A história da comunidade judaica em Natal

A presença judaica em Natal, Rio Grande do Norte, teve início nas décadas de 1910 e 1920, com imigrantes judeus oriundos de diversos países da Europa, como a Ucrânia, a Espanha e a Polônia, que chegaram à cidade atraídos pelo crescimento do comércio na região. O núcleo inicial foi em torno de quatro irmãos e um tio da família Palatnik. Conforme escreveram Egon e Frieda Wolff: “Seria difícil de imaginar a comunidade judaica de Natal, a partir do segundo decênio do século 20, sem os Palatnik”.

Antecedentes

Judeus expulsos dos seus lares na Europa Oriental – Fonte – https://en.wikipedia.org

Como sabemos, o Brasil é um caldeirão multicultural que possibilitou, dada a sua História, o diálogo entre diversas religiosidades. O que nos choca, hoje, são os diferentes tratamentos e (desconhecimentos a respeito dessas tradições. O Rio Grande do Norte, pela sua posição geográfica costeira e proximidade com a África e a Europa, foi um importante espaço de fluxo entre povos que transitavam daquele continente para cá, nos deixando um legado cultural rico e uma diversidade religiosa ímpar.

O estado potiguar possui, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2010, “tradições indígenas”, islâmicos, espíritas, judeus, candomblecistas, umbandistas, hinduístas, budistas e cristãos com suas várias vertentes. No que toca aos judeus, o RN tem 320 pessoas que se consideram judias, sendo que dessas 320, 266 habitam no município de Natal.

As perseguições ao povo judeu foram comuns ao longo da História. Dada a não crença no cristianismo, não considerando a divindade de Jesus Cristo, os judeus eram taxados, sobretudo, de indigentes, tendo sido criada, como forma de marcar negativamente sua imagem e representa-los como figura caricaturesca e demonizada, o que contribuiu para a consolidação de um feroz antissemitismo. A eles eram imputadas a culpa da morte do Cristo (deicídio); de profanarem a hóstia sagrada, já que não a consideravam como o corpo de deus (transubstanciação); de serem habitantes da nação, mas sem pertencerem aquele povo; de usura etc. O mínimo caso de meramente querer findar uma dívida que tinham para com eles já era motivo de atear fogo ao palheiro. Essa imagem e divulgação dessas ideias pejorativas ao povo judeu foi a razão de diversas ondas de violência, saques e assaltos às judiarias, o que muitas vezes culminava em expulsões a todo o povo judeu daquela região, o que ficou conhecido como “diáspora judaica”.

Monumento na Moldávia em honra aos que morreram nos progroms realizados na Bessarábia.

Para a historiadora este processo migratório dos judeus vai muito além de uma mera necessidade econômica. A questão judaica na Europa durante o século XIX até a primeira metade do século XX foi marcada por pressão e opressão, onde o espírito antissemita se manifestou nas esferas política, econômica e social, atingindo grande parte da população que hostilizava e culpava os judeus por toda sorte de mazelas. Deixar a Europa no final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX representava para eles antes de tudo uma questão de sobrevivência.

No século XX, essas ideias preconceituosas ainda imperavam e de origem a um forte movimento antissemita no leste europeu, tendo, anos mais tarde, esse antissemitismo nutrido e frutificado a ideologia nazista das primeiras décadas desse século.

O historiador Hans Borger (2002, p. 374) aponta que houve 691 pogroms entre 1903 e 1906, sendo a maioria desses atos violentos em solo ucraniano e marcando o país com sanguinária ideologia antijudaica. O antissemitismo era de tal forma comum que artigos e jornais antissemitas eram distribuídos nas praças e a sua ideologia era absorvida e reproduzida pelos operários de fábricas e pelos camponeses. Até mesmo os estudantes universitários reproduziam esse discurso e as ligas nacionalistas eram armadas e treinadas para matar revolucionários e judeus, ou ambos num só – como eram acusados de serem.

Essa onda antissemita forçou a migração de milhões judeus residentes naquela região europeia. Muitos buscaram a Palestina ou os Estados Unidos, locais com judeus fortemente ligados à politica e à economia, o que conta a sua liberdade religiosa e a legalização de sua entrada. No entanto, as migrações judaicas que acima de cudo buscavam sobrevivência, acarretavam um alto custo. Na medida em que almejava melhor qualidade de vida, isso acarretava em um espaço para morar, o custo com a embarcação, um Ando para a alimentação até se alojar e conseguir emprego etc. Diante disso, as possibilidades de escolha do novo pais não eram facultadas a todos os judeus.

Palatnik

Irmãos Palatnik

A família Palatnik, grupo familiar de judeus que vieram a Natal, deixaram a cidade da Podólia, na Ucrânia, em 1911, aportando aqui no Brasil em 1912. A escolha pelo Brasil foi influenciada pelas noticias que circulavam a Europa sobre as benesses concedidas aos imigrantes como politica económica desses países em desenvolvimento e que tinha recentemente abolido a escravidão.

Em calientes terras tupiniquins o Rio de Janeiro foi a primeira parada de Tobias Palatnik e seus parentes. Mas foi por um período curto e logo aqueles judeus seguiram para Salvador. Mas também a capital baiana não foi o melhor dos destinos e eles partiram para o norte, em direção à cidade do Recife, onde os Palatnik começaram a fazer sua clientela, em grande parte composta por operários.

Com o fim da escravidão em 1888, o Brasil perdera sua principal mão de obra e carecia de uma substituta. Ao invés de fomentar uma política reparatória e indenizatória aos negros, fortemente influencia pelos ideais eugenistas e raciais, as elites agropecuaristas e o governo decidiram substituir a mão de obra escrava pela dos imigrantes europeus.

