitania dos Portos e as tripulações de diversos navios brasileiros que utilizavam o Rio Potengi como atracadouro de forma permanente, ou temporária.
Já a Força Aérea Brasileira – FAB, mesmo tendo sido criada no primeiro semestre de 1941, estava fortemente presente em Natal, tendo sido criado em 1942 a Base Aérea de Natal e atuando na mesma área que os americanos chamavam de Parnamirim Field. Em março de 1943 a FAB tinha então cinco esquadrilhas aéreas, que formavam dois Grupos de Aviação. Havia uma Companhia de Infantaria de Guarda composta de cinco pelotões, além de toda uma enorme estrutura de apoio para que essas unidades militares cumprissem corretamente suas inúmeras missões em tempo de guerra[18].
Comentamos anteriormente que muitos dos militares que serviram em Natal eram provenientes do interior potiguar, mas havia uma parcela substancial que vieram de outros estados brasileiros. Um exemplo claro – Quando foi criado o 16 RI, pelo Decreto Lei 3.344, de 6 de junho de 1941, sua guarnição foi formada por elementos do 29º Batalhão de Caçadores (29º BC), de Natal, complementada por elementos do 11º Batalhão de Caçadores (11º BC), da cidade do Rio de Janeiro, e da 1ª Companhia do 12º Batalhão de Caçadores (1ª/12º BC), de Jacutinga, Minas Gerais (Ver O Nordeste na II Guerra Mundial – Antecedentes e Ocupação, de Paulo Q. Duarte. Rio de Janeiro-RJ, BIBLIEX, 1971, págs. 184 a 186.).
E foi para essa massa de homens fardados vindas de várias partes do país, ou do sertão potiguar, que a Cantina do Combatente serviu perfeitamente. Para um contingente de pessoas cujo salário era bastante limitado, ter um ambiente onde eles podiam se alimentar, escutar uma boa música, ler algo de bom e pegar cigarros, sendo tudo isso de graça, era uma verdadeira dádiva!
Além de ser um ótimo ponto de apoio e de encontros uma situação positiva, destinada a apoiar os militares que não sabiam ler e nem escrever, era que na Cantina do Combatente sempre era possível encontrar alguém que voluntariamente escrevesse uma carta para seus familiares em locais distantes.
Uma das festas que foi marcante na história daquele local foram as comemorações pelo Dia do Soldado de 1943. Muitas autoridades presentes, muita gente circulando e foi realizado o “Show do Combatente”. No palco se apresentaram a banda do 16º RI, da Polícia Militar, além dos “conjuntos regionais” do 2º BCC e do 2º GMAC e a orquestra do Air Transport Command (ATC), da Força Aérea do Exército dos Estados Unidos (United States Army Air Force – USAAF). Dividindo o palco com esses grupos musicais se apresentaram atrações locais da Rádio Educadora de Natal, que transmitiu ao vivo todo o evento (Ver jornal A República, Natal-RN, ed. 26/08/1943, pág. 8.).
Em novembro de 1943, Aluízio Alves entregou o cargo de Secretário da LBA no Rio Grande do Norte a Sra. Maria de Lourdes Dantas Matos e apresentou um relatório de sua gestão.
No tocante a Cantina do Combatente foi informado que entre dezembro de 1942 e setembro de 1943 o local forneceu mais de 52.000 refeições, expediu quase 3.500 cartas, entregou para os militares cerca de 17.500 maços de cigarros e atendeu de diversas formas 374 famílias de combatentes das três armas. Aluízio foi convidado por Dona Darcy Vargas a ir ao Rio de Janeiro, onde recebeu vários elogios da Primeira-dama pelo seu trabalho e conheceu a Cantina do Combatente na cidade carioca.
Outro evento em 1943 que foi bastante movimentado foi a comemoração do “Natal dos Combatentes”, na noite de 22 de dezembro.
Em janeiro de 1944 a Sra. Maria de Lourdes Dantas Matos anunciou que a Cantina do Combatente de Natal passaria por reformas. Mas dessa época em diante ela deixa de ser notícia nos jornais de Natal A Ordem e A República. Não encontrei nenhuma referência de sua reabertura, ou quaisquer outras notícias sobre um provável encerramento das atividades do local.
