Os navios no Porto de Natal
🛳️A cidade de Natal teve o mar como uma espécie de berço. A cidade é circundada por um vasto cordão de dunas, o que provocava, segundo alguns intelectuais natalenses do início do século XX, uma espécie de isolamento da cidade em relação ao resto do mundo, fez do mar de Natal a via de contato do mundo exterior com a pacata capital potiguar, especialmente quando se tornaram mais corriqueiras as viagens marítimas nos paquetes ou nos transatlânticos a vapor. Dessas viagens, os natalenses mais abastados traziam, além de bagagens, muitas novidades e muitas ideias.
Nesta postagem veremos viagens, festas e naufrágios no porto na tentativa paulatina de superação de obstáculos naturais, tornando-o mais funcional para inserção da província e estado do Rio Grande do Norte no cenário comercial mundial.
A CONQUISTA DA COLÔNIA
Os portugueses foram os primeiros a se lançar nessa aventura, atraindo navegadores, geógrafos, construtores de navios, técnicos e especialistas em navegação que possibilitaram a primazia deles nas navegações transoceânicas. Mas é bom lembrar que no período medieval o Atlântico praticamente não figurava na cartografia. Sob a dinastia de Borgonha, Portugal já dava os primeiros passos para se tornar a potência marítima que se ornou. No reinado de D. Dinis (1279-1325), os portugueses iniciaram o aprimoramento técnico, com o aperfeiçoamento náutico e o gradativo domínio das artes de navegação, e construíram navios de guerra.
A expedição militar que conquistou Ceuta, , importante entreposto comercial árabe no norte da África, segundo Saraiva (1979, p. 122), contava com 19.000 combatentes, 1.700 marinheiros e 200 navios.
Quando do retorno de sua viagem de descobrimento da América, Colombo teve uma audiência com o rei de Portugal, na qual lhe relatou os seus feitos. D. João II argumentou que as terras por Colombo, sob bandeira espanhola, “descobrira eram da coroa de Portugal, de acordo com a partilha do mundo feita no Tratado de Alcáçovas. Parece que chegou a mandar preparar navios para as ir ocupar, mas entretanto entrou em negociações com os Reis Católicos para uma solução pacífica” (SARAIVA, 1979, p. 138).
A descoberta do Brasil, aponta Skidmore (2003), adapta-se à perfeição à relação entre a Coroa portuguesa e a exploração ultramarina. No início de março de 1500, o rei português D. Manuel compareceu a uma missa solene para celebrar o lançamento da maior frota oceânica que Portugal até então lançara. Eram “13 navios transportando 1.200 tripulantes e passageiros” lançados ao mar quando há pouco grande navegador português Vasco da Gama retornara à Lisboa de épica viagem (1497-1499) que abrira a rota marítima para as Índias. A intenção declarada da expedição comandada pelo nobre Pedro Álvares Cabral era a mesma da de Vasco da Gama – “rumar para a extremidade sul da África, contornar o cabo da Boa Esperança e seguir para o norte rumo às Índias pelo Oceano Índico” (SKIDMORE, 2003, p. 20-21). E, então em 1500, Pedro Álvares Cabral seguiu para as Índias, comandando “uma frota formada por treze navios, com mil e duzentos homens a bordo”.
Diogo de Lepe foi outro navegador espanhol que possivelmente esteve, em fevereiro de 1500, no cabo de São Roque. São poucas as fontes para a reconstituição de sua viagem. Por isso não há dados seguros sobre o local da costa brasileira em que seus navios aportaram.
A partir daí, o Brasil passou a ser usado como “escala ideal em meio à longa viagem oceânica até a Índia. Se qualquer ponto do território poderia servir de escala para reabastecimento dos navios da “carreira das Índias”, o Rio Grande do Norte, pela privilegiada posição geográfica, pronunciada no oceano Atlântico, seria um dos principais pontos para reabastecimento das expedições portuguesas que se dirigiam às Índias. A privilegiada posição geográfica e as correntes de ventos e oceânicas impulsionavam as embarcações em direção à costa norte-rio-grandense. Citando vários autores, Tarcísio Medeiros (1985, p. 121-128) discorre sobre as várias possibilidades, hoje consideradas quase que lendárias, de povos antigos, como os fenícios, terem visitado o Rio Grande do Norte antes das grandes viagens marítimas da Idade Moderna.
Os índios potiguares destacaram-se por resistir às tentativas de aproximação das frotas portuguesas. Em julho de 1514, Estevão Fróis, depois de deixar o rio da Prata, “chegou ao litoral do Rio Grande do Norte com o navio avariado”. Quis desembarcar, mas foi rechaçado pelos nativos “liderados por um certo Pedro Galego, náufrago que tinha ‘os beiços furados e que andava, havia muito tempo, em companhia dos índios Potiguar’. Pedro Galego ficaria conhecido como ‘o espanhol que se fizera botocudo’. Anos mais tarde, ele seria visto outra vez pelo português Diogo Pais” (BUENO, 1998b, p. 120).
A presença de piratas franceses ao longo da costa data de 1535, pelo menos. Ela é frequentemente citada nos documentos portugueses a partir de meados do século XVI.
Antes de se chamar Alecrim, esta área teve várias denominações. Primeiro foi Refoles, partindo do pressuposto básico de que os piratas e mercadores franceses vinham frequentemente extrair o pau-brasil e outros produtos, e sempre usaram o rio Potengi como ancoradouro para seus navios. O corsário Jacques Riffault, no Século XVI, atracou por inúmeras vezes em nosso rio, fazendo com que aquele local passasse a se chamar no ponto da Nau do Refoles ou apenas Refoles.
Em 1535, Aires da Cunha veio à capitania do Rio Grande (do Norte) juntamente com os filhos de João de Barros, Jerônimo e João. A expedição, uma das maiores já formadas, era composta por 900 homens e cem cavalos, contava com dez navios (cinco naus e cinco caravelas) e atravessou o oceano Atlântico sem grandes sobressaltos. Os dados são confirmados por Eduardo Bueno, segundo o qual nenhuma expedição montada em Portugal com destino ao Brasil fora tão bem dotada de recursos. Tirando o exagero, “era a maior esquadra que, até então, jamais partira de Portugal para a América, com dimensões só inferiores às da armada de 13 navios com a qual, 36 anos antes, Pedro Álvares Cabral descobrira o Brasil ( BUENO, 1999,p. 157).
Mesmo com o fracasso dessa primeira tentativa de colonização da capitania, houve nova tentativa anos depois, quando foi organizada uma segunda expedição comandada pelos filhos de João de Barros, remanescentes da primeira tentativa. Porém, o resultado foi igualmente desastroso, fato atribuído, conforme Hollanda (1989, p. 105), “a exações praticadas contra os silvícolas pelos predecessores”. Segundo Cascudo (1984, p. 18), o ano dessa segunda expedição foi 1555. Diz Gabriel Soares (apud HOLLANDA, 1989, p. 105-106), que João de Barros ainda armou mais navios e remeteu mais gente “sem dessa despesa lhe resultar nenhum proveito”, perdidos completamente no Maranhão os bens conquistados com o comércio das especiarias orientais e o seu prestígio junto à coroa portuguesa.
O alvará de 2 de março de 1561, por exemplo, que relata a segunda tentativa frustrada de posse da terra pelos filhos do donatário João de Barros, a quem o território da capitania havia sido doado quando da instituição das capitanias hereditárias desde 1532, assinala a presença de seus navios. Diversos documentos mencionam a aliança que os franceses fizeram com os índios potiguares. Expulsos da Paraíba, os franceses se haviam instalado ao norte, sobretudo na foz do Rio Grande e em outros lugares ao longo do litoral, principalmente oriental. Nestes locais, eles exploravam o pau-brasil, construíam casas e depósitos, e alguns deles se instalaram definitivamente entre os índios.
Após a morte de João de Barros, em 1570, os seus herdeiros desistiram do intento de ocupar a capitania, não sem antes “pleitearem pagas a Felipe II de Espanha, Rei de Portugal (por morte de D. Sebastião), sendo Jerônimo agraciado em 1582 com uma tença no valor de cento e cinqüenta mil réis” (PINTO & PEREIRA, 1998, p. 30). Para Jerônimo, existem outras razões estratégicas, visto que “os navios que vão do Brasil às Antilhas vêm à Capitania.
A combinação de forças entre portugueses e espanhóis foi decisiva para que em 1586 estivesse garantida a conquista da Paraíba e abrisse caminho em direção à capitania do Rio Grande, a partir daí o objetivo principal dos portugueses. E novamente o grande obstáculo que se afigurava à pretensão portuguesa era a resistência franco-indígena. No mês de agosto de 1597, uma esquadra francesa composta por treze naus zarpou do rio Potengi para atacar a fortaleza de Cabedelo, em Filipéia de Nossa Senhora das Neves, atual João Pessoa. Outras sete embarcações (ou vinte, dependendo da fonte) ficaram estacionadas, “esperando ordens” para reforçar a investida. Trezentos e cinqüenta arcabuzeiros desembarcaram. Entre os dias 15 e 18, ocorreu, por terra e mar, o ataque, prontamente rechaçado pelos colonos da Paraíba, o que obrigou os atacantes a retrocederem para o Rio Grande. O comandante de um dos navios foi feito prisioneiro. Segundo o seu depoimento, uma numerosa esquadra francesa estava sendo equipada e, no ano seguinte, estaria pronta para assaltar o litoral brasileiro. O capitãomor da Paraíba, Feliciano Coelho, responsável por conduzir o interrogatório ficou extremamente agitado e informou às autoridades superiores. O Governador-Geral do Brasil, Francisco de Souza, apressou as providências necessárias e cumpriu as determinações da Carta Régia de Felipe II, Rei da Espanha e de Portugal, que exigia a ocupação da capitania do Rio Grande (PINTO & PEREIRA, 1998, p. 55). Em 1587, os portugueses pensaram que a situação na Paraíba estivesse estabilizada, afastados os franceses e os índios potiguares. Enganaram-se, pois dez anos depois os potiguares e os franceses, com um armada de treze navios, desembarcaram no litoral paraibano e atacam o fortim lusitano, o que demonstrava “a fragilidade da ocupação da orla marítima na região imediatamente ao norte da Capitania de Itamaracá.” (HOLLANDA, 1989, p. 192-193).
Gabriel Soares de Souza, em seu tratado descritivo do Brasil de 1587, ao acusar a presença francesa rio adentro, indiretamente nos ajuda a entender por que a Fortaleza foi construída na sua foz. O mesmo relato também já apontava o potencial de exploração econômica do estuário do Rio Grande:
Neste Rio Grande, podem entra muitos navios de todo porte, porque tem barra funda de dezoito até seis braças (…) tem este rio um baixo à entrada da banda do norte, onde corre água muito à vazante e tem dentro algumas ilhas de mangues, pelo qual vão barcos por ele acima quinze ou vinte léguas e vem de muito longe. Esta terra do Rio Grande é muito sofrível para este rio se haver de povoar, em o qual se metem muitas ribeiras em que se podem fazer engenhos de açúcar pelo sertão. Neste rio há muito pau de tinta onde os franceses o vem carregar muitas vezes (Apud, Medeiros Filho (1997: 18).).
A fundação de Natal representou um passo fundamental no projeto de conquista do território assim definido, no que tange à capitania do Rio Grande. A urbe surgiu como cidade de conquista de um território igualmente cobiçado por nações rivais e ocupado por populações nativas hostis à conquista. A ameaça francesa à conquista lusa da capitania se manifesta desde as primeiras décadas do século XVI.
Era tão forte a presença francesa que muitos recantos de nossa costa foram batizados com nomes como porto Velho dos Franceses e porto Novo dos Franceses (ambos no Rio Grande do Norte), rio dos Franceses (na Paraíba), baía dos Franceses (em Pernambuco), boqueirão dos Franceses (em Porto Seguro), ou praia do Francês (próximo à atual Maceió, em Alagoas). Outro ponto no qual os navios normandos ancoravam com muita freqüência era a praia de Búzios, no Rio Grande do Norte, a cerca de 25 km ao sul de Natal (BUENO, 1998b, p. 99-100).
Ao porto localizado na praia de Búzios podiam “surgir navios de 200 toneladas”, registra João Teixeira I (apud PINTO & PEREIRA, 1998, p. 49). Os franceses usavam o porto da desembocadura do rio Pirangi (aproximadamente 25 km de Natal) para o “resgate do pau” como os portugueses se referiam aos locais de corte e estocagem de pau- brasil.
Mascarenhas Homem organizou uma expedição marítima, formada por 12 navios (sete navios e cinco caravelões), comandada por Francisco de Barros Rego, e uma terrestre, composta por companhias de infantaria e cavalaria, sob o comando de Feliciano Coelho. O encontro das forças portuguesas aconteceu na foz do rio Potengi. Participando da expedição terrestre estavam “jesuítas e franciscanos – dentre os quais havia aqueles que conheciam a língua tupi – e centenas de indígenas, originários da Paraíba e Pernambuco, pertencentes a tribos Tupi já controladas pelos colonizadores” (MONTEIRO, p. 28).22 Vários negros da Guiné “acompanhavam a expedição como burros de carga, conduzindo mantimentos e petrechos de guerra” (ALMEIDA, apud PINTO & PEREIRA, 1998, p. 56).
Desde logo, Governador-Geral, D. Diogo de Menezes, compreendeu a importância política e estratégica da Fortaleza dos Santos Reis, divisando as diversas funções que ela desempenharia: “afastamento definitivo dos franceses, abrigo para navios desgarrados, posto avançado para as jornadas do norte, além daquela que parecia ser a única: sentinela da Barra do Rio Grande” (GALVÃO, 1979, p. 72-73). Pero Lopes de Sousa naufragou numa praia entre Macau e Touros e lá deixou um filho morto. Os sobreviventes do naufrágio, como o próprio Pero Lopes e sua mulher Dona Tomasia e alguns poucos soldados foram socorridos e medicados na Fortaleza dos Santos Reis.
O ideal, a nosso entender, seria que as comemorações do Quarto Centenário se desenrolassem ao longo de 1997, vez que a esquadra de seis navios e cinco caravelões adentrou o Potengi na manhã de 27 de dezembro de 1597, cuidando imediatamente os seus tripulantes da construção de defesas de paus de mangue e barro com que se preveniram dos ataques mortíferos dos arcabuzeiros franceses em número de cinqüenta, e de infinitas hordas de guerreiros indígenas, que não lhes deram trégua.
Do continente americano, os navios espanhóis saíam carregados de ouro e prata. Isso despertou a cobiça de alguns países europeus, como a Inglaterra, a França e a Holanda, que procuravam participar do comércio colonial.
NA OCUPAÇÃO HOLANDESA
Desde que proclamou a sua independência, as Províncias Unidas mantinham “abertamente ou não, uma imensa guerra de corso contra a Espanha”. Com Portugal, porém, as relações eram as melhores possíveis, com banqueiros investindo em engenhos de açúcar e exercendo “um quase monopólio na distribuição e refino desse produto para o resto da Europa” (SILVA, In: LINHARES, 1990, p. 68). Iglesias (1993, p. 40), descreve as boas relações mantidas entre lusitanos e flamengos: “os navios holandeses iam a Lisboa levar os produtos do Norte europeu, como trigo e bens industriais, voltando com as especiarias do Oriente e da África, madeiras, açúcar e curiosidades do Brasil”.
A União Ibérica e a declaração de independência da Holanda modificou por completo as relações comerciais entre Portugal e Holanda. A inimizade entre espanhóis e holandeses privou os últimos do lucrativo comércio açucareiro, em virtude da ação de Filipe II proibindo a manutenção das relações comerciais entre Espanha (e suas colônias, entre elas Portugal e Brasil) e Holanda, como explica Francisco Carlos Teixeira da Silva:
Ora, desde o momento em que assumiram o poder em Lisboa, Filipe II, 1591, e Filipe III, 1605 (respectivamente Filipe I e Filipe II de Portugal), publicaram, nessas, alvarás estabelecendo que: “nenhuma nau, nem navio estrangeiro, nem pessoa estrangeira, de qualquer sorte, qualidade e nação que seja, não possa ir, nem fosse dos portos do Reino de Portugal, nem fora dele, às conquistas do Brasil…”. Tais medidas, aliadas ao acirramento das disputas na Europa, acabam por levar os dois países à guerra, em 1609 (1990, p. 68).
Ademais, como reforça Sérgio Buarque de Hollanda (1989, p. 235-236), foram vários os momentos (1585, 1596, 1599) em que os navios holandeses sofreram embargos por ordem da Coroa espanhola, o que ocasionava interrupções temporárias do comércio e consequentemente a escassez de vários gêneros, sobretudo do sal, produto essencial às indústrias do pescado e dos laticínios.
Aliados aos potiguares, os franceses representavam uma ameaça para a soberania da Coroa portuguesa sobre estas terras, que se encontravam efetivamente sob o controle dos franceses em 1596. Aparentemente, o lugar iria servir de base para a retomada dos locais que os portugueses lhes haviam conquistado, ao sul.
No século XVII, a região de Ponta Negra foi utilizada como porto para navios, já sendo área conhecida. Em seu diário, o holandês Matias Beck, ao sair de Recife rumo ao Ceará, aportou “atrás da Ponta Negra”, uma distância por volta de 3 léguas da Fortaleza dos Reis Magos, denominado por Beck como “Forte Ceulen”, termo utilizado pelos holandeses para referenciar a referida fortaleza ao longo do período da dominação holandesa no Brasil. A região de Ponta Negra também aparece em representação cartográfica de João Teixeira elaborada por volta de 1611.
Em 21 de dezembro de 1631, uma nova esquadra holandesa tentou desembarcar na capitania do Rio Grande. Enviada pelo Conselho Holandês, a esquadra comandada pelo Tenente Coronel Hartman Godefried van Steyn Callenfels era composta por 14 navios e dez companhias. Tentou adentrar na barra do rio Potengi, mas foi impedida pela artilharia da Fortaleza dos Reis.