O governo brasileiro já concedia outorgas desde o séc. XIX coma decadência do sistema escravista, tendo continuado essas concessões de terras e dinheiro para os imigrantes que aqui vinham para trabalhar. A historiadora Luciana Oliveira (2009, p. 73) aponta que a vinda dos Palatnik foi intencionada em receber os “200 hectares de terra fértil com água e floresta, além de 5000 réis para pagamento em dez parcelas anuais a partir do terceiro ano, sem juros, e isenção de impostos durante os cinco primeiros anos”.

Os primeiros judeus chegaram em terras natalenses no ano de 1912, fugindo dessas perseguições. Saídos da Ucrânia, um pequeno país do leste europeu que faz fronteira com a Rússia, buscavam uma vida mais segura e livre de opressões, tendo sido a Rússia um forte propagador das ideias antissemitas daquela época, que em muitas vezes resultaram em pogroms que dizimavam a etnia judaica naquela região.

Navios no Rio Potengi, em Natal.

Chegada ao Brasil, a família Palatnik, então formada pelos sobrinhos Tobias e seus irmãos, Adolfo, Jacob e José (este último com apenas 16 anos) e um tio Beinish (Braz) Palatnik, residiu alguns meses em Recife. A cidade conhecida como “Veneza Brasileira” eles aprenderam que, além do comércio realizado de porta a porta, mesmo falando o português ainda de forma rudimentar, eles podiam comprar no atacado e com exclusividade. Neste período a cambraia bordada foi seu principal produto.

Recife certamente ajudou os irmãos Palatnik a assegurar alguns lucros, mas a concorrência comercial na cidade era um problema complicado, que contava naquele período com 80 judeus atuando como prestamistas. Segundo a autora estes judeus que já atuavam em Recife eram em sua maioria rapazes solteiros, provenientes da Bessarábia (região histórica da Europa Oriental, cujo território se encontra principalmente na atual Moldávia), Polônia e a Ucrânia, que batalhavam duro para poder concretizar um objetivo comum – o desejo de conseguir meios para poder se estabelecer na Palestina com os demais familiares que deixaram na Europa Oriental. 

Foi então que Tobias Palatnik, o mais velho dos quatros irmãos, resolveu transferir-se para Natal objetivando fugir daquela concorrência. Uma das primeiras ações quando estavam aqui, estáveis e estruturados, foi a de estabelecer em Natal uma Kehila.

A escolha de pegar o trem e seguir em direção a Natal foi a melhor decisão que Tobias tomou quando chegou ao Brasil. Nessa época Natal ainda era uma pequena capital com população inferior a 25.000 habitantes, com apenas 27 famílias formada por estrangeiros, três linhas de bondes elétricos, uma catedral, um cinema mudo e que estava começando a passar por intensas transformações. A cidade estava aos poucos desabrochando e vivenciando o início da modernidade tão desejada pela elite local.

A organização e o estabelecimento de elementos em comum com outros judeus, como um local de culto e ensino da Torá (livro sagrado para o judaísmo, a Lei); uma escola para os filhos aprenderem hebraico e serem doutrinados nos princípios religiosos; bem como espaços de sociabilidade – criando e atando laços de irmandade – e de sepultamento dos seus pares foram fatores cruciais para a coesão e a sobrevivência de judeus na diáspora, já que a partir dessas Kehilá os judeus possuíam os serviços mínimos para sua subsistência.

Mas se por um lado a elite natalense se deleitava com os avanços e belezas da “Belle Époque”, uma grande parcela da sua população – os mais pobres – eram tratados de maneira verdadeiramente invisível.

Aqueles ucranianos, que sabiam bem o que significavam as violentas exclusões dos pogroms contra judeus na Europa Oriental, certamente perceberam que também havia exclusão em Natal. Mas esta era extremamente sutil, realizada de maneira covarde, praticada sem violência física contra uma massa morena, mas carregada de extrema hipocrisia. A exclusão em Natal diferenciava os seres humanos principalmente pela cor e condição socioeconômica.

Acredito que Tobias Palatnik percebeu de maneira muito correta que aquelas pessoas excluídas, mesmo com uma condição financeira mais limitada, apontavam para a possibilidade de um mercado consumidor extremamente promissor em Natal. Já a maioria dos seus concorrentes, membros de uma elite branca e racista, que praticavam intensos atos de exclusões sociais contra aquelas pessoas consideradas ralé, jamais iriam ate eles, bater nas portas dos seus “mocambos” para vender alguma coisa.

Negócios

Os conhecidos Mocambos, as moradias dos mais pobres de Natal.

Tobias Palatnik se deparou com um espaço que estava pronto para ser explorado. Percebeu que a venda a prestação tinha futuro na cidade e que a oportunidade comercial era bem melhor que em Recife. Logo avisou aos seus irmãos e estes seguiram para o novo destino e começaram um novo investimento.

Percebi lendo o texto da historiadora Luciana Souza de Oliveira e os jornais de época, que para os Palatnik a diferenciação dos natalenses abonados com os “negos”, como os mais ricos da cidade pejorativamente chamavam os mais pobres (que nem precisavam ser claramente afrodescendentes para assim serem classificados), era algo que nada lhes importava.

O que importava mesmo era negociar, chegar até o cliente, atender o desejo das pessoas, independente de onde eles moravam, ou da cor da sua pele…

Logo na primeira investida Tobias Palatnik pôde observar que só nas Rocas, a região dos pescadores, onde viviam os mais pobres da cidade, ele poderia conquistar facilmente mais de 200 clientes. Outra coisa que certamente o judeu percebeu foi que aquelas pessoas, não obstante suas limitadas condições financeiras, possuíam um acentuado sentido de honra em relação a quitação de suas dívidas financeiras, onde poucos se davam ao papel de caloteiros.