Provavelmente, como é normal em relação ao período da Segunda Guerra Mundial em Natal, a partir de 1944 a estratégica posição geográfica da capital potiguar e a atuação dos submarinos inimigos na área do Atlântico Sul já não tinha a mesma relevância e importância para os militares norte-americanos. Para os brasileiros, 1944 foi um ano onde toda atenção se voltou para o desenvolvimento da Força Expedicionária Brasileira (FEB) e sua partida para o front italiano. Com isso algumas unidades militares, principalmente do Exército, foram deslocadas de Natal para outras localidades brasileiras e é provável que o movimento na Cantina do Combatente de Natal tenha diminuído bastante.
Mas esse local prestou relevante serviços ao esforço de guerra em Natal e certamente para um potiguar da cidade sertaneja de Angicos, a Cantina do Combatente foi um momento de grande aprendizado e de muita atividade administrativa na área pública. Tendo sido, juntamente com outras ações realizadas por Aluízio Alves à frente da LBA, algo que, de uma forma ou de outra, ajudou a melhor prepará-lo para assumir o cargo de governador potiguar vinte anos depois.
CONFLITOS
Durante a estadia dos americanos em Natal no período da Segunda Guerra Mundial, os atos de violência entre americanos e potiguares nos bares e cabarés da Ribeira e da Cidade Alta constituíam uma realidade. Aumentara o número de cabarés em Natal em virtude da chegada dos americanos à cidade. Os cabarés e ―bas-fonds‖ eram os únicos locais onde havia movimento depois das 21 horas.
Espaços como a Pensão Ideal, o Wonder Bar (Ribeira), o Bar Quitandinha (Alecrim), o Grande Ponto (Cidade Alta) e o Beco da Quarentena (Ribeira) eram frequentados por militares estrangeiros e brasileiros de baixa patente, sendo frequentes as brigas nesses locais da boemia natalense. Os oficiais de alta patente frequentavam o Grande Hotel e o cabaré de Maria Boa, casa de luxo de Maria Oliveira de Barros, onde se encontravam as bebidas e as mulheres mais caras de Natal. Na Rua Doutor Barata, onde havia lojas, cafés e pensões alegres, hotéis e restaurantes, ocorreram casos de desavenças entre aqueles que os frequentavam, tanto americanos quanto potiguares, motivados pela preferência das mulheres em namorar os estrangeiros, provocando ciúmes nos rapazes natalenses.
Também eram comuns as brigas envolvendo norte-rio-grandenses e americanos por causa de prostitutas e de bebidas. Os jornais da época enfatizavam o fictício clima de harmonia e paz entre natalenses e americanos. Contudo, na verdade, os conflitos e as tensões entre ambos resultaram em casos de polícia, desmascarando a suposta cordialidade entre esses dois grupos (Cf. PEDREIRA, 2005, p. 217-237.)
Por outro lado, as elites tentavam mediar o relacionamento da população da cidade com os soldados, tentando amenizar os conflitos que eram observava na sua convivência diária. Segundo Pinto (1971) (PINTO, Lauro. Natal que eu vi. Natal: Imprensa Universitária, 1971.) e Melo (1993) (MELO, Protásio Pinheiro. Op. Cit.), houve muitos confrontos físicos entre brasileiros e estadunidenses nos bares da cidade e, para Smith Junior (1992, p.149) (Idem.), os militares estadunidenses sentiam que os natalenses “não gostavam dos americanos e se ressentiam da atitude destes com relação à população local”. Ainda para Melo (1993)334, as reações se expressavam nos espaços públicos da cidade, onde os soldados estadunidenses se portavam com desrespeito, uma vez que sem nenhuma perspectiva de resistência ao invasor, a cidade era um maná para os marines. Compravam tudo com as suas maravilhosas cédulas verdes e, para variar quebravam o pau por qualquer razão. Treinados para matar com golpes de mão, claro que sempre levavam vantagem nos entreveros com os caboclos (CASTRO, s.d., apud MELO, 1993, p.86) (Depoimento de Nei Leandro de Castro, jornalista e poeta In: MELO, Protásio Pinheiro. Op. Cit.).
Na vida noturna da cidade, até às 21 horas, “os americanos eram donos dos bares e senhores absolutos do terreno, como também dos restaurantes, pensões de mulheres e bebidas, tudo enfim, à custa dos ricos e inesgotáveis dólares” (MELO, 1993, p.82) (Depoimento de Nei Leandro de Castro, jornalista e poeta In: MELO, Protásio Pinheiro. Op. Cit.) e, nesses lugares, quando esse horário limite se aproximava, montava-se uma “praça de guerra” que explodia por motivos insignificantes e pela intolerância que existia entre ambos, revelando um lado da convivência que a imprensa e a historiografia oficial não registraram e deixaram poucos indícios para o presente.