No mesmo dia em que ocorreu o desembarque holandês na antiga praia de Ponta Negra (hoje correspondente a Areia Preta) – 8 de dezembro de 1633, um dia de 5ª feira, cuja maré cheia verificou-se às 10 e meia da manhã – , parte das tropas dirigiu-se à barra do Rio Grande (Potengi), embarcada em diversos navios sob o comando de Jan Cornelissen Lichthart, conduzindo também os senhores Van Ceulen, ten.cel. Balthasar Bymae e Carpentier. A esquadra veio impusionada pelos ventos leste e norte, pretendendo a conquista do Forte dos Santos Reis, situado na barra daquele rio.
Quando os navios holandeses demonstraram a intenção de penetrar a barra do rio, a artilharia do Forte dos Santos Reis Magos passou prematuramente a atirar com os seus canhões, o que não impediu a manobra dos invasores. Chegados à distância conveniente do forte, os navios flamengos passaram a responder ao fogo português, com fúria e precisão.
Era plano dos invasores desembarcar a companhia que vinha a bordo, em certo local à margem esquerda do rio, com a finalidade de cortar o abastecimento d`água dos defensores do forte. Tal manancial de água potável correspondia ao rio da Redinha, cujas águas desembocavam na praia do mesmo nome, no Potengi. Todavia, verificaram ser desnecessária tal providência, pois os próprios botes dos navios poderiam impedir a aproximação dos portugueses, que pretendessem procurar aquele manancial d`água.
Em uma das gravuras vêem-se alguns navios holandeses fundeados no oceano, ao nascente da fortaleza. À altura do rio da Redinha, então navegável (Versche Riever), aparecem duas caravelas portuguesas, aprisionadas, subindo o Potengi rebocadas por duas canoas flamengas movidas a remo. À frente das duas canoas, segue uma outra embarcação similar. O grosso da esquadra flamenga achava-se ancorada em um ponto, à margem direita do Potengi, no local onde desembocava um certo riacho provindo da atual lagoa do Jacó, no porto hoje denominado de Canto do Mangue
João Teixeira ALBERNAZ, o velho, “cosmógrafo do Rei de Portugal com carta patente para exercer o ofício de mestre construtor de cartas de marear e de instrumentos astronômicos”, viveu no período de 1602 a 1666. É de sua autoria um mapa intitulado RIO GRANDE, publicado em 1631, o qual se encontra na mapoteca do Itamaraty, no Rio de Janeiro. Certamente o mapa foi baseado em um rascunho, de autoria de desenhista anônimo, laborado por volta do ano de 1614.
Logo após a entrada da barra, via-se o “caminho que os navios fazem para se desviarem dos baixos”, o qual se aproximava bastante da margem direita do Potengi. Na rota do dito caminho havia um “surgidouro dos navios”, com uma profundidade de 35 pés.
O mapa de Albernaz também descreve um “Surgidouro dos navios quando vêm acima”, coincidente com o ponto do Potengi que fica nas proximidades da atual Rua Passo da Pátria. A partir do século XVIII, o surgidouro era conhecido como o Porto do Oitizeiro.
As experiências das abordagens anteriores e um relatório objetivo e detalhado de Adriano Verdonck, segundo Hélio Galvão (1979, p. 80), fez o Supremo Conselho Holandês decidir-se pela ocupação do Rio Grande. Composta por onze navios e 808 soldados, no dia 5 de dezembro de 1633, saiu de Recife, comandada pelo Almirante Jean Cornelissen Lichthard, a expedição que conquistou a capitania do Rio Grande. Tavares de Lyra (1998, p. 78) assevera que no dia 7 de dezembro, na altura de Mamanguape (Paraíba) um navio holandês encarregado de patrulhar o litoral paraibano, sob o comando de Albert Samient, incorporou-se à esquadra.
Como o principal centro político e administrativo da capitania, Natal, já fora conquistado, restava aos holandeses empreender a conquista do principal centro econômico – a povoação de Cunhaú, onde havia um pequeno forte, canhões de ferro, o que ainda assim praticamente não permitiu a resistência dos moradores. “Laet informa que o Fortim fôra construído por marinheiros de Dunquerque, ali abrigados enquanto durava a reconstrução de um navio para substituir o próprio, estragado num encalhe. Era um reduto quadrangular e duplo, com muralhas de três metros, na encosta duma elevação.
Paralelamente à luta contra os brasileiros, a Holanda entrou em guerra com a Inglaterra pelo domínio do comércio ultramarino. Essa disputa acirrou-se a partir de 1651, quando a Inglaterra promulgou os Atos de Navegação, pelos quais ficou estabelecido que todas as mercadorias importadas deveriam vir para a Inglaterra em navios ingleses ou em navios de seus países de origem, o que prejudicava sensivelmente os interesses comerciais holandeses.
Iniciaram-se, também, os constantes conflitos entre a classe dominante colonial e a metrópole portuguesa, além da subordinação econômica de Portugal à Inglaterra, tanto pelo apoio dos ingleses na guerra contra os holandeses, como nos conflitos que Portugal travava com a Espanha desde a Restauração (1640). Durante o conflito com a Espanha, em tratado celebrado com os ingleses, Portugal recebeu “o auxílio de alguns milhares de militares e de alguns navios”, o que lhe permitiu “fazer face às grandes ofensivas do exército espanhol”, impedindo que o esforço militar da Espanha para empreender a reconquista do território lusitano fosse inútil (SARAIVA, 1979, p. 205).
Tarcísio Medeiros (201, p. 54), afirma que a duração e os focos de sobrevida da revolta indígena, levante que persistiu por três décadas deveu-se ao apoio dado pelos holandeses, atendendo aos apelos “daquele Antônio Paraupaba, regedor-mor cariri”, então residindo em Haia. Para tanto, navios corsários holandeses aportavam “no delta do rio Açu e na embocadura do Jaguaribe” trazendo armas e munições para os índios amotinados. A pacificação feita sob os auspícios de Bernardo Vieira de Melo não impediu alguns levantes de índios na capitania.
RELATO DE KOSTER
Em 1816, o viajante inglês, Henri Koster, publicaria seu livro Travels of Brasil, que ganharia, em 1942, a tradução feita pelo intelectual Luís da Câmara Cascudo de Viagens ao Nordeste do Brasil. Nessa obra, Koster, apresentava as impressões colhidas na passagem por diversas cidades do país. Entre elas estaria Natal. Em sua estadia, na capital norte-rio-grandense, o viajante inglês deixaria registrado, algumas impressões sobre a cidade, nos interessando aqui em particular seu relato sobre o porto de Natal. Ao referir-se ao porto, Koster menciona que
A barra do Potengi é muito estreita, mas tem profundeza para os navios de 150 toneladas. A margem setentrional avança consideravelmente e, por essa razão, é necessário que o navio rume ao sul para entrar. O canal, no meio dos arrecifes que ficam a pequena distância da praia, requer conhecimento. Enfim, o porto é de acesso difícil. O rio é muito seguro, quando se haja vencido a barra. A água é profunda e completamente tranquila, e nesse ponto há amplitude para que dois navios possam entrar. Adiante o fundo é raso e, num espaço de algumas milhas, a profundeza é extremamente diminuída. Imagino que seis ou sete navios podem estar perfeitamente no porto. Não se deve penetrar em barras formadas entre bancos de areia como esta senão com bons pilotos, porque elas mudam sempre de lugar e de fundura. Quando a maré se eleva, as margens do norte são inundadas até uma milha a entrada do porto e o mar cobre uma grande extensão de terra que, à maré vazante, fica constantemente úmida e lodacenta, mas permitindo suficiente passagem. (KOSTER, Henri. Viagens ao Nordeste do Brasil. Tradução: Luís da Câmara Cascudo. São Paulo-Rio de JaneiroRecife-Porto Alegre: Companhia Editora Nacional, 1942.p.220.).
O mesmo autor também irá citar a capacidade do porto da Cidade de Natal, que pode abrigar de “seis a sete navios” (KOSTER, 1978, p. 90), bem como também fez referência às regiões inundadas de difícil acesso. Através de uma intervenção governamental foi construída uma calçada que viabilizaria o tráfego, denotando assim a preocupação por parte do poder público para com o porto no período em questão.
ISOLAMENTO
No início do século XIX, a Europa foi palco das guerras napoleônicas. Dessa forma, entre 1795 e 1807 a diplomacia portuguesa atuou sempre no sentido de preservar a paz, chegando mesmo a pagar à França anualmente um imposto de dezessete milhões de cruzados. Aos franceses, entretanto, só interessava uma neutralidade efetiva, ou seja, os ingleses não poderiam utilizar os portos portugueses “para a guerra que faziam à França”, fato inaceitável para os ingleses, visto que os portos lusitanos “eram indispensáveis para os seus navios”, sem contar que aos portugueses afigurava-se praticamente impossível “impedir que continuassem a se servir deles”.
Natal possuía empecilhos naturais (dunas, mar, rio) e um porto que não possibilitava o acesso de navios de grande porte, o que dificultava o escoamento da produção e o contato com outros municípios. Nesse sentido, a ligação comercial do interior do Rio Grande do Norte foi, durante muito tempo, efetuada com a praça do Recife, com a Paraíba ou com Macaíba, cidade nas vizinhanças de Natal (SILVA, Fagner David da. Traçando caminhos e ligando espaços: as estradas do Rio Grande do Norte e o automóvel (1914-1934). Dissertação (Mestrado em História). Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natal, 2016. p.31.).
Fabrício Gomes Pedroza, ou Fabrício II, primeiro presidente da Intendência de Natal (1892-1895), estava entre esses homens. Tio de Pedro Velho, Pedroza herdou do pai homônimo um verdadeiro império na região de Coité (hoje Macaíba; à época, ainda ligada ao município de São Gonçalo), a Casa de Guarapes. Segundo Cascudo, no período imperial, nenhuma outra casa comercial aproximou-se daquela fundada pelo pernambucano Fabricio Pedroza. Apenas entre os anos de 1869-1870, mais de vinte navios teriam aportado às margens do rio Jundiaí, onde ficava a dita Casa, vindos diretamente da Europa. O movimento, ainda de acordo com Cascudo, citando relatório provincial de 1872, superava o do Porto de Natal e sobrepujava o da vizinha Macaíba.
A cidade de Macaíba, distante de Natal vinte e um quilômetros, quem não quisesse ir a cavalo, a burro ou a pé, podia escolher o transporte fluvial. Era feito por duas lanchas pertencentes ao prático da barra, mestre Antônio. A “Julita” fazia diversas curvas mostrando aos passageiros os mangues das duas margens do rio Potengi.
Era necessário, pois, formular um discurso que justificasse a permanência de Natal enquanto capital e pudesse atrair investimentos para o estabelecimento de obras que integrassem, mantivessem e reforçassem essa posição de privilégio na hierarquia das cidades da então província. Assim, na década de 1870 tem-se a aprovação do projeto de construção de uma ferrovia ligando Natal à cidade de Ceará-Mirim e de uma ponte de ferro na região do Refoles, duas alternativas para mudar a condição de isolamento da cidade e impedir novos questionamentos a respeito de sua condição de capital. No final da década de 1870, a linha de trem passou a ser considerada o elemento responsável por garantir a centralidade de Natal (Para aprofundar esse tema, ver: RODRIGUES, Wagner do Nascimento. Dos caminhos de água aos caminhos de ferro. Op. cit., p. 68. 81 Construiu-se a ferrovia).
O porto também não era considerado como um espaço intrínseco à cidade, não sendo ainda a sua “sala de espera,” como veremos no Período Republicano. O porto estava fora do tecido urbano, promovendo uma rápida ligação dos navios com a cidade, não estando, no entanto, integrado de forma efetiva à capital. A passagem de alguns engenheiros por Natal, na década seguinte, endossaria ainda mais essa questão do porto como um espaço fora do domínio da cidade.
Desde o início da colonização do Brasil, o trabalho escravo fazia a riqueza da aristocracia rural. Houve até um aumento considerável do tráfico, acompanhado de uma repressão inglesa, que chegou ao auge em 1845, com a decretação do Bill Aberdeen, que permitia a repressão aberta ao tráfico negreiro. Navios ingleses, perseguiam navios negreiros e, mesmo diante dos protestos do nosso governo, chegaram a invadir portos no litoral brasileiro, violando a nossa soberania. As autoridades brasileiras, por vezes, comprometeram-se a extinguir o tráfico de escravos. Apesar da promessa, o tráfico negreiro prosseguia. Porém, em 1845, a Inglaterra decretou o Bill Aberdeen, que autorizava a Marinha inglesa a aprisionar os navios negreiros que cruzassem o oceano Atlântico e permitia o julgamento dos traficantes de acordo com as leis inglesas.
Os partidos tomam a sério os programas e os lugar-tenentes se digladiam em artigalhões e passeatas. Assim, até a proclamação sonolenta da República. O fato interessante de 1889 é ter o Conde d’Eu mandado o navio esperar por Silva Jardim, galo de campina da propaganda, que tinha ido arengar em S. José de Mipibu.
No Rio Grande do Norte, desde meados do século XIX, o porto de Natal será alvo de vários estudos e tentativas de melhoramento. Em 1847, é feito um levantamento do canal pelo Capitão Tenente F. T. Ferreira, indicando-se os melhores acessos ao porto, dependendo da direção do vento, do tipo da maré e dos obstáculos encontrados no rio. No entanto, o primeiro diagnóstico técnico será dado pelo engenheiro inglês J. Hawkshaw, a partir de uma comissão do governo imperial, que aconselhou o arrasamento de uma seção do recife da boca da barra e a dragagem do canal.
A especificidade da modernidade na Era Industrial dos períodos antecessores estaria nas proporções e na vastidão de territórios influenciados pela essência do moderno. A tecnologia, nesse sentido, tornou possível, com seus telégrafos, navios a vapor e estradas férreas, diminuir as distâncias e expandir a circulação de idéias numa velocidade e proporção jamais alcançadas. Quando o processo de modernizaçãoabarca, direta ou indiretamente, todo o mundo, já no século XIX, era possível perceber a formação de uma nova sensibilidade, reflexo do turbilhão de rápidas e incertas mudanças que se davam cotidianamente alterando e/ou resignificando tradicionais formas de viver.
O desenvolvimento das novas tecnologias marcou, inclusive, uma nova etapa da economia mundial. Foram pelos navios a vapor que grande parte das novas tecnologias conseguiram ultrapassar grandes barreiras espaciais e criar um mercado em terras distantes da Europa (COSTA, Angela Marques da; SCHWARCZ, Lilia Moritz. 1890-1914: no tempo das certezas. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.).
COMPANHIAS DE NAVEGAÇÃO
Na segunda metade do século XIX foram construídas estradas de ferro e reformado o setor portuário de várias províncias do norte do Brasil: companhias de navegação a vapor estabeleceram rotas com escalas em Natal, tendo sido a Companhia Pernambucana de Navegação Costeira e Vapor a primeira a servir, de 1853 em diante, à província do Rio Grande do Norte; construção de hospitais públicos; instalação de trilhos urbanos e água encanada. Devemos ressaltar ainda, diz Manuel Correia de Andrade (1995, p. 34), que o espaço do Rio Grande do Norte
começou a se industrializar, em termos capitalistas, modernos, ainda no século XIX, a partir de 1840, com a intensificação da exportação da cera de carnaúba, dando vitalidade à porção ocidental, beneficiada com o assoreamento do porto cearense de Aracati que antes polarizava a região. Tal fato provocou a transferência de grandes comerciantes daquela cidade para Mossoró e a escolha desta como escala regular dos navios da Companhia Pernambucana.
Segundo Cascudo (1984, p. 315-316), a Companhia Pernambucana de Navegação Costeira a Vapor instalou-se por Decreto Imperial no 1.113, de 31.01.1853, com monopólio sobre a navegação costeira entre os portos de Maceió a Fortaleza. No Rio Grande do Norte a Companhia atuava nos portos de Natal e Macau. Através de subvenção provincial, a Companhia também passou, a partir de 1857, a atuar em Mossoró.
Em 1859, o Presidente Nunes Gonçalves, em um longo trecho de seu Relatório, analisa a situação da capital e as causas de sua pobreza e decadência, e faz a primeira referência a Guarapes. Segundo o Presidente, a construção de uma ponte atravessando o rio Salgado não solucionaria totalmente o isolamento da capital. O Sul e o Leste da Província continuariam isolados da capital e os recursos destinados não compensariam o investimento, já que parte da produção continuaria desviando-se para a Paraíba e outros portos clandestinos ao sul. Guarapes, fora do cinturão de areia que circundava a Capital e com pleno acesso ao interior, era a localidade perfeita para receber investimentos do Governo da Província:
Duas leguas ao Sul da Capital, á margem direita do mesmo rio, que a banha, no lugar denominado Guarapes, observa-se, como não vos é estranho, um pequeno povoado, que, pelas favoraveis disposições em que se acha, pode ter um rápido crescimento, a ser por qualquer modo animado. Extremado ao Norte e ao Sul por dous pequenos rios de excellente agoa potavel, já fora do alcance dos morros, com bellas vias de communicação para varios pontos, entre outros, a Cidade de S. José, donde dista apenas 6 legoas, reunido as precisas condições de salubridade e fertilidade do terreno, pode brevemente constituir-se um ponto commercial intermediario desta Cidade a todo o interior da provincia, e em uma epocha talvez não muito remota ser para ali transferida a sède da capital, visto ainda o grande favor que lhe assiste de um ancoradouro quase tão extenso e profundo, como o que aqui se oferece aos navios de maior lotação. [grifos nossos] (Relatorio do Presidente Nunes Gonçalves de 14 de Fevereiro de 1859. p. 16-18).
POR UM PORTO SEGURO
rvá-lo da força das águas e permitir mais uma comunicação entre a Cidade Alta e a Ribeira. A retificação da ambígua fronteira entre a cidade e o rio entrava em consonância com os ideais de civilidade e racionalidade. O muro seria o início de um grande aterro que iria cobrir totalmente a praça. O Presidente propõe que sejam utilizados os lastros dos navios para formar esse aterro, pois eram lançados diretamente no rio, contribuindo para obstruir o canal. Essa obra não resistiria durante muito tempo à força das águas, sendo necessário abrir um pequeno esgoto para permitir a circulação das águas entre o alagado e o rio.