Bairro das Rocas.

Assim os produtos foram sendo oferecidos de porta em porta e logo se estabeleceram fortes laços econômicos. Mensalmente os irmãos passavam nas casas dos clientes, oferecendo novas mercadorias e estes pagavam as parcelas dos produtos que haviam sido anteriormente vendidos. Esse tipo de procedimento tornava a relação entre comerciante e cliente mais estreita, fazendo com que os anseios de consumo da sociedade local, mesmo dos mais humildes, fossem supridos de maneira pessoal. Segundo Luciana Souza de Oliveira os irmãos Palatnik foram os primeiros que trouxeram para a cidade essa nova maneira de comercializar.

Com arrojo e garra, aliado ao desejo de trabalhar e de prosperar em Natal, Tobias e seus irmãos alcançaram seus objetivos iniciais em menos de seis meses, quando conseguiram conquistar cerca de mil clientes.

A prosperidade econômica veio logo, rápida mesmo. Em 1915 os Palatnik puderam adquirir uma fazenda com uma usina de açúcar, álcool e aguardente. Mas o forte daqueles judeus era o comércio e foi com ele que a família Palatnik escreveu uma história de prosperidade na cidade.

Com a estruturação e o crescimento econômico daqueles judeus em Natal, esses jovens tiveram a oportunidade de ir à Palestina algumas vezes visitar seus parentes. Foi nessas poucas visitas que os jovens Palatnik constituíram suas famílias com as moças que residiam na chamada “Terra Santa”.

Mesmo construindo as suas vidas em Natal, mesmo aqui sendo a cidade que esses judeus escolheram para desenvolverem suas famílias, a cidade não poderia lhes oferecer alguns elementos responsáveis pela continuidade de sua identidade.

Diante disso, os Palatnik, unidos a outras famílias judias que começaram a emigrar para Natal, iniciaram um projeto de construção e implantação da Kehilá, sendo essenciais para essa organização uma sinagoga, uma escola e um cemitério.

Faltavam-lhes garotas que professasse a mesma fé e que tivesse os mesmos conceitos e valores para manter uma identidade judaica em seus lares. Vale ressaltar que aqueles jovens judeus conseguiram se relacionar muito bem com as pessoas em Natal, mesmo criando essa delimitação de não envolvimento de caráter íntimo e pessoal com aqueles que eram diferentes a sua cultura.

Ocorreram então várias uniões a partir de 1920. Com esses casamentos, muitos outros familiares, entre eles primos, irmãos, pais, tios e outros membros, decidiram deixar seus países e foram atraídos para a capital potiguar.

Essas ramificações e parentescos foram os elementos principais para que a família Palatnik se destacasse, tornando-se os membros proeminentes para o estabelecimento de uma comunidade judaica na cidade, pois o número de pessoas que gravitavam em torno deles crescia com o passar dos anos.

Familia Palatnik – Em pé, a partir da esquerda: Adolfo Palatnik, Jacob Palatnik, Braz Palatnik, Tobias Palatnik, José Palatnik, Tobias Prinzak, Moisés Kaller e Horácio Palatnik. Sentadas: Cipora Palatnik, Dora Palatnik (com Chimonit Palatnik no colo), Rivca Palatnik, Olga Palatnik (com Ester Palatnik no colo), Sônia Palatnik, Dora Kaller e Augusta Palatnik – Fonte – LUCIANA SOUZA DE OLIVEIRA, A FALA DOS PASSOS: IMIGRAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS JUDAICOS NA CIDADE DO NATAL, (1919-1968), NATAL, 2009, UFRN.
O escritor Luís da Câmara Cascudo participou da festa do Yom Kippur junto aos judeus de Natal e descreveu a visita em um interessante artigo – Fonte – Jornal ” A República” 12/11/1933.
Jose e Sonia Palatnik – – Fonte – LUCIANA SOUZA DE OLIVEIRA, A FALA DOS PASSOS: IMIGRAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS JUDAICOS NA CIDADE DO NATAL, (1919-1968), NATAL, 2009, UFRN.

De prestamistas eles abriram uma fábrica e uma loja de móveis chamada Casa Sion, sendo localizada a rua Dr. Barata, número 6, no bairro da Ribeira, uma das principais artérias comerciais da cidade na época.

Já Braz Palatnik surge com uma casa comercial na década de 1920, que inclusive era batizada com o seu nome e ficava localizada igualmente na rua Dr. Barata, nos números 204 e 205 e ali parece que ele vendia de tudo um pouco. Anúncios no jornal “A República”, o principal da cidade, mostra uma propaganda onde se oferecia guarda-chuvas, cobertas para camas, calçados para homens, tolhas, tecidos de cambraia e muitas outras coisas. Tempos depois esta loja mudou para a rua Ulisses Caldas, na esquina com a rua Felipe Camarão, no Centro da cidade, muito próximo, ou mesmo vizinho, ao Centro Israelita.

A foto e o texto acima mostram o lugar onde os destinos administrativos de Natal, capital do Rio Grande do Norte, são traçados e executados desde 1922. Oficialmente conhecido como Palácio Felipe Camarão é um marco na cidade, mas o que importa mesmo nessa nota de jornal é um pequeno detalhe no final do texto. Ali ficamos sabendo que os móveis construídos na época da inauguração desta marcante edificação, que não sei se ainda estão por lá, foram executados pela firma “Tobias Palatnik & Irmãos”.