Em meados de 1943, as Forças Armadas Brasileiras também passaram a promover atividades culturais com as mesmas características dos shows
organizados pelos clubes estadunidenses. Estes eram patrocinados por empresários brasileiros e excursionavam pelas bases nordestinas. Eram shows itinerantes que foram considerados como mais um “serviço de guerra a ser oferecido aos soldados americanos e brasileiros” (FRANÇA. Aderbal. Urca-Tupi em Natal. A República, Natal, 2 jul. 1943, p.6) . Dentre estes, o primeiro chamou-se “Show da Vitória”, foi organizado pelos Diários Associados e reuniu artistas da Rádio Tupi e do Cassino da Urca.
MARIA BOA
As casas de meretrício possuíam bares e quartos, nos quais o sexo pago era consumido. Além disso, constituíam residências para as mulheres que trabalhavam na casa, a exemplo do Wonder Bar, situado na Rua Chile, nº. 106; da Pensão Ideal, na Rua Almino Afonso, de Dona Nena; do Arpérge, na Rua Chile com a entrada na Travessa Venezuela, nº. 36, pertencente a Dona Francisquinha Edite da Silva; a 13 de maio na Almino Afonso, a Pensão Rosa de Ouro, na Almino Afonso com a Ferreira Chaves, nº. 158, de D. Maria Rosa; a Pensão Alabamba, de Zefa Paula, na Rua Ferreira Chaves, de frente à antiga sede da Delegacia de Roubos e Furtos; e a Pensão 15 de Novembro.
O mais famoso cabaré de Natal foi a Casa de Maria Boa. Era um estabelecimento de luxo, o melhor da capital potiguar. A proprietária, Maria Oliveira Barros, chegou a Natal vinda de Campina Grande, com vinte anos, na década de 1940, período em que os americanos estavam em Natal em virtude da Segunda Guerra Mundial. A casa de Maria Boa ficava no bairro da Cidade Alta, próxima ao baldo, na Rua Padre Pinto e nas imediações do atual prédio da Cosern. A casa hospedava prostitutas, muitas vindas do sul do país, que eram contratadas para trabalhar. O quadro de funcionárias era sempre renovado, de modo a manter mulheres belas e atraentes. No período posterior à Segunda Guerra Mundial, o cabaré continuou a receber os homens mais ricos e poderosos da cidade de Natal. Nas palavras do memorialista Ary Guerra Lima:
O Professor Antônio Pinto de Medeiros, frequentador assíduo do cabaré, costumava dizer que o estado do Rio Grande do Norte era governado em Maria Boa, que era o único lugar onde se encontravam os Secretários de Estado, Deputados e Diretores de repartições, para discutir os problemas de Estado (LIMA, 2008, p. 63.).
SHOWS
A programação de shows intensificou na cidade e acontecia tanto nos clubes locais como nos estadunidenses. A cidade passou a ser frequentada por artistas famosos, que se exibiam prioritariamente na Base de Parnamirim Field e nos USO’s, porém, eventualmente, se apresentavam nas unidades militares brasileiras (EM NATAL…, 1944). Os primeiros grupos brasileiros contratados foram os Cassinos da Urca e Icaraí do Rio de janeiro In: EM NATAL, artistas dos cassinos da Urca e Icaraí: exibições para os soldados de terra, mar e ar sediados nesta capital. (A República, Natal, 31 out. 1944).
Posteriormente, a partir de junho de 1944 (NOVA…, 1944), a direção dos clubes também começou a contratar artistas brasileiros e locais para seus espetáculos. NOVA fase de realizações para os USO Clubs: para um melhor entendimento – Programas de intercâmbio brasileiro-americano – O apoio da Rádio Educadora – Fala-nos Miss Gertrude Dondero, alta funcionária dessa organização, em Nova York (A República, Natal, 4 jun. 1944).
Ao longo de 1944, os USO’s trouxeram para Natal artistas do cinema e do rádio, como Tyrone Power, Humphrey Bogart, Nelson Eddy, Jack Benny, Larry Adams, Ann Lee, Winnie Shaw, Marlene Dietrich, Tommy Dorsey e a Orquestra de Glenn Miller. Nestes casos, os shows eram exibidos no Teatro da Base Aérea Estadunidense, no “Wing Headquarters Squadron”, e, em geral, o Jornal A República apenas fazia a divulgação do espetáculo. Em todos eles, no entanto, eram convidadas as “autoridades civis e militares e grande número de pessoas da sociedade” (A FESTA de hoje em Parnamirim. A República, Natal, 22 dez. 1943, p.8), quando eram distribuídos convites e disponibilizados transportes a partir “da sede da Cruz Vermelha Brasileira, junto ao Rex”, na Avenida Rio Branco, Cidade Alta (Idem., p.8).