O Presidente Henrique Pereira de Lucena ainda apresenta um argumento que demonstra a importância que os novos entrepostos do Jundiaí haviam adquirido para o comércio da província:
Ainda com relação á ponte, nota-se que não devendo ella ser movediça, mas sim fixa, segundo o contrato, a navegação do rio por vapores e navios de alto bordo, na distancia de tres leguas, se tornará impossivel; porquanto o rio ficará litteralmente fechado para taes embarcações; incoveniente este que não se dará no porto de Guarapes, porque, desse ponto para cima, o rio só póde ser navegado por barcaças e canôas. (Relatorio do Presidente Henrique Pereira de Lucena de 05 de outubro de 1872 p. 35-39).
No ano de 1877, o engenheiro inglês, John Hawkshaw, passaria por Natal para realizar um breve estudo das condições do porto, analisando sua situação e indicando quais melhoramentos deveriam ser feitos. Em seu relatório feito sobre o porto, John Hawkshaw apontaria, como a principal dificuldade encontrada nesse espaço, a sua má entrada. Para esse engenheiro,
A principal dificuldade deste porto consiste na sua má entrada. O recife, em volta de cujo extremo norte são forçados a passar os navios que demandam o porto, é limitado por um baixo inferior. O recife torna o acesso muito curvo e perigoso, por que, vencida que seja sua extremidade, os navios são obrigados a mudar rapidamente de rumo, para evitarem o baixio. (Relatório com que o exm. sr. dr. José Bernardo Alcoforado Junior passou a administração da província do Rio Grande do Norte ao exm. sr. dr. Antônio dos Passos Miranda, no dia 20 de junho de 1876. Rio de Janeiro, Typ. Americana, 1877. p. 19.).
Com a impossibilidade de receber navios de maior porte em seu ancoradouro, o questionamento da posição de Natal enquanto capital e centro comercial da província passa a ser colocado em evidência, já que a cidade não conseguia realizar o escoamento da produção que vinha do interior da província (ARRAIS, Raimundo. op., cit., p. 121.).
A Câmara Municipal do Natal rebate também a argumentação dos habitantes do bairro baixo de que os “matutos” (O termo no documento refere-se aos comerciantes do interior que vinha vender seus produtos na capital. (Relatorio do Presidente Manuel Januário Bezerra de 4 de dezembro de 1878. Obras Publicas, p. 15)) teriam mais dificuldade para comerciar gêneros de exportação (açúcar, fumo, couro, etc.), já que não havia armazéns destinados para tal na cidade alta. A Câmara Municipal afirma que
… é de todos reconhecido que os gêneros de tal natureza são transportados por mar nas próprias embarcações dos compradores á seus armazéns, ou baldeados nos navios á carga, e se alguns destes gêneros, como o assucar é exposto a retalho, elle é conduzido em costas de animaes dos engenhos aquém do rio Salgado. (Relatorio do Presidente Manuel Januário Bezerra de 4 de dezembro de 1878. Obras Publicas).
Em 1861, o presidente Figueiredo Junior retira a revogação e volta a proibir construções particulares no local. Ele faz a primeira intervenção concreta no espaço, construindo um muro entre o alagadiço e o rio. O “Caes do Salgado” racionalizava e delimitava o espaço, que antes confundia-se com a terra e a água. Ainda é feito um aterro entre o terreno e o muro).
MÃOS À OBRA
Com a proclamação da República no Brasil, uma das primeiras medidas foi a abertura da economia aos capitais estrangeiros, especialmente ingleses, promovendo uma industrialização e modernização do país. No início do século XX, o Rio de Janeiro, capital da República, sofreu remodelações. Segundo Sevcenko,
A nova filosofia financeira nascida com a República reclamava a remodelação dos hábitos sociais e dos cuidados pessoais. Era preciso ajustar a ampliação local dos recursos pecuniários com a expansão geral do comércio europeu. […] O antigo cais não permitia que atracassem os navios de maior calado […], as ruelas estreitas, recurvas e em declive, típicas de uma cidade colonial, dificultavam a conexão entre o terminal portuário, os troncos ferroviários e a rede de armazéns e estabelecimentos do comércio de atacado e varejo da cidade. As áreas pantanosas faziam a febre tifóide, impaludismo, varíola e febre amarela, endemias inextirpáveis (SEVCENCO, Nicolau. Literatura Como Missão: Tensões Sociais e criação Cultural na Primeira República. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 28.).
No Período Republicano, em Natal, o mar apareceria como uma das principais forças capazes de projetar a pequena capital no mercado mundial, apresentando ao país e ao mundo, uma cidade liberta do atraso e estagnação do passado. Pelo mar diversos navios passariam por Natal, trazendo mercadorias e pessoas das mais diversas regiões do Brasil e do mundo.
Em 1890, o engenheiro Souza Gomes, ajudante da comissão de conservação do porto de Recife, é enviado para fazer estudos no porto de Natal e indicar os melhoramentos necessários. A partir da visita desse engenheiro, o Governo abre um crédito para aquisição do material necessário para a dragagem do canal e destruição das rochas, segundo o projeto apresentado por Souza Gomes. Ainda em 1890, o porto de Natal passa a fazer parte do segundo distrito dos portos marítimos, com um engenheiro específico, responsável também pelas obras e estudos dos portos da Paraíba, Pernambuco e Alagoas.
A Baixinha, recife localizado na costa sul do litoral, aterrorizaria, até o começo do século XX, os viajantes que buscavam aportar na capital. Desde o começo das obras do porto, em 1893, o arrasamento da Baixinha, foi colocado como o principal serviço a ser feito. Segundo o jornal, “bastaria arrasar a Baixinha e o futuro que tanto nos espera logo chegará.” (ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. A República, Natal, 21 de fevereiro de 1891.) No entanto, mesmo depois de dez anos após o início dos trabalhos no porto, a Baixinha, ainda continuava a assombrar os viajantes e os administradores locais norte-rio-grandenses. A falta de equipamento apropriado para seu arrasamento, foi apontada, pela comissão de melhoramentos do porto, como um dos grandes motivos para a demora desse serviço. Porém, mesmo com o atraso, o jornal A República, não via problemas em ressaltar, como os serviços da barra estavam adiantados, resultando na entrada de navios de maior porte em Natal. Cada navio que conseguia transpor a barra, era comemorado e exaltado pelo periódico, que fornecia ao leitor informações específicas da embarcação, como seu tamanho e largura.
Em 1893, foi criada a Comissão de Melhoramento do Porto e que para ela foi nomeado o engenheiro Cunha Lima. Diz que sob a direção dele a comissão não obteve êxito, mas com a saída do mesmo e a nomeação do engenheiro hidráulico Souza Gomes, em 1895, as primeiras obras para o melhoramento do porto começaram a serem postas em prática. Segundo o editor, o engenheiro Souza Gomes fez um estudo do porto “e traçou um plano que consistia primeiramente na fixação das dunas para impedir o accumulo de areias no canal, dragagem do canal, etc” (Melhoramento do porto. A República, 12 de maio de 1902.). Ainda segundo o articulista, devido os trabalhos realizados por Souza Gomes, todos acreditavam que “dentro de um anno, o porto desta capital daria accesso aos navios de grande calado” (Idem).
No final do século XIX, era cada vez mais notória a crença de que o desenvolvimento e o progresso da cidade passaria pelo porto de Natal: “quando o Rio Grande do Norte, após a proclamação da República, entrou na plena posse de Estado autonomo, comprehendeu que o problema magno, do qual dependia todo o seu futuro, era a abertura da barra” (Melhoramento do porto. A República, 12 de maio de 1902), atestava o jornal “A República”. Externando esse antigo interesse, o articulista começava a narrar o processo que se deu, a partir de então, para a efetivação de um serviço de engenharia que tivesse por fim a ampliação da abertura da barra do rio Potengi para que no porto da cidade pudesse atracar navios de grande calado, os chamados transatlânticos.
Em 1906, chegou a Natal, o escafandrista Manuel da Gaya, experiente mergulhador, de 60 anos de idade, contratado pela comissão de melhoramentos, para realizar estudos na Baixinha. O primeiro mergulhador profissional a pisar em terras potiguares, Manuel da Gaya, viria a capital para realizar sondagens no mar, destinadas a fornecer, ao engenheiro-chefe Pereira Simões, informações importantes sobre o interior do rio Potengi de modo a direcionar novas intervenções pela comissão no porto. Logo no seu primeiro mergulho, próximo à Baixinha, o mergulhador se deparou com os cascos de um antigo navio que havia naufragado em Natal em 1883, o Sussex.(OBRAS do porto. A República, Natal, 17 de abr. de 1906.).
No dia 3 de agosto de 1907, a comissão de melhoramentos realizou, na fortaleza dos Reis Magos, uma festa para comemorar o recuo de 30 metros da boia que assinala a ponta da Baixinha, que indicava o quase desaparecimento da curva reversa, existente próximo a esse recife. Tal feito, era, segundo o jornal A República, resultado do trabalho de arrasamento e dragagem de entulhos na barra empreendido pela comissão, permitindo, agora, o ingresso de navios de maior porte no porto. (OBRAS do porto. A República, Natal, 3 de ago. de 1907.) Do porto externo, prosseguimos nossa visita ao porto interno, formado pelo ancoradouro interno.
Em 1910, foi encomendado, pelo engenheiro-chefe, Pereira Simões, uma pequena locomotiva e um novo guindaste para ajudar nas obras, e que posteriormente, poderia, segundo o engenheiro, servir para otimizar o descarregamento das mercadorias que chegavam a Natal nos navios. O uso desses equipamentos, foi destacado pela Folha Republicana, como prova do avanço da cidade, pois o uso deles possibilitaria a superação dos limites impostos pela natureza. A ciência estaria ajudando os grupos dirigentes locais, a vencer os obstáculos no espaço urbano que faziam Natal dormir, ainda no “sono do passado.” (OBRAS do porto. A República, Natal, 25 de ago. de 1910.).
O porto de Natal está sendo construido pelo illustre engenheiro Decio da Fonseca. Foram feitas obras de dragagem, aprofundamento e delimitação dos canal, removidos obstaculos, fixadas as dunas, feito um ancoradouro muito vasto e um caes, apparelhado de trilhos e armazens que permitte a atracação dos navios de maior calado (PORTINHO, Carmem V. A remodelação de Natal. A República, n.160, Natal, p.02, 13 jul. 1930.).
Apesar de terem sido rodeadas por atrasos e denúncias referentes ao desvio de recursos importantes destinados aos serviços de melhoramento as intervenções promovidas pelo estado sobre o porto permitiram na primeira década do século XX, o acesso de navios de maior porte na região portuária.
SALUBRIDADE
Os higienistas e sanitaristas do final do século XIX se preocuparam com a entrada de navios estrangeiros no país, pois suspeitavam serem eles, os responsáveis pela entrada e saída das doenças causando epidemias de doenças da febre amarela, cólera morbus, varíola, tuberculose. Na área de propriedade da Empresa Tração, Força e Luz [existia] uma grande superfície “pantanosa e coberta de viçoso capinzal, e nas suas imediações [ficavam] os fornos de incineração do lixo da cidade […], fazendo-se a combustão ao ar livre.
Sem uma estrutura de “hygiene publica” minimamente organizada – contava-se em Natal apenas com um único depósito de medicamentos e o Médico do Partido Público, cargo existente desde 1831, pelo menos, além dos esporádicos médicos estrangeiros embarcados nos navios que fundeavam o rio Potengi e que acabavam diagnosticando e receitando em terra durante a permanência da sua embarcação – pouco se podia fazer frente aos imperativos da higiene (Ferreira et al., 2003, cap.2; Cascudo, 1947, p.203-214.).
Como o bairro da Ribeira apresentava sérios problemas de insalubridade, boa parte da população era dizimada pelas epidemias de febre amarela, varíola, tuberculose, sarampo e sífílis, incomodando os estrangeiros. O aumento da população; a insuficiência de águas e de esgotos, o desconhecimento dos tratamentos; a ignorância popular, à desobediência às leis e às posturas municipais; a precária vigilância sobre os navios vindos de portos infectados e a incompetência das autoridades seria algumas das razões do agravamento das péssimas condições ambientais em nossa capital. Em suma, o projeto ‘modernizador’ só ofereceu mais vantagens e benefícios às elites, eliminando as classes trabalhadoras, pois o embelezamento da cidade e a higienização da mesma, representaram uma separação clara entre os espaços deferidos para as atividades comerciais, industriais e de lazer, e aqueles concedidos como lugares para atividades outras como hospitais, cemitérios, e moradias das classes inferiores.
Em 1902, com a eclosão de um surto de peste bubônica no Recife, foi feito um plano de isolamento dos doentes na fortaleza dos Reis Magos, mediante o medo da propagação de uma epidemia na cidade. Todos os navios que atracavam na capital norte-rio-grandense, passariam, então, pela inspeção do profissional de saúde do porto, na época, o médico Segundo Wanderley.
Outro ponto crucial do controle no porto, diz respeito ao problema da higiene. Em 1907, Oswaldo Cruz, diretor da Repartição Geral de Saúde Pública, enviou ao Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Tavares de Lyra, um ofício exigindo a reforma dessa repartição, fundamental para o “progresso do país,”, pois o aumento do número de navios a atracarem nos portos brasileiros, exigia uma maior visita dos médicos nessas embarcações. (SERVIÇO sanitário dos portos. A República, Natal, 28 de fev. de 1907.).
Em 1910 foi o cólera que se tornou preocupante. Mais uma vez, a referência sobre a doença viria da cidade do Recife, não porque a mesma estivesse sendo acometida por uma epidemia de cólera, mas sim porque de lá teve início uma grande preocupação com o problema, pois, na Europa, vivia-se uma situação de epidemia da doença e a cidade do Recife era um dos mais importantes portos comerciais do país, que recebia diariamente muitos navios vindos do velho continente.
DESENVOLVIMENTO DOS PORTOS
As províncias agora teriam liberdade de escolher o local mais propício para suas capitais, não dependendo mais de uma estrutura centralizadora e distante para definir isso. As primeiras cidades fundadas no Brasil obedeciam principalmente aos interesses militares da coroa portuguesa e os sítios originais desses povoados começavam a revelarem-se inadequados para a novas necessidades das províncias emancipadas. No início do século XX, o historiador João Ribeiro assim descreveria esse processo:
As primeiras cidades do Brasil começam pelos morros e só tarde descem á planície e nunca se formam á borda do mar, e mesmo nos rios, só nos lugares onde não chega o navio de longo curso – essa prudência dos fundadores do século XVI e no seguinte, que foram uma luta interrompida pela posse da terra. Assim fundaram-se S. Cristóvão, Olinda, S. Vicente, longe-perto do oceano, Baía e Rio (Morro do Castelo) nas eminências; cidades á boca do oceano como Fortaleza, Maceió, Desterro, Aracaju, etc. são recentíssimas. (RIBEIRO, História do Brasil: Curso Superior, apud: CALAZANS, 1940, p. 42).
Durante a República Velha, as principais obras federais realizadas nos estados serão os melhoramentos dos portos. O escoamento da produção dos estados era feito por meio os portos situados nas cidades litorâneas, das quais partiam as principais estradas em direção às zonas produtoras. Assim descreve Vargas a situação dos portos durante a República Velha:
Os portos eram quase todos constituídos por trapiches e pontões dos quais saíam pequenas embarcações ou balsas que levavam as mercadorias aos navios de maior porte fundeados ao largo. Embora, durante o Império, tivesse havido grande produção de estudos e projetos visando à construção de portos, pouco foi realizado. O único porto de atracação era o do Rio de Janeiro, com suas duas docas: a da Alfândega e a do Mercado, porém ambas de pequeno calado. (VARGAS, 1994, p. 189).
Diante desse quadro, era natural “que uma das principais realizações republicanas no campo da engenharia civil, tinha sido a construção de portos marítimos.” (VARGAS, 1994, p. 189) Além da necessidade econômica de escoar a produção dos estados, havia outros fatores em jogo. O porto era por onde as outras nações viam o Brasil, uma nova nação republicana, com aspirações progressistas e modernizadoras:
Foi o tempo, em que contentava a navegação um bom e abrigado ancoradouro, bem o conheceis. Hoje o navio exige acostamento e descarga rapida. […] O passageiro, fatigado dos esforços feitos ao sacudir das ondas, olha desgostoso, comquanto resignado, o novo intermediario ainda embarcação, em que tem de metter-se para alcançar o desejado repouso em terra; a sua aspiração, que todos os povos buscam satisfazer, é passar immediatamente do navio á terra, da coberta ao caes. (Relatorio do Ministro da Indústria Viação e Obras Publicas Antonio Francisco de Paula Souza, 1893, p. 65-68).
No dia 11 de outubro de 1905 seriam expostas as seguintes razões para a escolha do local, no jornal O comercio do Rio de Janeiro:
O porto de Natal é superior aos demais portos do Rio Grande do Norte, porque offerece melhor abrigo ás embarcações e tem maiores profundidades, além de ser francamente accessível em qualquer maré pelos navios brazileiros que viajam na nossa costa, facto que não se verifica com os outros portos a elle comparaveis, que só dão entrada aos vapores de pequena cabotagem e isto mesmo apenas na occasião da preamar; demais está situada neste porto a cidade de Natal, capital do Estado, que precisa ter facil communicação com o interior, e estão em andamento as obras de que carece o porto, cujo melhoramento é incontestavelmente de custo muito inferior áquelle que teria de ser feito em qualquer um dos outros (Relatorio do Ministro da Indústria, Viação e Obra Públicas, Lauro Severeiano Müller, 1906, p. 629).