Os proprietários desta empresa, com um sobrenome tão diferenciado dos tradicionais nomes familiares de origem portuguesa existentes em Natal, eram os membros de uma família de judeus ucranianos, que em poucos anos foram considerados os membros mais proeminentes da comunidade judaica em Natal.

No final da década de 1920, o costume do banho de mar já estava bem difundido, havendo até loja de roupas especializada, como a “Casa Braz Palatnik”, na Rua Ulysses Caldas, n.205. (A REPÚBLICA. Roupas para banhos de Mar, 27 set. 1927)

Em 1931 os irmãos Tobias e Braz Palatnik estão com uma fábrica de mosaicos na rua Extremoz e uma loja destes produtos na rua Dr. Barata, mas no número 190. Tinham também uma serraria na rua Ulisses Caldas e mantinham a Casa Sion para vender os móveis por eles fabricados.

5 de fevereiro de 1937

Em 1936 o antigo e marcante cinema Polytheama, referência da sétima arte na história da cidade e localizado na Praça Augusto Severo, 252, se torna a Casa Palatnik. Como em outros comércios destes judeus a diversificação e a variedade de produtos é a tônica da casa comercial. Ali se vendia desde camas de ferro, passando por móveis de vime e junco e até mesmo pedras para túmulos.

Conforme os Palatnik vão prosperando, eles vão participando de atividades junto à sociedade natalense. José Palatnik, por exemplo, se torna conselheiro da Associação Comercial de Natal e do conselho fiscal do Banco Industrial Norte-rio-grandense S.A.

25 de janeiro de 1939.

Temos a informação que Samuel Axelband fundou, em data desconhecida, uma loja chamada “Casa Glória”, especializada em artigos masculinos, no bairro da Ribeira, na Rua Dr. Barata, número 205. Ao lado da sua loja havia o comércio de um outro judeu, era a “J. Mandel & Cia”, um parente de sua esposa.

Além da diversificação de negócios, pesquisando nos jornais antigos fica patente como os Palatnik investiram forte na aquisição de imóveis por toda a área de Natal. Nessa época era normal que os documentos emitidos pela prefeitura da cidade nas negociações ligadas a imóveis, com exceção de valores, fossem divulgados nos jornais locais. Neste aspecto, principalmente no início da década de 1940, os Palatnik estão sempre presentes com pagamentos de impostos referente a muitas aquisições e venda de imóveis. Provavelmente perceberam que, mesmo de forma lenta, a cidade se expandia e a compra de imóveis era outra nova oportunidade de negócios a ser trabalhada.

O jornal Tribuna do Norte, na sua edição de 22 de novembro de 2013, informa que os irmãos Palatnik investiram na construção civil em Natal. Eles foram pioneiros na construção de conjuntos habitacionais: as primeiras casas da Ponta do Morcego (numa delas veraneava o governador Juvenal Lamartine) e a famosa Vila Palatnik, pegando a avenida Deodoro, rua Ulisses Caldas (em frente ao Colégio da Conceição) e rua coronel Cascudo.

Região da Ponta do Morcego, em Natal
Temos a informação que Samuel Axelband fundou, em data desconhecida, uma loja chamada “Casa Glória”, especializada em artigos masculinos, no bairro da Ribeira, na Rua Dr. Barata, número 205. Ao lado da sua loja havia o comércio de um outro judeu, era a “J. Mandel & Cia”, um parente de sua esposa.

CIRN

Muitos desses judeus, habitando ou não em Natal, estão vinculadas ao Centro Israelita do Rio Grande do Norte (CIRN) que, por sua vez, está vinculado à Confederação Israelita do Brasil (CONIB). O CIRN foi fundado no início do século XX, quando um grupo familiar de judeus do leste europeu foi motivado a deixar suas moradas para fugir das constantes perseguições e das opressões que sofriam naquela região e época. Segue a história do referido Centro:

A idealização da kehilá se tornou possível quando havia número de homens judeus suficientes para constituir o minián, uma vez que se erige, para qualquer atividade religiosa judaica, a presença de 10 homens que tenham feito o bar mitzvá. Em 1925, é estabelecido o Centro dos Israelita – embora oficialmente no tenha sido registrado em 18 de agosto de 1929 – que tinha suas atividades religiosas e sinagogais na casa da família Palanik, na Rua General Varela, 024, Cidade Alta/Natal.

Luciana de Oliveira (2009, p. 130) afirma que a propriedade à época era um grande sitio, tendo sido construído na frente da residência um salão para as reuniões da comunidade, que fora “chamado de Gan (jardim em hebraico), tiveram o cuidado em colocar dentro dele a Arca, um móvel de madeira trabalhada que tinha a função de abrigar a maior riqueza de uma Sinagoga: os rolos sagrados da Torá”. Esses rolos da Torá, ou sefer Torá, foram trazidos diretamente da Palestina por Tobias Palatnik, sendo essenciais para a atividade litúrgica judaica.

Sefer Torá são os rolos de papiro que possuem em hebraico os cinco livros da Torá, que são Bereshit, Shemot, Vayikrah, Bamidbar e Devarim ou Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Enquanto Chumash refere-se à Torá feito em livros impressos, ou seja, a versão “encadernada” do Pentateuco. Assim, chama-se de Sefer Torá apenas versão da Torá escrita em hebraico e em rolos e que é usada para fins litúrgicos nas sinagogas.

