Aterro da Praça da República
O primeiro esforço significativo nesse sentido estava na obra de melhoramento e aformoseamento da Praça da República, classificada como “a obra urbanística de maior significado da primeira década do século” (ARRAIS, 2009, p. 164). No entanto, até o ano de 1892 nada ainda havia sido feito. “O Caixeiro”, em mais uma de suas reportagens denunciativas reiterava as singularidades “pitorescas” e “bucólicas” da praça que, por não apresentar um aterro e um sistema de drenagem eficiente, até então constituía local de descanso para “jumentos” e “suínos”.
A importância das intervenções na Praça da República eram tão urgentes que em uma reportagem do periódico “A República”, de 15 de abril de 1896, é feito um contraponto entre o projeto de aformoseamento da Praça André de Albuquerque – localizada na Cidade Alta e marco zero da ocupação da cidade – e a falta de iniciativas do tipo na Praça da República. Ou seja, se estavam sendo investidas somas no melhoramento de outras praças e logradouros da cidade, parte desses investimentos deveria ser destinada à intervenção da praça da estação ferroviária.
Além da urgência do aterro e embelezamento, o charco formado na praça era recorrentemente apontado também como foco de doenças, por abrigar águas paradas que liberavam, na cultura da época, “miasmas”, que podiam ser causas de epidemias (TEIXEIRA, 2009, p. 300). Até o ano de 1901 nada havia sido efetivamente realizado e a chegada de mais um inverno piorava a situação, com a formação de alagadiços.
Para piorar, a falta de educação da população, a partir do depósito de lixo e dejetos nas valas que drenavam as águas pluviais tornava a situação ainda mais crítica (A REPUBLICA, 1901, p. 01). Ruas e logradouros adjacentes, tais como o largo do Bom Jesus e as ruas de Santo Amaro e da Campina, se tornavam “inabitáveis”, como eram descritos nesses períodos por alguns periódicos.
Entre esses argumentos, os jornais em circulação chegavam a citar o fato de que uma intervenção na Praça da República significaria um beneficiamento das próprias elites políticas e intelectual, já que ou residiam ou se hospedavam em suas adjacências. Além de representar uma nova centralidade na cidade, bem como, a sua nova porta de entrada, o aterro da Praça da República consistiria – junto com a posterior pavimentação da Avenida Junqueira Aires – a comunicação entre os dois bairros que compunham Natal à época: a Ribeira e a Cidade Alta.
Por volta do ano de 1895, calcula-se que a Ribeira possuía cerca de 500 casas, enquanto que a Cidade Alta apresentava cerca de 1500.(CALÇAMENTO, 1895). E em virtude da separação ocasionada pelo alagadiço, os dois bairros quase que funcionavam como núcleos à parte, o que alimentou uma rixa entre as suas populações, denominadas, respectivamente, de Canguleiros e Xarias.
Até então a Praça da República – que após os serviços de melhoramento receberia a denominação de Praça Augusto Severo – estabelecia a comunicação entre os bairros de maneira muito precária. Câmara Cascudo descreve essa comunicação da seguinte maneira: “logo adiante da estação da Estrada de Ferro, na praça Augusto Severo, a corrente d’água era viva, obrigando a existência de uma ponte, simples tronco de árvore, transposto em equilíbrio instável” (1999 [1946], p. 150).
A falta da pavimentação da Avenida Junqueira Aires era também apontada como um transtorno tanto para a comunicação entre os dois bairros, com também em relação ao depósito de materiais na Praça da República. A condição precária, portanto, dificultava até mesmo o acesso e o desembarque da estação à cidade, uma vez que as águas se estagnavam em frente a esse edifício.
A situação da Praça da República apenas seria revertida no ano de 1904, durante o término do primeiro governo de Alberto Maranhão.
Fontes:
Caminhos que estruturam cidades: redes técnicas de transporte sobre trilhos e a conformação intra-urbana de Natal / Gabriel Leopoldino Paulo de Medeiros. – Natal, RN, 2011.
Consultas:
ARRAIS, Raimundo. O mundo avança! Os caminhos do Progresso na cidade do Natal no início do século XX. In: BUENO, Almir de Carvalho (Org.) Revisitando a história do Rio Grande do Norte. Natal: EDUFRN, 2009.
TEIXEIRA, Rubenilson Brazão. Da Cidade de Deus à Cidade dos Homens: a secularização do uso, da forma e da função urbana. Natal: EDUFRN, 2009.
A REPUBLICA, Natal, ano 11, 26 abr. 1901.
CALÇAMENTO. O Nortista, Natal, n.176, ano 4, 30 mar. 1895.