Na cidade, além dos tradicionais Aero Clube e Teatro Carlos Gomes, surgiram o Cassino Natal, o Círculo Militar, o Clube Hípico de Natal. Todos integravam uma “cadeia de promoções” e ofereciam sucessivas festas e bailes.
O Cassino Natal, que foi inaugurado a 20 de outubro de 1943, estava localizado vizinho ao Grande Hotel e promovia reuniões sociais e shows. Era tido como um espaço luxuoso, onde as pessoas frequentavam vestidas a rigor, com todos os jogos tradicionais e uma boa banda onde brasileiros e americanos dançavam e se divertiam fraternalmente.
Os americanos tinham seus clubes, além de excelente cassino, dentro da base, onde brasileiros eram convidados e circulavam figuras do cinema hollywoodiano, do show business e outros.
O Circulo Militar era o clube das Forças Armadas Nacionais, que fora organizado pelas diversas Guarnições Militares do país e tinha como objetivo “criar e manter um ambiente social, promovendo reuniões familiares e festividades”, assim como contribuir com “o espírito de cordialidade entre os oficiais das várias armas e suas famílias” (DANILO (Aderbal de França). Círculo militar. A República, Natal, 31 mar. 1944, p.7). Suas atividades eram basicamente bailes que ocorriam no Aero Clube.
E, por último, o Clube Hípico de Natal, que estava localizado na Estrada de Parnamirim e foi criado para promover provas hípicas e congregar as elites da cidade e a oficialidade das forças armadas brasileiras e estadunidenses. Foi inaugurado apenas com as instalações do salão de festas, mas previa a construção de um parque esportivo com quadras (tênis e voleibol) e piscinas. Para Danilo (DANILO (Aderbal de França). O hipismo em Natal. A República, Natal, 23 mar. 1944d., p.7), tratava-se de uma “porta de um novo progresso” que poderia atrair “impressões diferentes para os turistas que passa[ss]em pela estrada do Tirol em busca de sensações”. Na festa de inauguração, a programação foi organizada pelo USO Town Club. Nesta foi organizada uma demonstração da “Caça à Raposa”, uma atividade esportiva que, posteriormente, passou a ser “praticada pelas elites, particularmente nas confraternizações com as tropas americanas” (CONFÚCIO. Club Hípico de Natal. A República, Natal, 5 abr. 1944., p.7).
Além das festas semanais, nos clubes natalenses, incluindo o Hípico, recém-fundado, onde confraternizavam natalenses ricos e yankees havia o mais perfeito entendimento.
No distrito da luz vermelha, foi instituído o exame periódico das mulheres para evitar doenças venéreas, com a criação de um documento que era chamado love card, por alguns engraçados da cidade, frequentadores da “noite”.
A cidade, os transportes, os bares, estavam sempre cheios de soldados. O comércio multiplicou suas vendas e muitos comerciantes enriqueceram, junto com os motoristas de carros de aluguel. Os aluguéis subiram e comerciantes de meias de seda, perfume Channel e relógios de pulso, nunca venderam tanto.
Os preços subiram com o uso do dólar como moeda oficial na cidade, especialmente nas casas noturnas, o que era uma realidade. Não se pedia mais cerveja nos bares e sim “bia” ( de beer, cerveja). As ruas viviam cheias de jeeps e caminhões o que aumentou extraordinariamente o trânsito na capital.
Quanto à conjuntura social, econômica e cultural da cidade do Natal, com a chegada dos americanos à cidade, ocorreram diversas mudanças no ritmo de vida, nos costumes, nos hábitos da população, mudanças essas que afloraram no contexto dos anos 40, com a forte influência da cultura americana, como já denotaram alguns estudos realizados sobre esse efervescente período da história de Natal.
A cidade do Natal viveu o seu momento de turbilhão: milhares de pessoas se deslocavam para a Capital, vindos de todos os lugares. Um grande contigente de população chegou à cidade motivado pela seca no sertão do Estado, flagelados, mendigos que foram rapidamente abrigados em lugares distantes, na periferia pobre da cidade.