Com o crescente antissemitismo que assolava a Europa, devido à ascensão do nazismo, tornou-se pública e política essa perseguição, o fluxo migratório de judeus de vários países ao Brasil tornou-se grande, embora houvesse o antissemitismo de Getúlio Vargas e a sua proximidade à ideologia fascista de Benito Mussolini, que dificultava e freava a entrada de judeus ao Brasil. Ansiando uma grande comunidade judaica natalense, o então Centro Israelita Norte-Riograndense elaborou um estatuto, oficializando a posição da Sinagoga e de suas atividades.

Segundo um conjunto de fichas que classificaram os estrangeiros residentes em Natal, produzidas pelo Departamento de Segurança Pública em 1937 e atualmente guardada no Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Norte, descobri que dezesseis judeus, dessas seis famílias comentadas, vieram da Bessarábia e desembarcaram no Brasil entre 1912 e 1935. A maioria dessas pessoas inicialmente desembarcou em outras capitais brasileiras, para depois seguirem em momentos distintos para Natal. Eram homens e mulheres com idades variando de 61 a 19 anos, vindos das cidades de Secureni e Ataki, localizadas a nordeste da Bessarábia e distantes apenas 28 quilômetros uma da outra.

Educação

Jardim de Infância Palatnik – A partir da esquerda, em pé: Eliachiv Palatnik, Sofia Kaller, Ester Palatnik, David Fassberg, Ester Palatnik (filha de Elias) e Moisés Palatnik. Sentados: Aron Horovitz, Aminadav Palatnik, professora Sarah Branitzky, Sarita Volfzon, Raquel Horovitz, Nechama Kaller e Simon Masur. Na frente: (?), Nechama Palatnik, Achadam Masur e Genita Volfzon – Fonte – LUCIANA SOUZA DE OLIVEIRA, A FALA DOS PASSOS: IMIGRAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS JUDAICOS NA CIDADE DO NATAL, (1919-1968), NATAL, 2009, UFRN.

Um dos apontamentos do estatuto do Centro Israelita, especificamente o 2° parágrafo do artigo 1º, previa “Fazer funcionar uma escola gratuita, não só para os filhos dos israelitas, como para as crianças que a desejarem frequentar” (WOLF 1984, p. 46). A construção da escola foi feita também num espeço onde residia a família Palatnik, com o projeto pedagógico que seguia o modelo didático da Palestina e o material didático a ser usado fora também importado de lá (OLIVEIRA, 2009, p. 109).

A primeira docente do Jardim de Infância Herzlia foi Cípora Palatnik, esposa de Adolfo Palatnik. Com o passar do tempo e o aumento de alunos e de alunas, o Centro Israelita trouxe em 1927 da Palestina para a atividade docente a professora Sarah Branitzky, tendo esta passado pouco tempo, pois casara, tendo sido substituída pelo casal de professores Abraham e Sarah Lipman, sendo essa responsável pelos anos iniciais e aquele pelo hebraico e matemática, mas ela passou pouco tempo neste trabalho.

Ainda na década de 1920, um espaço regular de educação judaica para crianças começou a funcionar, junto a um programa de educação judaica complementar.

Muitas crianças judias que nasceram em Natal participavam não apenas da vida judaica, também se relacionavam com as outras crianças da cidade sem, no entanto, esquecer que mesmo sendo Potiguares, eram acima de tudo judeus, guardando e seguindo as tradições que eram ensinadas pelos seus pais. Uma destas crianças foi Uma das crianças judias nascidas em Natal, mais precisamente em 19 de fevereiro de 1928, foi Abrahan Palatnik.

Cemitério

Com o natural crescimento da comunidade local, que passou a contar com mais de trinta famílias de judeus, logo não eram apenas os aspectos ligados a vida terrena que preocupavam esta comunidade, as questões de morte também se tornou uma preocupação.

Estabelecidos e estruturados como Centro Israelita, fez-se necessário organizar um espaço sepulcral para cumprir seus ritos fúnebres alinhados à Lei a Torá (mitzvá). Para isso, o CIRN estabeleceu uma comissão para reivindicar frente à prefeitura um espaço para destinar os seus mortos.

Em 10 de janeiro de 1931, através de contatos entre os líderes da comunidade e a Prefeitura de Natal, cujo prefeito a época era o Sr. Gentil Ferreira de Souza, foi doada uma quadra murada no Cemitério Público do Alecrim para que os membros da comunidade judaica fossem enterrados mediante seus rituais tradicionais. Igualmente foi fundada uma sociedade funerária chamada Chevra Kadisha.

Recebida a doação, a comunidade judaica construiu o muro e em 10 de janeiro de 1931 foi inaugurado o “Cemitério Israelita”, que a partir de então abrigaria todos os judeus e ali se cumpririam as diretrizes de sepultamento judaicas, tendo sido criada até uma chevra kadisha. O Centro encarregou-se ainda de trazer para o cemitério israelita os restos mortais dos anteriormente falecidos e sepultados para ali serem abrigados.

O Cemitério Israelita se encontra na quadra nº 7 do Cemitério do Alecrim, na esquina das ruas Santa Rita de Cássia com a Santo Antônio. Ele hoje possui 24 túmulos, no qual estão presentes os judeus que compuseram o CIRN desde o século passado. Devido ao fato de hoje o Cemitério Público do Alecrim ser tombado e considerado patrimônio histórico do município de Natal, estão impossibilitados os novos sepultamentos e somente o pode haver caso já se tenha um túmulo no cemitério.

Até hoje existe este espaço exclusivo no Cemitério do Alecrim e entre os vários judeus natalenses enterrados está a lápide de Rosinha Palatnik. Ela faleceu no dia 7 de agosto de 1936, com apenas 20 anos de idade, depois de uma permanência no hospital de um mês e quinze dias em razão de uma apendicite. Rosinha era carioca, nascida Rosinha Tendler, filha de Boris e Anna Tendler e era casada com Horácio Palatnik (ver jornal “A República”, edição de domingo, 9 de agosto de 1936).