CRESCIMENTO DA RIBEIRA
Ruas como a do comércio e a Dr. Barata, diretamente próximas ao porto, junto a outras como a Correia Teles e 13 de maio, estas duas últimas já situadas no bairro da Cidade Alta, se tornariam pontos privilegiados dessa circulação de mercadorias. Muitas das lojas presentes nessas ruas tiveram no jornal A República espaço disponível para seus anúncios, que além de enfatizar a procedência dos seus produtos, nesse caso, os grandes centros urbanos da época, também ressaltavam por vezes, os navios de onde as mercadorias vinham, promovendo a expectativa em seus leitores, da chegada dessas embarcações no porto.
Esses anúncios dos produtos são, a nosso ver, uma importante fonte para nos ajudar a começar a responder a tais questões levantadas a partir da chegada dos grandes carregamentos trazidos pelos navios, pois revelam alguns possíveis destinos destas mercadorias que estão entrando na cidade. Por exemplo, no anúncio da loja Novo mundo, em 1902, a loja, que se anuncia como o “centro das novidades parienses”, os seguintes produtos são anunciados: Chapéus, capotas, gorros e bonets, chapéus de sol, toucas, bengalas, guarnições, figuras de biscuit, estratos e quinquilharias. (ANUNCIOS, A Republica, Natal, 15 de abril de 1902.)
A loja Despensa Natalense, por exemplo, situada na Rua do Comércio, anunciou nas páginas do periódico republicano, a chegada do vinho que abastecia o restaurante internacional, que vinha por meio do vapor Brasil. A loja Novo Mundo, localizada na Rua Correia Telles, insistiria na referência da procedência de seus produtos, que segundo a propaganda presente no periódico, vinham diretamente da capital francesa. O Vapor Inglês Navigator, que vinha de Liverpool, era o navio que abastecia a loja, trazendo artigos do vestuário. Esses navios, que atracavam no porto e abasteciam os principais estabelecimentos da cidade, também transportavam equipamentos para serviços importantes na capital, com as obras de construção da estrada de ferro e às próprias obras de melhoramento do porto de Natal. Figuras como Fabricio Pedrosa e Júlio Von Sohsten, grandes capitalistas na cidade, eram os agentes das companhias de navegação na capital, responsável por intermediar as negociações entre os comerciantes e as empresas, anunciado nas páginas do Jornal A República, as datas para realizar os pedidos de produtos a serem trazidos por estas embarcações. Tais mercadorias, vindas em navios que podiam com os melhoramentos do porto, incluir Natal em suas escalas de viagens, traziam esses produtos, que eram anunciados com expectativa nas páginas do jornal A República.
O porto não se resumia ao cais. O porto era formado por uma rede de espaços necessários para seu funcionamento, onde era fundamental a presença de armazéns dedicados a receber parte dos grandes carregamentos que vinham nos navios.
Outro comerciante importante na cidade, que também mantinha armazéns na Rua do Comércio, era Júlio Von Sohsten. Agente da Harrison Line, tal como Fabricio Pedrosa, Von Sohsten exportava farinha e algodão pelo vapor inglês Matador. Dono de uma empresa de pesca, A Baleia, na Paraíba, Von Sohsten trouxe para Natal, a “pesca moderna”, inaugurando essa atividade em 1910, junto ao governador, Alberto Maranhão, a bordo da embarcação que homenageava o governador com seu nome. (NAVIO Alberto Maranhão. A República, Natal, 19 de jul. de 1910.) À bordo, fora realizado uma festa, tendo como convidados, além do governador e o próprio, as figuras mais “ilustres” da sociedade natalense, segundo o jornal A República, além de parte da imprensa, que também fora convidada para a festa. Von Sohsten, também era dono da lancha Progresso, construída em solo potiguar para realização das atividades envolvidas na pesca.
A necessidade de pôr a Capital em fácil communicação com o interior; o facto de ser o porto de Natal – cujo melhoramento está em via de execução – acessível, em qualquer maré, aos navios e vapores brasileiros que viajam na costa; o inconveniente que resultaria de ser outro qualquer o ponto inicial da estrada, por ficar esta isolada da rede ferroviária actualmente existente; o menor custo da linha que, percorrendo a zona flagellada, permitte chegar ao seu centro sem haver necessidade de atravessar a serra da Borborema, que, em vez de ser transposta, é contornada no seu cabeço extremo (RIO GRANDE…, 1906, p. 08-09)
ACESSO AO PORTO
Em 1870, segundo o relatório do presidente de província da época 78 embarcações haviam conseguido desembarcar em Natal.
Em 1900, no governo de Ferreira Chaves, sete anos depois do início das obras do porto, 152 embarcações haviam conseguido atracar em algum dos pontos de embarque e desembarque espalhados na cidade. Sobre esses dados da entrada de navios em Natal no Império e na República, ver: CUNHA, Silvino Elvidio Carneiro da. Relatório apresentado á Assemblea Legislativa do Rio Grande do Norte. Recife, Typ. do Jornal do Recife, 1870. p. 31, e CHAVES, Joaquim Ferreira. Mensagem dirigida ao congresso legislativo do Estado Rio Grande do Norte. Typ. do jornal A República, 1900.
Esse acesso de navios de maior porte, oriundos das mais diversas regiões do país e do mundo, ainda que limitado, se comparado a outras capitais portuárias brasileiras nesse mesmo momento, estimulou um movimento de busca, por parte de pequenos e grandes comerciantes locais, por adquirir terrenos ou casas no bairro da Ribeira, de preferência próximas ao porto, no intuito de estabelecer lojas e firmas. Essa busca se explicaria, em grande medida, pela expectativa construída pelos principais periódicos natalenses, como o jornal A Republica, em torno da possibilidade de atracar no porto navios de maior porte, que abririam o caminho para circulação de produtos à capital norte-rio-grandense almejados pelas elites locais.
No dia 15 de fevereiro de 1903, o senador Pedro Velho volta a Natal, sendo preparada uma festa para sua recepção. Várias embarcações, se reuniriam em frente ao cais da Alfândega, muitas delas, com flâmulas e ornamentações. Aqueles que desejassem receber Pedro Velho, embarcariam nesses navios, já que a embarcação, na qual vinha o senador, não tinha condições de entrar na barra. No rebocador, Augusto Severo, que recebia o nome do irmão de Pedro Velho, embarcou o governador do estado, seu secretário e ajudante de ordens, junto também a comissão do Partido Republicano, formada pelo desembargador Moreira Dias, pelo comandante Arthur Lisboa, Manoel Dantas, coronel Pedro Soares e Francisco Câmara.
Fabricio Pedrosa, coronel e presidente do congresso, também era representante da firma inglesa Harrison Line, que enviava de Liverpool para Natal, navios destinados a compra do algodão. Navios como o Actor e o Navigator, traziam, para cidade, produtos que não havia na capital, como o vinho, que o hotel internacional anunciava nas páginas do Jornal A República, ou a manteiga dinamarquesa, que supria o estoque da despensa natalense da firma Machado & Cia. Pedrosa estava na comissão que esperava Pedro Velho no cais, junto ao presidente da intendência e ao representante do Partido Republicano.
Os trabalhos de dragagem do ancoradouro interno, gerariam reclamações do agente da Harrison Line, Fabricio Pedrosa, que argumentava que, devido ao intenso serviço dragagem próximo ao cais da alfândega, um de seus navios haviam tocado o fundo do rio Potengi.
Em janeiro de 1913 chega à cidade o senador Ferreira Chaves, a bordo do paquete Bahia, candidato ao Governo do Estado e representante da oligarquia Albuquerque Maranhão. O senador, em discurso aos representantes da elite e imprensa potiguares, traça um panorama dos melhoramentos efetuados no Rio Grande do Norte durante a gestão de Alberto Maranhão, seu partidário (VOLTANDO ao assumpto, A Republica, Natal, ano 25, n.24, 31 jan. 1913.).
A vida dos “trabalhadores do mar” passou a ser organizada pelas licenças exigidas pela capitania dos portos. O desembarque na cidade envolveu, a partir do Período Republicano, uma série de exigências. Primeiramente, as embarcações não poderiam mais estar fundeadas próximas ao cais, sendo necessário haver uma distância de vinte metros dos navios em relação ao cais. (CAPITANIA do porto. A República, Natal, 2 de junho de 1913.).
Quer de dia, quer de noite, quaisquer embarcações miúdas, quer andem ou não sejam de serviço publico ou particular, não poderão conservar-se atacadas ou amarradas ás escadas dos navios ou cais senão o tempo a frete dispensável para embarcar e desembarcar as pessoas ou objetos que conduzirem e as que tenham de esperar ficarão ao largo, em distancia que não estorve a passagem das outras, e só poderão atracar quando largar e que estiver na ocasião atracada. (CAPITANIA do porto. A República, Nata, 9 de out. de 1912.).
Em 1914 uma viajem Natal – Rio de Janeiro – Natal a bordo de um navio do Lloyd demandava oito dias para ir e voltar.
Através da Manoel Machado e Cia a população de Natal também poderia saber informações de valores para cargas, passagens e encomendas nos paquetes. Os paquetes eram navios geralmente movidos a vapor que faziam travessias regulares levando passageiros, encomendas e correspondências. Esse serviço também era anunciado no jornal sempre com a informação do dia que o paquete chegaria ao porto, como consta no anuncio da República de 27 de Abril de 1921 da chegada do Paquete Camocim da Companhia de Navegação a Vapor do Maranhão:
Esperado dos portos do Norte cerca de 28 do corrente, seguirá logo após a indispensavel demora directo do porto do Recife. Dispõe de boas accomodaçoes para passageiros. Para cargas, passagens, encomendas, valores e mais informações, a tratar com os agentes: M. Machado e Cª Rua do Comércio n.40 (A REPÙBLICA, 27/04/1921).
REMOÇÃO DOS DESVALIDOS
No início do século XX, eis, então, mais uma forma de tratamento dada aos “desaforados” natalenses. Aqueles que ameaçavam a ordem e o processo de remodelação urbana deveriam ser recolhidos, os loucos deveriam ser isolados em hospitais ou despachados para o outro lado do Rio Salgado, os retirantes precisavam integrar as comissões de trabalho ou embarcar nos navios para o norte do país, e os perigosos deveriam ser trancafiados no presídio.
Era preciso garantir a imagem de uma capital em processo de modernização. As acusações dirigidas ao governador referentes às suas ações perante os flagelados não pararam por aí. O Diário de Natal denunciou o êxodo forçado ao qual os retirantes eram obrigados a aceitar. Segundo a Folha Oposicionista, Alberto Maranhão estaria enviando os pobres flagelados aos montes em navios para o norte, a fim de diminuir a massa de desordeiros que habitava a capital e as principais cidades do estado.
Segundo matéria d’A Republica, mais de 6.500 sertanejos já haviam deixado o estado, indo a maioria deles para o extremo Norte (4.939). A REPUBLICA, Natal, 28 abr. 1904. Este número ainda cresceu de modo considerável, pois ao menos até o dia 14 de junho (data do último aviso publicado n’A Republica sobre o embarque de emigrantes), centenas de retirantes continuaram a deixar o estado. Em ARRAIS, R.; ANDRADE, A.; MARINHO, M. O corpo e a alma da cidade: Natal entre 1900 e 1930, p. 33, há uma tabela que aponta nomes de alguns dos navios que levaram esses imigrantes para o Norte e o respectivo número de passageiros em cada embarcação.
O jornal A Republica também noticiava essas emigrações. Em 1904, o periódico possuía uma coluna intitulada Emigrantes que informava o nome do navio ou paquete nacional, a quantidade de emigrantes embarcados e o destino desses indivíduos (EMIGRANTES. A Republica, Natal, 18 fev. 1904; EMIGRANTES. A Republica, Natal, 07 mar.1904; EMIGRANTES. A Republica, Natal, 16 mar. 1904; EMIGRANTES. A Republica, Natal, 18 abr. 1904; entre outras.). Os que não embarcaram nesses navios foram divididos em quatro comissões para participar como mão de obra nas reformas urbanas da capital. Um grupo participou da construção da estrada de ferro Natal-Ceará-Mirim, sendo coordenado pelo engenheiro Sampaio Correia. Um segundo grupo foi encaminhando para trabalhar na construção da praça Augusto Severo.
Muitos Telegramas do Acre e outras matérias do jornal oposicionista compararam essa migração com a comercialização de escravos, denominando os navios encarregados da emigração de navios negreiros e comparando Natal à África (FORA a escravidão. Diário do Natal, Natal, 05 maio 1904. p.1; TELEGRAMAS do Acre. Diário do Natal, Natal, 07 maio 1904. p.1).
LIOYD BRASILEIRO
A maior e mais tradicional armadora brasileira foi fundada em 19 de fevereiro de 1890, na República, durante o governo do marechal Hermes da Fonseca. Na segunda década do século XX, a companhia já era a maior do País. Em 1939, por exemplo, tinha frota de 122 navios, que dava ao Brasil a liderança no setor marítimo na América do Sul. Antes da Primeira Guerra Mundial, o Lloyd dispunha de excelentes navios de passageiros e de cargas também, atuando em linhas para o Prata, para a América do Norte e Europa. Alguns dos nomes da fase: Rio de Janeiro, São Paulo, Acre, Pará, Satélite e Javari.
No Rio de Janeiro, onde ficava a sede da empresa, a Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro contava com um cais próprio, além de não utilizar práticos de porto. Os navios eram manobrados pelos próprios arrais da armadora. Os serviços regulares do Lloyd abrangiam dez linhas, inclusive o Extremo Oriente, com destaque para o tráfego europeu, para onde mantinha sete saídas mensais, e para os Estados Unidos, para onde partiam seis embarcações por mês.
No dia 21 de janeiro de 1904, o jornal A República, publicou uma matéria intitulada “crônica geográfica”. Nela, o autor que assinava como Euricelius, afirmava, logo de início que, “decididamente o mundo é pequeno e temos a sensação de sentirmos nele como que aprisionados.” (CRÔNICA geográfica. A República, Natal, 21 de jan. de 1904.) Ao longo da matéria, o autor argumenta como os avanços da navegação permitiram encurtar as viagens. Se a volta ao mundo, no século anterior, poderia ser feita em oitenta dias, tal como relatado no livro do famoso escritor francês Júlio Verne, na época em que o periódico publicava a crônica, segundo seu autor, até em sessenta dias poderia ser feita tal proeza. No começo do século XX, o desejo de encurtar as distâncias, de romper as fronteiras espaciais, tão presente nos discursos entusiásticos de administradores, reformadores e literatos europeus, sobre os meios de transporte e os avanços da ciência, chegaria a Natal.
As elites locais natalenses, almejavam, como nos lembra Raimundo Arrais, estabelecer pontos de ligação entre a capital potiguar com as transformações em curso nesses grandes centros. O mundo envolvido pela velocidade, pela crença no poder redentor da ciência, na superação da natureza, por meio do emprego da técnica oriunda do saber científico, era o sonho de consumo dos administradores norte-rio-grandenses, que buscaram alterar a forma da cidade para modificar sua “alma”. No intuito de romper essas fronteiras geográficas, Manuel Dantas, uma das principais figuras intelectuais potiguares no período, assinou, no jornal A República, colunas como, “geografia política,” dedicada a trazer, para seus leitores, informações sobre a cultura, política e economia dos principais países europeus. Manuel Dantas, particularmente, seria uma das figuras no meio intelectual natalense, que mais se empenhariam em estabelecer, por meio da leitura, da imaginação, esse transporte de uma parte dos natalenses para o “velho mundo”.
No passado, os navios de passageiros brasileiros, os conhecidos “Navios de Linha”, ou “Paquetes de Cabotagem”, pertencentes principalmente a Companhia Costeira e do Lloyd Brasileiro, serviam como o principal elo entre as capitais localizadas na costa do Brasil e os rios da região amazônica. Quem daqui seguia para a escala em Recife, pegava um destes barcos e na capital pernambucana fazia uma transferência para navios que impressionavam pelo tamanho, qualidade, conforto e detalhes.
Uma destas empresas que ligavam a região Nordeste com a Europa, era conhecida como Lloyd Holandês, ou Koninklijke Hollandsche Lloyd, que tinha a sigla KHL. Esta empresa era representada em Recife pelo pernambucano de descendência holandesa Julius von Sohsten, que tinha fortes ligações com o Rio Grande do Norte, já tendo possuído na nossa cidade uma casa de comércio no bairro da Ribeira.
A KHL foi fundada em 1899, destinada a levar gado e outras mercadorias entre Amsterdam e a América do Sul, principalmente a Argentina. Devido à proliferação da febre aftosa no vizinho platino, a empresa passou a trabalhar com transporte de passageiros e carga. Seus navios levavam desde passageiros de alto poder financeiro, a pobres imigrantes desejosos de tentar uma nova vida no hemisfério sul.
Em 1902, atracaria no porto, o primeiro navio da grande companhia Lloyd Brasileiro, uma das principais companhias de navegação da época no país. Desde o começo do referido ano, o governador Alberto Maranhão, vinha estabelecendo negociações com o diretor da companhia para que os navios do Lloyd passagem por águas potiguares.(VAPORES do Lloyd. A República, Natal, 22 de abr.
As limitações do porto, principalmente a entrada da barra, que assustava as embarcações, na iminência de se chocarem com o rochedo denominado de Baixinha, era apontado como umas das principais causas para que as embarcações da Lloyd, de maior porte, se comparadas as de outras companhias, como a pernambucana, atracassem no porto da capital.
O jornal A República, apresentou em suas matérias a expectativa dos grupos dominantes do estado e das elites locais, com a resolução dessa situação. A passagem dos vapores da Lloyd por Natal representaria a chegada do progresso nas terras potiguares, progresso este que vinha sendo possível, em parte considerável, pelas obras de melhoramento do porto. A insistência da companhia em não incluir Natal em sua escala de viagens era apontada, pelo periódico, como “má vontade” da Lloyd Brasileiro com o Rio Grande do Norte.
A principio, toda dificuldade estava na barra, que diziam impraticável; agora, são as marés, que obrigariam os paquetes a se demorar, atrasando as viagens. Nenhum destes motivos é procedente: no 1º caso, por que vapores muito maiores que os do Lloyd frequentam o nosso porto; quanto ao ultimo, por que as vantagens para a companhia seriam de modo a compensar o sacrifício da demora. Um pouco de boa vontade, apenas, dos atuais diretores do Lloyd e tudo estaria feito. (VÁRIAS. A República, Natal, 21 de abr. de 1902.).