VILAS MILITARES
Tanto os americanos como o Exército Brasileiro construíram Vilas Militares, além das “Staff Houses” e dos clubes “USO’s”. Nos bairros de Tirol e Petrópolis, eixo da “pista” que ligava a Natal a Parnamirim, instalaram-se os oficiais e militares de alta patente. Os espaços de convivência e de lazer eram compartilhados com a elite local, que se deslocava para Parnamirim, quando era convidada para os eventos festivos, assim como disponibilizava suas residências, o Aero Clube, o Teatro e os Cinemas da cidade para eventos comuns.
“A presença dos galegos (designação usada pelo homem do povo para identificar qualquer estrangeiro) motivou a aprendizagem da língua inglesa,
ao ponto de que, já ao término da guerra, muitos natalenses falavam e escreviam corretamente esse idioma. Tornara-se comum o livrinho ‘Safaonça’ (dicionário com as frases mais comuns para se conversar e traduzir a língua inglesa, com a grafia e a pronúncia figurada), verdadeira tábua de salvação para aqueles que tinham necessidade de conviver com os americanos, principalmente mocinhas que sonhavam casar com oficiais de Tio Sam, ou espertos comerciantes de rua” (Aguiar, 1931:32).
O FIM DA GUERRA
Enfim, o momento esperado por tantos: a 5 de maio dava-se a queda de Berlim e a 8 a Alemanha rendia-se. Terminava a Segunda Guerra Mundial, que tanto prejuízo deu ao mundo e tantas modificações trouxe à vida da pequena Natal. No dia 5 houve missa campal, visitas aos túmulos dos soldados americanos no cemitério do Alecrim e sessão solene no Teatro Carlos Gomes.
O dia 8 foi feriado nacional. No dia 10, outra sessão solene realizou-se no Teatro Carlos Gomes. Entre cada discurso ouvido, pianistas da cidade tocaram os hinos nacionais dos países vencedores: Lygia Bezerra de Melo (“Fantasia sobre o Hino Nacional Brasileiro”, de Gottschalk), Moisés Roiz, (“Hino Nacional Polonês”), Ethel Mandel (“Estados Unidos”), Maria Célia Pereira (“Inglaterra”), Yara Bezerra de Melo (“França”).
A banda de música do Regimento Polícial Militar finalizou com o “Hino Nacional Brasileiro”. Faltou ser tocado o hino nacional da Rússia, país que desempenhou importantíssimo papel na vitória dos aliados. Waldemar de Almeida, organizador do evento, não incluiu o hino russo por falta da sua partitura. Talvez fosse mais certo considerar-se que Waldemar havia propositalmente excluído a Rússia dos festejos. Seus princípios religiosos católicos não combinariam com uma homenagem a um país comunista.
FONTES PRIMÁRIAS:
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CLEMENTINO, Maria do Livramento Miranda. Impacto urbano de uma base militar: a mobilização militar em Natal durante a 2ª. Grande Guerra, Natal:
UFRN/CCHLA, 1995.
LIMA, José Airton. A História do Rádio no Rio Grande do Norte. Natal, 1984.
LIMA, Pedro de. Natal século XX: do urbanismo ao planejamento urbano. Natal: EDUFRN, 2001.
MARIZ, Marlene da Silva; SUASSUNA, Luiz Eduardo Brandão. Natal: Sebo Vermelho, 2002.
MELO, Protásio Pinheiro de. Contribuição norte americana à vida natalense. Natal: Sebo Vermelho, 2015.
PEDREIRA, Flávia de Sá. Chiclete eu misturo com banana: carnaval e cotidiano de guerra em Natal (1920-1945). Natal: EDUFRN, 2005.
SMITH JUNIOR, Clyde. Trampolim Para a Vitória. Natal: UFRN Editora Universitária, 1992.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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ANUÁRIO NATAL 2013 / Organizado por: Carlos Eduardo Pereira da Hora, Fernando Antonio Carneiro de Medeiros, Luciano Fábio Dantas Capistrano. – Natal : SEMURB, 2013.
Cantos de bar: sociabilidades e boemia na cidade de Natal (1946-1960) /Viltany Oliveira Freitas. – 2013.
Dos bondes ao Hippie Drive-in [recurso eletrônico]: fragmentos do cotidiano da cidade do Natal/ Carlos e Fred Sizenando Rossiter Pinheiro. – Natal, RN: EDUFRN, 2017.
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Natal Não-Há-Tal: Aspectos da História da Cidade do Natal/Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo; organização de João. Gothardo Dantas Emerenciano. _ Natal: Departamento de Informação, Pesquisa e Estatística, 2007.
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