Túmulo de Rosinha Palatnik no Cemitério Público do Alecrim – Foto do autor.
Rosinha Palatnik

No abandono da quadra murada exclusiva para os membros da comunidade judaica/israelita em Natal também é notório o esquecimento. O conjunto de lápides com inscrições na língua hebraica e com a famosa estrela de Davi não chama tanta atenção quanto as sepulturas enormes e suntuosas.

Música

Os judeus também tiveram atuação expressiva na música na Cidade de Natal nas primeiras décadas do século XX. Sobre isso há a considerar Carta de Waldemar de Almeida datada de 28 de janeiro ao cronista Danilo, publicada em sua coluna “Sociaes”, com o título “Alguma coisa sobre música”.
A República, 31 de janeiro de 1936: Quando cheguei em Natal e um grupo de senhoras da sociedade pediu-me para ficar algum tempo lecionando piano. Não há por que não considerar a importância desse apelo na decisão do pianista.

Gumercindo Saraiva acrescenta ao conhecimento do fato os nomes (de algumas?) das pessoas que o estimularam: […] é procurado pelas exmas. senhoras d. Branca Pedroza, Anna Cicco, Rosinha Galvão e d. Cipora Palatnik para fundar um curso de piano. Ali nasceu, sob os auspícios dessas damas da sociedade natalense o Curso Waldemar de Almeida […]. SARAIVA, Gumercindo. “Waldemar de Almeida e a música no Rio Grande do Norte”.

Entre os primeiros alunos “Curso Waldemar de Almeida” estavam Cipora Palatnik e Nehama Palatnik Nehama Palatnik. Era uma época em que novas famílias judias se estabeleciam em Natal.

A exemplo da como a família Axelband em janeiro de 1938. Não sabemos como seu deu a chegada dessa família em Natal, qual negócio Samuel montou primeiramente e nem como se deu sua relação com a comunidade judaica e com a população local. Mas sabemos que quem se destacou em sua família na cidade por essa época, foi a sua filha Riva Axelband, que começou a chamar atenção do maestro Waldemar de Almeida como exímia pianista e logo a jovem realizava apresentações para a sociedade local. Como na 19ª audição do “Curso Waldemar de Almeida”, ocorrida em 31 de janeiro de 1938 no Teatro Carlos Gomes, atual Teatro Alberto Maranhão. No seu piano marca Albert Schmölz, Riva tocou a “Mazurca” opus 24 n. 1, do polonês Frederic Chopin e nos anos seguintes outros recitais se repetiriam.

Segunda Guerra Mundial

Durante a Segunda Guerra Mundial o Rio Grande do Norte sediou uma das maiores bases de aviação dos Aliados no hemisfério ocidental, a famosa Parnamirim Field. Este fato, ocorrido antes mesmo da declaração formal de guerra do Brasil contra os países do Eixo, proporcionou a chegada de muitos militares estadunidenses a Natal.

A presença de um pequeno número de soldados judeus, incluindo um capelão, Shaftei Baum, animou a vida comunitária. A escola judaica, que estava sem funcionar, foi formalmente reinaugurada pelo capelão Baum, em 15 de julho de 1944.

O Censo demográfico de 1940 apontou Natal registrou um total de 54.836 habitantes, os quais 109 eram judeus. Segundo Câmara Cascudo (Ver o livro História da Cidade do Natal, 1999, IHGRN, pág. 389) sua sinagoga havia sido fundada em 12 de janeiro de 1919, um domingo, quando a pandemia de Gripe Espanhola se encaminhava para seu final. É provável que a existência dessa comunidade judaica e o fato de prováveis parentes de sua esposa, cujo sobrenome de solteira era Mandel, já viverem e comerciarem em Natal, tenha influenciado Samuel Axelband a viver nessa parte do Brasil.

No convívio diário entre visitantes e os brasileiros de Natal houve antes outras influências estrangeiras, que os potiguares receberam de outras nações, como os comerciantes alemães, funcionários consulares, italianos, sírio/ libaneses, que os natalenses chamavam de turcos, os franceses da Latécoère, os ingleses e os judeus de várias nacionalidades.

E assim viviam, sob o mesmo teto, natalenses e adventícios. A cidade se modificava rapidamente, na rua Dr. Barata, durante o dia, podiam ser vistos generais de 4 estrelas, a bela artista de Hollywood – Kay Francis – exibindo sua silhueta sensual, o rei da Arábia, o comediante Joe Boca Larga e Buster Gordon. E ainda a viúva de Chiang Kai-Shek , os soldados comprando meias de seda, perfumes Channel e relógio de pulso e os militares confraternizando nos bares que os judeus de Recife abriram para ganhar o dólar fácil.

Em agosto de 1942 era o próprio Brasil que entrava na Segunda Guerra Mundial. Em Natal e a população foi chamada para participar do esforço de guerra, com ações da defesa passiva. A tradicional comunidade sírio-libanesa de Natal, tendo a frente Neif Habib Chalita e Kalil Abi Faraj, participou deste processo junto com outras colônias de estrangeiros que viviam na cidade, entre estas os judeus. Nestas atividades eles eram liderados por José Palatnik e Leon Volfzon. Não sabemos em que grau ocorreu a participação destas comunidades no processo de defesa passiva de Natal, nem como foi a interação de sírio-libaneses e judeus neste objetivo, mas tudo leva a crer que transcorreu sem maiores alterações em razão da inexistência de notícias apontando problemas.