Tomaz Salustino, proprietário da mina Brejuí, de Currais Novos, desembargador aposentado, vice-governador do Estado, o homem mais rico do Rio Grande do Norte, é o rei da scheelita, vivendo em Currais Novos, no meio das minas, numa serra imensa, verdadeira Montanha Magnética e quando aparece em Natal, não deixa de ir à Avenida Tavares de Lira, modesto, falando baixinho e sempre achando a vida difícil, apesar dos milhões amealhados… O corretor de cambio, José Aguinaldo Barros, (descrito pelo autor) fundador da Bolsa de Valores do RN, boêmio, ator, poeta, deixou inédito “Poemas para Nina”, publicado em 1993, que há vinte anos passados teve a honra de ser o melhor datilografo da cidade, trabalhando na agência do Lloyd Brasileiro, companhia de navegação proprietária de navios de passageiros que ligava Natal ao restante do País, Agência na rua Dr. Barata, atual n. 220, numa mesa bem junto da porta da frente onde o povão juntava pra ver a “estraladeira” da antiquada Remington, Marca de máquinas de escrever, e ouvir o trinado do primeiro canário-belga importado, cuja gaiola ficava no portal do prédio, é o corretor do desembargador Tomaz.
O vapor Manaus era uma carroça. Nunca chegava ao porto de Natal no dia em que era esperado. Gostava muito de fazer surpresas… Juquinha, o catraieiro ajudante do bote “Jacaré”. Era uma figura muito popular no ambiente do cais da Avenida Tavares de Lira. Tinha uma grande qualidade – só mentia quando estava bêbado. Era o encarregado de transportar da casa até o convés do navio a bagagem da maioria das pessoas que embarcava em Natal.
Desde a fundação, em 1890, o Lloyd Brasileiro sempre enfrentou dificuldades, mas a que surgiu no final dos anos 80 para a década de 90 foi a que levou a companhia a uma situação insustentável, com prejuízos e dívidas imensas, que finalmente levaram à extinção, há um ano. Um dos golpes que levaram o Lloyd ao naufrágio foi a decisão do Governo de abrir a navegação brasileira e companhias estrangeiras. O objetivo era baratear os fretes marítimos, reduzindo os custos das importações e exportações.O resultado foi uma acirrada concorrência entre as armadoras, que na disputa por espaço levaram os preços dos fretes para baixo, com reflexos trágicos para o Lloyd. Este quadro foi aliado à má gestão, ao excesso de pessoal e a custos trabalhistas elevados, entre outros fatores.Nos anos 90, ainda se tentou passar o Lloyd Brasileiro para uma armadora privada, mas as negociações não chegaram a um resultado satisfatório.
O Lloyd Brasileiro foi extinto em 15 de outubro de 1997. A extinção da estatal Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro foi determinada pelo presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, para dar um fim à crescente dívida, que atingiu níveis dramáticos no final da década de 80 e início dos anos 90, com o arresto (apresentação judicial) de navios.
Alguns dos navios do Lloyd foram leiloados para quitar parte das dívidas. A empresa alemã Eckhardt Marine, de Hamburgo, adquiriu o Itaquatiá, Itanagé, Itapé, Itaité e Itapagé.A armadora nacional Norsul adquiriu os graneleiros Rio Apa, Rio Trombetas e Rio Branco. Esses navios ficaram, durante vários anos, ancorados na baía de Guanabara.O último ato do Lloyd, que alcançou o posto de maior companhia de navegação da América Latina e de uma das maiores do mundo, foi a extinção, atolado em dívidas de R$ 240 milhões.
AVENIDA E CAIS AOS NAVIOS
Na reforma do cais da Tavares de Lyra, realizada em 1904, uma das intervenções destacadas pelo governador, era a construção de uma grade de ferro que favorecia a prática da observação e contemplação do rio Potengi. O porto se tornaria, não só um lugar de entrada e saída de mercadorias, mais também um local de onde os transeuntes poderiam admirar os navios que aportavam na capital, observando o rio e as novas práticas esportivas, vistas como necessárias, pelas elites locais, para cuidar da saúde e da beleza dos corpos.
Era o local de atracação do Taubaté. A nave foi construída em 1905 pelo estaleiro alemão Bremer Vulkan AG, da cidade de Bremen. Recebeu inicialmente o nome de Franken, que batizou toda uma classe de nove navios cargueiros e esta nave pertenceu inicialmente a empresa de navegação Norddeutscher Lloyd. Estes navios percorriam principalmente as rotas entre a Alemanha e a Austrália, além da América do Sul.
Os navios eram equipados com um motor a vapor de 3.200 HP, que lhe proporcionavam a velocidade máxima de 11,5 nós (cerca de 21 quilômetros por hora), possuíam em média 130 metros de comprimento e 16 metros de largura, deslocando 5.055 toneladas.
Em 1908, foi lançada pelo Governo Estadual, a proposta de construção da avenida do porto, projeto idealizado por Pedro Velho, que havia falecido no ano anterior. O projeto consistia na abertura de uma nova avenida, entre a Tavares de Lyra e a Rua Sachet. A construção desta avenida, em frente ao cais, favorecia o passeio público por essa região, estimulando parte da população a visitar o cais, para contemplar o rio Potengi e os navios que desembarcavam no porto.
No projeto de construção da avenida do porto, proposto em 1908, pelo governador, podemos perceber, como a existência dos armazéns próximos da região portuária, eram um ponto fundamental na busca dos grupos dirigentes locais em tornar o porto a “sala de espera da cidade”.
Pelo só enunciado desse projecto vê-se quão melhor ficaria o aspecto da cidade aos olhos curiosos dos visitantes por via maritima a realização dessa obra que de perto consulta as necessidades de nossa futurosa capital. De facto; uma lingueta servida por um caes regular de atracção, em todo o comprimento do trecho indicado, guarnecida por armazens de fachadas construidas com um certo gosto de architectura, olhando para a extensão tranquila e belissima do nosso vasto ancoradouro, daria aos hospedes da cidade uma impressão de vida e de progresso em contraste verdadeiramente chocante com a desoladora impressão de abandono e mau gosto que actualmente fere a retina dos que do rio observam, do tombadilho dos navios que cruzam nossa barra, a casaria mal amanhada e mal disposta que se agglomera com os fundos para a entrada, numa attitude pouco digna e mal asseiada de impassivel impudor. (MELHORAMENTOS da cidade. A República, Natal, 12 de fev. de 1908.).
Em 1908, Manoel Dantas, uma das figuras de destaque do meio intelectual natalense e redator do jornal A República, publicou, no respectivo periódico, uma matéria, na qual descrevia sua emoção ao ter visitado o cais da Augusto Tavares de Lyra:
Sexta feira passada, deveres de amizade levaram-me ao caes “Augusto Lyra” para os votos de boa viagem a dois distinctos moços, dignos representantes dessa geração, nova e cheia de fé que o Rio Grande do Norte, dentro do meio social que personificamos, vai formando para um dia confiar-lhe seus destinos. Tive então uma impressão de contentamento profundo ao espectaculo que offereciam as aguas do Potengy, em cuja tranquilidade como que havia uma exhaustão de vida. O sol faiscava sobre a lisura do espelho cristallino, naquella tarde de verão. As collinas cobertas de verdura eram uma moldura côr de esperança na fita prateada do rio. Escalerea e canôas, pejados de gente e mercadorias, iam e vinham de terra para o “Orator”, o “Bragança”, o “Planeta”, o “Cabral”, o “Alagoas”, cinco vapores que affirmavam a vida do nosso porto e a prosperidade do nosso commercio. (CONTENTE, Braz. A Republica, Natal, 10 ago. 1908.).
O Bragança foi construído em 1882. O ex- Cyril (1897) foi adquirido da Booth Line pela Empreza Navagacao Gram Pará, Pará, renomeado Bragança. Em 1907 foi transferido para Lloyd Brasileiro. Em 1925 naufragado. Infelizmente não encontramos nenhuma sobre Alagoas. Pesava 1.989 toneladas.
Em sua descrição, Manoel Dantas enfatiza o “espetáculo” que as águas do Potengi lhe proporcionam, com os navios circulando pelo porto, trazendo mercadorias e pessoas. A impressão que o porto despertou neste intelectual, foi, para ele, uma das provas de que o progresso havia chegado às terras potiguares. Segundo o autor, “se isto não é progresso, e se não é expansão de uma terra que promete, então é que mudou-se a noção de todas as ideias que concebemos sobre a grandeza dos povos.” ( Idem, p. 1.).
Na época em que o transporte marítimo era mais utilizado, era no Cais da Tavares de Lira, local importante de Natal, que atracavam os antigos navios mistos de passageiros e cargas conhecidos como paquetes, principalmente das empresas Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro e Companhia de Navegação Nacional. Tratava-se do ponto de embarque e desembarque mais importante da nossa cidade.
Os serviços de implementação das linhas férreas dos veículos nas ruas também geram problemas – como já mencionado anteriormente – em relação ao acúmulo de detritos nas vias, como por exemplo, na Avenida Tavares de Lyra (No dia 14 de abril de 1917 essa avenida passaria a abrigar a primeira agência do Banco do Brasil em Natal.), uma das mais movimentadas da cidade, defronte ao Cais Tavares de Lyra.
A avenida Tavares de Lyra, um dos mais bonitos pontos desta cidade, é onde se nota maior movimento á qualquer hora do dia, augmentando quando em nosso [cais] ancoram navios vindos do norte ou sul. Em todo caso, á Avenida Tavares de Lyra não se vota o cuidado merecido e vemol-a entulhada de materiaes de troços imprestáveis que concorrem para o seu afeiamento e difficultam o transito (ESTRADA de Ferro Central do Rio Grande do Norte, A Republica, Natal, ano 25, n.8, 11 jan. 1913, p. 01).
FUTURISMO DE DANTAS
Tradutor dos principais clássicos da literatura mundial na capital, Dantas, grande admirador do escritor francês Júlio Verne, da qual afirmava ser uma das suas principais influências intelectuais (CONGRESSO DE GEOGRAFIA. A República, Natal, 25 de Julho de 1905.) , buscou trazer para os leitores do jornal, informações valiosas, adquiridas a partir de suas leituras, sobre esse mundo moderno e industrial que era o desejo de consumo das elites locais. Em 1909, Dantas ministrou, no Teatro Carlos Gomes, sua famosa conferência, intitulada: Natal daqui a cinquenta anos. Conferência, que fora publicada no mesmo ano pela tipografia do jornal A República. Nessa conferência, Dantas propõe o esforço de imaginar a cidade de Natal no futuro. Uma cidade cosmopolita, atraindo turistas de várias regiões do mundo, a “rainha das dunas”. Merece destaque, na narrativa deste intelectual, a descrição feita em relação ao porto e seu papel nessa “cidade do futuro”.
Nesse mesmo dia, no vasto porto que se construirá anos antes adiante dos arrecifes, por meio de dois molhes gigantescos, partindo, um, da ponta do morcego, outro da ponta do Genipabu, como dois braços enormes querendo apertar num amplexo hercúleo as ondas revoltas do mal alto, o transatlântico Cidade do Natal, palácio flutuante de 40.000 toneladas, lançou ferro, despejando no cais, ruas e parques milhares de passageiros que vão encher o trem transcontinental na torna-viagem, recebendo os milhares de passageiros que acabaram de fazer a travessia sensacional. (DANTAS, Manoel. op. cit., p. 8.).
A imagem construída por Manoel Dantas, em relação a este porto de Natal do “futuro”, é importante para percebermos os novos sentidos atribuídos a este espaço na Primeira República e sua nova articulação com a cidade. Como nos lembra Giovana Paiva, a conferência ministrada por Manuel Dantas, está inserida dentro de um momento de transformações na cidade, onde os intelectuais buscavam intervir, por meio de sua escrita nessas mudanças materiais e simbólicas proferidas na capital. A Natal do futuro de Dantas, representava, para a autora esse desejo de modificar a paisagem citadina pelos administradores locais, construindo um “cenário de modernidade”. As mudanças que ocorreriam nessa Natal do futuro, seriam representações das transformações almejadas no presente, por este intelectual. (PAIVA, Giovana. A conferência de Manoel Dantas: a elite natalense construindo a imagem de uma cidade moderna. In: FERREIRA, Ângela Lúcia; DANTAS, George (Org.). Surge et Ambula: a construção de uma cidade moderna Natal, 1890-1940. Natal: EDUFRN, 2006.).
Primeiramente, podemos ver o desejo de construir um porto capaz de receber grandes navios, um dos pontos que suscitariam mais reclamações por parte dos administradores locais. O transatlântico Cidade do Natal, de 40.000 toneladas, representa o anseio de receber, no porto, navios de grandes companhias de navegação, que pelas limitações apresentadas pelo porto de Natal, decidiam não incluir a capital em suas escalas de viagem. Devido ao medo de naufragar, pelo encontro com os diversos arrecifes espalhados ao longo do litoral, os navios de maior porte, que vinham para Natal, prefeririam não entrar na barra, exigindo que pequenas embarcações fossem lançadas ao rio Potengi para buscar as mercadorias ou passageiros que viam neles.
ESTRADA DE FERRO
Em 26 de novembro de 1870, a Lei nº 630 autoriza o Presidente a contratar com o engenheiro João Carlos Greenhalg e major Afonso de Paula de Albuquerque Maranhão a construção de um tramway, ou estrada de ferro, entre Natal e o vale do Ceará-Mirim, passando por São Gonçalo. Em 14 de dezembro do mesmo ano, é autorizada a contratação com os engenheiros Luís José da Silva e João Carlos Greenhalgh, para uma estrada de ferro ligando a cidade de Mossóro ao porto de navios mais conveniente no rio que banha a cidade.
A Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte foi construída tendo como premissa o combate à seca. Essa ferrovia acabaria se tornando a materialização de uma antiga aspiração que era a estrada interligando os municípios de Natal e Ceará-Mirim, tornando-a parte um projeto mais amplo: a via seria a linha de penetração ao interior do estado, interligando a capital às zonas produtivas algodoeiras do Seridó norte-riograndense. Com base na Lei nº 1145 de 31 de Dezembro de 1903 (A Lei nº 1145 de 31 de Dezembro de 1903, autorizava o governo do estado a mandar proceder os estudos de uma estrada de ferro, que, partindo de ponto conveniente do litoral do RN, fosse ter à região mais assolada pela seca (RIO GRANDE…, 1906, p. 08)), o então ministro da Viação e Obras Públicas Sr. Lauro Muller, nomeou, em 23 de Fevereiro de 1904, a Comissão de Estudos e Obras Contra as Secas (A Comissão de Estudos e Obras Contra as Secas surgiu a partir da Comissão de Melhoramentos do Porto de Natal, sendo desmembrada nos primeiros anos do século XX (SIMONINI, 2010).) chefiada pelo engenheiro Sampaio Correia, incumbida de realizar os estudos de planejamento para a Estrada de Ferro Central (RIO GRANDE…, 1906, p. 08). A escolha do traçado – que partiria de Natal em direção ao interior – gerou grande polêmica e disputa entre as elites natalenses e mossoroenses. Entre as principais razões em defesa do traçado adotado, constavam as seguintes:
A necessidade de pôr a Capital em fácil communicação com o interior; o facto de ser o porto de Natal – cujo melhoramento está em via de execução – acessível, em qualquer maré, aos navios e vapores brasileiros que viajam na costa; o inconveniente que resultaria de ser outro qualquer o ponto inicial da estrada, por ficar esta isolada da rede ferroviária actualmente existente; o menor custo da linha que, percorrendo a zona flagellada, permitte chegar ao seu centro sem haver necessidade de atravessar a serra da Borborema, que, em vez de ser transposta, é contornada no seu cabeço extremo (RIO GRANDE…, 1906, p. 08-09).
Os terrenos ocupados pelo parque ferroviário eram antigas zonas alagadas que separavam o bairro da Ribeira e a comunidade – até então não reconhecida como bairro oficial da zona urbana – das Rocas, antiga vila de pescadores e, posteriormente, residência de grande parte da população operária da cidade, principalmente, de ferroviários.
Alem dessas preocupações que evidenciam a capacidade do administrador, sob a sua vigilante actividade têm tomado grande impulso a construcção da estação central, nos antigos terrenos alagados nas proximidades das Rocas e da rotunda destinada ao abrigo das locomotivas e officinas. Um dos mais belos serviços já concluídos é da ponte caes de 200 metros de extensão, montada sobre columnas metálicas com parafusos Mitchell, permittindo a atracação de navios até 18 pés de calado, com apparelhamento completo para carga e descarga. É este um dos melhoramentos mais uteis ultimados pela administração da Central, ainda ignorado por muitos dos que aqui habitam, mal informados da transformação por que tem passado a cidade, na parte comprehendida entre as Rocas e o antigo Canto, abrigo das nossas jangadas desapparecidas (ESTRADA de Ferro Central do Rio Grande do Norte, A Republica, Natal, ano 25, n.8, 11 jan. 1913, p. 01).
EDUCAÇÃO AO PORTO
Seguindo esta concepção de formar artífices, criam-se instituições para os iniciantes pobres. Neste caso, o nome reflete uma escola que não era para aprender os ofícios que formavam oficiais e mestres, mas era destinada aos desvalidos iniciantes, ou seja, eram aprendizes dos ofícios. Por isso, as Escolas de Aprendizes Artífices não formavam artistas ou oficiais, somente profissões inferiores a estas. O decreto que criou as Escolas de Aprendizes Artífices dizia que eram “destinadas ao ensino profissional primário” e que “procurará formar operários e contramestres” (BRASIL, 1909). Pelo dicionário da época um contramestre era um “Empregado de navio, imediatamente inferior ao mestre. Artífice, que substitui o mestre. (De contra… + mestre). (FIGUEIREDO, 1913, p. 515). Portanto está claro que a formação era equivalente ao que chamamos hoje de “auxiliar”. Mas, no uso da linguagem, se pergunta, mas auxiliar de que ou de quem? Seria um auxiliar de um mestre, auxiliar de uma determinada profissão ou ofício.
