O Café Nice II
Nas décadas de 1970 e 1980, época em que o choro esteve “na moda” (CAZES, 1999, p. 177), o Café Nice II ( Segundo João Juvanklin o Café Nice tinha o número II porque já existia um Café Nice no Rio de Janeiro, de modo que o café de Natal fazia referência ao da capital carioca) localizado no bairro do Alecrim, mais especificamente na rua Agostinho Leitão, foi o principal ponto de encontro de importantes músicos, entre eles muitos chorões residentes não só em Natal.
João Juvanklin, um dos maiores compositores do choro local, Alexandre Moreira (sobrinho de Juvanklin), o multiinstrumentista Sivuca, Joel Nascimento (considerado depois de Jacob do Bandolim o maior bandolinista do Brasil), Ademilde Fonseca, “Antônio Sete Cordas” (considerado o maior violonista de sete cordas de Natal) e Altamiro Carrilho (flautista transversal); são alguns dos músicos que se apresentaram no local durante esse perı́odo, e de uma forma bastante espontânea como relata nosso entrevistado:
Cada artista que vinha tocar no Teatro Alberto Maranhão fazia seu show e depois ia tocar no Café Nice. Então muita gente nem ia ao teatro esperando para ir mais tarde ao Café Nice, que era um ambiente mais ıntimo. A grande força do Café Nice era essa capacidade de integrar músicos de fora com os de Natal (João Juvanklin, entrevista realizada em 02/12/2011).
Shows aparte
O bar de “seu” Zeca recepcionou a nata da música popular brasileira, numa
época em que não existia axé-inusic nem pagode. Foram os anos de ouro do
projeto Pixinguinha, que trouxe a Natal nos anos 70, artistas como Nara Leão, Johnny Alf e Beth Carvalho.
Outros artistas como Nelson Cavaquinho Braguinha, João Nogueira,
Paulo Moura, Carmem Costa, Nana Caymmi, Sivuca, Marinés, Miúcha, Oswaldinho, João do Vale, Altamiro Camilho, Canhoto da Paraiba, Pery Ribeiro ja pisaram no Café Nice potiguar. Suas fotografias, pendundas
nas paredes, atestam a história.
Além dos nomes do cenário artístico nacional, muitos outros de relevância
na politica e cultura norte-rio-grandenses compõem a galeria de personalidades amantes das serestas daquele bar. O tempo passou.
Hoje não existe projeto Pixinguinha e a boa Música Popular Brasileira não toca
mais nas principais FMs do País. Em seu lugar, infelizmente, ouve-se os ritmos interacionais e as investidas comerciais de alguns oportunistas de
plantão.
Nessas duas décadas de som, o Café Nice privilegiou a MPB, colocando-a no pódio, onde ela merece estar. Marcou época, fez admiradores, divertiu uma geração.
Depoimentos
“Foi sim, era um ponto de encontro, era um ponto onde se encontravam os artistas, políticos. Ai tem também depois da Quitandinha, primeira rua à direita, já chegando na Mário Negócio, tinha o Café Nice, que era um ponto interessantíssimo. Nomes como Paulinho da Viola apareceram no Café Nice e muitos outros, Dilu Melo e outros nomes iam pra lá, porque independente do artista estar aqui, ser convidado e ir apresentar lá, dar uma palhinha, eles tinham grupo selecionado, instrumentistas muito bons, e era muito bem frequentado apesar do local, depois morreu, mas era um local muito bom, muito bom mesmo”. Ana Maria Ubarana
“O samba é povão, é intuição, é suavidade, é adoração. O repertório que conheci nas mesas do velho bar Café Nice, no Alecrim, extinto reduto bamba de Natal. Aprendi a gostar de Paulinho da Viola, com o Pagode do Vavá, onde a plebe prova do feijão da Vicentina e sabe que a coisa é divina. Onde me apresentaram à obra de Martinho da
Vila para dela nunca mais me separar. Há um samba-enredo, chamado Gbala, no Templo da Criação que se fez hino em minhas idas aoestádio Castelão para ver o ABC jogar.” Rubens Lemos – Coluna na Tribuna do Norte de 28/04/2021.
O músico Reinaldo Azevedo, guitarrista da Banda Anos 60, que falou sobre a vida cultural e contou como era movimentado o Café Nice, “um grande ponto musical onde os boêmios se encontravam todo fim de semana.”
Saideira
É muito difıćil apontar um único fator responsável pelo encerramento das atividades do Café Nice II, no entanto, o desenvolvimento acelerado do comércio formal e informal no bairro do Alecrim, no final das décadas de 1980 e 1990, pode ter sido um dos motivos. Atualmente, o local sedia uma
loja comercial.
Espaços do choro em Natal – RN: um olhar geográfico por Pablo Raniere Medeiros da Costa & Alessandro Dozena.
CAZES, Henrique. Choro: do quintal ao municipal. 2. ed. São Paulo, SP: Editora 34, 1999.
Memória minha comunidade: Alecrim / Carmen M. O. Alveal, Raimundo P. A. Arrais, Luciano F. D. Capistrano, Gabriela F. de Siqueira, Gustavo G. de L. Silva e Thaiany S. Silva – Natal: SEMURB, 2011.