Participação da tradicional comunidade sírio-libanesa de Natal no processo de defesa passiva da cidade durante a Segunda Guerra Mundial, juntamente com a comunidade judaica.

Com a chegada dos estadunidenses houve um aporte financeiro muito intenso na capital potiguar. Consequentemente a cidade se encheu de forasteiros em busca dos preciosos dólares e este aumento populacional trouxe consequências para Natal. Entre estes figuram o aumento da carestia e a falta de moradias e esse ultimo fato motivou os Palatnik a abrir um novo negócio – Uma loja de material de construção para abastecer um mercado que construía novas casa.

Provavelmente Samuel percebeu claramente a grande possibilidade de negócios que ocorreria com a Segunda Guerra Mundial e a presença de tropas americanas na capital potiguar em Natal. Logo seu negócio prosperou enormemente, ao ponto de fundar na Rua Chile, número 240, em frente a atual Capitania dos Portos, uma movelaria chamada “Progresso”.

Segundo o livro Natal, Uma comunidade singular, Egon e Frieda Wolff (Pág. 53, Rio de Janeiro, 1984), 30 dias após a morte de Franklin Delano Roosevelt, Presidente dos Estados Unidos, houve na sede do Centro Israelita de Natal (CEN), no centro da cidade a cerimônia dos trinta dias de falecimento, que na fé judaica se denomina Shloshim. O ato foi realizado pelo Rabino Baum e contou com a presença de militares americanos judeus. Também estiveram presentes vários judeus que moravam em Natal, entre eles Samuel Axelband. 

Mas a pequena e calma cidade, que crescia a olhos vistos, já não atraia os judeus como no passado.

Após o fim da guerra, como fizeram quase todos os judeus que viviam em Natal, os Axelband partiram da cidade nordestina que lhes deu tranquilidade para viver, mas que depois da Segunda Guerra e da partida das tropas estrangeiras, tinha pouco em termos econômicos a oferecer. Samuel foi viver em Recife, onde manteve uma representação de relógios.

Vila Palatnik.

Após a Segunda Guerra Mundial tem início a migração dos judeus natalenses para outros centros urbanos como Rio de Janeiro e Recife, mas alguns seguiram para o recém-criado Estado de Israel. Assim, com o número de judeus extremamente reduzidos em Natal, as atividades do Centro Israelita foram encerradas em novembro de 1968.

Segundo a historiadora Luciana Souza de Oliveira a história da presença dos judeus em Natal foi algo expressivo. Eles foram os responsáveis por construir na capital Potiguar uma das comunidades judaicas mais atuantes do Brasil, que chegou a ser conhecida na Palestina como a Jerusalém do Brasil.

Bairro da Ribeira, em Natal, na época da Segunda Guerra.
NATAL, BRASIL – JUNHO DE 1943: Uma visão como os soldados americanos falam com uma mulher local em Natal, Brasil. (Foto de Ivan Dmitri / Arquivos de Michael Ochs / Imagens Getty) *** Legenda local *** Trata-se da Vila Palatnik na Avenida Deodoro.
Av. Deodoro (Centro) Tive a grande oportunidade em ter residido na minha infância, em uma casa igual a essa (Av.Deodoro, 530). Lembro que todas eram iguais, parecia uma vila numa larga avenida. Existia em toda a avenida, no centro\canteiros, muitos pés de Ficos…jogávamos futebol e voleibol nas calçadas. Quando vinha um carro, era parado o jogo. Táxis? Eram jeeps. Lembro muito em ter andado em alguns deles. 1965 a 1969 quando passei a residir na Rua Jundiaí. Sempre admirei muito esta linda avenida. Hoje, lastimável este trecho: desfigurada, sem história…feia e suja. Um cenário de saudade com tristeza. Por Esdras Rebouças Nobre
O Centro Cultural Trampolim da Vitória acaba de ganhar o livro “Filhos de David” de Sonia Zyngier, que conta a saga dos Palatnik, famosos aqui em Natal pela Vila Palatnik entre outros! Muito obrigado à família! Durante a Segunda Guerra Simonita Palatnik se casou com o militar americano Abe Cohen e se mudaram para o Rio de Janeiro. Uma das filhas do casal veio a Natal e conheceu o Cctv Parnamirim. Ela e o marido foram comigo conhecer a Base Aérea de Natal, cheia de histórias dos seus pais. Por Ex-Rampa Fred

Atualidade

O CIRN manteve suas atividades religiosas até 1968, quando os judeus que o compunham e aqui viviam foram, pouco a pouco, migrando para outros estados brasileiros e outros países. No entanto, a comunidade seria revitalizada e um novo grupo de judeus reabriria as portas e atividades religiosas do CIRN.

Se a origem de uma comunidade judaica natalense está diretamente ligada ao antissemitismo, com a fuga dos Palatnik para o Brasil; a reabertura do CIRN também estava. Um grupo de judeus marranos reagruparam-se com o intuito de reativar a adormecida instituição. Esse grupo tinha em comum o fato de serem de ascendência ibérica e “cristãos-novos”, além da intenção de voltarem a viver como judeus praticantes.

Em março de 1979 esse já era um grupo coeso e que emitia um boletim informativo em nome do CIRN. Durante as próximas décadas, o CIRN desenvolveu-se, sob a justificativa de trazer para o seu seio os judeus sefarditas solo potiguar, para congregar, praticar as atividades e festividades religiosas e para viver conforme a Lei de Moisés. Atualmente, o CIRN é dirigido por Flávio Hebron e a Sinagoga Brás Palatnik serve não só de sinagoga para a liturgia judaica, como também de memorial, com um acervo iconográfico sobre a História do CIRN e dos judeus ancestrais potiguares.