Além dos pescadores, outra profissão do mar mereceu atenção da Folha Republicana: a dos marinheiros. Esses não deveriam ser vistos como sinônimo de escravos, onde a “chibata era sua lei”. (FONTES, Hernani. Marinheiro e escravo? A República, Natal, 18 de abr. de 1910.) Segundo um artigo publicado na Folha Republicana, em 1910, em outros tempos, quando os navios eram movidos a remo, os marinheiros realmente não eram bem vistos na sociedade. Um dos motivos, era porque, geralmente, escravos e prisioneiros de guerra eram transformados em marinheiros, destinados a usar sua força bruta para a embarcação conseguir navegar. Com a evolução dos navios, primeiramente a vela, depois a vapor, a qualificação para ocupar tal profissão mudaria consideravelmente. Primeiramente, não mais escravos, mais sim homens livres que procuravam os navios, voluntariamente, submetendo-se como soldados a leis militares, trabalhando em serviço de empresas navais. Segundo, os modernos navios a vapor exigiam uma maior instrução desses profissionais, que além de se formar em escola de aprendizes de marinheiros, também buscariam escolas técnicas para aprender algum ofício.
HOLOFOTE CAUSA PÂNICO
O holofote das lembranças de Câmara Cascudo causou muita confusão. O equipamento chegou a Natal com uma esquadra, de dois ou três navios, num dia em que
A noite desceu tranquillamente. Os navios accenderam as lâmpadas. Foi um deslumbramento. Todos nós, e talvez toda a cidade, mordiamos, com o olhar faminto, a palpitação luminosa dos pharolêtes e pontas de fogo, que pintalgavam a treva. De repente um jacto de luz cortou em dois ancoradouros. Correu, lambendo o dorso verde do rio, salpicou de pedraria o bojo negro dos navios ancorados, bateu no caes, e subiu direito e sereno para o ar, zimbrando o ambiente tranquilo, ladeou a portaria das casas adormecidas, voou aos telhados e fugiu, num rasto de oiro e opala, por sobre o casario aglomerado e denso. Ficava num minuto parado, como cauda de um cometa, depois, d’um salto brusco, corria toda a cidade, em vergastadas simultaneas e scintillantes. Alongando a linha de fogo, ia aos Morros, Rocas e Areal, num brilho desusado e poderoso d’imenso diamente. Voltava, como que exhausto, arrastando-se em tracejos feericos n’agua verde do Potengy silencioso.
As impressões descritas por Cascudo em suas reminiscências com relação à inovação “scintilante” transfiguraram a cidade; a presença de um holofote jogando luzes a grandes distâncias e em movimento abalou a tranquilidade da cidade adormecida, construiu uma paisagem distinta, recortada por pontos de luz em movimento que deixou marcas em diversos lugares, revelando os espaços por trás do aspecto sinistro da escuridão. Deslumbramento foi a sensação descrita pelo autor, com o brilho daquela luz:
Foi um delírio de mêdo na cidade, o caes despovoou-se. A multidão correu espavorida, ullulando miséréres, estorcendo-se e pedindo perdão dos peccados, forçando, aos empurrões, puxadellas e hombradas, as portas das egrejas. Em casa o pavor era dominante. Com as velas accezas, as palinhas do ultimo domingo de Ramos, o pessoal da familia e creados ajoelhados, trêmulos, tínhamos o aspecto d’uma cidadella sitiada por uma arraçada mourisca. Só muito depois, quando meu pai regressou, é que nos fez recobrar o juízo e reatar relações cordiaes com o phenomeno. (CASCUDO, Luis da C. Histórias que o tempo leva… São Paulo: Monteiro Lobato & Co., 1924. [Coleção Mossoroense, série C, v. 757, 1991, p. 217 – 226.]).
Outro aspecto interessante na história de Cascudo sobre o holofote é como se dá o seu desfecho. Em sua casa
o pavor era dominante. Com as velas accezas, as palinhas do ultimo domingo de Ramos, o pessoal da familia e creados ajoelhados, trêmulos, tínhamos o aspecto d’uma cidadella sitiada por uma arraçada mourisca. Só muito depois, quando meu pai regressou, é que nos fez recobrar o juízo e reatar relações cordiaes com o phenomeno (CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1984., p. 225.).
FESTAS ABORDO
A chegada do vapor planeta, um dos menores vapores da companhia, foi acompanhada por uma grande festa de recepção, toda noticiada pelo periódico republicano. O navio foi construído em 1890 e em 1916 foi sucateado. Pesava 1.400 toneladas. Por volta das seis da manhã, parte da população natalense se dirigiu para o cais da alfândega, principal ponto de desembarque antes do cais da Tavares de Lyra ser efetivado para o posto de cais exclusivo de desembarque de passageiros.
À noite, a bordo do navio, foi dada uma festa, que reunia as figuras mais “ilustres segundo o jornal A República, da sociedade natalense”. O periódico não deixou de relatar os detalhes mais chamativos do evento, entre eles, o fato do navio ser todo iluminado com energia elétrica. É importante lembrar, que nesse momento, na cidade, o serviço de energia elétrica ainda não havia sido introduzido no espaço urbano. Apenas em 1911, com a construção da usina do oitizeiro, na região do baldo, sobre a propriedade da empresa de melhoramentos de Natal, foi que a energia elétrica de fato chegou a capital potiguar. Até este período, o serviço de iluminação era feito pelos lampiões movidos a gás acetileno, que por sua vez haviam substituído os lampiões movidos a querosene. Sobre a introdução do serviço de energia elétrica em Natal no começo do século XX, ver: ANDRADE, Alenuska. A eletricidade chega à cidade: inovação técnica e a vida urbana em Natal (1911-1940). 2009. Dissertação – Programa de Pós-graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2009.
As festas realizadas nos navios atracados no porto renderam comentários entusiásticos no periódico republicano. Antes da passagem do vapor planeta por Natal, outra festa a bordo de um navio havia rendido pela imprensa local declarações de encantamento por parte de membros das elites locais com as instalações da embarcação. Foi o caso da festa realizada a bordo do vapor Bolívar, logo no começo do ano de 1902. Lulu capeta, com seu humor característico, não se furtou em tecer suas impressões sobre a especial ocasião.
Esses valores modernos circulavam em Natal fossem por meio de propagandas nos principais periódicos, via produtos que chegavam dos navios ancorados no porto, nos nomes das lojas da capital, via transcrição de matérias divulgadas em jornais de outras capitais do país, via folhetins publicados nos periódicos ou por meio de livros de literatura e revistas francesas e ianques.
Assisti hontem a uma esplendia festa a bordo do Bolivar, um beo vapor inglez surto no porto d’esta cidade. O comandante James Good, é um cavalheiro distinctissimo, atencioso e… pandego. Torou-se champagne, como quem bebe agua, sahindo todos os convidados agradavelmente satisfeitos. Queira o distincto marinheiro, comandante Goog, e todo o pessoal do Bolivar, aceitar os meus sinceros cumprimentos, não esquecendo de, todas as vezes que ancorar por cá, promover muitas fests iguais a de hontem. Meu caro leitor, franqueza, si eu for outra vez ali, levo pra lá, com certeza, a vazia de drumi. (O BOLIVAR. A República, Natal, 17 de jan. de 1902.).
O Planeta não foi o único dos navios a despertar esse deslumbramento das elites locais. Outras embarcações também chamariam a atenção pelas suas singularidades. Em 1906, o periódico republicano comentaria a passagem no vapor norueguês, um dos três maiores nos últimos tempos segundo a Folha. No final da matéria, o jornal ainda criticaria o fato de grandes navios da Lloyd não passarem ainda pela cidade. (VAPOR norueguês. A República, Natal, 11 de jan. de 1906.). No ano de 1907, o periódico republicano publicaria uma matéria dedicada exclusivamente a descrever a estrutura interna de um dos grandes navios da companhia. O navio em caso era o vapor Ceará, destinado à escala de viagens do norte do país.
Acomodações de primeira classe, 20 de segunda e 300 de terceira, sendo os primeiros navios que possuem uma segunda classe especialmente construída para esse objetivo. Os navios tem camarotes de luxo, com salão, quarto de dormir e toilette com banheiro. Todos os camarotes são ventilados e iluminados à luz elétrica. O mobiliário é de primeira ordem, dando aos arranjos internos um ar agradável de bem estar e conforto. Possue um esplendido bar e salão de jogo e fumar, com um lindo hall de entrada e uma sala de visitas. (LLOYD Brasileiro. A Republica, Natal, 21 de maio de 1907.).
Podemos perceber, na descrição das instalações do navio, mais uma vez a atenção conferida à existência de luz elétrica a bordo. Como comentamos anteriormente, a cidade não dispunha de um serviço de iluminação elétrica no período em que tais embarcações atracavam no porto de Natal. Esses navios, ancorados no porto, permitiam que uma parte dos natalenses sonhasse com um mundo de experiências que desejavam avidamente consumir, e que por um momento, parecia tocar a cidade. Essas experiências não se restringiam apenas ao uso da energia elétrica, mas sim ao que a entrada desses navios no porto representava para capital potiguar.
O Ceará foi construído em 1907. Em 1927 renomeado Commandante Ripper. Em 1940 nome renomeado Comandante Ripper. Em 1962 foi descartado. Pesava 3.324 toneladas.
SEGURANÇA DOS NAVIOS
As embarcações que chegavam à cidade, deveriam também apresentar alguma bandeira de identificação da nação a qual pertenciam, elemento importante para a segurança da capital. A questão da segurança no porto, foi bastante destacada nas leis publicadas pela intendência, de maneira a evitar que este espaço se tornasse um lugar de desordem.
Em 1907, o capitão do porto de Natal, Arthur Alvim, comunicava pelo jornal A República, o despacho feito pelo Ministro da Marinha, que proibiu o embarque e desembarque de tripulantes de navios mercantes sem combinado termo de ajuste na capitania, em presença do capitão do navio e tripulantes. O problema da segurança no porto, não foi restrito a capital potiguar, sendo discutido pelos Ministros da Marinha e de Guerra, medidas que garantissem a defesa dos portos brasileiros. A criação de uma comissão de engenheiros e artilharia do Estado maior para o estudo da defesa dos portos seria recomendada pelo Ministro da Guerra.
COMUNICAÇÃO
Nesse novo cenário, a sensação de velocidade consistiu num dos sentimentos símbolos da modernidade da Belle Èpoque, estando ligada, em grande parte, ao desenvolvimento dos meios de comunicação e de transporte. Em Natal não foi diferente. Fora o telégrafo ótico da Catedral, utilizado para informar a entrada e saída de navios e suas especificações, a população não tinha do que desfrutar nem, tampouco, do que se orgulhar, antes da chegada do bonde movido a tração animal em 1908.
“Lembro o alvissareiro da torre da Matriz. Antes de 1862 estava o mastro fincado no pátio do Quartel Militar. Feita a torre da Matriz, chantaram o pau dos sinais no topo e perto do alvissareiro, João Irineu de Vasconcelos, ganhando 240 $ 000 por ano. Ficava ele olhando a cidade, morros, praias, rio e mar. Todo o horizonte era uma moldura circular para a sua curiosidade. Devia erguer uma bandeira sempre que avistasse navio. Do lado do norte do mastro se fosse barco vindo dessa zona. Do sul, se lá despontasse.”
(Luís da Câmara Cascudo)
O decreto estadual nº 156 de 18 de novembro de 1921 do governador Antônio J. de Mello e Souza restabeleceu o serviço “Telégrafo Óptico” operado pelos escoteiros do Alecrim. Tratava-se de um sistema de sinalização com bandeiras efetuado a partir da torre da igreja Catedral (ponto mais alto da cidade) onde eram indicadas informações como: saída e entrada de navios, se eram de guerra ou de transporte, nacionalidade, se havia enfermo a bordo, se pediam o prático, nome da embarcação e até se o navio batera na “baixinha”, a pedra famosa onde encalharam várias embarcações.
Segundo as “explicações”, o telégrafo começaria a funcionar a “um quarto antes do nascimento do sol, terminando um quarto de hora depois do ocaso”. São centenas as convenções, de acordo com o Código Marítimo Internacional, mas o nosso, da Catedral, só empregava três bandeiras – azuis e vermelhas, quadradas e em forma de quadriláteros, – e três galhardetes.
Entre outras informações, os sinais indicavam a saída e entrada dos navios; se eram de guerra ou transporte; nacionalidade; se estavam passando noutra direção ou vinham ancorar em Natal; se havia enfermo a bordo; se pediam o prático; nome da embarcação e da companhia de navegação, etc. Havia até um sinal que indicava se o navio batera na “baixinha”, a pedra famosa onde encalharam várias embarcações. O telégrafo óptico prestou serviço real à população natalense desde o século passado até, talvez, a década de trinta.
Consoante, Natal educava-se para os novos tempos. Para tanto era preciso polir os sentidos da população. Nesse aspecto os meios de comunicação tiveram papel primordial. Os jornais que circulavam em Natal mantinham colunas fixas sobre viajantes, anunciavam a todo o momento quem partia e quem chegava. A Republica é um desses exemplos, que na sua coluna social apresentava, com orgulho, o nome dos residentes que podiam participar dessa nova atividade. Na página dedicada à sociedade, os que viajavam de avião ganhavam um destaque especial, eram noticiadas as viagens de navio, de carro, o movimento dos portos. Essas colunas atravessaram as décadas de 1930, 1940 e 1950 recheando o imaginário da população com ideias de viagens.
SOCIABILIDADES
Entre 1900 e 1909 as exibições de filmes em Natal eram raras e em locais improvisados. A partir de 1909, entretanto, o Teatro Carlos Gomes (hoje Alberto Maranhão) passou a ter sessões com alguma regularidade. Este era também chamado de “Cinema Natal” e se caracterizou por exibir também films em sessões infantis. A máquina de projeção (cinematógrafo) chegou a Natal – vinda do Rio de Janeiro – em um dos navios do Loyd Brasileiro.
Sobre a primeira regata realizada em Natal, registrou ‘‘A República’’, de 16/11/1915 – ‘‘Todo o Cais, desde o Passo da Pátria até o elegante Pavilhão destinado aos convivas em frente à Praticagem, estava repleto de famílias do qual tomariam parte seis embarcações, todas elas tripuladas por competentes timoneiros e vigorosos mancebos. Os navios ancorados no Porto apitavam freneticamente; ao largo, embarcações da Praticagem do Porto; da Escola de Aprendizes Marinheiros, e uma lancha da Capitania dos Portos que conduzia o Governador, o Capitão do Porto, outras autoridades e alunas da Escola Doméstica de Natal que, ao término de cada páreo, premiavam as guarnições vencedoras com medalhas, ainda no leito do Potengi’’.
As comemorações do centenário da Independência do Brasil, em setembro de 1922, movimentaram os habitantes da cidade de Natal. Dentro dos festejos, três barcos de pescadores da Colônia José Bonifácio fizeram uma arriscada viagem ao Rio de Janeiro (Cf. GALVÃO, 2009, p. 88-90.). A iniciativa mobilizou governantes e populares a comparecerem ao cais da Avenida Tavares de Lira para prestigiar a partida dos aventureiros à capital federal. Finalizadas as comemorações do centenário de Independência do Brasil, no Rio de Janeiro, os pescadores natalenses, a bordo do navio Maranguape, retornaram a sua cidade no dia 19 de outubro de 1822.
Em artigo publicado em julho de 1930, Carmen Portinho, engenheira que representou o Rio Grande do Norte no IV Congresso Pan-Americano de Arquitetura, comentou outros pontos do Plano de Sistematização, que foi exposto no referido congresso ocorrido no Rio de Janeiro. A engenheira ressaltou que o novo planejamento ampliaria as vias de acesso do bairro comercial para outras partes da cidade. No porto seriam realizadas obras de dragagem, aprofundando e delimitando canais, removendo obstáculos, fixando dunas, entre outras medidas que permitissem a atracação de navios de maior calado(PORTINHO, Carmen V. A remodelação de Natal. A Republica, Natal, 13 jul. 1930.).
Nos anos 1930, a capital do RN também foi um dos principais pontos da linha da empresa francesa de transporte Aeropostal na América do Sul. Aqui era feita a baldeação das malas postais entre navios e aviões. Tripulações completas se hospedavam por aqui, convivendo com os natalenses.
Elissósio de Amorim Guimarães, funcionário do Departamento de Correios e Telégrafos, campeão de bilhar; poeta, publicou “Society” e “As bossas”, nos áureos tempos da boêmia, fez uma viagem para o Ceará, acompanhado da família. Os amigos naturalmente foram a bordo do “Ita” (os navios da Companhia de Navegação Costeira tinham nomes como Itapé, Itanagé, etc., que foram abreviados para “Ita”) e como não podia deixar de ser tomaram algumas centenas de chopes. Quando desceram o portal do navio vinham alegres e ao passarem na Rua Dr. Barata, Carlos Siqueira, poeta, trovador, funcionário da Estrada de Ferro Central e Renato dos Guimarães Wanderley, funcionário autárquico, tiveram uma ideia, considerada pelos demais, como notável, verdadeiramente genial. Entraram na tipografia do velho Augusto César Leite, tipógrafo, jornalista, proprietário de gráfica, publicou o jornal “Gazeta do Comércio”; um dos fundadores da Liga Artístico-Operária do RN (1904), e encomendaram um cento de cartões daqueles que trazem uma cegonha carregando um bebê chorão no bico, nos quais mandaram imprimir uns dizeres anunciando que Elissósio, comunicava aos amigos que nas águas do Atlântico, entre o Rio Grande do Norte e o Ceará, nascera o herdeiro da família e que por este motivo seria batizado com o nome de Navegantino. Quando Elissósio voltou e a casa se encheu de amigos para visitar o hipotético recém-nascido, ficou furioso e por muitos anos as inimizades rolaram por conta da pilheria.
O menino irrequieto, peralta, com o diabo no couro, era Raimundo Ramalho. A cidade pacata do interior era Macau, com o rio gemendo e as pilhas de sal se erguendo, com os canoeiros remando e as barcaças singrando o lamarão, levando para o bojo dos navios gigantescos toneladas e mais toneladas de sal. E Macau vivia a sua existência provinciana, somente quebrando a monotonia do burgo, as farras ruidosas dos trabalhadores das salinas, nos dias de sábado, dançando xote nas Quatro Bocas, ao som de uma velha sanfona e decidindo no “porrete” e na ponta das “lambedeiras” as suas diferenças na conquista da mulher amada…
REFORMA E AMPLIÇÃO
Durante o período de 1893 a 1930, a cidade de Natal passou por grandes transformações. Ruas e calçadas foram alteradas, novos espaços de sociabilidades foram construídos, novos serviços urbanos foram introduzidos, como a energia elétrica e o bonde.
As reformas do porto foram realizadas aos poucos, sendo concluídas oficialmente em 1932. Mesmo não estando inteiramente concluídas suas obras, o porto começou a funcionar, permitindo a entrada de navios em Natal, que traziam consigo grandes cargas de produtos para a cidade.
Inauguração do Cais do Porto de Natal em 1934 – O projeto do Cais do Porto de Natal foi aprovado em 14/12/1922, mas só dez anos depois foi autorizado o início da obra pelo governo Getúlio Vargas. A obra foi coordenada pelo engenheiro Hildebrando de Góis.
O investimento em estrutura urbana na capital surgiu de um esforço modernizador do prefeito Omar O’Grady (1924-1930) e dos governadores José Augusto de Medeiros (1924-1928) e Juvenal Lamartine de Faria (1928-1930), em uma busca por transformar a cidade no “Cais da Europa” (ARRAIS, 2012), já que recepção de fluxo de aviação (VIVEIROS, 2008) e navios, se tornava mais constante e projetava o desejo de expansão e visibilidade da cidade.
INSURREIÇÃO COMUNISTA
Em 1935 muitas autoridades estaduais civis e militares, como o capitão corveta Leonel Bastos, comandante da Escola de Aprendizes Marinheiros e o deputado Pedro Matos, se refugiaram (asilo político) em navio de guerra de bandeira mexicana que estava ancorado no Porto da Ribeira. Algumas dessas pessoas estavam no Teatro Carlos Gomes quando tomaram conhecimento da insurreição comunista.
PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
Antes da Primeira Guerra Mundial, o Lloyd dispunha de excelentes navios de passageiros e de cargas também, atuando em linhas para o Prata, para a América do Norte e Europa. Alguns dos nomes da fase: Rio de Janeiro, São Paulo, Acre, Pará, Satélite e Javari.
Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial quase todos esses barcos foram capturados pelos Aliados, ou se internaram em portos neutros.
O Brasil havia adotado, inicialmente, uma postura neutra neste confl ito bélico. Apenas em abril de 1917, decorridos quase três anos do início da Primeira Guerra, o país rompe sua neutralidade, após ter um navio, o vapor Paraná, um dos maiores da Marinha mercante, torpedeado por um submarino alemão, nas proximidades do cabo Barfleur, na França. É neste momento que Venceslau Brás, presidente do Brasil e, em consequência, presidente da Liga, declara guerra à Alemanha e aos países do Eixo.
Com a deterioração das relações diplomáticas entre o Brasil e a Alemanha os navios desta nação em nossos portos foram confiscados pelo nosso governo, sendo rebatizados e entregues a companhias de navegação nacionais. O Franken recebeu a denominação de Taubaté, e ficou sob a responsabilidade da empresa Lloyd Brasileiro.
A marinha mercante brasileira no início do último conflito era integrada, em sua maioria, por velhas embarcações, muitas das quais lançadas ao mar antes da Primeira Guerra Mundial. O Lloyd Brasileiro tinha alguns navios mistos mais modernos, para cargas e passageiros. A Companhia de Navegação Costeira, do empresário Henrique Lage, possuía a frota dos “Itas” e “Aras”, navios franceses para passageiros, com propulsão a diesel, de padrão de luxo. Além dessas empresas, a Companhia Comércio e Navegação e outros pequenos armadores exploravam o transporte de cargas entre os portos nacionais, passando a navegar para os Estados Unidos e a África com o advento da guerra.
Em 1917, durante a Primeira Guerra, o Paraná foi torpedeado por submarinos alemães em águas da França, o que provocou o rompimento de relações diplomáticas do Brasil com a Alemanha. Um dos resultados da decisão foi a ocupação dos cargueiros alemães que se encontravam em portos brasileiros.
Nesses navios obsoletos, as tripulações não desfrutavam do conforto oferecido pelos modernos barcos mercantes, sofrendo principalmente com o frio ou com o calor tórrido na casa de máquinas, onde penavam carvoeiros e foguistas. O pessoal das máquinas, além disso, em caso de emergência, precisava subir três escadas até o convés, devendo o oficial encarregado, antes de subir, parar a máquina sob a sua responsabilidade, para que a hélice não colhesse náufragos ou baleeiras em caso de torpedeamento. Outros heróis eram os telegrafistas, que, ao enviar pedidos de socorro, arriscavam-se a não ter acesso às baleeiras e expunham-se ao canhoneio e metralha dos submarinos contra suas cabinas, a fim de impedir a transmissão de qualquer informação sobre a posição do submersível.
Diante desses anseios, o porto de Natal se tornou um espaço fundamental na cidade para transportar, não só no sentido literal, mais também imaginativo, uma parte dos natalenses a esses códigos e valores compartilhados do outro lado do atlântico. Podemos dizer que o porto se transforma, no período republicano, numa fronteira entre Natal e o mundo moderno sonhado pelas elites locais. Fronteira pensada aqui não no sentido tradicional, enquanto demarcações físicas, territoriais, mais como construções humanas, históricas, que antes de antecederem os espaços, os produzem, não só do ponto de vista físico, mas, sobretudo simbólico. Pensamos a fronteira no sentido próximo ao que Michel de Certeau definiu como um lugar terceiro, jogo de interações e de entrevistas, a fronteira é como um vácuo, símbolo narrativo de intercâmbios e encontros”. (CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano. I. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 212.). Um espaço imaginário, constantemente resinificados pelos sujeitos. Nas expectativas construídas pelo periódico republicano em torno dos melhoramentos do porto podemos perceber como esse espaço vai adquirindo, na República, essa função.
SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
A chegada ao Cais do Porto de Natal do 31º Batalhão de Caçadores foi festivo e contou com discursos, bandas de músicas, formatura de militares estaduais, escoteiros do Alecrim, além da presença de autoridades estaduais e municipais e de uma multidão de populares dos vários bairros da cidade (Chegou, A República, Natal, 15 out. 1939.). O efetivo de 600 soldados do Batalhão desembarcou do navio e foi acompanhado em cortejo pelas ruas do bairro da Ribeira até as antigas instalações do Quartel do Exército, localizado na Cidade Alta, onde este batalhão ficaria alojado até a conclusão do Quartel do Tirol.
O setor industrial passou por uma revolução, principalmente a partir de 1940, em virtude da eclosão da Segunda Guerra Mundial; o modelo de substituição de importações foi revigorado. Houve um incremento considerável no setor industrial de bens de consumo não duráveis, gerando a necessidade de importação de maquinário para produzi-los. Visando a criação de condições para produzir esse maquinário, o governo passou a investir na indústria de base. Chegou-se a elaborar um plano qüinqüenal que consagrava fundamentalmente a instalação de uma usina de aço, uma hidrelétrica em Paulo Afonso, a construção de fábricas para a aviação, a drenagem do rio São Francisco, além da intenção de compra na Alemanha de navios para o Lloyd Brasileiro e de aviões. Não se chegou a consumar totalmente este plano, em virtude dos rumos da guerra e das pressões que se efetivaram sobre o governo brasileiro. (PENNA, 1999, p. 191-192).
A segunda Força Armada brasileira, a Marinha, também retardou sua chegada à Cidade do Natal. Segundo o Jornal A República, esta chegou oficialmente em 16 de março de 1941, com a visita do Ministro Aristides Guilherme para comunicar ao Intendente Estadual a construção de uma Base Naval em Natal. A previsão era que esta comporia o plano de defesa nacional e seria a única Base Naval no norte do país onde navios de grande porte poderiam ancorar por um período de tempo maior e onde se procederia, caso fosse necessário, manutenção e reparos nos navios de guerra brasileiros. A operação seria composta pela instalação de um “dique seco” (VAI ser construída uma base naval em Natal: um dique seco medindo 140 metros de comprimento. A República, Natal, 25 jun. 1942., p.8), onde os navios poderiam ser postos fora da água para que se efetuassem reparos na parte externa.
Ao longo desses primeiros anos, precisamente no início do ano de 1941, o Governo Federal declarou oficialmente que o país estava vivendo uma crise econômica, principalmente nos estados do Norte e Nordeste. Segundo Clementino (CLEMENTINO, Maria do Livramento M. Economia e modernização: o Rio Grande do Norte nos anos 70. Natal: UFRN/CCHLA, 1995.), as mercadorias produzidas para exportação entulhavam-se nos armazéns dos portos brasileiros e não conseguiam ser escoadas como o faziam anteriormente. As cidades, indistintamente começavam a sentir as consequências de não poderem receber os produtos para abastecer seus mercados. Em Natal, estoques de couro e de caroços de algodão ficaram empatados no Porto sem que houvesse previsão de chegada de navios para transportá-los, e a população começava a conviver com a falta de comida (Idem.).
Enquanto foi possível manter-se afastado das questões que se desenrolavam na Europa, o governo brasileiro “adotou uma estratégia de barganha”, cuja política externa caracterizava-se por uma posição de equidistância em relação à guerra que acontecia na Europa e ameaçava chegar às Américas. A postura do governo brasileiro teve, ao longo do ano de 1942, “de ser revista em função de modificações na conjuntura mundial. O avanço dos Aliados, que irá se concretizar no ano seguinte sobre o Eixo, exigiu uma reorientação da política externa do regime varguista, por ocasião da Conferência do Rio de Janeiro, em janeiro de 1942” (PENNA, 1999, p. 192). Nessa reunião, um encontro envolvendo os Ministros do Exterior dos países americanos, no qual o Brasil foi representado por Osvaldo Aranha, foi decretado o rompimento de relações diplomáticas com os países do Eixo. A Alemanha reagiu em meados de agosto: submarinos alemães torpedearam navios brasileiros, matando mais de 600 pessoas.
Ainda durante a Segunda Guerra Mundial, o Lloyd perdeu alguns navios da frota, torpedeados por submarinos alemães, todos em 1942, como o Buarque em 16 de fevereiro, o Cairu em 8 de março, o Cabedelo em 4 de abril, o Parnaíba em 1º de maio, o Comandante Lira em 18 de maio, o Gonçalves Dias em 24 de maio e o Alegrete em 1º de junho.
Entre os principais auxiliares do governo Vargas existiam simpatizantes dos regimes alemão e italiano e do liberalismo norte-americano e inglês. A pressão dos Estados Unidos, reforçada por empréstimos concedidos por bancos daquele país, precipitou, porém, o rompimento das relações diplomáticas do Brasil com a Alemanha, a Itália e o Japão. O afundamento de navios brasileiros levou o nosso governo a declarar guerra ao Eixo.
Dessa forma, o governo norte-americano, através do Ministério da Guerra “concluiu que a única solução prática para o problema da defesa seria a construção e melhoramento dos aeroportos no nordeste do Brasil. Essa construção seria executada em nome do Programa de Desenvolvimento dos Aeroportos e envolveria as linhas aéreas Pan American e suas subsidiárias” (SMITH, 1992, p. 23). Ato contínuo, uma multidão de funcionários do governo norte-americano instalou-se no Brasil, atuando em consonância com as orientações do governo brasileiro.
Pelo acordo acertado com os Estados Unidos, o Governo Brasileiro rompeu relações diplomáticas com a Alemanha, o Japão e a Itália e declarou seu apoio aos Estados Unidos. Ao meio do período em que se desenrolou o processo de negociação, entre os meses de março e agosto, vários navios mercantes brasileiros foram alvos de sucessivos bombardeamentos, o que, posteriormente, encurralou a neutralidade desejada pelo presidente Vargas e o obrigou a também declarar guerra aos países do Eixo no dia 22 de agosto de 1942. Ou seja, a partir de 31 de agosto de 1942, o Brasil entrou na guerra ao lado das Forças Aliadas e foi iniciado o Estado de Guerra em todo o território nacional.
A falta de informação e de registros na imprensa oficial da cidade foi uma constante nesse período. A inauguração das instalações da Base Aérea de Natal ocorreu em 7 de agosto de 1942 e suas atividades iniciaram com as operações de patrulhamento dos navios mercantes brasileiros e da costa do Rio Grande do Norte, do Ceará à Paraíba. As Forças Armadas estadunidenses instalaram duas bases em Natal, a que foi utilizada pelo seu Exército e outra, pela Marinha. Ambas operavam com atividades aéreas: aviões de guerra de grande porte e com pequenos hidroaviões e navios.
Para as elites locais, a conjuntura da Guerra Mundial confirmou a importância estratégica da Cidade do Natal e sua relação com a aviação mundial.
Após a assinatura dos acordos de cooperação militar com os Estados Unidos, a notícia de que as Forças Armadas Estadunidenses já estariam operando no litoral nordestino não causaria qualquer surpresa dentro da Cidade do Natal, uma vez que os Estados Unidos já haviam construído do outro lado da Base Aérea Brasileira, perto da lagoa, Parnamirim Field, o campo que mais ajudou a ganhar a guerra. Todos os serviços modernos, todos os recursos da técnica, possíveis ao gênio e ao dinheiro, estavam abundantemente acumulados em Parnamirim. A gasolina, média de 100.000 litros diários, vem de um pipe line com 20 quilômetros de distância, recebendo-a dos navios tanques, na cidade do Natal. (CASCUDO, 1999, p.422).
Sua presença dentro da cidade não requeria mais qualquer disfarce. Os militares estrangeiros estavam presentes em todas as ocasiões se assim o desejasse. Seus navios atracavam a toda hora e movimentavam o Porto de Natal. As cargas eram desembarcadas e transportadas em enormes caminhões com dezesseis rodas e com reboque (CASCUDO, 1999) que atravessavam a cidade na direção de Parnamirim, dando seguimento às obras da base aérea. Parnamirim Field se estruturava e se preparava para entrar em operação a qualquer momento.
O Governo se encarregava da iluminação das ruas, edifícios públicos, farol da barra e navios que, por ventura, estivessem atracados no Cais do Porto. Os procedimentos eram divulgados pela imprensa local que, ao mesmo tempo, tentava abrandar o pânico que se instalava entre os moradores da cidade.
As instalações portuárias, por sua vez, receberam inúmeras melhorias que possibilitaram aos estrangeiros o atracamento de navios maiores e o desembarque de grandes cargas. Natal, impulsionada pelo esforço de guerra, abriu-se ao mundo por meio dos investimentos dos governos norte-americano e brasileiro.
Em meados de 1942, Parnamirim Field era o aeroporto mais movimentado do mundo, “a maior mobilização técnica obtida pelos Estados Unidos fora de seu território” com “pistas de dois mil metros” que facilitavam a descida imediata de 250 aviões. Mil e quinhentos edifícios abrigavam 10.000 homens. (…) A gasolina, média de 100.000 litros diários, vem de um pipe line com 20 quilômetros de distância, recebendo-a dos navios tanques, na cidade do Natal” (CASCUDO, 1999, p. 422).
O abastecimento das bases militares na cidade era prioridade. Segundo o Jornal A República (O ABASTECIMENTO…, 1943)374, através da Comissão de Tabelamento e a Delegacia de Ordem Social, e apoiado na legislação nacional, a Intendência Estadual mandou averiguar os estoques existentes e mapear a produção do interior para estimular seu remanejamento para a capital. E, com tudo disso, a população da cidade sentiu as consequências da falta de comida:
De manhã, a caminho das minhas ocupações, levo de casa a impressão renovada das dificuldades domésticas. Giram na memória as lembranças da carne verde exposta aos últimos fregueses, as mercearias cheias, os navios descarregando, os preços razoáveis. No centro dessa gravitação o peso da vida atual, da falta de alimentos, do queixume epidêmico, da insuficiência dos recursos para a obtenção do que se necessita. A cidade, que era pequena, cresceu e cresceu muito, é um novo mundo. Novidades de toda sorte, e sobre todas as novidades, a mais impressionante delas – a da falta de gêneros (FRANÇA. Aderbal. Entre a ventura e o desengano. A República. Natal, 18 fev. 1943b, p.7).
Apesar da existência dos transportes ferroviários que interligavam o Rio Grande do Norte aos Estados de Pernambuco e da Paraíba, sua capital dependia fundamentalmente de navios e da produção do centro-sul do Brasil. Porém, com o bloqueio ao qual o Brasil estava submetido, o transporte de cabotagem estava suspenso.
Ainda agora o Interventor Fernandes Dantas telegrafou à Comissão de Marinha Mercante, solicitando que esse órgão tomasse as devidas providências a fim de que um dos nossos navios de cabotagem conduzisse gêneros que já não existem no mercado do Rio Grande do Norte (O TRANSPORTE de gêneros alimentícios para Natal: comentários do “Diário de Notícias” ao telegrama do Interventor Fernandes Dantas ao Presidente da Marinha Mercante. Agência Nacional apud A República. Natal, 27 out. 1943., p.8).
O ataque a navios brasileiros pelos alemães também foram motivos de dificuldades para a economia brasileira, principalmente relacionado ao aumento do custo de vida, o abastecimento de mercadorias, o impacto causado pelo consumo de combustível, que se tornou pela suspensão de petroleiros na costa leste dos Estados Unidos para o Brasil (FERREIRA, 2017), que segundo Ferraz (2005) foi sentida pelo cidadão comum de duas maneiras:
a) Através das estratégias do governo do Estado Novo de constituir um “front interno”, no qual se visava a mobilização dos trabalhadores pela defesa do país e pelo aumento da produção;
b) Na escassez e do encarecimento de produtos de consumo cotidiano, devido às dificuldades de importação e á especulação com os preços gêneros de primeira necessidade;
Com as escolhas feitas ao fim de 1942 de declarar guerra oficial ao Eixo, tornou-se mais eminente as notícias sobre guerra, principalmente ao ponto de assumir caráter informativo como aconteciam dinâmicas de aproximação e distanciamento do campo físico do Brasil, que passa por eminentes ataques a navios e teme por seu território (GOMES, 2017).