Em sua grande maioria, os judeus do Rio Grande do Norte vivem em Natal e na região metropolitana. Segundo o censo oficial realizado pela Federação local, em 2005 existiam 75 famílias assim distribuídas: Natal: 50 famílias; Mossoró: 2 famílias; João Pessoa: 5 famílias; Campina Grande: 10 famílias; outras cidades: 13 famílias.

Figura 1 – Sinagoga Brás Palatnik (Foto: Diego Fontes, 2020).

Figura 2 – Cemitério Israelita, Cemitério Público do Alecrim (Foto: Diego Fontes, 2020).

Legado

As famílias judias que se estabeleceram na cidade mudariam não apenas a história dos judeus em Natal, mas o próprio espaço urbano e cultural. Foi na capital potiguar que eles tiveram a oportunidade de (re)construir as suas vidas oferecendo a cidade o que eles tinham de melhor: o trabalho e suas mercadorias. Em contrapartida a cidade os recebeu consumindo os seus produtos importados e dando a eles uma condição de vida digna na qual puderam oferecer a suas famílias o suprimento de suas necessidades.

A imigração deste grupo de judeus para Natal representou mais que um simples evento, foi a importante inserção de um povo, de uma cultura, uma religião, uma economia, organização espacial e social, bem como a (re)construção do “seu lugar” na capital Potiguar.

Homenagem

Abraham Palatnik: Um artista genuinamente potiguar nascido em Natal/1928. Tornou-se um artista de renome internacional quando foi o pioneiro da arte cinética no Brasil; a arte cinética é uma vertente das artes plásticas onde o artista manipula objetos dando movimentos causando ilusórios efeitos visuais para o espectador.

O artista americano Alexander Calder contemporâneo de Palatnik fez algo semelhante quando criou os seus “Móbiles”. Agora em 2008 o artista paraibano radicado em Natal J Medeiros criou na UFRN em homenagem, o Museu Abraham Palatnik.

Palatnik estava morando no Rio de Janeiro. Faleceu em maio de 2020 vítima de Covid.

Abrahan Palatnik com os pais, nos “Morcegos”

Fontes:

A HISTÓRIA DE UMA FAMÍLIA DE JUDEUS QUE FUGIU DAS PERSEGUIÇÕES EM SUA TERRA E VIERAM PARA A CIDADE DE NATAL PARA VIVER EM PAZ – Tok de História – https://tokdehistoria.com.br/2021/06/06/a-historia-de-uma-familia-de-judeus-que-fugiu-das-perseguicoes-em-sua-terra-e-vieram-para-a-cidade-de-natal-para-viver-em-paz/ – Acesso em 09/01/2022.

Centro Israelita do Rio Grande do Norte – Confederação Israelita do Brasil – https://www.conib.org.br/comunidades/centro-israelita-do-rio-grande-do-norte/ – Acesso em 09/01/2022.

JUDEUS EM NATAL – A SAGA DOS PALATNIK – Tok de História – https://tokdehistoria.com.br/2016/10/12/judeus-em-natal-a-saga-dos-palatinik/ – Acesso em 09/01/2022.

Memória minha comunidade: Alecrim / Carmen M. O. Alveal, Raimundo P. A. Arrais, Luciano F. D. Capistrano, Gabriela F. de Siqueira, Gustavo G. de L. Silva e Thaiany S. Silva – Natal: SEMURB, 2011.

Memória Religiosa da cidade de Natal: coletânea de ensaios / Irene van den Berg (Org.)-Natal/RN Editora, 2021.

Natal Não-Há-Tal: Aspectos da História da Cidade do Natal/ Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo; organização de João. Gothardo Dantas Emerenciano. _ Natal: Departamento de Informação, Pesquisa e Estatística, 2007.

SAIR CURADO PARA A VIDA E PARA O BEM: diagrama, linhas e dispersão de forças no complexus nosoespacial do Hospital de Caridade Juvino Barreto (1909-1927). RODRIGO OTÁVIO DA SILVA. NATAL. 2012.

O nosso maestro: biografia de Waldemar de Almeida / Claudio Galvão. Natal: EDUFRN, 2019.

Referências:

CASCUDO, Luís da Câmara. Yom Kippur em Natal. Jornal A República, Natal, n. 881, p.7, 12 nov. 1933.

BORGER, HANS. Uma história do povo judeu: das margens do Reno ao Jordão São Paulo: Séfer, 2002.

GRINBERG, Keila (org.). Os judeus no Brasil: inquisição, imigração e identidade, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

OLIVEIRA, Luciana Souza de. A fala dos passos: imigração e construção de espaços judaicos na cidade do Natal (1919-1968). 198f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-graduação em História, Universidade Federal de Rio Grande do Norte, Natal, 2009.

OLIVEIRA, Luciana Souza de. A fala dos passos: imigração e construção de espaços judaicos na cidade do Natal (1919-1968). 198f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-graduação em História, Universidade Federal de Rio Grande do Norte, Natal, 2009.

OKSMAN. Sérgio (dir.). Irmãos de Navio: Histórias da Imigração Judaica no Brasil. São Paulo: Documenta Filmes, 1996. DVD (60 min), son., color.

ROZENCHAN, Nacy. Os judeus de Natal: Uma comunidade segundo o registro de seu fundador. Revista Herança Judaica, n. 106, abr. 2000. São Paulo: B´nai B´rith 2000.

SCHEINDLIN, R. História ilustrada do povo judeu. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003.

WOLFF, Egon e Frieda. Natal: uma comunidade singular. Rio de Janeiro: Cemitério Comunal Israelita, 1984.

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