Em 1943, foi realizada uma “concorrência pública” para a exploração de um serviço de ônibus na capital, em consequência das constantes reclamações com relação ao então serviço de bondes. Ficava explícito na nota que o mercado está favorável para a implantação desse tipo de negócio modernizador, devido ao crescimento da economia potiguar, atestando que:
Isso afasta os possíveis riscos de insucesso para uma empresa particular que se dedicasse à exploração do serviço de ônibus. […] Precisamos ter visão comercial, e, sobretudo, espírito de colaboração com o governo, para ajudá-lo no seu propósito de melhorar os nossos transportes urbanos (A República, Natal, 5 dez. 1943).
Na passagem acima referida, percebe-se o interesse governamental na implantação do serviço, buscando o melhoramento na locomoção dos habitantes (particularmente a elite, uma vez que o transporte público não beneficiava os bairros pobres), bem como atingir os anseios de modernização da cidade por meio dos transportes e dos seus usos, confirmando a intenção de gradativamente substituir os bondes, os navios e trens por automotivos e aviões, que refletiam o futuro.
Parnamirim Field também foi campo de escala para vôos e viagens de personalidades famosas, como artistas de cinema a caminho do front europeu para divertirem as tropas: o ator Humphrey Bogart (em 1943), a atriz Kay Francis (em 1943 e 1945), o comediante Joe Brown e vários outros, além de autoridades aliadas, como madame Chiang Kai Chek, a mulher do general que presidia a China (em 1943), Franklin Delano Roosevelt, presidente dos Estados Unidos (embarcou de Parnamirim em 28 de janeiro de 1943, após se encontrar com o presidente Getúlio Vargas a bordo de um navio ancorado no rio Potengi)). Depois de almoçarem, inspecionarem a Base de Hidroaviões e o Campo de Parnamirim e visitaram, acompanhados do interventor Rafael Fernandes, do almirante Ary Parreiras e do brigadeiro Eduardo Gomes, os Quartéis do Exército e da Aeronáutica, jantaram a bordo do navio Humboldt. A preocupação com o lazer parecia ser parte de uma política de compensação e também uma tentativa para minimizar as necessidades que os soldados pudessem vir a ter de deixar o âmbito da base.
Oficiais brasileiros agora cooperavam estreitamente com a Marinha e a Força Aérea norte-americanas na guerra contra os submarinos, um processo que incluía o fornecimento aos brasileiros de aviões e navios norte-americanos, bem como de armas terrestres. Entretanto, isso implicava a necessidade de pessoal de manutenção do Exército dos EUA no Brasil. Em 1943, brasileiros e norte-americanos construíram uma rede de modernas bases militares aéreas e marítimas no litoral do Nordeste (SKIDMORE, 2003, p. 171-172).
No período da segunda guerra mundial, era Djalma Maranhão correspondente da Associated Press (1943). Desta fase é criação do jornal “O Monitor Comercial”, que Djalma ainda dirigia em 1950: noticiava o movimento de carga e descarga dos navios no porto de Natal.
O quadro de carestia só foi sanado no final de 1944, quando o transporte marítimo retomou a normalidade e os navios de cabotagem reiniciaram a
abastecer o comércio da Cidade do Natal. Seu comércio foi sendo paulatinamente abastecido, porém os preços não retrocederam aos patamares anteriores.
Com o término da Segunda Guerra Mundial, a Cidade de Natal enveredou em uma grave crise econômica, que vem a ser considerada como fato gerador da crise dos transportes. O Porto de Natal, que durante o conflito havia comportado um grande número de navios, inclusive os grandes navios de guerra norte-americanos, perde importância, mesmo com a inauguração de diversas obras para o melhoramento do serviço portuário em 25 de novembro de 1945 (Cf. O Diário, Natal, 25 nov. 1945.). Tais investimentos cessaram a partir desse ano, devido principalmente a crise econômica e a fuga do capital estrangeiro. O porto não foi devidamente dragado e, em 1950 (Cf. Diário de Natal, Natal, 9 dez. 1950.), o Sr. Rui Moreira Paiva, agente da Companhia de Navegação Costeira, informou à imprensa local que a barra estava obstruída, impossibilitando o acesso dos navios à Cidade de Natal.
É difícil avaliar o impacto desta mobilização nos dias de hoje: desde os equipamentos construídos, como um aeroporto, às estradas que foram abertas para facilitar o transporte de cargas, da utilização de moedas estrangeiras – principalmente o dólar— à popularização da língua inglesa, das festas necessárias aos divertimentos dos soldados brasileiros e americanos ao surgimento de aviões e de navios sofisticados, a cidade, que estava mal preparada, foi profunda e subitamente transformada. O ambiente muito movimentado e dinâmico durante os anos de guerra, que se verificava, por exemplo, no desenvolvimento intenso do comércio e na mudança dos costumes da população, produziu uma impressão de progresso jamais percebida até então. A cidade passa de 54 836 habitantes em 1940 a103 215 pessoas em 1950, ou seja, um aumento extraordinário de 88,22 % em apenas uma década.
E chegou a partida. Foi uma manhã de tristezas e de lágrimas quando o governo dos Estados Unidos mandou um navio para levar os corpos aqui sepultados de volta para a sua pátria. Foram mais de 50 ataúdes, cobertos com a bandeira nacional e embarcados no cais do porto, num ambiente de tristeza para as namoradas, os amigos e o povo em geral que durante toda a ocupação pacífica de Natal, tinha aprendido a conviver com a tropa aliada e passado, na sua quase totalidade, a estimá-los. Toda Natal, num gesto de alta significação para o moral da guerra, estava ali se despedindo de seus amigos do norte. Felizmente, o impacto não foi total pois, o resto da tropa foi saindo paulatinamente. E a cidade também se transformou. Aquele barulho esfusiante desapareceu. Voltamos aos nossos costumes do passado, é verdade, mas toda nossa alma estava mudada. Uma nova mentalidade se inseriu na velha cidade dos Reis Magos, pensando em quantos não mais voltariam a sua pátria de origem.
PÓS-GUERRA
Após a Segunda Guerra Mundial, o Lloyd comprou, nos Estados Unidos e Canadá, os cargueiros da série Nações. Na época, o nome da companhia era aportuguesado, Loide, assim como os batismos dos navios: Loide Argentina, Loide Cuba, Loide Honduras, Loide Uruguai, Loide América, Loide Canadá, Loide Brasil, Loide México e Loide Chile, entre outros. Essas embarcações ficaram conhecidas como Bombas, porque o desenho lembrava uma bomba. Foram excelentes navios, que navegaram mais de 20 anos. O Lloyd, terminada a Segunda Guerra Mundial, utilizou vários navios para o transporte de pracinhas e refugiados de guerra, entre eles o D. Pedro I, o D. Pedro II e o Barão de Jaceguai.
A necessidade de hotéis e pousadas na cidade devia-se ao movimento gerado pelo Porto. Situado no bairro da Ribeira, teve significativa importância na economia da cidade, durante as décadas de 50, 60,70. Com a freqüência desse tipo de transporte pessoal e cargueiro, o comércio e os serviços de apoio a atividade portuária foram se instalando ao redor do Cais, tanto serviços de atendimento ao público em geral como Bares (o atual Bar das Bandeiras, tem seu nome ligado às diversas bandeiras dos países de todo o mundo trazidas ao porto pelos navios), Restaurantes, Pousadas, como também de atendimento a demanda dos navios que atracavam no Porto. Ali estavam os comerciantes de peças para navios, técnicos e etc. Diante da necessidade de transporte dessas cargas para destinos interestaduais e intermunicipais, a Rede Ferroviária Federal se fez presente: a linha férrea chegava até os armazéns do Porto. Obviamente que sua função não era apenas essa, como foi, relatada anteriormente.
O bairro da Ribeira abarcava espaços destinados à prostituição e à prática de jogos de azar. As pensões alegres da Ribeira, algumas mais requintadas e outras mais modestas, eram frequentadas por jovens e velhos, marinheiros brasileiros e estrangeiros, cujos navios atracavam no Porto de Natal. No entanto, o bairro também possuía lugares destinados ao comércio de mercadorias importadas, como o Bar Natal, situado na Rua Doutor Barata, nº. 166 (BEBIDAS. A República. Natal, 01 jan. 1946, s/p).
Os botecos eram frequentados por marinheiros, trabalhadores do cais do porto, boêmios e prostitutas. Nesse estabelecimento comercial, nas palavras de Newton Navarro, ―chegam três mulheres de vestidos vistosos. Aceitam, sem reservas, uma ‗chamada‘. Estão à espera dos homens do navio estrangeiro, que logo mais chegarão para o festival da noite‖ (NAVARRO, Newton. Beira-Rio. Natal: Sebo Vermelho, 2011., p. 56.).
Navarro apresenta-se como o cronista da cidade e da boemia. Como frequentador da noite natalense, não define o que é boemia, mas seus escritos reforçam sua condição de observador noturno, como também de testemunha de fatos ocorridos às altas horas na capital potiguar. Na crônica Coisas, de A República, 31 de agosto de 1957:
Folheio lentamente a pequena caderneta. Passam notícias… Passam letras, pontos, rasuras, sinais, convenções. Mas aos poucos, essas anotações parecem criar alma e corpo. Me acreditem. Parecem viver e então passo a ver nas páginas meio sujas, pessoas, casas, praças; aquele barzinho de meia luz, com um marujo lá no canto, contemplando meio bêbado a sua estranha tatuagem no braço. Vejo mais coisas… Lonjuras, distancias, tempo batido de bruma, sentimento disperso, erradio… Vagabundagem. Beira de cais com navios tumarentos. Súbito a fumaça que tolda os olhos. Anuncia-se tudo. Fecho a caderneta. Deixo tudo. Caminho para a rua e embarco dentro da primeira hora cinzenta que prenuncia a noite. Nada mais (NAVARRO, A República, Natal, 31 ago. 1957, s/p.).
SS HOPE
O Projeto HOPE é uma iniciativa não governamental e filantrópica surgida no ano de 1958, quando Dwinght David Eisenhover, então presidente norte-americano (1953-1961), convidou o médico cardiologista Dr. William B. Walsh para coordenar e desenvolver atividades de promoção e cuidados à saúde em países em desenvolvimento. A ele também foram designadas a responsabilidade de angariar recursos financeiros e a organização de uma equipe de saúde, voluntária e multiprofissional.
Assim, para a vinda e permanência do navio-hospital SS HOPE a Natal, pelo período de dez meses (fevereiro a dezembro de 1972), foi necessário reunir esforços locais. Para tal, foi celebrado um convênio entre o governo do estado, por meio das Secretarias Estaduais de Planejamento-Coordenação Geral e de Saúde, representadas por Marcos César Formiga Ramos e Genibaldo Barros, respectivamente, e a UFRN, na pessoa do Reitor Genário Alves Fonseca, em 5 de outubro de 1971.
Este projeto sem fins lucrativos, cuja função precípua era desenvolver ações humanitárias e o intercâmbio entre os profissionais de saúde, utilizou-se do navio-hospital SS HOPE para realizar cruzeiros, entre os anos de 1960 e 1973, e manteve-se através de contribuições particulares dedutíveis no imposto de renda e de entidades sindicais, comerciais e industriais (equipamentos e produtos farmacêuticos). Contava com um corpo de profissionais de saúde voluntário e isso, no caso dos médicos e odontólogos, tornava possível realizar rodízios, a cada dois meses.
O navio-hospital SS HOPE era equipado com cento e dez leitos, biblioteca, bar, farmácia, anfiteatro, igreja, sala de aulas, refeitório, barbearia, banco de sangue, estação de rádio, sala de recreação, padaria, almoxarifado, heliporto, oficinas de consertos e reparos, açougue, gerador de energia, entre outros, e dispunha de modernos recursos audiovisuais de ensino.
Importa dizer que o navio-hospital SS HOPE realizou cruzeiros até o ano de 1973, sendo no ano seguinte aposentado e devolvido à Marinha norte-americana, que se responsabilizou pelo desmonte. Na atualidade, o Projeto HOPE mantém-se ativo dedicando-se à assistência humanitária terrestre por todo o planeta, implantando programas educativos e treinando profissionais de saúde. Para tal, mantém representações na Alemanha, Reino Unido e nos Estados Unidos.
Retornando ao Projeto HOPE em Natal, convém frisar que o mesmo permaneceu no período de 1972 a 1985, mas com atuações e denominações distintas, a saber: Projeto HOPE (1972), por ocasião da estadia do navio-hospital SS HOPE, cujas ações foram centradas na ajuda humanitária e no intercâmbio entre os profissionais de saúde; e Projeto HOPE Terra (1973-85), com seus funcionários atuando junto às instituições públicas de saúde ou na docência em cursos da saúde da UFRN.
NAUFRAGIOS
Mesmo lutando para construir uma imagem positiva dos serviços da barra, foi difícil para o periódico não provocar em seus leitores, dúvidas a respeito desses trabalhos mediante os vários casos de naufrágio que ocorriam no porto e que eram relatados no jornal. O caso do naufrágio do Vapor Brasil, em 1905, encalhado na barra, foi um desses acontecimentos indesejados pelo jornal e muito mais ainda pelos administradores norte-rio-grandenses, pela publicidade adquirida em jornais de outros estados. Tendo encalhado na Barra, segundo o jornal do comércio do Rio de Janeiro, o Vapor Planeta levou os seus passageiros a perderem muitas de suas mercadorias no mar, sendo abrigados pelos empregados da comissão de melhoramentos do porto, na Fortaleza dos Reis Magos. (VAPOR Brasil. A República, Natal, 29 de mar. de 1905.). Outro vapor, o Maranhão, foi enviado pela companhia de navegação Lloyd Brasileiro, para levar de volta para a capital federal, os passageiros e as mercadorias que sobreviveram. O vapor Brasil foi construído em 1890 e sucateado em 1924. Pesava 2003 toneladas.
O episódio gerou, inclusive no próprio jornal A República, algumas sátiras, como a publicada em 11 de abril, que afirmava que após o naufrágio, alguns cidadãos natalenses, adquiriram bonitos chapéus, todos estes encontrados no mar, resultado do inconveniente evento, sendo apelidado o navio de “Papai Brasil” (PAPAI Brasil. A República, Natal, 11 de abr. de 1905.). Um boato, por sinal, foi criado na cidade, de que um indivíduo havia achado, no rio, uma mala contendo joias preciosas. O boato logo fora desfeito pelo Coronel Cascudo, que conseguiu identificar o indivíduo, e descobrir que, na verdade, não havia joias na mala. Um dos passageiros, que realmente tinha joias, decidiu, na ocasião, fazer uma exposição na cidade de seu material, enquanto esperava o Vapor Maranhão, que vinha socorrer aqueles que haviam naufragado com o Vapor Brasil. ( EXPOSIÇÃO de joias. A República, 31 de mar. de 1905.). O vapor Maranhão iniciou suas atividades em 1887. Em 1891 foi transferido da Cia. Nacional de Nav. a Vapor, Rio de Janeiro. Em 1923 foi sucateado.
O episódio do naufrágio ocasionou também uma pequena desavença entre o periódico Republicano e o jornal do comércio, da capital federal, que segundo o jornal potiguar, estaria distorcendo as versões dos acontecimentos. Para os editores do A República, o naufrágio não fora provocado pela barra, o que havia sido ventilado pelo periódico carioca. O jornal potiguar não desistira de vender ao público natalense, a imagem de que não havia problemas com a Barra, que estava sendo transposta naturalmente por grandes navios. (A BARRA. A República, Natal, 6 de abr. de 1905.).
Com as recorrentes dificuldades dos seus navios em fundearem a barra, a companhia Lloyd Brasileiro, suspendeu a entrada de seus vapores na capital potiguar, enviando para Natal, um engenheiro representante da companhia com a missão de averiguar a situação da Baixinha e elaborar um novo plano de melhoramentos. O comandante Jaufrett veio a Natal, no dia 11 de julho de 1906, sendo recebido por Pereira Simões. Jaufrett visitou o porto, empreendendo sondagens sobre a região e sugerindo algumas mudanças nos trabalhos realizados pela comissão. Uma delas, era encontrar uma nova entrada para barra, já que no momento, por falta de verba e aparelhos adequados, o arrasamento da Baixinha não podia ser concretizado. A ideia era amenizar o raio da curva da concordância dos arrecifes, ampliando seu raio de curva interno. (OBRAS do porto. A República, Natal, 11 de jul. de 1906.).
Segundo o relatório feito por Jaufrett, o porto de Natal teria condições, até o final desse ano de receber, sem problemas, os navios do Llolyd. A companhia autorizou, no dia 21 de agosto a entrada de seus vapores com algumas restrições. Os vapores podiam, segundo o jornal que publicava as notícias referentes ao relatório do comandante inglês, entrar, desde que não tivessem o calado superior a 16 pés, além de ser imprescindível, se colocar, a noite, na região sul da Baixinha, uma boa iluminativa. No dia 22 de agosto desse ano o engenheiro chefe da comissão, Pereira Simões, enviou uma carta ao redator do jornal A República, comentando as afirmações publicadas no periódico, no dia anterior, do comandante Jaufrett.
Pereira Simões discordaria do representante da Lloyd, quando este afirmava que bastava seguir algumas condições para que os navios entrassem, até o final do ano, normalmente no porto. Para Simões, o representante achava, que, diminuindo parte da Baixinha e colocando uma boia, bastaria para entrada dos navios, no entanto, para o engenheiro-chefe, a entrada dos vapores só seria realmente possível, no final do ano seguinte, 1907, caso a comissão recebesse a verba requerida para os serviços.
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